capítulo 4

Ninguém Quer Virar Lenda Urbana

A luz da manhã começava a tocar o acampamento, mas ninguém parecia aliviado por ver o sol.

As mochilas estavam prontas. Os equipamentos, conferidos. E mesmo assim, o clima era de velório.

— Gente, vamos ser realistas aqui? — disse Greg, ajustando o colete com raiva. — Eu não quero morrer. E também não quero ser possuído. Nem virar estátua. Nem virar pó maldito. Tá? Só pra deixar claro.

— Tinha outras profissões, né? — murmurou Ana, enquanto checava o GPS. — A gente podia ter sido professora, gerente de loja, sei lá… qualquer coisa que não envolvesse pacto com deuses da morte.

— E ainda vem aquela plaquinha simpática no começo da tumba — completou Farley, debochado. — “A MAIS AMADA.” Vocês sabem o que isso quer dizer, né? Pegadinha de maldição. Começa fofinho, termina com a gente gritando no escuro com os olhos sangrando.

— Cala a boca, Farley — murmurou Mahmoud, sombrio.

— Tô errado? É sempre assim. Tumba bonita, inscrições lindas, aí pronto — BAM — um maldito espírito de 3 mil anos aparece e acaba com a expedição.

— O tapa veio seco, viu? — disse Ana, cruzando os braços. — E bem dado. Cês sabiam que cinco anos atrás uma equipe sumiu numa tumba associada a Anúbis?

Todos olharam pra ela.

— Sumiu inteira. Nem os ossos acharam. Nada. Nem pedaço de corda. A área foi selada e o governo fingiu que nem existiu. O guia local que levou eles foi o último a ser visto. Dizem que o chacal ficou ofendido. Levou todo mundo.

O silêncio foi total.

Farley pigarreou.

— Tá. E quem é que decide que ir lá agora é uma boa ideia?

— Eu — disse Elisa, firme.

Ela os encarou, os olhos verdes afiados, duros.

— Porque se essa tumba é real… e é o que os hieróglifos dizem… então é a descoberta do século. E porque a gente não veio até aqui pra fugir na hora H.

— A gente também não veio aqui pra virar nota de rodapé em livro de maldições! — retrucou Greg. — “Equipe Mourad, vista pela última vez sorrindo antes de abrir o portão do inferno com um pé de cabra.”

— Desce. Ou não recebe. Simples assim — disse Ana, secando o suor da testa com a manga. — Eu não vim até o Egito pra sair com as mãos abanando.

Farley bufou.

— Maldição ou não, se eu morrer, quero que escrevam no meu túmulo: “Foi contra a vontade dele.”

Mahmoud terminou sua oração, em silêncio. Depois falou, sem olhar pra ninguém:

— Ele vai saber quem zombou. E quem respeitou. E só um desses grupos volta pra casa.

O Ar do Submundo

A escada improvisada rangia sob o peso dos equipamentos. Um a um, a equipe descia, os pés tocando o antigo corredor subterrâneo aberto dias antes. A lanterna na mão de Elisa tremia levemente. Não por falha. Pela tensão em seu pulso.

— Que merda… — murmurou Greg lá atrás, olhando em volta.

O ar ali embaixo era denso, como se fosse feito de algo mais espesso que oxigênio. Não tinha cheiro. Não tinha cor. Mas estava errado. Muito errado.

— Tá mais gelado aqui do que devia — disse Farley, esfregando os braços. — Isso é impossível, a gente tá no meio do deserto.

— Shhh — sussurrou Mahmoud.

Mesmo quem não rezava, agora sussurrava palavras soltas. Ana, a cética, mordia o lábio e tinha os dedos fechados em punho. Até Greg — que fazia piadas sobre múmias dois dias atrás — murmurava alguma coisa entre os dentes.

— Espera aí — disse ele, olhando pra Elisa. — Você tá orando?

Ela não respondeu de imediato. Continuava caminhando à frente, os olhos atentos aos hieróglifos que surgiam nas paredes com o feixe da lanterna.

— Você não era ateia?

Elisa respondeu sem virar:

— E tô orando pra quem, exatamente? Não sei. Só sei que se você não tá sentindo, eu tô. O ar tá estranho. Não é só frio. É... pesado. Vivo.

O grupo parou por um segundo. Todos olhavam em volta.

As paredes agora eram lisas, mas tinham manchas escuras em lugares aleatórios. Como marcas de mão. Ou sombra de algo que já esteve ali.

— Tem coisa aqui — murmurou Ana. — Tá vendo? O ar não se mexe. A gente respira, mas ele não se mexe.

Greg engoliu seco.

— É como se… ele estivesse nos respirando.

A lanterna de Elisa iluminou o fim do corredor. A porta estava lá. Intacta. Majestosa. Imensa.

As inscrições tremiam à luz. E por um segundo, todos juraram ter ouvido um som — como uma respiração longa. Não humana. Não animal. Vinda de dentro da pedra.

— É aqui — disse Elisa.

Ela pousou a mão na rocha fria.

— E seja lá o que estiver do outro lado… ele já sabe que chegamos.

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