A manhã de sexta-feira amanheceu como qualquer outra, mas algo no ar estava diferente. Lúcia sentia, no fundo do peito, uma inquietação que não conseguia explicar. Ela passou a manhã tentando se concentrar em seu trabalho, mas seus pensamentos estavam longe. A noite anterior ainda ecoava em sua mente: Beatriz, com aquele sorriso afiado e suas palavras doces, tinha deixado uma marca. Havia algo em sua atitude que a incomodava mais do que ela gostaria de admitir. Mas o pior estava por vir.
Naquele dia, André não mandou nenhuma mensagem, o que não era normal. Ele sempre mandava algo simples, uma mensagem rápida perguntando como ela estava ou se ele a veria à noite. Mas nada. O silêncio foi mais pesado do que qualquer palavra. Lúcia tentou se convencer de que ele estava apenas ocupado, mas não pôde evitar a sensação de que algo estava errado.
Quando o horário de almoço chegou, ela foi até o café onde costumava se encontrar com André, esperando que ele aparecesse como sempre, mas ele não estava lá. Decidiu então chamar uma amiga para passar o tempo, mas, ao entrar no local, o que ela viu a fez parar no lugar. Beatriz estava lá, sentada com André, rindo de algo que ele tinha dito. O olhar de Beatriz estava fixo nele, e seus gestos eram exagerados, como se estivesse sempre tentando conquistar cada pedaço da atenção dele.
Lúcia tentou ignorar o nó que se formava em seu estômago, mas foi impossível. Ela sentou em uma mesa mais afastada, tentando dar espaço, tentando não fazer parte daquele cenário. O café parecia diferente, mais frio. A conversa de Beatriz com André estava alta o suficiente para que Lúcia ouvisse fragmentos. E o que ela ouviu, sem querer, a fez sentir uma sensação crescente de angústia.
“Você não acha que a Lúcia tem sido um pouco… diferente?” Beatriz perguntou de forma quase casual, mas havia algo no tom de sua voz que soava mais como uma dúvida implantada. “Ela não tem sido muito distante? Às vezes, acho que ela está escondendo alguma coisa. Não sei, parece que ela tem segredos, sabe?”
Lúcia congelou na cadeira, sentindo um calor crescente no rosto. Ela sabia que a frase de Beatriz não era só uma observação simples. Era uma semente de dúvida sendo plantada na mente de André. Um jogo de manipulação que ela já começava a perceber. Não era uma simples preocupação sobre o comportamento dela, era uma tentativa deliberada de semear insegurança, de criar uma narrativa onde Lúcia não fosse digna de confiança. Ela fechou os olhos por um momento, tentando não reagir. Não queria ser o alvo dessa provocação disfarçada, mas a dor estava lá, misturada com confusão.
André, por sua vez, parecia pensar nas palavras de Beatriz, mas não foi até ela que ele se voltou. Ele parecia estar em dúvida, ponderando, mas Lúcia não conseguia ler seus sentimentos. Ele não estava perguntando diretamente a ela o que estava acontecendo, e isso a fez sentir ainda mais distante, como se ele já tivesse começado a duvidar dela antes de dar a ela a chance de explicar. Beatriz, por sua vez, continuava a plantar dúvidas, a jogar indiretamente sobre o que Lúcia poderia estar fazendo ou sentindo.
“É só uma impressão minha, claro… Mas a Lúcia tem esse jeito, né? Às vezes ela é tão… fechada. Eu só fico pensando se não está acontecendo algo que você não sabe. Já pensou nisso?” Beatriz continuou, como se estivesse se preocupando, mas Lúcia sabia que aquilo não passava de uma tentativa de fazer André questionar sua confiança nela.
Lúcia levantou-se da cadeira de forma abrupta, sem querer mais ouvir. Ela se sentia encolhida, pequena, impotente diante daquela situação. Seus olhos estavam marejados, mas ela não queria deixar Beatriz, nem ninguém, ver sua fragilidade. Caminhou até a porta, sentindo um aperto no peito. Quando estava prestes a sair, André a viu, e seus olhos se iluminaram ao reconhecê-la, mas a expressão dele rapidamente mudou quando viu que ela estava indo embora sem mais nem menos.
“Lúcia, espera!” Ele correu até ela, preocupado. “O que aconteceu? Você está bem?” A preocupação no tom de voz dele foi genuína, mas Lúcia não sabia se devia confiar. Ela sabia que Beatriz estava ali, perto, observando, esperando para saber qual seria a reação de André. O que ela não sabia era até onde ele acreditava nas palavras dela.
“Eu só… Eu só não estou me sentindo bem.” Lúcia mentiu, sem coragem de contar tudo o que sentia. Era uma mentira amarga, mas ela não sabia como falar sobre as sementes de insegurança que Beatriz havia plantado, como se fossem raízes crescendo dentro de seu coração. Não queria demonstrar vulnerabilidade, especialmente para alguém que parecia não entender completamente o que estava acontecendo.
André franziu a testa, parecendo desconcertado. “Mas o que está acontecendo, Lúcia? Eu não entendo, você… você não me parece bem desde aquele dia. O que está acontecendo entre a gente?”
Aquelas palavras caíram como uma lâmina fria. A dor de perceber que ele talvez já estivesse absorvendo as palavras de Beatriz, ou pelo menos começando a questionar o que tinha com ela, foi insuportável. Lúcia olhou para ele, sem saber como responder. Não queria que ele a visse como alguém que estava fazendo drama ou criando histórias. Mas a verdade era que a insegurança estava corroendo tudo o que ela pensava que fosse certo.
“Eu não sei, André.” A voz dela saiu baixa, quase sussurrada. “Eu só preciso de um tempo para pensar sobre tudo isso. Não quero te fazer mal, mas preciso processar as coisas. Eu não sou boa em lidar com… com isso.” Ela gesticulou vagamente, sem saber exatamente o que estava dizendo, mas a sensação de que ele já tinha se distanciado um pouco estava pesando em sua alma.
André a observou por um momento, com os olhos pensativos, mas não disse mais nada. Ele parecia querer entender, mas ao mesmo tempo, Lúcia sentia que ele já estava começando a se afastar mentalmente, como se, mesmo sem perceber, tivesse dado ouvidos a Beatriz. Como se a dúvida plantada na conversa tivesse começado a ganhar terreno.
Lúcia saiu do café sem olhar para trás, com o coração pesado e os olhos marejados. Ela sabia que Beatriz estava jogando um jogo sujo, semeando desconfiança e ressentimento, mas o pior de tudo era perceber que, em algum lugar entre suas palavras e os gestos cuidadosos de André, ela já havia perdido algo. Não era apenas uma questão de ser amada. Era a sensação de ser compreendida, de ser vista. E naquele momento, ela sentia que tudo estava se desfazendo ao seu redor, como um jogo de cartas que ela não sabia mais como jogar.
Enquanto caminhava sozinha pelas ruas, o peso da situação caía sobre ela, e uma pergunta ficava gravada em sua mente: como Beatriz, com sua manipulação sorrateira, havia conseguido se infiltrar no coração de André, e o que isso significava para ela e para o que ainda restava entre eles?
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Atualizado até capítulo 24
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