Clara soltou as cartas no chão, mas não largou sua mochila. Segurando firme a alça, ela saiu correndo, empurrando quem estivesse na frente. Os risos ainda ecoavam atrás dela, zombeteiros, cruéis.
Desceu as escadas com pressa, atravessou os portões da escola sem olhar para trás. O sol já começava a se pôr, tingindo o céu com tons alaranjados e rosados. A luz dourada batia contra seu rosto, mas não aquecia nada dentro dela.
Ela caminhava rápido pela calçada, os passos duros, quase tropeçando. Queria sumir. Sentia o peito apertado, os olhos ardendo, o gosto amargo na boca. Cada palavra das cartas, cada riso no corredor, cada detalhe da encenação cruel… tudo girava em sua mente como uma tempestade.
Ninguém na rua parecia notar o que se passava. As pessoas passavam por ela como se fosse invisível — e talvez fosse mesmo.
Virando a esquina de casa, ela apertou o passo. Não queria que ninguém a visse naquele estado. Não queria explicações, perguntas, olhares. Só queria o silêncio do seu quarto. Só queria desaparecer.
Clara empurrou devagar a porta da frente e entrou. A casa estava mergulhada em silêncio. Largou a mochila ao lado da porta e tirou os tênis, os passos suaves sobre o chão de madeira.
Andou pelo corredor com cuidado, até chegar na porta do quarto dos pais. Espiou com delicadeza. Lauren estava deitada de lado, os olhos fechados, o rosto pálido e cansado. Dormia profundamente. Clara fechou a porta com cuidado. Achou melhor não acordá-la.
Seguiu em direção ao quarto ao lado, quando escutou um som suave e arrastado — um balbucio doce e leve.
Austin.
Ela abriu a porta e encontrou o irmãozinho no berço, com o rostinho iluminado por um sorriso largo. Os olhos azuis brilharam ao vê-la.
O coração de Clara desmanchou.
Como se, por um segundo, toda a dor e exaustão tivessem desaparecido. Ela se aproximou e, ao chegar perto, percebeu: o corpo dele estava suado, a fralda pesada e o pijaminha manchado. Provavelmente com fome também. Ele devia ter passado o dia inteiro assim.
Clara sentiu uma pontada no peito.
Desde a morte de Ethan, Lauren havia mergulhado numa depressão profunda. E depois que Austin nasceu, a depressão pós-parto só piorou. Lauren já não era mais a mesma.
Com cuidado, Clara pegou o irmãozinho nos braços.
Clara (sussurrando): Vamos cuidar de você, meu amor.
Levou-o até o banheiro e preparou um banho morno. Austin deu gritinhos de alegria quando sentiu a água, rindo com as mãos batendo na superfície.
Clara (sorrindo): Você tá uma bagunça, sabia?
Ela o lavou com carinho, limpando cada pedacinho. O bebê ria e balbuciava, e Clara sentia o peito se acalmar. Após o banho, secou-o com uma toalha macia e deixou-o apenas de fralda. Penteou seus cabelos loiros e cheirosos, passou um perfume suave e o levou para a cozinha.
Sentou-o na cadeirinha e lhe deu alguns brinquedos. Austin logo começou a bater blocos coloridos na mesinha, entretido.
Clara acendeu o fogo e começou a preparar uma papinha para ele, mexendo a panela com cuidado. O aroma começou a subir, preenchendo a cozinha.
E então, escutou a porta da frente se abrir.
Passos firmes ecoaram pela casa até a cozinha.
Roger: Hmm… tá com cheiro bom aqui.
Ele se aproximou com um sorriso cansado e afetuoso. Beijou a cabeça de Austin, que imediatamente esticou os bracinhos para ele.
Roger: E aí, campeão?
Pegou o filho nos braços, girando-o no ar, arrancando risadas felizes. Depois o colocou de volta na cadeirinha e olhou para Clara.
Roger: E sua mãe?
Clara: Tá dormindo. Desde mais cedo.
Roger suspirou. Seus olhos baixaram por um instante.
Roger: O diretor me ligou. Contou o que aconteceu na escola hoje.
Clara tentou disfarçar, mas não conseguiu. Os olhos encheram de lágrimas. Mordeu o lábio com força, mas quando Roger a encarou, com aquele olhar cheio de cuidado, tudo desabou.
Clara: Eu não aguento mais, pai… Eu… eu só tento viver em paz, mas eles não deixam. Eles me odeiam, me culpam, me fazem reviver tudo aquilo. Todos os dias. E eu… eu tô cansada…
Roger se aproximou, silencioso.
Colocou Austin na cadeirinha outra vez e foi até Clara. A envolveu por trás, os braços firmes ao redor do corpo dela. Beijou o topo da sua cabeça, como sempre fazia.
Roger: Eu tô aqui, minha menina. Eu vou resolver isso. Você não merece carregar esse peso sozinha. Ninguém nessa casa vai continuar fingindo que tá tudo bem. Hoje à noite… a gente vai conversar. Todos nós.
Clara fechou os olhos no abraço dele. E, por um instante, sentiu que talvez estivesse segura.
Roger caminhou em silêncio pelo corredor da casa até o quarto. Abriu a porta devagar e, ao empurrá-la, viu Lauren deitada, os olhos entreabertos, despertando com o som da maçaneta.
Lauren: Roger…? Que foi?
Ele manteve a voz firme, quase fria.
Roger: A gente precisa conversar.
Lauren (suspirando): Eu não tô com cabeça pra isso agora…
Roger: Vai ter que estar. Essa conversa vai acontecer hoje.
Sem esperar resposta, Roger seguiu direto para o banheiro e fechou a porta atrás de si. A água do chuveiro começou a correr logo depois.
Clara, que ouvia tudo da cozinha, engoliu seco, mas permaneceu concentrada. Mexeu a papa com cuidado até que estivesse pronta. Desligou o fogo, colocou a comida no prato e se virou para Austin, que já balançava os bracinhos animado.
Clara (sorrindo): Hora do papá, meu amor.
Ela começou a alimentá-lo com delicadeza, colher por colher. Austin comia feliz, emitindo sons suaves entre uma risada e outra.
Pouco depois, passos lentos se aproximaram. Lauren apareceu na cozinha. Estava descabelada, pálida, com as olheiras fundas marcando o cansaço. Ela não disse nada — apenas foi até a pia, pegou um copo, encheu com água e bebeu em silêncio. Seus olhos mal encontraram os de Clara. Em seguida, sem uma palavra, virou as costas e voltou para o quarto.
Clara soltou um suspiro aliviado. Ao menos, dessa vez, não houve críticas, acusações ou discussões. Ela voltou sua atenção para Austin, que já estava lambendo os lábios satisfeitos.
Alguns minutos depois, Roger apareceu, agora limpo, de camiseta escura e calça de moletom. Ele caminhou até a cozinha, passou as mãos pelos cabelos ainda úmidos e se aproximou de Clara com um sorriso leve.
Roger: Cheiro bom esse… você tá virando uma chef.
Clara (sorrindo): Tô tentando manter esse bebê mimado satisfeito.
Roger riu e foi até o fogão, pegando ingredientes para preparar algo para o jantar. Ligou o rádio, colocando uma música animada, daquelas com batida leve e um refrão contagiante.
Enquanto ele cortava os legumes, Clara lavava alguns utensílios, e os dois trocavam piadinhas. Era um daqueles raros momentos em que tudo parecia certo no mundo. O clima entre eles era leve, caloroso, quase íntimo.
Roger: Sabia que eu gosto muito de cozinhar com você?
Clara: É porque eu sou boa companhia.
Roger: Exatamente. E porque você me deixa roubar os temperos especiais da mamãe sem ela ver.
Os dois riram, cúmplices.
Austin, ainda na cadeirinha, observava tudo com olhos curiosos, batendo as mãozinhas nos brinquedos. O som da panela fervendo, as risadas, a música ao fundo… tudo criava uma cena quase reconfortante, quase normal.
Mas Lauren ainda estava no quarto.
E mais tarde, aquela conversa esperada ia acontecer.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 54
Comments
Anonymous
Da pra perceber que Laura não é filha do Roger,ele a mulher é o filho sao loiros e tem olhos azuis ela é morena, a mãe deve ter traído o marido
2025-04-20
6