Ilha da Profecia
O cheiro de sal impregna o ar. O som das ondas quebrando contra a areia se mistura ao farfalhar das folhas agitadas pelo vento. O calor do sol toca minha pele, mas o arrepio que percorre minha espinha não tem nada a ver com o clima. Algo está errado.
Abro os olhos de repente, minha respiração acelerada, como se tivesse acabado de despertar de um pesadelo. O céu azul acima de mim parece vasto demais, estranho demais. Tento me sentar, mas meu corpo está rígido, como se não fosse meu. Meu vestido está sujo de areia e folhas secas, um tecido pesado demais para um ambiente tão selvagem.
E então percebo.
Não estou sozinha.
Ao meu redor, outras sete pessoas estão espalhadas pelo chão, algumas ainda desacordadas, outras começando a se mover. Meus olhos percorrem seus rostos e, imediatamente, um frio gélido me domina. Eu os conheço. Sei exatamente quem são.
Meu coração martela no peito quando a verdade me atinge como um golpe certeiro.
Não pode ser.
Mas é.
Estou dentro do meu livro favorito.
E não há nada de encantador nisso.
A lembrança do enredo ressurge em minha mente como uma onda violenta. O mundo que conhecia foi destruído há 400 anos, um colapso cuja causa ninguém compreende. A civilização caiu, mas, por algum milagre, um grupo de astronautas estava na Lua quando tudo aconteceu. Eles retornaram décadas depois, apenas para encontrar um mundo irreconhecível. Os animais haviam se transformado em monstros grotescos, e a humanidade teve que se reconstruir a partir do caos. Dois reinos surgiram desse renascimento forçado, tentando sobreviver em meio ao terror que agora habitava a Terra.
Mas nem mesmo os reinos estavam a salvo.
Uma profecia selou o destino dos sete membros mais importantes da realeza atual: para que o mundo continuasse existindo, eles precisariam sobreviver por dois anos em uma ilha isolada, infestada pelas criaturas mais perigosas desse novo mundo. Nenhum deles sabia o motivo. Nenhum deles sabia se era verdade. Mas, mesmo assim, foram enviados.
E agora, eu estou aqui.
Minha mente ainda tenta negar o impossível, mas tudo faz sentido. A sensação estranha no meu corpo, a textura diferente da minha pele, a forma como meu próprio rosto parece errado. Engulo em seco, o pavor crescendo dentro de mim.
Com mãos trêmulas, arrasto-me até a margem do rio próximo e olho para a água cristalina. E lá está ela.
Não sou eu.
Os olhos frios, o rosto delicado e impecável, o cabelo escuro caindo em ondas perfeitas.
Eu conheço esse rosto.
Porque ele pertence a Maya.
A vilã da história.
A mulher cruel que todos odeiam. Aquela que, no livro, foi acusada injustamente, traída e condenada a um destino pior que a morte.
Minhas mãos se apertam em punhos, e meu coração martela ainda mais forte dentro do peito.
Se estou aqui… isso significa que a história ainda não aconteceu. Significa que ainda há tempo.
Mas tempo para quê?
Para mudar meu destino? Para sobreviver?
Ou para ser destruída como no livro?
As vozes dos outros começam a surgir ao meu redor, confusas, tensas. Eles vão perceber que estou acordada. Vão perceber quem eu sou.
E eu sei exatamente o que eles pensam de Maya.
Respiro fundo e forço meu corpo a se acalmar. Se há algo que aprendi na minha vida passada, é que pânico nunca ajudou ninguém a sobreviver.
Se vou mudar essa história, preciso começar agora.
E, para isso, preciso ser mais do que a vilã que eles odeiam.
Preciso ser alguém que ninguém espera.
Claro! Aqui está um trecho detalhado explorando o passado da Maya e sua relação com Liam:
Maya nunca foi uma pessoa bondosa. Não porque nasceu assim, mas porque o mundo nunca lhe deu escolha.
Desde pequena, carregava um fardo que não lhe pertencia. O título cruel e mentiroso de "filha de uma amante" a seguia como uma sombra, sussurrado nos corredores do castelo, dito entre risos disfarçados em reuniões da nobreza, estampado nos olhares de desprezo que recebia. Mas o pior de tudo não era a forma como a tratavam—era o que fizeram com sua mãe.
Uma mulher honrada, digna, que nunca traiu ninguém. Mas a mentira, quando repetida vezes o suficiente, tem o poder de se tornar verdade nos olhos dos outros. E, por mais que tentasse lutar contra os boatos, eles se espalharam como uma doença incurável, corroendo tudo ao redor.
A vergonha. A humilhação. O isolamento.
O peso de tudo isso foi demais para sua mãe, e, pouco a pouco, a vida se esvaiu dela. Quando Maya percebeu, já era tarde demais. Sua mãe estava doente, consumida não apenas pela enfermidade, mas pelo desespero. E ninguém fez nada.
Ninguém tentou ajudá-la.
Ninguém tentou salvá-la.
E quando ela morreu, foi como se sua existência tivesse sido apagada. Nenhuma grande cerimônia, nenhum luto verdadeiro. Apenas sussurros abafados e olhares que diziam que, no fundo, aquilo era esperado.
Foi ali que Maya percebeu.
Não importava o que ela fizesse, o mundo já a havia condenado.
Então, por que deveria ser boa?
Por que deveria se importar?
A bondade não salvou sua mãe. A bondade não a protegeu dos olhares de nojo e das palavras cruéis. Então, ao invés de lutar contra sua reputação, Maya abraçou-a. Tornou-se aquilo que todos diziam que ela era.
Fria. Calculista. Impiedosa.
Ela nunca se importou com quem estava ferindo, nunca mediu as consequências de suas ações. Era melhor ser temida do que ser humilhada. Melhor ser cruel do que ser fraca.
Mas havia uma exceção.
Liam.
Por razões que nem ela compreendia completamente, sempre quis que ele a visse de forma diferente. Talvez porque, no fundo, ainda desejasse que alguém acreditasse nela. Que alguém enxergasse além da máscara que foi forçada a vestir.
Com ele, Maya tentou ser melhor. Pequenos gestos, palavras que não carregavam veneno, tentativas sutis de criar algo parecido com amizade. Mas não importava o que fizesse, Liam nunca via. Ele só enxergava a versão dela que todos acreditavam existir.
— Você não engana ninguém, Maya. — Ele dissera uma vez, o olhar afiado como uma lâmina. — Sei exatamente o tipo de pessoa que você é.
E aquilo doeu mais do que qualquer outra coisa.
Porque, pela primeira vez, ela realmente tentou.
E falhou.
Então, Maya desistiu.
Se o mundo nunca lhe daria uma chance, ela também não daria nada ao mundo além de sua pior versão.
E agora, renascida nesse corpo, dentro dessa história que conhecia tão bem, essa dor ainda pulsava dentro dela. O ressentimento, a raiva, a solidão.
Mas havia algo diferente.
Liam ainda olhava para ela com desconfiança, mas, pela primeira vez, Maya percebeu outra coisa. Uma hesitação. Uma sombra de dúvida. Como se, em algum nível, ele estivesse começando a sentir que não poderia simplesmente ignorá-la.
Talvez, dessa vez, as coisas fossem diferentes.
Ou talvez fosse apenas mais um ciclo que acabaria do mesmo jeito de sempre.
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Atualizado até capítulo 61
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