Narração: Amélia Grimaldi
A claridade invadia o quarto pelas enormes cortinas de seda, e eu acordei com a estranha sensação de estar sendo observada. Virei o rosto lentamente… e lá estava ele.
Enrico, deitado de lado, o braço por cima da barreira de almofadas, me encarando com aquele maldito sorriso no canto dos lábios.
Amélia: — Você não tem nada melhor pra fazer além de me vigiar dormindo?
Enrico: — Só estava certificando-me de que minha esposa ainda respira. Já pensou no escândalo se a herdeira Grimaldi morresse na noite de núpcias?
Revirei os olhos, sentando na cama.
Amélia: — Se continuar me acordando assim, pode ter certeza que essa manchete vai se realizar.
Ele riu, se levantando. Estava apenas com a calça social, o abdômen definido à mostra, exibindo a confiança irritante de quem sabia o efeito que causava.
Enrico: — Está irritada logo cedo… isso é um péssimo sinal para um casamento.
Amélia: — Péssimo foi descobrir que acordo casada com um exibido que acha que desfilar sem camisa é demonstração de poder.
Enrico: — E não é? — ele arqueou a sobrancelha, se aproximando apenas para me provocar.
Peguei uma das almofadas e joguei contra ele, mas Enrico apenas a agarrou no ar, rindo.
Enrico: — Tem certeza que isso é uma briga… ou é só a sua forma de me desejar bom dia?
Amélia: — Se fosse pra te desejar bom dia, Enrico, eu jogaria a almofada com força suficiente pra quebrar seu nariz.
Ele soltou uma risada rouca, divertida, e se inclinou perto do meu ouvido.
Enrico: — Cuidado, moglie. Se continuar assim, vai acabar se apaixonando pelo homem que deveria odiar.
Afastei-o com a palma da mão no peito, sem conter o sorriso sarcástico.
Amélia: — Apaixonar? Prefiro me apaixonar por uma víbora. Pelo menos ela morde só uma vez.
Ele riu mais uma vez e seguiu até o closet, vestindo a camisa branca recém-passada. Antes de sair, lançou o último golpe:
Enrico: — Vista-se. O café da manhã será servido. E lembre-se: hoje você tem o papel da esposa perfeita.
Amélia: — Perfeita? Ah, claro. Só não especificou se é como esposa… ou como atriz.
Ele piscou de forma cínica e saiu do quarto. Fiquei ali, respirando fundo, entre a raiva e a vontade de rir.
Dividir o quarto com Enrico já tinha se mostrado uma batalha. Agora, encarar o café da manhã diante de todos seria a próxima guerra.
Ajeitei o vestido com calma, como se cada dobra perfeita fosse parte da armadura que eu precisaria usar para enfrentar o mundo lá fora. Diante do espelho, prendi o cabelo e encarei meu reflexo.
Odiava admitir, mas ainda sentia o eco da risada de Enrico no quarto, como se a confiança dele tivesse ficado grudada no ar. Respirei fundo e puxei um sorriso cínico para mim mesma. Se ele queria uma esposa perfeita, teria. Só não prometo que será do jeito que imagina.
Peguei as joias discretas deixadas sobre a penteadeira e finalizei o visual. Um último ajuste no colar, um último suspiro.
Amélia: — Muito bem. Que comece a peça.
Abri a porta do closet e encontrei Enrico encostado no batente, já vestido com a camisa branca impecavelmente alinhada. Ele me observava como quem avalia uma obra de arte — ou uma arma prestes a disparar.
Enrico: — Finalmente. Estava começando a achar que teria que tomar o café sozinho.
Cruzei os braços, erguendo uma sobrancelha.
Amélia: — Seria um alívio para todos, tenho certeza.
Ele riu, aquele riso rouco que parecia feito apenas para me irritar, e se aproximou oferecendo o braço.
Enrico: — Lembre-se, moglie, hoje todos os olhos estarão sobre você. Seja gentil, sorria… e, acima de tudo, não me envergonhe.
Segurei o braço dele, mas apenas porque era o papel que me cabia. Inclinei-me ligeiramente para que só ele pudesse ouvir.
Amélia: — Ah, Enrico… Se eu tiver que escolher entre sorrir e envergonhá-lo, juro que saberei decidir na hora certa.
Ele me lançou aquele olhar satisfeito, como se eu tivesse acabado de confirmar o quanto o jogo dele me afetava. E, com isso, descemos juntos em direção ao salão de café da manhã — palco da próxima guerra.
Os degraus da escadaria ecoavam sob nossos passos. Enrico mantinha a postura impecável, o braço oferecido como se fosse uma extensão de sua autoridade, enquanto eu sustentava o sorriso ensaiado, aquele que sabia confundir qualquer um sobre o que realmente se passava dentro de mim.
Ao chegarmos ao salão de café da manhã, os olhos se voltaram imediatamente para nós. Uma dúzia de familiares e associados já estavam acomodados às mesas fartamente servidas. O cheiro de café fresco, croissants amanteigados e frutas exóticas misturava-se à tensão invisível que pairava no ar.
Enrico, com a naturalidade de quem nasceu para ser o centro de atenção, conduziu-me até a mesa principal. Puxou a cadeira para mim, teatralmente, como se fôssemos o retrato da harmonia conjugal.
Enrico: — A rainha merece o trono, não acha, moglie?
Sentei-me com a calma estudada, ajeitando o guardanapo sobre o colo. Inclinei levemente o rosto, exibindo um sorriso afiado.
Amélia: — O problema é quando o rei esquece que a rainha também sabe mover as peças.
Alguns sorrisos discretos se acenderam ao redor da mesa, mas ninguém ousou comentar. Enrico apenas sorriu, servindo o próprio café, fingindo que minhas palavras não haviam cutucado seu orgulho.
O silêncio foi quebrado pela voz de uma das tias de Enrico, que olhava para nós como quem contempla uma pintura.
Tia Donatella: — Vocês formam um belo casal. É inspirador ver duas famílias tão poderosas unidas assim.
Enrico agradeceu com um leve aceno, mas eu não deixei escapar a oportunidade.
Amélia: — Inspirador, sim. Só resta saber se a inspiração é digna de admiração… ou de cautela.
Os olhares se cruzaram em volta da mesa, mas ninguém ousou aprofundar o comentário. Enrico apenas pousou a xícara sobre o pires, olhando-me fixamente.
Enrico: — Você tem uma língua afiada, moglie. Espero que saiba usá-la fora daqui com mais… delicadeza.
Amélia: — Não se preocupe. Lá fora, a plateia gosta de discursos ensaiados. Aqui dentro, prefiro a verdade.
A tensão ficou suspensa por um segundo, mas logo ele relaxou o ombro e mudou de assunto, como se a discussão fosse apenas parte de uma peça ensaiada entre nós.
Enquanto os presentes conversavam sobre negócios, alianças e eventos sociais, eu apenas observava, sentindo o peso do papel que me obrigaram a vestir. Entre cada gole de café e cada sorriso contido, uma certeza se formava dentro de mim: este casamento não seria apenas um jogo de aparência. Seria guerra.
E, naquele momento, olhando para Enrico — seu sorriso confiante, seu olhar que parecia prever cada movimento meu —, percebi que a guerra já tinha começado.
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Atualizado até capítulo 55
Comments
Carolina Luz
Enrico gosta de provocar 🤪
2025-08-29
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