Capítulo 2

O som da chuva retumbava nos meus ouvidos enquanto eu abria caminho pela tempestade, com as mãos trêmulas sobre o volante. Olhava de soslaio para o homem inconsciente no assento do passageiro, sentindo-me estranha e muito preocupada. Sua respiração era pausada, mas estava ali, presente, agarrando-se à vida.

— Aguenta, por favor, não vá para junto de São Pedro… — sussurrei, como se ele pudesse me ouvir.

Assim que cruzei as portas do hospital, tudo aconteceu num instante. Desci de um salto e corri para a recepção, muito agitada.

— Gritei: Preciso de ajuda! Há um homem ferido no meu carro.

Os maqueiros não perderam tempo. Com movimentos rápidos e precisos, tiraram seu corpo quase inerte do assento e o colocaram sobre a maca. Do fundo do meu coração, eu pedia para que aquele homem ficasse bem, enquanto o levavam às pressas para a sala de emergência.

— O que aconteceu? — perguntou a doutora Alicia Cervantes, caminhando ao meu lado enquanto observava o paciente.

— Encontrei-o na estrada. Estava inconsciente e tinha um ferimento na cabeça — expliquei, secando o rosto com a manga do meu uniforme encharcado.

Alicia assentiu com a testa franzida e dispôs-se a examiná-lo. Fiquei à margem enquanto ela e sua equipe trabalhavam. Limparam-no, verificaram seus sinais vitais e suturaram o ferimento em sua testa. Depois, fizeram exames de imagem para descartar fraturas ou lesões internas.

Esperei no corredor, abraçando os próprios braços, numa tentativa de me aquecer. A água continuava escorrendo do meu cabelo, grudando na minha pele, mas eu nem notava. Minha mente estava fixa no homem que acabara de ajudar.

Pouco depois, a doutora saiu da sala com sua expressão profissional intacta.

— Não parece haver dano cerebral nem fraturas graves. Só nos resta esperar que ele acorde.

Soltei um suspiro de alívio, mas não durou muito. O olhar inquisidor de Alicia me fez endireitar.

— Em que te meteste agora, Melisa? — perguntou com os braços cruzados. — Quem é esse homem?

— Não sei — admiti. — Encontrei-o caído na estrada quando voltava para casa. Não podia deixá-lo lá, sabes que sempre ajudo quem precisa.

Alicia bufou, balançando a cabeça.

— Sim, claro. Não consegues evitar. Mas desta vez, pode ser que te tenhas metido em algo complicado.

— Talvez… mas não podia ignorá-lo. Além disso… ele é muito bonito — soltei, com um sorriso cansado.

Alicia ergueu uma sobrancelha e suspirou.

— Ai, Melisa… Resta esperar que ele acorde para saber quem é e o que aconteceu.

— Sim, doutora. Enquanto isso, eu me encarregarei dele.

Minha amiga olhou para mim com ternura. Sabia como eu era. Desde que nos conhecíamos, sempre fora impulsiva quando se tratava de ajudar alguém. E sim, muitas vezes isso me metia em problemas, mas não podia evitar, essa era eu.

— De acordo — disse finalmente. — Mas se houver novidades, avisas-me imediatamente.

— Avisarei.

Alicia foi-se embora, deixando-me sozinha.

Passei a noite na sala de observação, sentada ao lado da cama dele. O som da máquina que monitorava seus sinais vitais era a única coisa que quebrava o silêncio. Fiquei observando-o, perguntando-me quem era e o que fazia sozinho no meio da estrada numa noite como aquela.

As horas passaram lentamente, e quando os primeiros raios de sol começaram a filtrar-se pela janela, um leve movimento captou minha atenção.

O homem franziu a testa, sua respiração acelerou e suas pálpebras tremeram antes de se abrirem de repente. Seus olhos, de um azul profundo e intenso, encontraram os meus. O homem pareceu perdido e confuso em seu olhar, como se não entendesse onde estava.

Então, sentou-se de repente, respirando com agitação. Suas mãos foram direto ao soro em seu braço, puxando-o como se quisesse arrancá-lo.

— Ei, calma! — disse, levantando-me rapidamente. — Não te mexas, estás num hospital.

A porta abriu-se imediatamente e Alicia entrou, seguida por uma enfermeira.

— Como te sentes? — perguntou a doutora enquanto verificava seu pulso e seu olhar. — Lembras-te do que te aconteceu?

O homem ficou em silêncio por um momento. Piscou várias vezes, como se tentasse encontrar as respostas em sua mente. Depois, seu rosto contraiu-se com desespero.

— Não sei — murmurou com voz áspera. — Não… não me lembro de nada.

Alicia e eu trocamos olhares.

— Qual é o teu nome? — insistiu ela, com paciência.

Ele cerrou o maxilar e negou com a cabeça, cada vez mais inquieto.

— Não sei.

Sua respiração tornou-se mais errática, e sua mão trêmula voltou a tentar tirar o soro.

— É normal que te sintas confuso — disse Alicia. — Pode ser que tua memória retorne com o tempo. Mas, por agora, precisas descansar.

O homem fechou os olhos e deixou a cabeça cair contra o travesseiro, como se sua confusão fosse demais para suportar.

Eu não tinha dito nada até aquele momento. Finalmente, dei um passo à frente e falei com voz tranquila.

— Olá, chamo-me Melisa. Fui eu quem te encontrou na estrada e te trouxe para aqui.

Seus olhos fixaram-se em mim, observando-me com intensidade, como se tentasse encontrar algo familiar no meu rosto.

— Enquanto recuperas a tua memória, eu cuidarei de ti — acrescentei com um pequeno sorriso. — Não estás sozinho, homem de Deus.

Ele hesitou por um instante, como se não soubesse se confiava em mim ou não. Mas, no final, assentiu lentamente.

Não tinha nome, não tinha lembranças, e naquele momento, a única coisa que tinha era a mim.

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