Cont...
Na manhã seguinte, Laura encontrou Rafael no mesmo canto do pátio, com seus fones de ouvido e olhar distraído. Ele parecia alheio ao mundo, mas, ao vê-la se aproximar, um leve sorriso surgiu em seus lábios.
— Então você leu? — ele perguntou, apontando para o papel que ela trazia dobrado em mãos. Laura hesitou, mas concordou.
– Li. E... acho que entendi o que quis dizer.- Ele arqueou uma sobrancelha, desafiando.
— Entende mesmo? Ou você acha que entende?- Ela respirou fundo. Sabia que Rafael estava testando suas palavras, talvez para descobrir se ela era apenas mais uma pessoa curiosa que desistiria ao primeiro sinal de resistência.
— Acho que nós dois construímos muros ao nosso redor, mas o seu é mais alto — disse ela, tentando não voar invasivamente.
Rafael ficou em silêncio por um momento, surpreso com a percepção dela.
— E por que você acha que tem certeza? — murmurou, cruzando os braços.
Laura não respondeu imediatamente. Em vez disso, enviou-se ao lado dele, abriu seu diário e mostrou uma página. Era um pequeno poema que ela havia escrito na noite anterior:
"Somos castelos em ruínas,
cercados por muros de tijolos gastos,
esperando que alguém tenha coragem
de atravessar o que nos proteja."
Por um instante, Rafael pareceu desconcertado. Ele pegou o diário delicadamente, leu o poema novamente e, depois de um longo suspiro, disse:
— Talvez você entenda mais do que eu pensei.
A partir daquele dia, algo mudou entre eles. Rafael começou a deixar cair, aos poucos, os tijolos de seu muro. Ele contou a Laura sobre sua infância difícil, a ausência de um pai e como sua mãe lutava para manter os dois enquanto ele se perdia em brigas e confusões. Laura ouvia atentamente, sem julgamentos, mas com uma empatia que Rafael nunca havia experimentado. Ao mesmo tempo, ela compartilhava com ele seus próprios segredos: como o silêncio em casa era sufocante desde que seus pais se separassem, e como ela usava o diário para não se perder completamente. Os encontros no pátio tornaram-se comuns. Ambos ainda eram solitários, mas agora dividiam a solidão um com o outro. E, naquele dia, ao escrever no diário, Laura anotou uma nova frase:
"Talvez o amor não seja destruir os muros de alguém, mas ajudá-lo a construir uma porta." Na semana seguinte, a rotina dos dois parecia girar em torno daquele mesmo canto do pátio. Laura e Rafael não precisaram de muitas palavras para entender o que se passava entre eles. Um olhar, um silêncio compartilhado, e tudo parecia ganhar significado. Certa tarde, quando o sol tingia o céu de laranja, Rafael surpreendeu Laura ao lhe estender um fone de ouvido.
— Escuta isso — disse ele, com um sorriso de canto, um pouco tímido.
Laura pegou o fone, colocando-o sem questionar. A melodia suave e melancólica invadiu seus ouvidos. Era uma música instrumental, cheia de emoção, como se cada nota traduzisse algo que Rafael ainda não conseguia colocar em palavras.
— Você escuta isso quando está sozinho? — ela disse, depois de um momento.Rafael concordou.
— É como se a música dissesse o que eu não consigo... entende?- Ela entendeu. Entendeu mais do que ele esperava.
— Obrigada por compartilhar isso comigo — disse ela, com sinceridade.- Rafael a encarou, como se estivesse tomando coragem para dizer algo mais.
— Laura... você acha que alguém como eu merece ser ouvido?- A pergunta a pegou de surpresa. Ela fechou os olhos por um instante, escolhendo as palavras certas.
— Acho que todos merecem ser ouvidos, Rafael. Mas você não precisa esperar que alguém ouça. Às vezes, a gente precisa aprender a se ouvir primeiro.- Ele ficou em silêncio, digitando aquilo. Era como se as palavras dela ressoassem nos tijolos do muro que ele ainda tentava derrubar.Mais tarde, quando Laura voltou para casa, encontrou o diário em sua mochila. Rafael havia deixado um pequeno bilhete dobrado entre as páginas:"Obrigado por escutar. Talvez, um dia, eu consiga ser uma pessoa que abre a própria porta." Ao ler aquilo, Laura esperava. Ela sabia que ambos ainda tinham muito a aprender sobre si mesmos, mas, de alguma forma, aquele muro que os separava estava acontecendo. Tijolo por tijolo, eles estavam aprendendo a atravessar juntos.
Fim...
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 21
Comments