As Cores de Alexandre

As Cores de Alexandre

Capítulo 1: Sinestesia

A sinestesia é uma condição neurológica que pode fazer com que uma pessoa associe paladar, cheiros, sons, cores e até mesmo sentimentos uns aos outros.
E o que isso tem haver com a minha história? Tudo.
Afinal eu tinha apenas 10 anos quando recebi o meu diagnóstico.
Doutor
Doutor
O seu filho tem uma condição neurológica chamada de sinestesia...
Lembro como o consultório cheirava a produtos de limpeza. E eu estava sentado em uma cadeira grande demais para mim, brincando com meus polegares.
O doutor falava com calma, cada palavra. Mas seus feromônios prendiam minha atenção, eram como observar um diamante lapidado exposto a luz.
Já os feromonios da minha mãe, que sempre fora um céu tranquilo depois da chuva, agora estava diferente. Carregado, denso. Uma tempestade prestes a desabar.
Seus feromônios preenchiam o ambiente como nuvens espessas, e a sensação me deixava inquieto, como se o ar ao nosso redor estivesse pesado demais para respirar.
Eu não entendia direito o que estava acontecendo, apenas que algo dentro de mim era diferente.
O doutor falava sobre sinestesia, sobre como meu cérebro misturava sentidos de um jeito incomum.
Minha mãe ouvia em silêncio, com os olhos fixos no homem à nossa frente.
Charlotte
Charlotte
Existe algum modo dele conseguir lidar? Afinal ele é um ômega dessa forma nunca...
Ela parou no meio da frase, como se o resto das palavras pesassem demais para serem ditas.
Seus lábios se curvaram em um sorriso levemente triste antes dela voltar os olhos para mim.
Charlotte
Charlotte
Ele vai ter uma vida normal?
Perguntou voltando-se ao doutor que respirou fundo antes de responder.
Doutor
Doutor
Essa condição é mais comum em betas. Eles levam a vida de maneira comum, sem grandes dificuldades… Mas, nesse caso, pode ser desafiador. Ainda assim, não penso que seja impossível.
Os feromônios da minha mãe mudaram sutilmente. O azul dela, que antes era carregado como um céu nublado antes da tempestade, parecia menos sombrio agora. Como se a chuva estivesse prestes a cessar, mas ainda deixasse tudo úmido e pesado.
E foi naquele instante que um pensamento tomou conta de mim: " Se eu fosse um beta, tudo seria mais fácil... "
Talvez minha mãe não precisasse carregar aquele olhar triste.
Talvez ela não precisasse se preocupar.
Talvez eu não fosse um incômodo.
. . .
Alexandre
Alexandre
Respiro fundo~
Ainda tenho dificuldades hoje em dia. Mas não é mais tão difícil de lidar como antes.
O tempo me ensinou a controlar um pouco, a treinar o meu cérebro para focar nos meus próprios feromônios. Eles são como quando pisamos na areia da praia, quentes e suaves, marcando o espaço, mas não o suficiente para me consumir.
Além disso sou seletivo com as minhas músicas, quanto mais agitadas mais vibrantes são suas cores, quanto mais calmas, mais frias.
Tiro os meus fones ao entrar na biblioteca, é um lugar pacífico na faculdade, sem barulhos altos ou um mar de diversos feromonios.
Sigo em direção a última mesa que era a única distante da janela. Sento na cadeira e pego o meu caderno de desenhos.
Minha aula de agora foi cancelada, vou precisar esperar para próxima.
Alexandre
Alexandre
Por que o professor resolveu faltar hoje? *resmunga*
Pego a caneta e começo a rabiscar, desenhando o cenário diante de mim.
Diversas mesas vazias, todas iguais. As linhas tomam forma de um espaço silencioso e imenso, vazio, mas de alguma forma acolhedor.
Alexandre
Alexandre
Hum?
Ergo o meu rosto e vejo alguém com a cabeça deitada sobre a mesa, ele dormia profundamente, e até roncava.
Como não o percebi antes?
Ele ronca mais alto. O som que ele fazia era como o de um urso negro hibernando, seguro a risada, e disfarço ao ver ele erguer o seu rosto sonolento.
Volto a rabiscar no meu caderno, um urso dormindo na mesa.
Era uma cena que parecia engraçada na minha cabeça.
Olho de relance em direção ao rapaz, os seus olhos cinzentos eram como a neve suja pela terra.
Não foi preciso ser um gênio para descobrir que ele era um alfa já que as cores de seus feromonios eram intensas como a de mil girassois.
Abaixo o olhar para meu caderno, suas cores ainda ressoam em meus olhos como uma nuvem, respiro fundo e tento focar em meus feromonios, ouço seus passos ecoar como uma névoa negra destoando do tom vibrante dos girassois.
Fecho meus olhos tentando focar em meus feromonios.
E assim como quando jogamos mentos num refrigerante senti seu toque sobre meu ombro.
Gael
Gael
Oi eu queria saber...
Levanto da cadeira, pego minhas coisas e saio.
Na minha cabeça agora havia uma explosão do amarelo vibrante e da sombra que pareciam extremos opostos lutando um contra o outro.
A minha respiração estava descompassada mas não sei dizer ao certo se a culpa era do alfa que se aproximou, do toque conflituoso ou da minha pressa em fugir daquele lugar.
Coloco meus fones de ouvido outra vez, respiro fundo e tento me concentrar nas melodias que escolho para me acalmar. A música me envolve, e lentamente, minha mente começa a voltar ao seu lugar. O contraste de cores, da névoa escura e do amarelo intenso, vai se dissipando aos poucos.
Eu agarro a alça da minha bolsa com firmeza, tentando retomar o controle, mas a sensação do toque ainda reverbera na minha pele, como uma lembrança que eu não posso esquecer, mesmo querendo.
Kim
Kim
Alex?
A voz de Kim chega até mim, abafada pelos fones de ouvido. Mesmo assim, consigo identificar o tom familiar e acolhedor. Levanto o olhar e dou um sorriso leve, tentando parecer mais calmo do que realmente estou.
Alexandre
Alexandre
Kim... O que tá fazendo aqui? Pensei que não tinha aula agora a tarde.
A pergunta sai de maneira automática, mas o momento em que ele se aproxima, seus olhos se fixam em mim com uma preocupação genuína, os mesmos olhos que sempre estavam ali para me ajudar quando algo estava errado.
Kim
Kim
Está tudo bem? Parece um pouco atordoado.
Os tons calmos da sua voz se misturam com o caos dentro da minha mente que eu tentava avidamente organizar.
Alexandre
Alexandre
Eu estou bem...
A mentira escapa da minha boca antes mesmo de eu perceber. Forço um sorriso, um daqueles sorrisos que não são totalmente convincentes, mas espero que sejam suficientes para que ele não insista.
E, por sorte, ele parece perceber isso, pois não insiste, apenas me observa com um olhar ainda preocupado. Logo, ele muda de assunto, talvez para me dar algum espaço, talvez para aliviar a tensão no ar.
Kim
Kim
Eu vim porque tinha um trabalho para entregar hoje, acho que não me sai bem.
Ele coça a cabeça de maneira descontraída, com aquele gesto que só ele tem, como se a culpa fosse uma velha amiga. Sorrio levemente, um sorriso que se forma automaticamente.
Kim sempre foi assim: um alfa descontraído, mas ao mesmo tempo sensível. Desde o ensino médio, quando soube da minha condição, ele se tornou cuidadoso com seus feromonios.
Kim
Kim
Por sinal você viu o Oliver hoje?
Ele olhava ao redor, e eu não pude deixar de sorrir novamente. Kim tem um amor não correspondido por Oliver, um beta que se tornou nosso amigo na faculdade.
Alexandre
Alexandre
Não, acho que ele não vem, parece que as aulas dele de hoje foram canceladas.
Kim
Kim
Ah sim...
Seus ombros largos pareceram diminuir e um bico se formou em seus lábios.
Mas conforme a conversa seguia a tristeza dele pareceu se dissipar aos poucos.
Sinto meu celular vibrar e então o pego para ver de quem era a mensagem.
"Amélia: Onde você está? A aula já vai começar!"
Alexandre
Alexandre
Ah! Eu tenho que ir, tchau Kim.
Kim
Kim
Tá tchau...
Corro sem olhar para trás em direção à minha aula. Hoje era o dia de fazermos a pintura do corpo humano. Me pergunto se conseguiram um novo modelo, já que o antigo desistiu de última hora.
Entro com cuidado, tentando não desconcentrar ninguém. O professor me dá um olhar mortal, mas não diz nada.
Amélia
Amélia
Idiota por que demorou tanto?
Ela sussurra para mim enquanto faz seu esboço de lápis, e eu sorrio levemente, tentando repor meu fôlego. Então, meus olhos se dirigem para o modelo que está posando na frente da sala. Meus olhos se arregalam instantaneamente.
Sinto meu rosto arder. Outra vez o amarelo intenso invade a minha visão, os girassóis pareciam ainda mais belos, e o tecido que cobria suas partes íntimas era um azul royal que lhe dava um ar de realeza.
Seus olhos nevados estavam fechados, parecia ter adormecido.
De repente, meus sentidos ficam instáveis, e uma dor de cabeça forte começa a se formar.
Por que ele está aqui?
Tento me concentrar, mas os tons vibrantes, a mistura de amarelo e azul, continuam a dançar na minha visão.
Respiro fundo, tentando controlar a crescente vertigem que se instala em meu corpo.
David
David
Vamos Alex, se concentre.
O professor fala ao longe com um olhar afiado. Afirmo com a cabeça e tento de alguma forma desenha-lo.
Mas diferente do que pensei não foi difícil escolher suas cores ou desenhar suas linhas, era quase como se minha mão se movesse sozinha.
Não percebi que estava tão imerso na pintura a ponto de não ouvir o professor dispensando a turma.
David
David
Bom trabalho Alex.
Como se recobrasse a consciência me volto ao professor que tinha um sorriso satisfeito.
David
David
Tenho certeza que será um belo quadro.
Volto os meus olhos para a pintura inacabada e sorrio um pouco cético, os tons de amarelo e azul se fundiam ao corpo do alfa a minha frente exatamente como enxergava, foi a primeira vez que consegui expressar com clareza as cores que via.
David
David
Ei, levanta daí.
Arrumo meus materiais e olho de relance para o alfa chutado nas canelas pelo professor, ele se levanta deixando o pano azul cair e sinto meu rosto outra vez arder.
David
David
Idiota! Por que não tá de cueca?
Gael
Gael
Qual o problema? Gosto da fresquinha.
Ele solta uma risada calorosa assim como os girassois, sorrio por sua piada sem graça e levanto percebendo então seus olhos sobre mim.
Gael
Gael
Hum? Ah! Era você o ômega de mais cedo?!
Ele sorri pega o lençol azul para se cobrir, seus feromonios eram vibrantes assim como seu sorriso, algo que me aquecia.
Gael
Gael
Eu sou o Gael, devo ter te assustado naquela hora, foi mal, prazer em te conhecer...
Ele estende sua mão e esperava que eu falasse meu nome, mas não conseguia falar.
Na primeira vez que o vi ele parecia um urso hibernando, depois um girassol vibrante, e agora mais se parece com o sol que cega os olhos de quem o encara por muito tempo. Era quente mas não a ponto de queimar e belo o suficiente para se querer admirar.
Gael
Gael
Bom... acho que não quer dizer seu nome, tudo bem... hum a gente se vê então.
Abro minha boca para falar mas ele já havia saído junto ao professor.
E aquela sensação calorosa logo se desfez com sua saída, mas seus feromonios vibrantes permaneceram um pouco mais.
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Comments

eduada

eduada

porra primeiro capítulo, autor(a) você é muito boa parabéns

2025-07-13

1

bibitchuuuu

bibitchuuuu

ca-ra-lho

2025-03-20

3

Ver todos

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