Lorena nunca foi do tipo que se intimidava com portas de vidro espelhado, seguranças com auriculares ou recepcionistas de sorriso mecânico. Ela carregava no olhar a firmeza de quem aprendeu cedo a não abaixar a cabeça. Mesmo assim, naquele dia, ao entrar no edifício Ferraz Tower, sentiu a pele eriçar como se antecipasse um toque que ainda não existia.
O saguão principal era uma obra de arte em mármore negro, linhas minimalistas e lustres que refletiam no chão polido como estrelas presas ao teto. As paredes altas guardavam segredos em silêncio. E, em cada canto, o ar pesado de exclusividade lembrava a qualquer visitante que ali só entrava quem era convidado — ou quem fosse suficientemente corajoso para se convidar.
Ela caminhou com passos firmes, os saltos ecoando como batimentos cardíacos em ritmo acelerado. Cada olhar que a seguia parecia julgar cada movimento, cada fio de cabelo ruivo preso em um coque elegante. Mas Lorena sabia, desde pequena, que as pessoas só respeitam quem se impõe.
A assistente a guiou por corredores silenciosos, tão silenciosos que ela podia ouvir a respiração da mulher à sua frente. O cheiro do perfume caro, a tensão nos ombros... Tudo denunciava o que vinha a seguir.
Quando parou diante da porta dupla, Lorena inspirou fundo. Ali dentro, encontraria Leonardo Ferraz — o homem que assinava contratos com o mesmo descaso com que esmagava corações. O homem que transformava rivais em poeira, que comandava empresas como um regente conduzindo uma sinfonia sombria. O homem que ela acreditava conhecer apenas pelos jornais, mas que já a observava muito antes de ela imaginar.
— Senhorita Duarte, ele a espera.
A assistente abriu a porta e saiu como quem foge de uma tempestade.
Lorena entrou.
O escritório era uma cápsula suspensa sobre a cidade. Vidros do chão ao teto deixavam São Paulo parecer um tabuleiro iluminado. A mesa, minimalista e escura, parecia uma extensão do homem que a ocupava. E ali estava ele, de costas, observando a paisagem, como se a presença dela fosse apenas mais um detalhe irrelevante na agenda.
— Feche a porta.
A voz dele era um comando suave, quase um sussurro, mas carregado de aço.
Ela obedeceu. Não porque fosse submissa, mas porque aquela ordem soou como um convite irresistível a um jogo que ela não sabia se estava pronta para jogar.
Leonardo se virou devagar.
O terno perfeitamente alinhado, o corte preciso, o relógio suíço reluzindo no pulso , cada detalhe nele gritava. Mas não era isso que paralisava Lorena. Era o olhar. Dois lagos escuros e profundos, onde qualquer um podia se afogar se ousasse mergulhar.
Ela sentiu o ar rarefazer entre eles. Por um segundo, esqueceu como respirar.
— Senhor Ferraz.
A voz dela saiu firme, mas dentro do peito o coração martelava como um tambor em dia de desfile.
Os lábios dele se curvaram em um sorriso lento, quase cruel.
— Lorena Duarte. Finalmente cara a cara.
Ele caminhou ao redor da mesa, aproximando-se sem pressa. Cada passo era um capítulo não escrito.
— Você não parece surpresa.
— Eu esperava alguém intimidador. Você confirma a expectativa.
Ela ergueu o queixo, firme, mas a pele arrepiada denunciava o turbilhão por dentro.
Leonardo soltou uma risada curta, um som que parecia escavar a espinha dela.
— Ainda acha que é apenas um contrato?
Ele se aproximou mais, parando tão perto que ela podia sentir o calor do corpo dele.
— Um contrato é um contrato. Negócios, apenas isso.
Lorena manteve os ombros firmes, mas os joelhos tremiam sob a saia lápis impecável.
Ele inclinou o rosto, o olhar percorrendo cada detalhe dela como se a despisse sem pressa.
— Negócios, Lorena?
O nome dela soou como uma carícia proibida nos lábios dele.
— Você sempre foi boa em negar o que sente.
Lorena congelou. A frase caiu como um raio silencioso.
— Como...
Ela tentou recuar, mas ele segurou seu braço com firmeza, sem violência, mas com uma autoridade que eletrizava.
— Eu te observo há anos. Muito antes de você saber quem eu era.
Ele sussurrou, aproximando o rosto do dela.
— Acha mesmo que você foi escolhida por acaso?
Ela sentiu o mundo estreitar ao redor. Ele sabia. Sabia dos concursos que ela venceu, dos projetos que a destacaram, da exposição que a tornara uma promessa no design. E, agora, tudo parecia uma trilha silenciosa desenhada por ele.
Lorena tentou puxar o braço, mas ele a segurou.
— Você me odeia por isso?
Ele perguntou, os olhos incendiados de desejo contido.
— Eu não sinto nada.
Ela mentiu, as palavras saindo rasgadas.
Ele sorriu, um sorriso que era ao mesmo tempo ternura e ameaça.
— Lorena, você mente mal. Sempre mentiu.
O polegar dele roçou o pulso dela, um toque que parecia acender pequenas explosões sob a pele.
— Desde aquela noite, quando tinha quinze anos, lembra?
O estômago dela despencou. Uma memória que ela guardava como uma fotografia rasgada voltou com violência. Ela, adolescente, cheia de sonhos e arrogância, rejeitando o garoto que a olhava como se ela fosse o sol.
— Você…
O sussurro dela veio quase mudo.
— Eu fui embora por sua causa.
Ele aproximou-se mais, tão perto que ela podia sentir a respiração dele roçar seus lábios.
— E mesmo longe, eu nunca parei de cuidar de você.
Lorena tentou falar, mas o peito dela subia e descia em ondas incontroláveis.
— Eu te vi se formar, vi você abrir o primeiro escritório, vi cada linha que você traçou em cada projeto. E aqui estamos.
Ele soltou o braço dela devagar, como se marcasse um limite imaginário.
— Agora, você vai trabalhar comigo. Ou melhor, para mim.
Ela respirou fundo, o ar arranhando a garganta.
— Você acha que pode me manipular?
Ela ergueu o queixo novamente, tentando reconstruir o escudo que ele desmontava com palavras.
Leonardo deu um passo para trás, observando-a como quem aprecia uma obra rara.
— Manipular? Não. Eu apenas te dou a chance de descobrir quem você realmente é.
Ele se virou, voltando para trás da mesa, mas o silêncio parecia manter a conexão entre eles viva, como um fio invisível.
Lorena fechou os olhos por um instante. Uma gota de suor escorreu pela nuca. A mente gritava para correr, mas o corpo parecia fincado ao chão, magnetizado.
— O que você quer de mim?
A voz dela soou mais suave, quase uma confissão.
Leonardo apoiou as mãos na mesa, inclinando-se levemente.
— Quero tudo. O seu talento. O seu orgulho. E, principalmente, a sua rendição.
Os olhos dele ardiam, negros como uma noite sem lua.
Lorena sentiu as pernas fraquejarem. O coração, antes um tambor, agora era um trovão silencioso.
— Isso não vai acontecer.
A frase saiu em um sussurro, mas cheia de uma força frágil.
Ele sorriu. Um sorriso calmo, como quem já conhecia o final de uma história que o outro nem sonhava.
— Não hoje. Mas vai acontecer.
Ele se endireitou, ajeitando a manga do terno como se encerrasse uma reunião qualquer.
— Você pode sair.
Lorena demorou um segundo para entender. Então se virou, cada passo parecendo um esforço sobre-humano. Quando a mão tocou a maçaneta, ela sentiu o calor dele atrás.
— Lorena.
A voz dele foi baixa, quase gentil. Ela virou o rosto
— Não minta para si mesma. Nem para mim.
O olhar dela encontrou o dele. Um segundo que durou uma eternidade. Ali, naquele silêncio, ela percebeu que ele conhecia cada pedaço dela melhor do que ela mesma.
Sem responder, saiu do escritório, os joelhos ainda trêmulos. O corredor parecia mais longo do que antes. Ao atravessar o saguão, a respiração ainda curta, Lorena segurou a bolsa com força.
Do lado de fora, o vento frio a despertou como um tapa suave. Ela olhou para o alto da torre, onde, atrás daqueles vidros, um homem a vigiava.
Um homem que ela conheceu criança. Um garoto que ela humilhou sem entender.
Agora, ele era um CEO impiedoso, um monstro de terno.
Mas o que realmente a fazia estremecer não era o poder dele. Era a lembrança do garoto de olhos escuros, parado na chuva, esperando que ela mudasse de ideia.
O garoto que virou lenda. O garoto que voltou para reivindicar tudo.
Lorena apertou os lábios, o coração martelando contra o peito.
Ela sabia, mesmo que não admitisse: nada na vida dela seria igual depois daquele encontro.
A partir dali, cada projeto, cada linha traçada, cada respiração seria um convite silencioso para um jogo perigoso.
Ela não queria participar. Mas também não conseguia fugir.
A mente dizia "não".
O corpo, em silêncio, já dizia "sim".
Lorena não sabia ainda, mas a semente havia sido plantada.
E, dentro dela, germinava um desejo tão avassalador quanto o medo.
Naquele dia, Lorena não saiu apenas de um escritório.
Ela saiu carregando um segredo que mudaria tudo: o de que, no fundo, uma parte dela sempre quis ser dele.
E Leonardo, com seus olhos de noite profunda, sabia disso desde sempre.
Ele só estava esperando o momento certo para fazer a última jogada.
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Atualizado até capítulo 33
Comments
Achewalt
Não aguento mais esperar, escreva logo! 😤
2025-07-17
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