David narrando...
O silêncio dentro do avião era ensurdecedor. Meu coração estava em pedaços. Todas as vezes em que meu pai tentou conversar comigo e eu estava ocupado demais para dar atenção... A verdade é que o distanciamento entre nós foi culpa minha. Nunca admiti isso. Nunca reconheci que fui eu quem permitiu que aquela desgraçada entrasse em nossas vidas.
Meu pai sempre foi um bom pai. Mas agora era tarde. Ele se foi... e eu nem estava ao lado dele. Apenas uma moça — aquela de quem ele falava com tanto carinho há anos — estava com ele. Em todas as festas, ele sempre mencionava essa moça, e eu confesso: sentia ciúmes. Ele a tratava como filha.
Essa mulher que eu não conheço nem por foto é quem cuida da menina dos olhos do meu pai: o hotel em Manhattan. Ela começou ali ainda menina e, hoje, administra tudo.
Soube da morte dele por meio da minha assistente e amiga — Emily, que também é irmã do meu melhor amigo, Victor Rossel Colin. Ela me ligou em prantos, a voz trêmula. Disse que ele havia morrido nos braços dela. Da tal Alice.
Meu peito aperta.
Victor insistiu para me acompanhar. Sabia que eu ia desmoronar. Sentou-se ao meu lado no avião, em silêncio, como sempre fez nos piores momentos da minha vida. Só colocou a mão sobre meu ombro e ficou ali. Foi o suficiente.
— “Você não precisa passar por isso sozinho, irmão.” — ele disse antes de decolarmos. E por mais que eu quisesse me fechar, a presença dele era um alívio silencioso.
Do avião, vejo que já há um carro me esperando. Victor e Emily vieram comigo. Vou direto para o hotel. No salão de festas foi organizado o velório do meu pai. Assim que entro, vejo uma moça linda — corpo escultural, boca carnuda, cabelos ruivos e cacheados, olhos verdes.
Assim que nossos olhos se cruzam, sinto um arrepio percorrer todo o meu corpo. Nunca senti aquilo antes. Talvez fosse a dor de ver meu velho pai naquele caixão.
Ela segurava a mão dele. Estava com o rosto abatido, as lágrimas caíam sem cessar. Percebi que só poderia ser Alice.
Quando me aproximei e vi meu pai naquela situação, não consegui me conter. Caí em um choro desesperado. Aquela sensação de perda irreparável voltou — a mesma que senti quando enterrei minha mãe. Agora era ele. O homem que me ensinou tudo. A ser homem, a ser administrador, a ser CEO…
Victor ficou ao meu lado o tempo todo. Me amparou quando meus joelhos falharam. Emily distribuiu lenços, organizou os cumprimentos, manteve tudo funcionando com a frieza e a compaixão que só ela consegue equilibrar.
As horas passam. Pessoas vêm nos cumprimentar, nos dar condolências. Alice e eu não trocamos uma única palavra.
Chegou o momento do enterro. O cortejo foi enorme. Meu pai sempre foi muito respeitado. No cemitério, havia dezenas de pessoas. Quando o caixão desceu à sepultura, percebi: meu mundo tinha acabado de vez.
Alice, aquela menina linda, estava devastada. Chorava desesperadamente. Fiz algo sem pensar — a abracei. Ela se agarrou a mim como se eu fosse uma tábua de salvação. Choramos muito. Naquele momento entendi: ela também estava destruída. Amava meu pai como a um pai de verdade.
Victor nos observava de longe, atento, mas sem intervir. Emily chorava silenciosamente.
Voltamos ao hotel, cada um em um carro. Ao descermos, resolvi chamá-la para conversar.
David:
— Podemos conversar, senhorita Alice?
Alice:
— Sim, senhor Miller. Podemos ir até a minha sala.
Nada respondi. Apenas a segui.
Entramos numa sala pequena, porém aconchegante. Sentamos em dois sofás de couro, um de frente para o outro. Então comecei:
David:
— Senhorita Alice, sei que nunca nos conhecemos, apesar de todos esses anos em que a senhorita trabalhou aqui. Eu não era próximo do meu pai por... motivos que agora não vêm ao caso. Mas sei que vocês dois eram muito próximos, quase como pai e filha. E eu queria agradecer por ter cuidado dele nesse tempo em que estávamos afastados.
Alice:
— Senhor Miller, o senhor William foi meu apoio quando mais precisei. Ele me deu tudo que eu nunca tive na vida: amor de pai.
Sinto muito por vocês não terem tido a chance de se acertar antes de sua partida. Mas quero que saiba: ele amava muito o senhor. Ele me disse isso em suas últimas palavras, "Diga para o David meu filho que eu o amo e que eu sinto muito"
Ao ouvir essas palavras, uma lágrima escorreu involuntariamente do meu rosto. Sem pensar muito, ela a enxugou com o polegar. O gesto me pegou de surpresa. Fiquei sem reação. O toque daquelas mãos pequenas me arrepiou por inteiro. Nunca senti isso antes.
Mas decidi ignorar. Devia ser só vulnerabilidade pela perda.
Alice:
— Me desculpe, senhor Miller. Agi sem pensar. Quero que saiba que continuarei cuidando deste hotel, que era a menina dos olhos do senhor William, com o mesmo amor e dedicação de sempre... a não ser que o senhor não queira.
David:
— Por favor, me chame de David. E sim, senhorita Alice, você continuará sendo responsável por este hotel. Tenho outros hotéis pelo mundo para administrar. Seria demais para mim cuidar de tudo.
Alice:
— Então, por favor, me chame apenas de Alice.
David:
— Combinado. David e Alice, então.
Ela levantou as mãos e disse, sorrindo:
Alice:
— Combinado, David.
Nos cumprimentamos. Novamente, aquela sensação de arrepio percorreu meu corpo. Ela me olhava com intensidade.
Tentei retomar minha postura.
Não podia permitir que Alice visitasse minha cama. Meu pai jamais me perdoaria. E, além disso, ela parecia ser diferente de todas as outras mulheres que conheci.
Mas... eu não queria pensar nisso agora.
Mais tarde, reencontrei Victor e Emily no bar do hotel. Victor me olhou, levantando uma sobrancelha, curioso:
— “Então... como foi a conversa com a senhorita ruiva?” — ele provocou com um meio sorriso.
Revirei os olhos e bebi meu uísque em silêncio.
Emily apenas sorriu, como se já soubesse de tudo.
A verdade é que até eu já sabia: Alice não seria apenas um detalhe no meu luto. Ela estava prestes a se tornar parte essencial da minha vida — quer eu quisesse ou não...
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Atualizado até capítulo 53
Comments
Tânia Principe Dos Santos
lamento muito que David não tenha feito as pazes com o pai em vida
2025-08-02
1
Alvaneide Campos
Que pena que o David não abraçou o pai em vida, agora chora de arrependimento!!!
2025-08-02
2
Gislaine Duarte
esses dois vão dar o q falar
2025-08-03
1