02*

 

Me chamo Luiza Moretti, tenho 26 anos, e sou auxiliar em uma creche no interior da Itália. Trabalho lá há alguns anos e, honestamente, não me vejo fazendo outra coisa. Meu mundo gira ao redor das crianças — daquelas mãozinhas sujas de tinta, dos choros desesperados por atenção, e principalmente daqueles sorrisos banguelas que me salvam nos piores dias.

Sou uma mulher simples, nascida e criada em uma vila pequena, onde todos sabem da vida de todos, e o cheiro de molho de tomate invade as ruas aos domingos. Minha criação não foi exatamente comum. Fui criada por minha nona Giovanna, uma típica italiana de sangue quente, dona de um coração enorme — e de um rolo de massa que ela jurava saber usar como arma.

Minha mãe — ou como costumo chamá-la, minha genitora — me deixou com a minha nona quando eu tinha apenas dois anos. Chegou numa tarde qualquer, me colocou nos braços daquela mulher forte e simples, e disse apenas: “É tua neta.” Depois disso, desapareceu como se nunca tivesse existido.

A nona não pensou duas vezes. Mesmo vivendo um dos momentos mais difíceis da sua vida, ela me acolheu. Havia perdido seu único filho — meu pai — há apenas um ano, em um trágico acidente de carro. A dor ainda era fresca, mas, de alguma forma, ela viu em mim uma chance de respirar de novo.

Cresci ouvindo histórias sobre meu pai. Minha nona mostrava fotos antigas dele — sorrindo, brincando, jovem — e dizia que ele teria sido um pai maravilhoso. Mas, para ser honesta, não me lembro dele. Nunca o conheci. Olho as fotos, escuto as histórias, mas não me reconheço naqueles traços. Às vezes penso se carrego mais da mulher que me deixou do que daquele homem que todos diziam ser bom. É uma dúvida que guardo só pra mim.

Mas se tem uma certeza que eu carrego é o amor da minha nona. Ela me deu tudo. Amor, valores, cuidado. Trabalhou duro a vida inteira para não me deixar faltar nada — e mesmo nos dias em que faltava, ela dava um jeito. Foi ela quem me ensinou a cozinhar, a respeitar os outros, e a me levantar sozinha sempre que a vida me derrubava.

Sou um pouco estourada, confesso. Tenho a língua afiada e, muitas vezes, falo sem pensar. Quando estou nervosa, gesticulo tanto com as mãos que já derrubei mais de uma xícara de café em brigas de bar. Às vezes falo rápido demais, misturo os assuntos, atropelo as palavras. Mas isso é só um detalhe. No fundo, sou uma mulher centrada, pé no chão. Desconfiada, sim, principalmente com homens.

Nunca acreditei muito nessa história de “príncipe encantado”. Já me envolvi com alguns homens, mas sempre acabava descobrindo uma traição, uma mentira, uma decepção qualquer. Isso só reforçou o que eu já desconfiava: não preciso de um homem para ser feliz. Posso me bastar. E me basto.

Foi então que, cercada pelo universo das crianças na creche, essa vontade de ser mãe começou a crescer dentro de mim. No começo, era uma coisa leve — um pensamento aqui, outro ali. Mas, com o tempo, passou a ser um desejo real, vivo, urgente. Ver aquelas crianças todos os dias, segurar aquelas mãozinhas pequenas, ouvir aquelas vozinhas doces chamando “tia Lu”, mexeu comigo de um jeito que eu não esperava.

Mas como realizar esse sonho sem estar casada? Sem sequer ter um namorado?

Simples: produção independente.

Não foi uma decisão fácil. Pensei muito antes de contar para a minha nona. Ela, com seu jeito tradicional e coração gigante, poderia não entender. Mas, para minha surpresa, ela me apoiou de imediato. “Se é isso que o seu coração quer, então vai atrás, minha filha”, disse ela, segurando minhas mãos com os olhos marejados.

Desde então, começamos a guardar dinheiro. Ela voltou a fazer doces e bolos para vender na feira da praça — seus famosos cannolis e sfogliatelles sumiam das barracas em minutos. E, mesmo quando eu dizia que podia cuidar sozinha, ela me dava sempre “uns trocadinhos”, como ela mesma chamava, pra ajudar com o “fundo do bebê”, como passou a dizer com orgulho.

Cada moeda guardada, cada doce vendido, cada hora extra que fiz na creche, me traziam um passo mais perto do meu sonho. Um sonho que muita gente julgava impossível, ou até errado. Mas eu nunca me importei com o que os outros pensam. Quem vive de acordo com o que os outros acham certo, acaba vivendo uma vida que não é sua.

Hoje, estou aqui, sentada em uma sala de espera de clínica, com as mãos suadas e o coração acelerado. É o dia da minha primeira consulta. Vou iniciar o processo de inseminação artificial.

Enquanto espero, olho para a barriga ainda vazia e tento imaginar o que está por vir. Medo? Sim, tenho. É muita coisa pra uma mulher só. Mas nunca tive dúvidas. Quero ser mãe com todo o meu coração. Quero sentir meu bebê crescendo dentro de mim, quero ouvir o batimento do seu coração pela primeira vez, quero acompanhar cada fase, cada chute, cada ultrassom.

Esse filho — que ainda nem começou a existir — já é amado. Já é esperado. Já é sonhado.

E quando ele chegar, vai ter uma mãe forte, decidida, cheia de amor. Vai ter também uma nona Giovanna com o rolo de massa na mão, pronta pra espantar qualquer um que se aproxime com más intenções. Vai crescer cercado de comida boa, valores firmes, e, principalmente, afeto.

Não sei como será o futuro. Não sei se vai ser fácil. Mas sei que, a partir de hoje, minha vida começa a mudar.

E eu estou pronta.

 

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Comments

Kelly Val

Kelly Val

Ser estourada é muito bom e espero que seja uma protagonista com personalidade forte e não leve desaforo para casa 🏠 e tão pouco engula "sapos " para agradar os outros. ( eu também gostaria de ser uma pessoa estourada, mas nasci com defeitinhos...minha paciência é como o universo "sem fim " dá até pra dormir 😴)

2025-07-26

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Kelly Val

Kelly Val

Autoraaaa❤️❤️❤️ que frase linda: " Esse filho já é amado, já é esperado, já é sonhado " autora que inspiração maravilhosa que palavras esplendorosa. Eu amo ser mãe, é uma benção divina e amo dizer a minha filha que ela é todos os dias o meu maior presente 🎁 é maravilhoso ser mãe ❤️

2025-07-26

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Kelly Val

Kelly Val

Mulher forte é outro nível: "eu já estou pronta." Autora ❤️ amo protagonista forte e determinada, nos inspira a reagir nos pequenos detalhes do dia-a-dia. Mulher determinada nos dá Motivação.

2025-07-26

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