O clima na mansão estava diferente naquele dia. A movimentação dos funcionários, o entra e sai de caixas com taças de cristal, os arranjos florais importados sendo posicionados nos cantos do salão.
Haveria um jantar.
Um evento elegante, exclusivo com investidores, figuras influentes e olhares atentos. Bernardo Vilela não era apenas um CEO; ele era o nome por trás de uma das maiores empresas de tecnologia de Nova Iorque, e jantares como aquele eram parte do jogo de poder.
Luna foi chamada cedo por Madeleine.
— Você vai cuidar da biblioteca. O senhor Vilela quer que esteja impecável, como nas fotos de revista. Tapetes alinhados, livros por cor e altura, poltronas limpas, bebidas dispostas com taças e copos certos. Entendido?
— Entendido — respondeu com firmeza, sem deixar transparecer o frio na barriga.
Era a primeira vez que teria tamanha responsabilidade sozinha. Mas aceitou o desafio como quem aceita enfrentar um furacão: de cabeça erguida.
Durante a tarde, Luna trabalhou em silêncio absoluto. Trocou o tapete, aspirou cada fresta do piso de madeira, limpou cada lombada dos livros, alinhou os quadros, posicionou as poltronas como se medisse com os olhos.
A biblioteca era seu refúgio dentro daquela mansão. Silenciosa, elegante, quente.
No canto, uma lareira apagada. Na parede oposta, uma estante que ia do chão ao teto. Luna a observava como se fosse um mundo inteiro. E talvez fosse.
Com tudo pronto, ajeitou um dos quadros que estava um pouco torto. Foi quando ouviu passos atrás de si. Não precisou virar. Já sabia quem era.
— Não sei se é sorte ou estratégia, mas você faz tudo parecer fácil — disse Bernardo, observando o ambiente.
Ela virou-se devagar, mantendo a postura.
— Não é fácil. Eu só faço com atenção.
Ele deu alguns passos, analisando os detalhes.
— Você tem um bom olho. Tudo está milimetricamente no lugar.
Ela sorriu de leve.
— O senhor disse que gosta de controle. Estou tentando manter o seu mundo organizado.
Ele a fitou por um segundo a mais do que o necessário.
— Está funcionando.
Por um instante, apenas o som de uma música instrumental distante preenchia o ar.
— Estará presente no jantar? — ela perguntou, tentando puxar de volta o profissionalismo.
— Claro. Eles vêm por mim, afinal.
— Então espero que sua biblioteca impressione tanto quanto seus discursos.
Ele sorriu de canto. Um raro sorriso.
— Você me provoca, Santiago?
— Não. Apenas constato.
Bernardo se aproximou até que houvesse menos de um metro entre eles. Luna podia sentir a presença dele como um campo magnético. Forte. Desconcertante.
— Você é diferente de tudo o que imaginei ao ler seu currículo — ele disse, a voz mais baixa.
Ela o olhou nos olhos.
— E o que imaginou?
— Alguém insegura. Tímida. Distraída.
— E o que encontrou?
Ele hesitou, como se estivesse atravessando uma linha invisível. Então respondeu:
— Uma mulher que me tira o foco.
Luna sentiu o coração acelerar. Mas antes que pudesse reagir, passos soaram do corredor. Bernardo recuou um passo com a mesma frieza com que se aproximara.
Madeleine surgiu à porta.
— Senhor Vilela, os convidados estão chegando.
— Já estou indo — respondeu ele, com a voz firme.
Luna aproveitou para sair também. Mas antes de desaparecer pela porta, Bernardo disse em tom baixo:
— Volte aqui depois do jantar. Preciso conversar.
Ela não respondeu. Apenas assentiu com um leve movimento de cabeça.
A noite avançou com risos altos, taças tilintando, sorrisos ensaiados e elogios falsos. Luna, como os outros empregados, ficou nos bastidores, observando discretamente.
Bernardo era magnético. Seu discurso fluía com a mesma facilidade com que dominava uma sala. Ela o observava por trás da parede de vidro que dava para o salão, sentindo algo estranho crescer dentro de si.
Admiração?
Desejo?
Perigo?
Tudo junto, talvez.
Horas depois, com o salão esvaziando, Luna voltou à biblioteca. Estava impecável, como antes. Mas agora, o ambiente parecia ter um peso diferente.
Bernardo entrou alguns minutos depois. Estava com o paletó desabotoado e a gravata frouxa. O cabelo levemente bagunçado.
— Obrigado por vir — ele disse, fechando a porta atrás de si.
— O que queria conversar?
Ele hesitou. Depois tirou o paletó, jogando-o sobre uma das poltronas. Aproximou-se devagar.
— Você me desconcerta, Luna. Desde que chegou.
Ela cruzou os braços, tentando manter a pose.
— Eu sou só uma funcionária.
— Não, você não é.
O ar pareceu sumir da sala.
— Eu não sou o tipo de homem que perde o controle, Luna. Mas… tem algo em você. Algo que desafia as regras que eu mesmo escrevi.
Ela respirou fundo, o coração martelando no peito.
— Então talvez esteja na hora de reescrever essas regras.
Bernardo parou a centímetros dela. Os olhares presos. A respiração pesada. As intenções mudas, mas evidentes.
Ela não recuou. E ele não avançou.
Mas o momento… queimava.
— Boa noite, senhor Vilela — ela sussurrou.
— Bernardo. Quando estamos assim, é Bernardo.
Luna saiu, sentindo a pele arrepiada e a alma inquieta.
O que estavam construindo ali… era perigoso demais para ter nome.
Mas impossível de ignorar.
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Atualizado até capítulo 45
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