raizes e promessas

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Capítulo 1

Raízes e promessas

O cheiro de café fresco preenchia a cozinha da pequena casa no bairro tranquilo de Santa Clara. A luz da manhã entrava em feixes dourados pela janela, dançando sobre a mesa posta com duas xícaras e um prato de pão recém-torrado. Marina, de cabelos curtos e expressão serena, mexia o açúcar na caneca com movimentos lentos, quase meditativos. Seus olhos verdes estavam distantes, como se buscassem respostas em um ponto invisível da parede.

— Mãe? — a voz de Sophia soou suave, quase sonolenta.

Marina se virou com um sorriso pronto, aquele sorriso que ela aprendeu a construir mesmo nos dias em que tudo dentro dela doía.

— Bom dia, meu amor. Dormiu bem?

Sophia arrastou os pés até a mesa, sentando-se de frente para a mulher que, aos seus olhos, sempre fora sua mãe — mesmo sem carregar seu sangue. Seus cabelos loiros estavam um pouco bagunçados, e os olhos azuis ainda carregavam os vestígios de sonhos.

— Tive aquele sonho de novo — disse, pegando um pedaço de pão.

Marina ficou em silêncio por um instante. Ela sabia exatamente do que a filha falava. O sonho recorrente em que Patrícia aparecia, sorrindo, chamando Sophia para um lugar que ela nunca conseguia alcançar.

— Ela sente sua falta tanto quanto você sente a dela, sabia? — Marina disse, com voz suave. — Mas ela confiou em mim. E eu prometi que cuidaria de você com tudo o que sou.

Sophia assentiu, engolindo em seco. Não chorava. Já não chorava há algum tempo. Mas havia dias em que tudo parecia pesado demais para seus quatorze anos.

Foi quando o celular de Marina vibrou sobre a bancada.

Uma mensagem. Um nome esquecido. Ou melhor, enterrado.

Aurora.

Marina encarou a tela como se ela tivesse acabado de rasgar uma fenda no tempo.

— Tudo bem? — Sophia perguntou, percebendo a mudança sutil no rosto da mãe.

— É só... uma velha amiga.

Mentira. Aurora não era apenas uma velha amiga. Era uma lembrança viva. Um amor silenciado à força. Um pedaço de vida que Marina havia guardado tão fundo que achou que nunca mais fosse tocar. Mas ali estava o nome. E uma única frase: "Estou de volta à cidade. Precisamos conversar."

— É a tia Adriana que vai passar aqui hoje? — perguntou Sophia, distraída, limpando um farelo da mesa.

— Vai sim — respondeu Marina, tentando retomar o controle do coração acelerado. — Ela e a Bia devem chegar depois do almoço.

Adriana era seu porto seguro. Sempre fora. Sabia tudo. Até sobre Aurora. Tinha sido a única a testemunhar a dor muda da separação das duas. E agora... o passado parecia querer reaparecer com força, justo quando ela achava que a vida, apesar dos pesares, estava finalmente entrando nos trilhos.

Sophia se levantou e deu um beijo na testa da mãe.

— Você anda com esse olhar estranho ultimamente.

— Que olhar?

— De quem tá prestes a fazer algo perigoso.

Marina riu baixo.

— Talvez eu esteja mesmo.

E enquanto observava a filha subir as escadas, Marina se permitiu fechar os olhos por um instante. Sentiu o cheiro do passado. O gosto de algo que ainda queimava, mesmo depois de todos esses anos.

Aurora estava de volta. E com ela, todas as perguntas que Marina achava que já havia respondido.

Mas o coração tem uma memória própria. E às vezes, ele decide reabrir feridas só para mostrar que algumas cicatrizes ainda sangram.

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Zuleide Santana

Zuleide Santana

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2025-04-27

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