O dia amanheceu mais frio do que o habitual.
A neblina envolvia a mansão Thornbird como uma serpente silenciosa, e os criados apressavam-se com mantos grossos e calafrios disfarçados. Vanessa foi acordada antes do nascer do sol por uma criada gorda de cabelo ruivo, que a empurrou com o pé.
— Levante-se. Hoje o Duque quer você na estufa principal.
— Mas... é o dia da limpeza da biblioteca — murmurou, com a voz ainda rouca de sono.
— E agora você vai onde ele mandar. Aprenda isso antes que seja tarde.
A estufa principal era como um santuário de vidro, escondido atrás do jardim norte. Lá dentro, o ar era mais quente, úmido, repleto de perfumes desconhecidos. Havia flores que jamais vira antes, algumas com espinhos dourados, outras que pareciam brilhar com a luz do sol.
Vanessa entrou, hesitante, sentindo-se uma intrusa naquele mundo colorido.
E então o viu.
Raphael estava agachado junto a uma planta escarlate de pétalas fechadas, as mangas arregaçadas, os dedos enterrados na terra.
— Feche a porta. — A voz dele soou firme, mas sem a frieza habitual.
Ela obedeceu.
— Venha aqui.
Vanessa aproximou-se com cuidado, sem entender por que havia sido chamada para ali.
— Já ouviu falar na flor Lâmira? — perguntou ele, sem olhá-la. — Não? Claro que não. Essa aqui... — Ele apontou para a planta à sua frente. — ...só floresce uma única vez. E apenas quando toca a pele de alguém que está prestes a morrer.
Ela o olhou, desconfiada.
— Acha que estou brincando? — Ele finalmente a encarou, os olhos tão frios quanto o ar da manhã. — Experimente.
— O quê?
— Toque nela.
— Mas se ela florescer...
— Eu não disse que morreria hoje — retrucou, com um meio sorriso. — Só quero saber se você está perto disso.
Ela hesitou, então, devagar, estendeu os dedos e tocou a flor.
Nada aconteceu.
Silêncio.
Raphael observou atentamente, mas a flor permaneceu cerrada, imóvel, indiferente.
Ele ergueu uma sobrancelha.
— Que estranho.
— Por quê?
— Achei que você já tivesse morrido por dentro — ele disse, erguendo-se. — Mas parece que ainda tem algo aí dentro. Um pedaço vivo.
Vanessa recuou um passo. Os olhos verdes cintilavam com o calor da ofensa — e da estranha provocação que ele lhe causava.
— Por que me chamou aqui? — perguntou, com ousadia inesperada.
Raphael a fitou longamente.
— Porque quero entender por que diabos a Imperatriz achou que me irritaria mais com você do que com os outros. — Ele se aproximou mais. — Mas, de alguma forma... ela conseguiu.
Vanessa sentiu o corpo inteiro reagir. Ele estava perto demais. A presença dele era como fogo ao redor do pescoço. E mesmo assim, ela não se afastou.
— Talvez a Imperatriz tenha enviado algo que você não pode controlar — respondeu ela, com voz baixa.
Um silêncio pesado caiu entre os dois.
Ele a encarava como se a visse pela primeira vez — não como um objeto, mas como uma equação impossível. Uma ameaça silenciosa. Um espinho inesperado na palma de uma mão soberana.
Então Raphael fez algo inesperado.
Ergueu a mão e tocou o rosto dela. De leve, como se a pele de Vanessa fosse feita de porcelana que ele não tinha certeza se queria quebrar ou guardar.
— Você ainda vai me causar problemas — murmurou, como uma promessa.
Ela manteve os olhos fixos nos dele, o coração descompassado.
— Então me mande embora.
Ele sorriu. Um sorriso lento, cruel — e belo.
— Não. Eu não fujo de problemas.
Quando ela saiu da estufa, o corpo inteiro tremia.
Não de frio.
Mas de algo que queimava por dentro. Algo que crescia como aquelas flores proibidas.
E Vanessa soube, naquele instante, que o Duque não era feito só de gelo.
Havia fogo nele.
Um fogo perigoso.
E agora... ele estava olhando para ela.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 40
Comments
Milla silva
verdade
2025-04-28
0
Luciana Ventura
tô gostando
2025-04-23
0