Coincidências Não Existem

EPISÓDIO 4 —

Sábado de manhã. O céu estava parcialmente nublado, com uma brisa suave que fazia as folhas dançarem nas calçadas. Liz só queria um pouco de sossego. Depois de uma semana longa e mentalmente desgastante,tudo que ela precisava era de silêncio. Saiu de casa com fones nos ouvidos e uma playlist calma tocando. Caminhava sem pressa, deixando a mente vagar. Tentava esquecer as últimas aulas, os trabalhos acumulados, as cobranças… e principalmente o novo “professor CEO” que insistia em ocupar mais espaço na cabeça dela do que deveria.

O problema era que pensar em não pensar nele fazia exatamente o oposto.

Decidida a fugir de tudo, entrou numa pequena livraria-café escondida no centro da cidade. Um lugar quase secreto, com cheiro de papel antigo, café fresco e música instrumental baixinha preenchendo o ambiente. Um refúgio. Lá, ninguém a conhecia. Não havia vozes altas, nem julgamentos, nem olhares curiosos. Era perfeito.

Liz passou os olhos pelas prateleiras até encontrar um livro de poesia contemporânea. Pegou o exemplar, pediu um cappuccino dessa vez, com açúcar e se acomodou em uma das mesas do fundo, perto da janela. Do lado de fora, a cidade seguia seu ritmo, mas ali dentro o tempo parecia desacelerar.

Ela estava finalmente relaxando, sentindo o calor da xícara entre os dedos, quando uma voz cortou o ar.

— Esse livro é bom. Mas o final decepciona.

O coração de Liz deu um salto. Ela ergueu os olhos devagar, quase desejando que fosse qualquer outra pessoa. Mas, é claro, não era.

Rian Cárter.

De novo.

Camisa branca dobrada até os cotovelos, jeans escuro e aquele olhar tranquilo que contrastava perigosamente com a bagunça que ele causava dentro dela.

— Você me persegue?

ela perguntou, arqueando uma sobrancelha.

Ele ergueu as mãos em rendição, com um sorrisinho de canto.

— Juro que não. Eu venho aqui todo sábado. Mas admito que é… curioso te ver aqui também.

— Coincidência

ela respondeu, voltando os olhos para o livro.

— Ou destino

ele rebateu, pegando um exemplar da prateleira ao lado. Mas, dessa vez, sua voz não tinha malícia. Soava quase... suave.

Liz tentou disfarçar o arrepio que percorreu sua nuca.

— Você não tem coisas de CEO pra fazer num sábado? Investimentos, reuniões secretas, contratos milionários?

— Tenho

ele disse, se encostando casualmente na cadeira ao lado.

— Mas prefiro café e livros. O mundo dos negócios pode esperar uma ou duas horas.

Ela o encarou por alguns segundos. Havia algo diferente naquele momento. Não era o Rian provocador da universidade, nem o chefe arrogante das aulas. Era só... um cara comum, numa manhã comum.

— Relaxa

ele disse ao perceber o olhar dela.

— Não vou te atrapalhar. Só passei pra dizer que gosto desse lugar também.

Rian se afastou e foi sentar sozinho algumas mesas depois, de costas para a porta, de frente para uma pilha de livros. Liz tentou voltar à leitura, mas sua atenção estava irremediavelmente dividida.

Mesmo em silêncio, ela sentia a presença dele. Forte. Irritante. Intensa. Era como se ele puxasse o ar do ambiente, como se o espaço ficasse mais apertado com ele por perto — e ao mesmo tempo, mais interessante.

Liz passou os olhos pelas páginas, mas mal absorvia o conteúdo. Em vez disso, pensava na postura dele, na forma como se inclinava para ler, no jeito como mexia na xícara sem perceber. E, principalmente, pensava em por que ele estava ali. Será que era mesmo coincidência?

Uma parte dela dizia que sim. Outra, uma parte mais íntima, instintiva,queria acreditar que não. Que, de alguma forma, ele tinha ido até lá porque... sabia que ela estaria ali. Porque queria vê-la.

Liz balançou a cabeça, espantando os pensamentos. Não fazia sentido. Ela não era o tipo de garota que se deixava levar por suposições românticas. Mas, mesmo assim…

Por que aquele homem — com aquele jeito todo seguro, provocador, porém contido mexia tanto com ela?

E pior: por que parte dela estava começando a gostar disso?

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