Naquela noite, depois que Dante deixou a livraria, Helena permaneceu imóvel por longos minutos. A chuva continuava a cair forte lá fora, mas dentro dela o silêncio era ainda mais ensurdecedor. Em sua mão trêmula, o cartão negro parecia queimar como se fosse feito de fogo.
O que deveria fazer? Jogar fora? Guardar? Fingir que aquilo nunca havia acontecido?
Ela nunca havia se sentido tão… observada. O olhar dele ainda estava gravado em sua mente, aquele cinza profundo que parecia despir sua alma. Helena apertou o cartão contra o peito, respirando fundo, tentando recuperar o controle de si mesma.
Finalmente, apagou as luzes, trancou a porta da livraria e correu pelas ruas molhadas até em casa. A pequena casa onde morava com os pais era simples, modesta, mas sempre acolhedora. Sua mãe já dormia, e o pai roncava baixinho no sofá. Helena subiu para o quarto em silêncio, tirou o casaco encharcado e se deitou na cama com o cartão ainda na mão.
Aquela noite foi de insônia. Virava-se de um lado para o outro, atormentada pelo rosto dele, pela voz dele, pelo perfume que parecia ainda estar impregnado em sua pele.
Quem era aquele homem? Por que havia se interessado por ela?
Helena nunca chamara atenção de ninguém. Sempre fora a garota invisível, tímida, que passava despercebida nas festas da escola, a que nunca foi convidada para sair, a que nunca teve sequer um namorado. E, de repente, alguém como ele… tão fora do seu mundo… havia olhado para ela como se fosse única.
O coração dela dizia para esquecer, mas havia algo irresistível naquela lembrança.
E, pela primeira vez, Helena sonhou. Sonhou com um par de olhos cinzentos e uma sombra protetora que a envolvia.
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Na manhã seguinte, tentou retomar sua rotina. Vestiu-se para o trabalho, prendeu o cabelo em um coque simples e caminhou até a livraria. A cada passo, tentava se convencer de que nada havia mudado. Mas, ao abrir a porta e ligar as luzes, seus olhos buscaram instintivamente o balcão, como se esperassem encontrá-lo ali.
O cartão ainda estava em sua bolsa. Helena pensou em escondê-lo, mas algo dentro dela a impedia.
O dia passou devagar. Clientes entravam e saíam, pedindo livros, comprando romances ou didáticos. Helena sorria, atendia com gentileza, mas sua mente estava distante, sempre retornando para aquela noite.
Ao anoitecer, quando o movimento diminuiu, Helena finalmente pegou o cartão e o observou de novo. Era diferente de qualquer outro: totalmente negro, elegante, com apenas um número prateado gravado no centro. Nenhum nome, nenhum logotipo. Misterioso, como ele.
Com as mãos trêmulas, tirou o celular da bolsa.
— Não… eu não posso — murmurou para si mesma, pressionando o aparelho contra o peito.
Mas, no fundo, uma parte dela queria ouvir aquela voz outra vez.
Respirou fundo, fechou os olhos e discou o número.
O telefone chamou apenas uma vez antes que fosse atendido.
— Helena… — a voz grave soou do outro lado, e o coração dela disparou. Ele não precisou que ela dissesse nada. Sabia que era ela.
— C-como… você sabe que sou eu? — perguntou, nervosa.
Do outro lado, Dante deixou escapar um riso baixo, quase um suspiro satisfeito.
— Eu saberia sua voz em qualquer lugar.
Helena ficou em silêncio. O coração batia tão rápido que parecia prestes a saltar do peito.
— Pensei que não ligaria — continuou ele, em tom calmo. — Mas algo me dizia que não resistiria.
— Eu não deveria ter ligado… — ela murmurou, apertando o celular contra o ouvido.
— Mas ligou. — A firmeza dele a desarmou completamente. — Isso significa que está curiosa.
Ela não sabia o que responder. Estava curiosa, sim. Mas também estava assustada.
— Quem é você? — finalmente perguntou, reunindo coragem.
Do outro lado da linha, houve um breve silêncio. Depois, ele respondeu com uma tranquilidade assustadora:
— Alguém que sempre consegue o que quer.
Helena engoliu em seco.
— E… o que você quer?
— Você.
A palavra foi dita com tanta convicção que um arrepio percorreu o corpo dela.
— Eu… não entendo — gaguejou, perdida.
— Não precisa entender, pequena. Apenas aceite.
Helena ficou em silêncio, incapaz de dizer qualquer coisa. Sentia-se dividida entre medo e fascínio, entre o impulso de desligar e a vontade de ouvir aquela voz para sempre.
— Amanhã à noite, vou buscá-la na livraria — disse ele, como se desse uma ordem. — Esteja pronta.
— O quê? Não! — Helena se levantou, aflita. — Eu não posso… não nos conhecemos!
— Já nos conhecemos o suficiente. — A firmeza dele a fez tremer. — Não tenha medo. Eu cuido de você.
— Mas eu… — ela tentou protestar, mas a voz falhou.
— Até amanhã, Helena. — E a ligação foi encerrada.
Ela permaneceu com o celular na mão, sem acreditar no que havia acabado de acontecer. O coração batia descompassado, e sua mente girava em mil direções. Ele queria buscá-la. Queria vê-la de novo.
Helena mordeu o lábio, desesperada. Devia contar aos pais? Devia ignorar? Devia fugir?
Mas, no fundo, sabia que não conseguiria. Algo naquele homem a puxava como um ímã irresistível.
E, mesmo sem perceber, já estava presa.
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Naquela noite, Helena mal conseguiu dormir. Cada vez que fechava os olhos, via o olhar cinza e ouvia a voz dele, firme e autoritária, dizendo que a queria.
O medo a corroía. Mas havia também outra coisa. Um fogo novo, que queimava em seu peito e que jamais havia sentido antes. Um desejo desconhecido, que a envergonhava, mas também a excitava.
Pela primeira vez, Helena começou a se perguntar como seria ser tocada, beijada… desejada. E, mais do que isso, começou a perceber que queria descobrir — mesmo que fosse pelas mãos de um homem como Dante.
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No dia seguinte, trabalhou nervosa. Cada cliente que entrava, ela imaginava ser ele. Cada toque da porta a fazia estremecer. O relógio parecia andar mais rápido do que nunca.
E, quando a noite caiu, Helena sabia que ele viria.
Não importava o quanto tentasse negar: Dante Salvatore já havia se tornado uma presença inevitável em sua vida.
E o destino, implacável, já estava escrito.
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Atualizado até capítulo 31
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