A noite já havia caído sobre a mansão Albuquerque, e o jantar com os Martins terminara com risadas forçadas e promessas de novos negócios. Violeta, exausta, recolhia as últimas taças do salão de jantar, o eco das vozes dos convidados ainda ressoando em sua mente. Cada palavra de Clara, com seu tom melífluo e olhares provocantes para Erick, havia sido como uma faca sutil em seu peito. Mas o que realmente a deixava sem ar era o momento na cozinha, quando Erick a chamou pelo nome, sem o “senhor”, com um sorriso que parecia enxergar além do uniforme de empregada.
Enquanto empilhava os pratos na pia, Violeta ouviu passos leves atrás dela. Era Dona Rosa, com o avental já desamarrado, pronta para encerrar o dia. — Você tá muito calada, filha. Alguma coisa tá te incomodando, não tá? — perguntou, o tom carregado de uma mistura de cansaço e preocupação.
Violeta hesitou, enxugando as mãos no pano de prato. — Só cansada, mãe. Foi uma noite longa — respondeu, desviando o olhar. Ela não podia contar. Não ainda. Como explicaria que cada olhar de Erick parecia reacender uma chama que ela sabia que deveria apagar?
Rosa estreitou os olhos, mas não insistiu. — Então vai descansar. Amanhã tem mais trabalho. E cuidado com o que sonha, menina. Nem tudo que brilha é ouro — disse, com uma sabedoria que fez Violeta engolir em seco. Rosa sempre parecia saber mais do que dizia.
No andar de cima, Erick estava em seu quarto, a gravata solta sobre a cadeira e a camisa desabotoada no colarinho. Ele encarava o teto, recostado na cama, tentando entender por que sua mente insistia em voltar para Violeta. A filha da empregada, alguém que ele mal notava até poucos dias atrás, agora ocupava seus pensamentos com uma frequência desconcertante. Era o jeito como ela falava, com uma mistura de timidez e firmeza, ou talvez a forma como seus olhos pareciam carregar um peso que ele queria desvendar. “É só curiosidade”, pensou, tentando se convencer. Mas algo dentro dele dizia que era mais.
Enquanto isso, Dona Karen tomava um cálice de vinho na varanda privativa de sua suíte, o olhar perdido na escuridão do jardim. A cena na cozinha não saía de sua cabeça. Erick nunca conversava com os empregados além do necessário, e aquele momento com Violeta, por mais breve que fosse, acendeu um alerta em sua mente. Ela conhecia o filho o suficiente para perceber quando algo estava fora do lugar. E Violeta, com sua beleza discreta e seu jeito reservado, era uma ameaça que Karen não podia ignorar. “Pobres sempre querem subir na vida”, pensou, com um desprezo frio. Ela não permitiria que nada atrapalhasse os planos que tinha para Erick.
Na manhã seguinte, o sol mal havia nascido quando Violeta começou a limpar a sala de estar. Ela varria o chão de mármore com movimentos automáticos, perdida em pensamentos, quando Erick apareceu na entrada, segurando uma xícara de café. Ele estava mais casual hoje, com uma camiseta preta e jeans, mas ainda exalava uma aura de quem nasceu para comandar.
— Bom dia — disse ele, a voz rouca de quem acabou de acordar. Ele se encostou no batente da porta, observando-a com um interesse que não tentava esconder.
Violeta sentiu o rosto queimar, mas dessa vez conseguiu sustentar o olhar por um segundo a mais. — Bom dia, Erick — respondeu, lembrando-se de omitir o “senhor” como ele havia pedido. O som do nome dele em sua boca parecia íntimo, quase proibido.
Ele sorriu, um canto da boca se erguendo. — Você sempre começa tão cedo assim? — perguntou, dando um passo para dentro da sala.
— Alguém precisa, né? — respondeu ela, com um toque de humor que a surpreendeu. Era como se, na presença dele, uma parte dela se soltasse, desafiando o medo de cruzar uma linha invisível.
Erick riu baixo, e o som fez o coração de Violeta disparar. — Justo. Mas sabe, às vezes me pergunto como é a sua vida fora daqui. Você nunca fala de si mesma.
A pergunta pegou Violeta desprevenida. Ninguém na mansão jamais se interessara por sua vida além do trabalho. Ela hesitou, o cabo da vassoura firme entre os dedos. — Não tem muito pra contar. Trabalho aqui, ajudo minha mãe... é isso. — Ela baixou os olhos, temendo que ele visse demais.
Erick inclinou a cabeça, como se quisesse dizer algo, mas antes que pudesse, a voz de Karen cortou o ar como uma lâmina. — Erick, você já terminou de revisar os relatórios que pedi? — Ela surgiu na sala, impecável em um vestido azul-marinho, o olhar imediatamente caindo sobre Violeta. — E você, já terminou aqui? Não quero poeira na sala quando os investidores chegarem.
Violeta sentiu o peso daquele olhar, como se Karen pudesse enxergar seus pensamentos. — Sim, Dona Karen, já estou terminando — respondeu, a voz firme, mas com um tremor que só ela notou.
Erick franziu o cenho, notando o tom cortante da mãe. — Mãe, relaxa. A sala tá impecável — disse, com uma leve irritação que não passou despercebida por Karen.
Ela ergueu uma sobrancelha, mas não retrucou. Em vez disso, lançou um último olhar gélido para Violeta antes de se virar para Erick. — Vamos, temos muito a discutir antes da reunião. — O tom era uma ordem disfarçada de pedido.
Erick hesitou, olhando para Violeta por um instante a mais antes de seguir a mãe. Quando saiu, Violeta soltou o ar que não sabia que estava segurando. Algo estava mudando entre eles, e ela sentia isso como uma corrente elétrica. Mas o olhar de Karen era um lembrete claro: qualquer passo em falso poderia custar caro.
Naquela noite, sozinha em seu quarto simples nos fundos da mansão, Violeta abriu um caderno onde às vezes escrevia seus pensamentos. Com a caneta tremendo, ela anotou: *“Hoje ele perguntou sobre mim. Sobre mim. Será que ele realmente quer saber? Ou é só pena?”* Ela fechou o caderno com força, como se pudesse guardar seus sentimentos ali dentro. Mas, no fundo, sabia que o que estava começando a nascer entre ela e Erick não podia ser contido por páginas de papel.
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Atualizado até capítulo 26
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