Amor no Silêncio – Capítulo 4
Quando o silêncio se transforma em música
Naquela noite, Luca não pregou os olhos. Ficou deitado olhando para o teto, as mãos cruzadas sobre o peito, sentindo o coração bater mais forte do que o normal. Cada batida parecia um aviso: “Amanhã tudo muda. Ou você voa... ou se esconde pra sempre.”
Ele sabia que Gabriel tinha razão. Que não podia viver eternamente se escondendo atrás da janela, atrás dos medos, dos traumas, do que os outros pensavam. Mas saber era bem diferente de conseguir.
Ao acordar, se olhou no espelho e tentou se enxergar como Gabriel o via: um cara forte, inteligente, gentil, que só tinha uma diferença — ele vivia no silêncio. Mas era inteiro, completo, suficiente.
Vestiu uma camisa preta, uma calça jeans simples, e colocou o colar com um pingente de clave de sol — presente de dona Elisa, a mãe de Aurora, quando ele era criança. Aquele símbolo sempre lembrava que a música podia existir mesmo sem som.
Quando desceu pro salão de festas do prédio, encontrou Gabriel já sentado no degrau, com um refrigerante na mão.
— “Aí está ele!” — disse Gabriel, abrindo os braços como quem recebe um herói. — “Preparado pra fazer história?”
Luca respirou fundo, levantou as mãos e sinalizou com um sorriso tímido:
— “Ou algo perto disso...”
Gabriel abriu a porta pesada. O salão estava vazio, meio empoeirado, com as cadeiras empilhadas no canto. Mas, no fundo, perto da parede de vidro, lá estava ele: o velho piano de cauda. Coberto por uma lona cinza, esquecido, como se o tempo tivesse parado ali.
Luca caminhou até ele, com passos lentos, e puxou a lona. A madeira escura estava um pouco desgastada, mas o brilho ainda resistia. Ele passou a mão suavemente pela tampa, sentindo cada ranhura, cada detalhe.
Sentou-se no banco. Os dedos pairaram sobre as teclas, hesitantes. Apoiou as mãos, fechou os olhos, e fez exatamente como dona Elisa ensinou anos atrás: não ouvir... mas sentir.
Pressionou a primeira tecla. A vibração subiu pelo corpo, começou nas pontas dos dedos, percorreu os braços e tomou o peito. Apertou outra, depois outra... e deixou que a memória guiasse seus movimentos.
A melodia era lenta, doce, carregada de sentimentos. Uma mistura de saudade, medo, esperança e amor. Gabriel, sentado no fundo, apenas observava, com um sorriso bobo no rosto.
— “Isso, cara... deixa ela ouvir você. Deixa ela te sentir...” — murmurava.
O som atravessava as paredes do salão, escapava pelas frestas, subia até os apartamentos... e até uma certa janela, onde Aurora estava sentada, desenhando distraída.
No início, ela nem percebeu. Só quando parou o lápis e sentiu algo diferente... um arrepio, uma memória. Levantou-se, foi até a janela, e seu olhar se fixou no prédio ao lado.
O salão estava com as luzes acesas. E ali, através do vidro, ela viu...
— “Luca...” — sussurrou, levando a mão aos lábios.
Fazia anos que não o via de perto, não daquele jeito. Tão entregue, tão vulnerável, tão... real.
Sem pensar muito, calçou os tênis, pegou um casaco e desceu as escadas. Cada degrau parecia mais rápido que o outro, o coração disparado no peito.
Quando chegou na porta do salão, parou. Respirou fundo, mordeu o lábio inferior, e por um segundo, hesitou.
Lá dentro, Luca estava completamente entregue à música. Nem percebeu quando Gabriel acenou discretamente para Aurora, dando um sorriso cúmplice, como quem dizia: “Vem... ele te espera, mesmo sem saber.”
Aurora empurrou a porta, que fez um leve rangido. Luca levantou o olhar, os dedos pararam no meio da nota. Seus olhos azuis se arregalaram. Por um segundo, o silêncio voltou... mas não aquele silêncio pesado, e sim um cheio de significados.
Ela deu dois passos pra dentro, cruzou os braços e sorriu.
— “Eu... fazia tempo que não te via... aqui...” — sua voz saiu suave, meio trêmula.
Gabriel se levantou, bateu palmas e sorriu largo:
— “Missão cumprida. Agora, eu... vou... beber água. Muita água. Lá em casa.” — e saiu, piscando pro amigo.
Luca olhou pra Aurora. Ela olhou pra ele.
O mundo inteiro ficou pequeno.
E então, com um sorriso tímido, ele sinalizou com as mãos:
— “Eu... senti sua falta.”
Ela não entendeu de imediato, mas sorriu, deu um passo mais perto e respondeu, olhando nos olhos dele:
— “E eu... senti sua falta também.”
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Atualizado até capítulo 46
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