Café Amargo, Olhar Doce

EPISÓDIO 5 —

Liz ainda tentava se concentrar na leitura quando percebeu que Rian havia desaparecido. Olhou discretamente pela cafeteria, mas a cadeira onde ele estivera antes agora estava vazia. O som ambiente continuava o mesmo, o tilintar de xícaras, o murmúrio das conversas, o aroma constante de café recém-passado e, mesmo assim, a ausência dele parecia mais presente do que sua presença.

Ela soltou um suspiro curto. Devia estar cansada. Era a única explicação plausível para aquele incômodo que não fazia sentido. Rian não era importante. Não pra ela. Era só uma distração inconveniente.

Fechou o livro devagar, pronta para ir embora, quando notou um guardanapo sobre a mesa. Pegou com curiosidade. Tinha algo escrito, com uma caligrafia firme e elegante:

“O final pode decepcionar, mas às vezes o meio compensa.”

Sem assinatura. Mas ela sabia de quem era. Não precisava de provas. Revirou os olhos, dobrando o papel e enfiando-o na bolsa.

Poético, talvez. Mas desnecessário. Ou seria... proposital?

Ela sacudiu a cabeça, tentando afastar o pensamento. Não podia começar a imaginar intenções onde talvez não houvesse nada além de mais uma provocação. E mesmo que houvesse, não importava.

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Segunda-feira. Aula nova, semana nova. Liz chegou cedo, como de costume. Gostava de se organizar antes que o tumulto tomasse conta da sala. A rotina era seu alicerce, e naquele dia, especialmente, ela precisava de algo firme para se agarrar. Escolheu o mesmo lugar de sempre, abriu o caderno e, pela primeira vez em dias, não pensava em mais ninguém além dela mesma.

Rian entrou pouco depois. Traje discreto: blazer cinza, camisa preta, expressão séria. Começou a aula sem rodeios, como se a leveza do sábado tivesse sido apenas uma ilusão.

— Bom dia. Hoje vamos falar sobre riscos, tanto pessoais quanto profissionais.

Seu tom era direto, sem firulas, e os olhos não buscaram os dela em nenhum momento. Ele passou a maior parte da aula explicando casos de gestão, falências, decisões críticas. Parecia completamente focado no conteúdo. Nenhum comentário fora de hora, nenhuma insinuação.

Era como se ela fosse apenas mais uma aluna entre tantos. E, estranhamente, isso a incomodou mais do que deveria.

Liz tentava se concentrar. Fazia anotações, respondia mentalmente às perguntas lançadas ao ar. Agradecia por ele finalmente estar se comportando como um professor normal, ou tentava se convencer disso. Mas havia algo diferente naquela manhã. Algo que ela não sabia nomear.

No final da aula, enquanto ela guardava o material, ouviu passos firmes se aproximando. Já sabia quem era antes mesmo de levantar os olhos.

— Liz.

Ela se virou com calma, o rosto impassível.

— Algum problema?

— Não. Só queria saber se o livro que você pegou no sábado te agradou

disse ele, com um tom neutro. Sem sorrisos, sem brincadeiras.

Ela hesitou por um momento antes de responder.

— Serviu ao propósito. Me distraiu.

Rian assentiu, cruzando os braços, como se estivesse avaliando a resposta.

— Fico feliz. É um bom lugar para espairecer.

Ela desviou o olhar em direção à porta, num gesto claro.

— Sim. E gosto justamente porque é tranquilo.

A mensagem estava ali, nítida. Ele entendeu. Deu um leve sorriso, quase imperceptível, e não insistiu.

— Bom, até a próxima aula.

— Até.

Liz saiu da sala com passos calmos. Sem coração acelerado, sem frases ensaiadas na cabeça. Apenas com a estranha sensação de que ele, ao não insistir, havia deixado mais perguntas do que respostas.

E dessa vez, ela não sabia se queria as respostas.

Mas ignorou. Tinha outras prioridades. Não era hora de pensar nisso. Não era hora de pensar nele.

Ou pelo menos era o que tentava repetir para si mesma.

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