Prólogo
Rio de Janeiro, 1813
Dizem que o primeiro baile de uma dama é como seu nascimento para a sociedade. Se isso for verdade, então nasci em meio a uma noite abafada, com o cheiro de jasmim e suor impregnando o ar do salão do Paço Imperial.
O vestido azul-claro apertava meu busto de forma indecente — ou assim pensei, ao notar que ele parecia chamar mais atenção do que minha presença em si. O corpete subia demais, as fitas não paravam nos ombros, e mesmo assim minha mãe me garantiu que eu estava "radiante como uma princesa portuguesa".
— Pare de puxar o decote, Clara — disse mamãe, ajustando meu cabelo preso com pérolas. — Você está belíssima. Deixe-se admirar.
— Ninguém vai me chamar para dançar — murmurei, baixando os olhos. — Nem ele...
— Ele? — O olhar de minha mãe se aguçou. — Está falando do marquês Jordan Marinho?
Puxei o leque com pressa, tentando disfarçar o rubor que me subia às faces.
— Mamãe...
— Ora, minha filha. Todos sabem do seu encantamento por aquele rapaz desde que usava tranças e botas de couro. Mas Jordan é um marquês agora. Precisa agir como tal. E você, minha querida... você é uma dama em seu primeiro baile. Comporte-se como uma. Sorria, dance, seduza com os olhos. E, pelo amor de Deus, pare de franzir a testa.
Assenti, mesmo sem convicção.
Não que eu esperasse milagres. Sempre fui maior do que as outras moças da minha idade — não em altura, mas em curvas. Meu corpo parecia ter desabrochado antes do tempo, e por mais que os espelhos me mostrassem uma silhueta cheia, de seios generosos e quadris arredondados, minha mente me lembrava, a cada instante, que eu não era como elas.
E mesmo assim... mesmo assim, parte de mim sonhava que Jordan olharia para mim aquela noite. Só uma dança. Só uma palavra.
Vi-o assim que entrei no salão. Alto, elegante, com aquele olhar preguiçoso de quem domina o ambiente sem esforço. Conversava com dois oficiais da guarda, rindo de algo que eu nunca saberia. Quando nossos olhos se cruzaram, meu coração deu um salto. Sorri. Ele, no entanto, apenas inclinou a cabeça em saudação... e virou-se de volta para seus amigos.
Meu sorriso murchou como as flores do meu leque.
— Não fique parada, moça — sussurrou minha mãe. — Você vai ser chamada. Eu prometo.
Mas a música mudou três vezes. Vi moças sendo conduzidas à pista com sorrisos extasiados. Vi minha prima Julieta dançar com um conde. Vi Jordan tirar uma moça loura — muito magra e muito elegante — para dançar uma valsa lenta. E então, foi como se o salão se esvaziasse ao meu redor.
Até que uma voz, vinda da esquerda, interrompeu minha dor silenciosa.
— Permite-me esta dança?
Virei-me, surpresa. Era um homem que eu nunca havia visto antes. Elegante, moreno, com olhos castanho-claros e um sorriso contido. Tinha sotaque lusitano, mas seus modos eram impecáveis.
— Sou Alex Hider — disse, com um breve aceno. — Duque de Portugal.
Olhei para sua mão estendida, depois para meu reflexo nos espelhos dourados do salão. Havia mesmo alguém me pedindo para dançar?
— Claro — respondi, com a voz baixa, colocando a mão na sua. Sua luva era quente.
Enquanto girávamos pela pista, percebi que todos olhavam. Talvez pela surpresa de me ver dançando. Talvez por ele ser um duque. Mas pela primeira vez naquela noite, senti-me... suficiente.
Alex me elogiou, falou do calor carioca e me fez rir com suas observações sobre os nobres da corte. Era gentil. Educado. Atento. Mas enquanto dançávamos, meus olhos ainda procuravam Jordan no salão.
Ele não olhava para mim.
Ele nunca olhava para mim.
E ainda assim, no fundo do meu coração, eu sabia — nenhuma dança, nenhum elogio, nenhum duque seria capaz de tirar de mim aquilo que sempre pertenceria a outro.
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Atualizado até capítulo 30
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