A primeira vez na vida que senti medo foi aos 2 anos... quando vi pontas de aço apontadas para o meu rosto. Naquela época eu não imaginava, mas já observava no olhar daqueles que me apontavam. Tinha convicção de que aquela coisa apontada deveria-me matar.
Então pude sentir os braços de uma quase mãe, e logo ouvir um sussurro:
— Não tenha medo... eles te temem mais do que você teme a eles...
O meu medo naquele momento não era ver a morte diante de mim, e sim saber que se eu escapasse daquilo, teria de viver me escondendo. O mundo não aceita uma "aberração".
E lá estava, novamente. Encarando a morte outra vez refletidas nos olhos sanguinários deste lobo ao qual decidi salvar a vida.
— Que piada... vai erguer a mão para a alma piedosa que te salvou?- talvez ele tenha honra o bastante para se sentir grato, e acabe não me matando!
— Gratidão... ?- ele me encara.- Ponha-se no seu lugar, mestiça imunda.
— É o quê?!- pasmo surpresa.- Você é idiota ou o quê?! Preferia permanecer morto?! Primeiro caso disso, um idiota abatido sangrando feito porco querendo continuar mor-
O chão de repente vêm a meu encontro. No lado esquerdo da minha face, a queimação sobe junto do latejar e dormência. Ele... acabou de me bater?
— Não dirija a palavra a mim, ser inferior.- ele cospe com asco.
A minha roupa branca está manchada de terra e as minhas mãos sujas de poeira. Pior, a minha dignidade está manchada. Se é assim, vamos terminar de mancha-la.
— Ser inferior, eu? Engraçado... seu cão sarnento pulguento.- digo me levantando lentamente.- Sua vida é tão insignificante para vir parar no caminho de um ser inferior?!- ele ergue a mão para me dar outro tapa, porém desvio deixando-o acertar o ar.- Seu vira-lata. Se acha melhor que eu por ser mestiça, mas não tem coragem para admitir que um ser mais baixo da sua classe impediu a sua morte. Covarde de merda.
– Eu vou-te... matar!!- ele grunhe tentando novamente me acertar, mas cai sobre os joelhos com fraqueza. Bem-feito, os ferimentos reabriram.
– É melhor me matar mesmo, porque nem mesmo o meu pai um dia acertou o meu rosto. Faça isso de novo, e vai saber realmente o significado de "maldita" no meu nome.- digo vendo-o cair agonizando com rosto em terra. Acabo tremendo vendo tal cena. Que se exploda. Nunca mais ajudo alguém, NUNCA MAIS!
Algumas horas depois...
— Por que exatamente... tem um cadáver no meio da minha sala?- vovó fala, saindo de bengala da sua sala de leituras e previsões.
— Odeio dizer que ele me descobriu.- engulo a seco observando as suas rugas mais caraquentas ao me encarar.- Ele... estava morto. Quer dizer, morrendo, aí eu tava lá, super na minha colhendo frutas nas... regiões... - AI!- levo uma bengalada na cabeça.
– Mentirosa. Tente de novo.- ela senta na minha frente.
— ... achei ele nas barrancas de Hirmortia.- susurro.
– O QUÊ?! De novo andando pelas fronteiras do Reino minha filha?! Quer morrer mesmo?! Me fala que faço isso!- diz tirando uma faca não sei de onde, e apontando para mim.
– Não! Saí sua assassina!- pulo para longe.
— Ah! ... sua idiota de pelo branco tingido.- é o quê?- Bom... se ferrou.
— Quê? Como assim? É só apagar a memória dele como sempre fez com os humanos, vovó!- falo cutucando o corpo moribundo com o pé.
— Claro, claro... parece tão fácil né?- confirmo.- MAS NÃO É!- outra bengalada. Meu crânio não vai suportar.- O rapaz não é um lobo qualquer, minha neta. É um Alfa.
— Não diga!- claro que eu já sabia, cabeça dura assim e arrogante, só podia ser hom- digo, alfa.
— Um Alfa dos Lobos Noturnos.- espera...
— Quer dizer que eu me lasquei?- pergunto.
— E bem bonito.- valeu pela sensibilidade, vó!- Alfas já são difíceis de apagar a memória... agora um sangue puro do clã lobo noturno, pior ainda.
— E agora, vovó?! Ele sabe que sou mestiça! O meu sangue entregou tudo!- agarro os cabelos.
— Você... deu o seu sangue a um desconhecido que achou na estrada?- ela ergue a sobrancelha.- É tão idiota que dá pena. Agora você quem lide com isso.
— QUE?! Como!? Essas coisas são suas responsabilidades!- ela me olha.
– Este rapaz pode trazer ruína, minha neta. Saiba disso antes de qualquer decisão.- essa foi a última frase dela antes de retornar a sua sala de previsões.
A minha avó é a única xamã de Hirmortia, Reino das Almas perdidas. Foi aqui que fiquei escondida do mundo, por ser mestiça, a morte é o que me espera do lado de fora do mundo. Por isso a minha avó trouxe-me para cá, para me proteger. E agora... coloquei tudo a perder. Eu realmente não deveria ter feito isso.
Desculpe vovó...
Passo metade da noite vigiando o lobo solitário, com medo da sua alcateia seguir o cheiro até aqui. Em algum momento adormeço, porém, um gemido fraco me desperta.
— Vovó!- vejo-a roncar no resto de sofá, mais velho que ela. Que bom, ao menos uma noite sem ataque.
Levanto-me indo até o moribundo ainda no meio da sala, coberto de suor. A febre dele não diminuiu. Eu poderia simplesmente joga-lo lá fora no lugar mais frio deste planeta, e deixa-lo morrer. Isto protegeria o meu segredo.
— Porém ele morreria igual você, papai...- a chaminé está acesa, expelindo o seu calor pelo lugar. E encima dela, no suporte, estão as cinzas do homem que me salvou da morte e trouxe-me até minha avó.- ... se você não fosse humano, teria sobrevivido a este frio. E talvez se não fosse fraca, você estaria aqui.
— Ele precisa de calor.- a minha avó fala entre roncos e deleis.- Precisa... zzzz... de calor! Cof cof cof!! ... caloooorrr!
– Vai dormir sua velha!- ela pára de falar.- E lá vamos nós! Salve o desgraçado que te bateu! Isto é o certo a fazer! Não corte o binguliu dele por acidente viu!- preciso de um psiquiatra.
O segurando pelo pé direito, arrasto o seu corpo para a sala da minha avó. A chaminé fica grudado nela, então as paredes são quentes. Será que esse animal consegue ficar sentado encostado nela?
— Vem pedaço de bosta...- nunca peguei tanto ódio de alguém na minha vida.- Fica aí, cachorro.- ele cai de lado. QUAL É!
– Precisa aquecer ele!- minha avó grita.
– JÁ ENTENDI! VÉIA DOIDA!- ela volta a roncar.
Realmente sou idiota.
Recosto-me na parede retirando o meu casaco de pele em seguida. Puxando o corpo do homem lobo o coloco com as costas pressionado contra o meu peito, e o cubro os seus pés com o meu casaco mantendo maior parte abaixo dos dedos frios, quase roxos pela falta de calor. Engolindo a seco, passo os meus braços ao redor do seu corpo dividindo a sensação térmica.
A tremedeira contra minha pele disfarça bem meu próprio... tremor? Por que eu tô fazendo isso mesmo? Pai... eu não consegui te salvar. Novamente irei falhar...?
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Atualizado até capítulo 35
Comments
Suna
an ain
2024-10-07
0
Maria Nice Grudgen
Comecei agora e já estou amando ler
2023-11-16
2
Rafaela Caroline Solza
comecei a ler hoje e estou amando kkkkkk não paro de rir kkkkkkk
2023-11-14
2