capítulo 5

Refúgio Sob a Terra

O terceiro dia amanheceu cinzento, úmido e silencioso. A floresta começava a rarear quando Lisa parou diante de uma formação rochosa coberta por mato denso e raízes entrelaçadas. Ela se abaixou, afastou parte da vegetação com cuidado, e expôs o que parecia ser apenas terra... até que um velho painel metálico surgiu.

Puxou com força. Um rangido surdo se espalhou, e uma pequena abertura revelou uma escada íngreme que mergulhava na escuridão. Lisa acenou com a mão.

— Entrem. Rápido. Sem falar. Não deixem rastros na entrada.

Um a um, os sobreviventes passaram, olhos arregalados, silenciados não por medo, mas por espanto. Quando todos entraram, Lisa desceu por último e fechou o acesso com folhas, pedras e marcas falsas de pegadas levando para o norte.

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O Bunker Esquecido

Lá dentro, a escuridão logo deu lugar à surpresa.

Era um antigo bunker militar, enterrado sob a terra e quase engolido pela floresta. Mas por dentro, ainda funcionava. Havia camas de campanha, algumas barracas de lona armadas, armários com remendos de mantimentos antigos — enlatados, barras secas, poucos medicamentos já vencidos, mas ainda utilizáveis. E o mais raro de tudo: chuveiros.

Um painel antigo acendia suavemente graças à luz natural que entrava por uma abertura lateral no teto e alimentava um velho conjunto de placas solares.

— Isso é… inacreditável — murmurou um dos mais velhos.

— Faz anos que não vemos um lugar assim... — disse uma mulher, ajoelhando-se para pegar uma caixa de gaze.

Lisa não falou. Apenas caminhou até uma das passagens internas, abriu uma porta camuflada por equipamentos quebrados, e revelou uma segunda trilha: uma passagem longa, úmida e estreita que serpenteava dois quilômetros dentro da caverna até sair em um rio escondido.

Ali, três botes infláveis ainda estavam intactos.

— Se tudo falhar, essa é a rota de fuga — explicou. — Pelo rio. Mas só usamos se o bunker for descoberto. Por enquanto, aqui estamos a salvo. Por enquanto.

Ela retornou ao grupo e indicou onde os feridos deviam ser levados. Médicos improvisados começaram a cuidar das pernas machucadas, dos cortes, das febres. As crianças receberam água morna. Pela primeira vez em dias, muitos choraram — não de medo, mas de alívio.

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O Silêncio da Caçadora

Com todos abrigados, Lisa saiu novamente, sem dizer uma palavra. Subiu até a entrada, e com paciência e precisão apagou todos os rastros. Depois, foi ainda mais longe — caminhou dois quilômetros além da entrada, deixando vestígios falsos: marcas de passagem, cinzas de fogueira, até restos de comida.

Tudo para enganar os caçadores.

Tudo para ganhar tempo.

Tudo por eles.

Ela sabia que estavam sendo caçados sem descanso. Sabia que o rei não estava longe. Mas agora... agora os doentes tinham tempo. Os velhos podiam respirar. As crianças podiam dormir.

Lisa olhou para o céu cinzento, e sussurrou como fazia toda noite:

— Só mais um dia. Só mais uma chance. Só mais uma vida salva.

Então desapareceu entre as árvores, como um sussurro do próprio vento.

A Sombra Passa Sem Ver

Os rastreadores chegaram ao vale ao sul pouco antes do entardecer. Estavam exaustos, olhos vermelhos de tanto forçar a visão, narinas sensíveis de tanto farejar. E nada. Nada além de um rastro que levava a lugar nenhum — cinzas dispersas, pegadas confusas, marcas antigas misturadas com novas. Falsos sinais.

Passaram a menos de vinte metros da entrada camuflada do bunker. Olharam, farejaram... e seguiram adiante, convencidos de que o grupo havia virado para o leste.

— Eles passaram por aqui — disse um, cheirando o ar.

— Mas já seguiram. Estão mais longe agora — respondeu o outro.

Mais dois dias de caminhada. Nada. Nenhum sinal verdadeiro.

No quinto dia, eles voltaram.

De mãos vazias.

Com o orgulho ferido.

E o rei esperando.

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Fúria Silenciosa

Val’Khar os observava em pé, diante do trono de pedra negra. Nenhum deles ousava levantar os olhos.

— Nada? — perguntou, a voz baixa, porém carregada como o rugido de uma tempestade contida.

— Seguimos o rastro por dias. Foi um jogo de espelhos, meu rei. Alguém os protege. Alguém que pensa como nós — disse o líder, sem levantar a cabeça.

— Vocês passaram pela entrada — rosnou Val’Khar, dando um passo à frente. — Sentiram o cheiro do mato. O vento carregava traços. E nada?

O silêncio era resposta suficiente. Ele se virou de costas, mãos cerradas.

— Meus melhores homens enganados como crianças.

Como... tolos.

Então, outra patrulha entrou. Carregavam prisioneiros — um grupo de humanos capturados ao norte, rostos sujos e olhares vencidos. Val’Khar os encarou como se fossem vermes.

Aproximou-se de um deles. Um homem de meia-idade, magro, tremendo de medo.

— Você — disse o rei. — Fale.

O homem apenas chorava. Val’Khar se abaixou até os olhos deles estarem no mesmo nível.

— O que os torna diferentes? O que esse traidor sabe...? — sussurrou com ódio. — Como ele engana meu faro? Minhas garras? Meus olhos?

Mas o prisioneiro não sabia. Era só mais um sobrevivente. Fraco. Cego. Perdido.

Val’Khar se levantou e virou para os soldados.

— Esses... descartem. Não têm valor.

— Sim, meu rei.

Ele voltou ao trono. O sangue em suas veias pulsava como lava. Seus pensamentos eram uma tempestade.

Isso não era mais apenas fuga. Era provocação.

Era desafio.

Era pessoal.

E no fundo de sua mente, algo que ele se recusava a admitir começava a germinar:

“Isso não é obra de um traidor qualquer. Há algo mais. Algo... que me escapa.”

Ele olhou para o sul.

A respiração se intensificou.

A caça estava longe de acabar.

Mas a guerra... agora, era outra.

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