Capítulo 4
O silêncio depois do caos era estranho. Quase doloroso. A respiração de Luna ainda vinha entrecortada, como se o corpo dela não conseguisse entender que a ameaça havia passado. Mas não era tão simples. A mãe se fora, sim — mas as palavras dela continuavam dentro do peito de Luna como cacos de vidro.
Dante não disse nada por um tempo. Apenas ficou ao lado dela, sentado no chão, o braço envolvendo os ombros dela com firmeza. O apartamento parecia mais escuro, mesmo com a luz da manhã atravessando as janelas. Tudo estava suspenso — como se o tempo tivesse parado para que ela pudesse se recompor.
— Você ainda está tremendo — ele sussurrou, puxando-a mais para perto.
Ela não respondeu. Tinha medo de falar e desabar de novo. Tinha medo até de respirar errado. Mas ali, colada ao peito dele, sentia algo que nunca conhecera: segurança. Dante era uma muralha entre ela e o mundo. Um abrigo. Mas também uma tempestade que ameaçava engoli-la.
— Vem — ele disse enfim, levantando-se com ela nos braços. — Você precisa descansar.
— Não quero dormir — murmurou Luna. — Sempre que fecho os olhos... ela volta.
— Então não dorme — ele disse. — Só deita. Eu fico com você.
Levantou-a como se ela não pesasse nada. Levou-a até o quarto, ajeitou os lençóis e deitou ao lado dela. Por um momento, os dois ficaram apenas ali. O mundo podia explodir lá fora, e ainda assim aquele espaço parecia sagrado.
Ela se enroscou nele devagar, como se buscasse calor depois de ter ficado muito tempo no frio.
— Você realmente não vai embora? — perguntou, com a voz falha.
— Nem se o inferno inteiro vier me buscar.
Luna fechou os olhos, sentindo o cheiro dele — couro, tabaco, e o calor de um homem que sabia ferir, mas também sabia proteger. Era um perfume perigoso. E ela estava viciada.
O silêncio se prolongou. A respiração de ambos sincronizada. Mas não era um sono tranquilo. Eram cicatrizes adormecidas, esperando o momento de sangrar de novo.
Depois de um tempo, ela falou:
— Ela me dizia que eu destruía tudo o que tocava. Que o olhar dela já era o suficiente pra me punir. Às vezes, ficava dias sem falar comigo. Passava por mim como se eu fosse um móvel quebrado da casa.
Dante a ouviu, em silêncio.
— Quando eu tinha doze anos, achei que se eu sumisse... ela notaria. Então fui até a linha do trem. Fiquei esperando por horas. Mas nada passou. Quando voltei pra casa, ela nem tinha notado que eu havia saído.
Ele apertou os olhos, com raiva. Queria encontrar aquela mulher de novo. Queria que ela sentisse um milésimo da dor que havia deixado para trás.
— Eu fui ensinada a me calar — continuou Luna. — A me encolher, a não incomodar. Por isso nunca falei pra ninguém quando aquele homem... — ela engoliu em seco — ...quando ele me tocava. Achei que era culpa minha. Ela dizia que eu “provocava”, lembra? Como se eu, com nove anos, soubesse o que era seduzir alguém.
— Você não tem culpa de nada, Luna. Nada.
Ela virou o rosto e olhou para ele. Os olhos escuros, ferozes, mas com um calor que ela não sabia explicar.
— Por que você tá aqui? Por que não correu depois de ver o desastre que eu sou?
— Porque eu também sou um desastre. Só que do lado de fora. Você sangra por dentro. Eu, por fora. Somos da mesma tempestade.
Luna não soube o que responder. Mas os olhos dela diziam tudo: obrigada. Por ver. Por não fugir. Por ficar.
A respiração se intensificou. Dante se inclinou devagar, os lábios tocando os dela com cuidado. Não era como a noite anterior, cheia de fogo e urgência. Era diferente. Era íntimo. Dolorosamente íntimo.
O beijo cresceu. Ela puxou a camisa dele, como se quisesse arrancar não só a roupa, mas o mundo inteiro. Ele respondeu com intensidade, as mãos explorando sua pele como quem reconhece um território sagrado.
— Me faz esquecer — sussurrou ela contra os lábios dele. — Nem que seja só por um tempo.
Ele não hesitou. Os corpos se entrelaçaram com um desejo faminto, mas havia algo mais ali. Algo profundo. Algo que doía e curava ao mesmo tempo.
As roupas foram se perdendo pelo quarto. O corpo de Luna tremia, mas não mais de medo. Era como se finalmente estivesse quebrando a armadura que usara a vida inteira. Dante beijou cada cicatriz, visível e invisível. Como se dissesse, sem palavras: você sobreviveu. E é linda por isso.
O quarto se encheu de gemidos abafados, de respirações rápidas, de suor e prazer. Mas também de algo mais cru: libertação. Não era apenas sexo. Era o grito mudo de alguém que havia sido silenciada por tempo demais.
Quando terminaram, ficaram abraçados. Suados, ofegantes, mas em paz.
— Eu não sou boa nisso — ela disse, envergonhada. — Em confiar. Em amar.
— Eu não quero perfeição. Quero verdade. Mesmo que doa.
Ela apertou os olhos, emocionada. Pela primeira vez, achava que talvez... talvez merecesse um pouco de carinho.
Mas a paz duraria pouco.
O celular de Dante vibrou na mesa de cabeceira. Ele se esticou e atendeu, sem sair de perto dela.
— Fala. — Silêncio. Depois, o rosto dele mudou. Ficou sério. Sombrio. — Tem certeza? — Outro silêncio. — Fica de olho. Se ela se mexer de novo, me avisa.
Ele desligou.
Luna o observava, o coração acelerado.
— Era sobre mim?
Dante hesitou. Depois assentiu.
— Sua mãe não voltou pra casa.
— Como assim?
— Parece que ela tá rondando por aí. Ligou pra umas pessoas estranhas. Gente que eu conheço. Gente perigosa.
— Meu Deus...
— Eu vou resolver isso. Mas preciso que você confie em mim. Não sai daqui sem me avisar. Promete?
Ela assentiu, o medo voltando a escorrer pela espinha. A sombra da mãe ainda rondava. E agora, parecia mais venenosa do que nunca.
Dante se vestiu e a beijou na testa.
— Eu volto logo. Tranca a porta. E se alguém tocar, não atende.
— Você vai atrás dela?
— Não. Vou avisar que, se ela não parar... vai ter consequências.
Luna viu a expressão dele endurecer como ferro. O homem que a beijara com doçura já não estava mais ali. Era outro agora. Um predador.
E ela sabia: aquele mundo que ele tentava manter afastado... estava se aproximando rápido demais.
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Atualizado até capítulo 25
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