05*

Luiza

Assim que cheguei em casa, mal tive tempo de colocar a chave na porta. A nona veio correndo pelo corredor, de avental sujo de farinha e um sorriso de orelha a orelha. Me envolveu num abraço apertado, daquele que só ela sabia dar.

— E aí, minha menina? Como você está se sentindo? — perguntou, ofegante, como se tivesse corrido uma maratona só de emoção.

— Maravilhosamente bem, nona. — sorri, sentindo o coração aquecido.

— Logo, logo teremos um bambino ou uma bambina correndo por essa casa, gritando, fazendo bagunça, derrubando panela... Ah, que alegria!

Ela beijou minha testa com carinho, e logo emendou:

— Vem, bambina! Vamos comer, que logo você estará comendo por dois. Tem que se alimentar bem desde já!

Fui com ela até a cozinha, onde um prato de lasanha recém-saído do forno me esperava. O cheiro do molho caseiro, o queijo derretido, o pão quentinho... Tudo aquilo parecia fazer parte da celebração silenciosa que começava dentro de mim.

Foram passando os dias, e então três semanas se completaram desde a inseminação. Meu retorno à clínica seria com quatro semanas, para a confirmação através do exame de sangue e o primeiro ultrassom. Mas, no fundo, eu já sabia.

Não era algo físico, era algo que vinha da alma. Eu sentia. No meu ventre, ainda plano, ainda silencioso, eu sentia o amor se formando.

Naquela noite, me deitei cedo, mas não consegui dormir. O travesseiro não confortava, o corpo parecia inquieto. Então, virei de lado, puxei a camiseta e deixei a barriga à mostra. Com a ponta dos dedos, comecei a acariciá-la com delicadeza, como se pudesse sentir a vida já pulsando ali.

— Oi, bebezinho... — sussurrei, com a voz embargada. — Eu sou sua mãe. E você é meu sonho consumado.

Uma lágrima escorreu no canto dos meus olhos, e deixei que ela caísse livremente.

— A mamãe te ama muito. Eu ainda não vi o positivo nos exames, mas meu coração sabe... Sabe que você está aí, sendo feito com o maior cuidado do mundo. Como um presente só meu.

Fiquei ali por um tempo, em silêncio, sentindo aquela conexão crescer. Até que, sem perceber, adormeci com a mão sobre a barriga, como se pudesse proteger aquele pequeno milagre antes mesmo de vê-lo.

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Enzo

Betina andava... diferente.

Chorava por tudo. Uma propaganda de margarina na TV já era motivo pra desabar. Na outra noite, ela me ligou chorando porque o sorvete dela tinha derretido antes de terminar. Além disso, as vontades loucas começaram.

— Amigo, eu tô com vontade de comer azeitona com brigadeiro. É normal isso? — perguntou ontem, com a cara mais séria do mundo.

Eu ri, meio nervoso, mas feliz. Por mais estranho que tudo fosse, fazia parte do processo. E, pra ser sincero, meu coração já estava se enchendo de esperança.

Hoje ela estava mais calma, mas ainda emocional. Sentamos na varanda do apartamento dela, e ela soltou:

— Amigo... Eu tenho certeza. Eu já tô grávida.

— Calma, Betina. Às vezes são os hormônios da medicação... — tentei ponderar.

— Não é, Enzo! Eu sinto! Aqui dentro! É seu bebê, eu tenho certeza.

Tentei não demonstrar tanto entusiasmo, pra não criar expectativas. Mas a verdade é que meu peito quase explodiu de alegria. A possibilidade de ter dado certo logo na primeira tentativa... de ter um filho crescendo, mesmo que ainda invisível... era forte demais.

Fiz um carinho em sua mão e sorri:

— Então vamos esperar a confirmação. Mas... eu também tô sentindo algo diferente.

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Clínica Fertile Vita — Departamento de Controle e Qualidade

No subsolo da clínica, entre arquivos e câmeras de vigilância, a supervisora do setor laboratorial, Dra. Matilde, revia os relatórios da semana. Por protocolo, toda movimentação de amostras, coletas e aplicações era registrada, tanto no sistema quanto por câmeras. Mas algo chamou sua atenção.

Havia um pequeno desvio de sequência nos códigos de duas amostras utilizadas exatamente no mesmo dia: uma pertencente ao paciente Enzo Bianchi, e outra identificada como anônima para uma paciente chamada Luiza Moretti.

Matilde apertou os olhos, ampliou a tela e revisou os carimbos de horário.

— Espera... as etiquetas estavam invertidas? — murmurou, puxando o histórico da recepção.

Chamou então uma técnica da equipe.

— Camila, esse código aqui foi manipulado por quem?

Camila franziu a testa, consultou a planilha e respondeu:

— Foi pela estagiária da tarde. Acho que... foi a Giulia.

Dra. Matilde fechou os olhos, respirou fundo e pegou o telefone. Ligou direto para a direção médica.

Minutos depois, ela estava reunida com o Dr. Pietro, médico de Enzo e Betina.

— Temos um problema em potencial. — começou Matilde, tensa. — A sequência de códigos da inseminação de duas pacientes no mesmo dia foi trocada na triagem de preparo. Acreditamos que a amostra de sêmen destinada à paciente Betina foi aplicada na paciente Luiza... e vice-versa.

Dr. Pietro levou as mãos ao rosto, chocado.

— Meu Deus... isso é gravíssimo. Vocês têm certeza?

— Ainda não. Não podemos confirmar sem testes genéticos. Mas os registros... apontam fortemente para essa troca.

— E os pacientes? Sabem de algo?

— Nenhum. As duas mulheres saíram da clínica confiantes. Estão aguardando confirmação da gravidez. A paciente Luiza acredita que recebeu material de doador anônimo. E Enzo acredita que Betina está carregando seu filho.

O silêncio caiu como uma bomba no consultório.

Dr. Pietro então disse, com a voz firme:

— Não vamos causar alarde agora. Vamos aguardar os exames das quatro semanas. Se ambas estiverem grávidas... saberemos como proceder. Mas mantenha sigilo absoluto.

Dra. Matilde assentiu.

— Sim, doutor. Mas cedo ou tarde... essa verdade vai bater à porta.

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Narrador

Duas vidas começam a crescer em silêncio. Duas mães se conectam aos seus bebês com o coração cheio de amor. E um pai... acredita que seu filho está a caminho pelas mãos de uma amiga.

Mas em algum lugar, a verdade pulsa. Esperando o momento certo para explodir.

Porque o destino, por mais caprichoso que seja, sempre cobra suas contas.

E quando isso acontecer... nada será como antes.

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Comments

Irene Corrêa

Irene Corrêa

rindo do jeito da Betina kkkkkk

2025-07-25

1

Silvia Moraes

Silvia Moraes

Coitada da Betina, tentando ajudar se meteu numa confusão.

2025-07-17

1

Naninha Oliveira da Rocha

Naninha Oliveira da Rocha

É o destino está traçado😉

2025-07-10

0

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