A música voltou a animar o salão, e outras pessoas ocuparam a pista de dança com movimentos desajeitados ou exagerados, mas Lívia e Cael não voltaram para seus lugares. Permaneceram à margem da pista, como dois intrusos num universo paralelo, onde só eles pareciam existir.
— Você dança bem — comentou ela, ainda sentindo a presença das mãos dele na cintura.
— Só quando a pessoa me inspira — respondeu Cael, com aquele meio sorriso que mexia mais com ela do que deveria.
Lívia abaixou os olhos, tentando conter o rubor em suas bochechas. Ela estava acostumada a manter o controle, a ser centrada, racional. Mas com ele, tudo parecia flutuar fora do eixo. E o pior — ou melhor — é que ela gostava disso.
— Preciso de um pouco de ar — disse, apontando para o jardim externo.
— Eu também — respondeu ele, no mesmo instante.
Saíram juntos pela porta lateral que levava a um corredor iluminado por pequenas lanternas. A brisa noturna era fresca e trazia o cheiro das flores misturado à grama molhada. O céu, limpo, deixava ver as estrelas com clareza. Era como se o universo tivesse parado para observar aquele momento.
— Gosto de lugares assim — disse Cael, andando ao lado dela. — Longe da cidade, do barulho, das exigências.
— Você parece alguém acostumado com exigências — provocou Lívia, lançando-lhe um olhar curioso.
— Estou. Mas não quer dizer que eu goste disso.
Pararam perto de um banco de madeira. Ela se sentou primeiro, cruzando as pernas, enquanto ele permaneceu de pé por um momento, como se ainda decidisse se ficaria ou não. Depois, sentou-se ao lado dela, mas não muito perto. Havia espaço entre eles, mas também havia uma tensão sutil preenchendo o ar.
— Você parece uma mulher forte — comentou ele, com sinceridade na voz.
Lívia sorriu de lado.
— E isso é bom ou ruim?
— É fascinante. Mas às vezes, pessoas fortes carregam tanto sozinhas que se esquecem de pedir ajuda.
Ela mordeu o lábio inferior. Ele tinha o dom de atingi-la nos pontos mais sensíveis sem soar invasivo.
— Você é sempre assim? — perguntou ela. — Intenso, observador?
— Só quando algo — ou alguém — me desperta.
O silêncio que se seguiu foi mais eloquente do que qualquer resposta. Os olhos de Cael estavam sobre ela novamente, mas agora com uma intensidade mais densa, como se quisesse memorizar cada traço, cada detalhe de seu rosto.
Lívia desviou o olhar, respirando fundo. Sentia seu corpo reagir à proximidade dele de maneira incontrolável. O calor em sua pele, o leve tremor nas mãos, o coração acelerado... tudo parecia gritante, como se seu corpo soubesse o que a mente ainda resistia em aceitar.
— Acho que preciso voltar — disse ela, tentando se levantar.
Mas Cael segurou seu pulso, suavemente.
— Fica só mais um minuto.
Ela congelou. O toque dele não foi agressivo, nem insistente. Mas foi firme. Quente. E carregado de algo quase invisível — desejo contido.
— Está tudo bem? — perguntou ela, tentando entender o que se passava por trás daqueles olhos cinzentos.
— Eu não sei o que está acontecendo aqui — respondeu ele, encarando-a. — Mas sinto que, se eu deixar você ir agora, algo importante vai se perder.
Lívia sentiu o coração se apertar. Ela também sentia. Uma parte dela queria fugir, correr para longe daquilo. Mas outra parte, bem mais forte, queria ficar. Queria entender. Queria... se entregar.
— Às vezes, coisas importantes acontecem quando a gente não planeja — disse ela, sua voz quase um sussurro.
Cael se aproximou, lentamente. Seus rostos estavam a centímetros de distância. Ele não a beijou — ainda — mas seus narizes se tocaram, suas respirações se misturaram, e a expectativa entre os dois era palpável, como eletricidade correndo por fios invisíveis.
Lívia fechou os olhos por um segundo. E quando os abriu, ele ainda estava lá, olhando-a como se ela fosse a única verdade que conhecia naquele momento.
Mas então o som de passos e risadas vindos do salão os trouxe de volta à realidade. Lívia se afastou primeiro, recobrando o fôlego, como quem desperta de um sonho.
— Melhor voltarmos — disse, levantando-se de uma vez.
Cael assentiu, mas seus olhos ainda estavam sobre ela como se marcassem cada passo. Eles voltaram em silêncio, lado a lado, mas com algo diferente entre eles. Uma chama acesa. Um elo criado. Uma semente plantada sem que nenhum dos dois soubesse o que, exatamente, estava começando a florescer.
Dentro do salão, Mari apareceu imediatamente.
— Você sumiu de novo! Me deve uma dança!
— Agora? — perguntou Lívia, ainda meio fora do ar.
— Agora! Antes que eu caia de sono!
Lívia riu e se deixou levar, embora seus olhos ainda procurassem Cael entre os convidados.
Mas ele não estava mais lá.
Horas depois, já em casa, enquanto tirava o vestido e se deitava na cama com os cabelos ainda cheirando a perfume, Lívia se pegou pensando nele. No toque da mão em seu pulso. No calor da respiração. No olhar que dizia mais do que qualquer palavra dita naquela noite.
Ela não sabia seu sobrenome. Não sabia onde ele morava, nem seu número, nem se o veria novamente. Tudo o que sabia era que algo tinha mudado.
E, por mais que tentasse racionalizar, o que sentia dentro de si era real. Um desejo calmo, mas profundo. Uma certeza incômoda de que aquela história — aquela conexão — não tinha terminado ali.
Era só o começo.
E o acaso já começava a agir.
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Atualizado até capítulo 55
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