Saí da empresa com os punhos cerrados, as unhas cravadas na palma da mão numa tentativa inútil de conter a dor que ameaçava transbordar. As lágrimas escorriam em silêncio, deslizando pelas curvas do meu rosto como uma confissão muda, mas minha expressão permanecia impassível. Orgulhosa. Digna. Eu não podia permitir que ninguém visse o estrago que aquela rejeição havia causado dentro de mim.
Bem-vinda ao inferno, Zoe.
As palavras de Stefan reverberavam na minha mente como um martelo, impiedosas e frias. Ele não me olhou como família, como a filha do irmão que ele havia perdido mas sim como um fardo inconveniente, um problema a ser resolvido o mais rápido possível. E não com delicadeza.
O vento daquela tarde parecia querer rasgar minha pele, cortante e cruelmente, como tudo que me cercava desde que pus os pés novamente nesse mundo. Virei a esquina, afastando-me do prédio imponente que abrigava o império de diamantes dos Vitale. A fachada era de puro vidro, fino mas por trás daquela beleza havia apenas gelo e sombras.
Antonio, meu motorista, esperava alguns metros adiante, exatamente onde pedi. Discreto, distante o bastante para não chamar atenção. Entrei no carro sem dizer uma palavra, mordendo o lábio inferior com tanta força que senti o gosto metálico do sangue invadir minha boca.
Pelo retrovisor, vi os olhos escuros de Antonio me observarem com uma preocupação muda. Mas ele sabia — como sempre soube — que não adiantava perguntar. Eu não responderia. Nem saberia por onde começar.
O trajeto até a mansão foi um borrão. As luzes da cidade passavam como fantasmas pela janela, indiferentes à minha dor. Lá dentro, o silêncio era tão denso que chegava a doer. Eu podia ouvir meu próprio coração — descompassado, furioso, machucado. Abandonado.
Horas depois...
Ao chegar em casa, caminhei pelos corredores vazios como uma alma penada. O eco dos meus passos ressoava pelas paredes altas, preenchendo aquele vazio opressor que chamavam de lar. A mansão era grande demais para mim, com seus cômodos impecáveis, frios, sem alma. Nunca me senti tão sozinha em um lugar tão cheio de coisas.
Deixei-me cair na cama, ainda vestida com as mesmas roupas do dia. O cetim dos lençóis era gelado sob minha pele quente de raiva e tristeza. O teto ornamentado acima de mim girava lentamente, como se zombasse da minha instabilidade. Fechei os olhos, tentando bloquear a imagem do olhar cortante de Stefan, aquela indiferença cruel que doía mais do que qualquer palavra.
Quem poderia imaginar que eu teria um tio tão escroto?
— O que eu faço agora? — sussurrei para o vazio.
A pergunta ecoou no quarto, sem resposta. Minha mãe estava morta. Meu pai, também. E o único parente que me restava queria que eu desaparecesse. Eu não sabia se queria chorar ou destruir tudo ao meu redor.
No fim, o cansaço venceu. E adormeci no meio da dor, do abandono e das perguntas sem respostas.
Acordei com mãos ásperas acariciando meu rosto, e uma voz sussurrando com ternura:
— Menina? Você estava chorando no sono, menina...
Maria. A única constante naquele mundo que parecia em ruínas. Seus olhos estavam marejados, e o carinho que ela me oferecia era o mais próximo de amor que eu conhecia desde que minha mãe se foi.
— Por que ele me odeia tanto, Maria? — perguntei com a voz rouca, esgotada de tanto chorar em silêncio.
Maria suspirou, sentando-se ao meu lado na cama. Seu corpo curvado carregava o peso de anos de segredos, e suas mãos calejadas tremiam levemente.
— Ele não te odeia, minha flor... — respondeu suavemente. — Ele tem medo.
— Medo? Do quê?
Ela hesitou. Por um momento, parecia que encarava algo muito maior do que eu poderia compreender. Seus olhos se desviaram, como se procurassem força em algum ponto invisível do quarto.
— De você lembrá-lo do que ele perdeu.
Aquelas palavras me atingiram como um tapa. Sentei-me bruscamente, o coração batendo forte.
— Conte-me a verdade, Maria. Por que meu pai morreu? Por que eu e minha mãe sempre estivemos longe? Por que Stefan age como se eu fosse uma maldição?
Ela fechou os olhos. Por um segundo, achei que não responderia. Mas o silêncio dela era mais eloquente que qualquer palavra.
— Maria... você conheceu meus pais. De verdade. Por favor, me diga... por que cresci longe dele? Por que ninguém nunca me contou nada?
Seus olhos se encheram de conflito. Ela balançou a cabeça lentamente.
— Não posso, Zoe. É para sua proteção.
— Proteção de quê?! Meus pais estão mortos. E o único parente que me resta me odeia! O que mais pode me machucar?
Maria levou a mão ao peito, como se segurasse algo que ameaçava escapar.
— Só o Stefan pode te contar a verdade. Ele... ele sabe o que aconteceu.
Soltei um riso amargo, sem qualquer humor.
— Ele nunca vai me dizer nada. Ele quer que eu desapareça.
Ela não respondeu. Em vez disso, abriu os braços. E eu fui, sem resistir. Encolhi-me contra ela como uma criança perdida, afundando no abraço que era o único lar que me restava. Seu vestido cheirava a lavanda e canela. Um cheiro que trazia lembranças de dias mais simples, de uma infância abafada por silêncios, mas onde ainda havia aconchego.
Aqui, no colo de Maria, chorei como não chorava há anos. Chorei até não restar mais nada. Até que o cansaço me envolvesse outra vez.
Mas uma certeza crescia dentro de mim, junto com a dor, eu não poderia fugir para sempre.
Mais cedo ou mais tarde, teria que enfrentar o passado.E quando esse momento chegasse, nada mais seria o mesmo. Porque há verdades que mudam tudo.
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Atualizado até capítulo 39
Comments
Maria Aparecida
qual será o segredo?
2025-05-24
1
Carla Santos
O passado vai te deixar vulnerável e ao mesmo forte determinada para um futuro promissor o que tanto teme essa família esse segredos a chave da destruição e salvação de zoe da família Vitali.
2025-06-01
0
Maria Aparecida
Maria sabe de tudo, com certeza o segredo é bem pesado
2025-05-24
2