Os dias passaram, mais rápidos do que eles gostariam.
Taehwan começou a chegar mais cedo no trabalho. Parou de faltar, parou de brigar com o gerente e até trocou de camiseta quando dava tempo. Tinha medo de perder o emprego — não por ele, mas por ela. Por eles.
Nos horários de almoço, largava o celular e puxava conversa com colegas mais velhas, mães solteiras, ou amigas de colegas que já tinham passado por gravidez. Perguntava de um jeito meio torto, sem saber se era vergonha ou orgulho o que engasgava sua voz.
— Como você sabia qual fralda comprar? — perguntava, apoiado na pilha de caixas.
— O que você dava pra sua namorada comer no último trimestre?
— Berço pode ser de brechó, né? Não precisa ser novo?
Nos fins de semana, batia perna pela cidade. Andava por becos escondidos e mercados de bairro, comparando preços. Achou um berço usado com uma das grades tortas — consertou com arame e esponja. Lavou com sabão e ficou orgulhoso. Pegou algumas roupinhas pequenas, já meio desbotadas, mas cheias de história.
Parou diante de uma prateleira de fraldas por mais de dez minutos. Não sabia que existia tanta variedade. Pegou a mais barata, depois a do meio. Guardou os panfletos com promoções. Agora, carregava uma sacola de pano com itens de bebê no caminho pra casa. E, às vezes, uma peça de roupa pra ela também — um moletom confortável, uma legging que viu na liquidação, um creme que disseram que era bom pra estrias.
Taehwan ainda fumava no quintal do prédio. Mas, agora, lavava as mãos antes de entrar.
Enquanto isso, Areum seguia firme. Ia para a escola todos os dias, uniforme cada vez mais apertado, olhar cada vez mais maduro. Sentava no fundo da sala, escrevia com atenção, anotava tudo. Queria continuar estudando até o último dia possível. Até o bebê vir ao mundo.
No apartamento, cuidava de tudo como se fosse dela desde sempre. Passava pano no chão, lavava a louça, dobrava as roupas com paciência. Cozinhava arroz, legumes, às vezes tentava algo mais elaborado que via na internet com o celular emprestado de Taehwan.
Ele chegava e encontrava tudo limpo, cheiroso. A mesa posta, com dois pratos. E ela, sorrindo cansada, de cabelo preso com uma piranha torta, barriga já marcando sob a camiseta velha dele.
— Você comeu direito hoje? — perguntava ele, sentando.
— Comi sim. E você? — ela respondia, colocando mais arroz no prato dele.
As conversas ficaram mais fáceis. Riam de piadas internas, discutiam nomes para o bebê, brigavam pelo controle remoto. Não era romântico. Era real. Era o tipo de intimidade que nasce quando duas pessoas enfrentam o mundo juntas, mesmo sem saber direito como.
E, entre os restos de cigarro apagado e a panela com arroz queimado, algo estava nascendo.
Não só um bebê.
Eles estavam virando um casal.
Não no sentido perfeito da palavra — mas no mais sincero.
Eram dois jovens quebrados tentando, tropeçando, cuidando um do outro à sua maneira.
E isso, por enquanto… era o suficiente.
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Cena Extra – Uma Receita e Dois Desastres
A chuva batia forte nas janelas, grossa e preguiçosa, como se o céu também estivesse cansado. A luz amarelada da cozinha dava um ar aconchegante ao pequeno apartamento, enquanto o som da água lá fora criava um fundo perfeito para a cena que se desenrolava.
Areum, com cinco meses de gravidez e um avental amassado amarrado por cima da camiseta de Taehwan, mexia uma panela no fogão com a concentração de um cirurgião. Taehwan, de cueca samba-canção e camiseta regata, segurava o celular e lia em voz alta a receita de um “doce coreano quente e fácil” que encontraram no YouTube.
— "Adicione o leite… aos poucos" — ele disse, tentando manter o tom sério.
— Já adicionei! — Areum respondeu, impaciente, mexendo a mistura que claramente estava... empelotando.
— Aos poucos, amor. Não "tudo de uma vez igual tsunami".
Ela o fuzilou com os olhos. — A próxima vez você faz sozinho, chef Michelin.
Ele ergueu as mãos em rendição, rindo. — Só tô lendo as instruções! É você que tá tratando o leite igual se fosse cimento.
— Ai, cala a boca e mexe aqui enquanto eu pego o açúcar.
Ela entregou a colher de pau pra ele e foi até o armário. Taehwan começou a mexer com vontade, exagerando nos movimentos como se estivesse tocando tambor. A mistura respingou no fogão e um pouco no chão.
— Ya! Você tá batendo ou cozinhando?
— Tô dando emoção pro prato. Isso aqui é arte!
— Isso aí é bagunça!
Areum voltou com o pote de açúcar, e quando o abriu, metade caiu direto dentro da panela.
Silêncio.
Olhares.
Ela congelada. Ele segurando o riso.
— Foi um toque de chef — ela murmurou.
— Um toque diabético, talvez — ele respondeu, e os dois caíram na gargalhada.
A mistura no fogo agora tinha a aparência e o cheiro suspeitos de algo que não deveria ser ingerido. Mas mesmo assim, eles colocaram em duas canecas e levaram para a sala, sentando no chão com as costas contra o sofá velho.
Areum tomou o primeiro gole. Fez uma careta.
— É horrível.
Taehwan tomou um gole. Tossiu.
— Tem gosto de castigo.
Ela começou a rir, segurando a barriga, tentando não se contorcer demais. Ele a olhou, com aquele sorriso torto de sempre, e disse:
— A gente pode não saber cozinhar… mas isso aqui — ele apontou entre os dois — acho que tá dando certo.
Areum se encostou no ombro dele, ainda rindo, os olhos brilhando mesmo com o gosto péssimo na boca.
— O que importa é que a gente tentou.
— E que não morreu, né? — completou ele, colocando a caneca longe, como se fosse uma ameaça química.
A chuva continuava lá fora. Mas ali dentro, naquela bagunça cheia de afeto e açúcar derramado, havia calor de verdade.
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Atualizado até capítulo 32
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