“A juventude é a embriaguez sem vinho.”
— Johann Wolfgang von Goethe
═════════════
Beatriz pulou da cama e encenou uma arrumação: entulhou roupas no armário, enfiou outras debaixo da cama e alisou o edredom. Em seguida, desceu para almoçar com a mãe. Voltaram a falar da escola, dos irmãos, da vida que tinha mudado desde que os dois saíram de casa. Rosa sorria: qualquer traço de convivência com Beatriz era um pequeno milagre doméstico.
Márcio só chegou perto das oito da noite: reunião, trânsito. Encontrou as duas na sala, com a TV ligada.
— Chegou tarde, pai!
— Coisas da vida, minha filha — disse ele, beijando ambas.
— Deixei seu jantar na cozinha — avisou Rosa.
— Comi qualquer coisa por lá. Hoje só quero banho e cama — respondeu, bocejando, antes de se espichar na poltrona.
Beatriz viu a brecha:
— Mãe, pai… a Júlia vai fazer uma festa do pijama neste sábado. Só meninas. Posso ir?
— Dormir fora está fora de questão. É regra da casa; por favor, respeite — cortou Rosa.
— Filha, é pela sua segurança — endossou Márcio.
— Vocês nunca confiam em mim! Qual é o problema? Só vai ter meninas, e a avó dela vai estar em casa. Por favor — implorou Beatriz, com os olhos úmidos.
Rosa tentou um meio-termo:
— Que tal você ir e, mais tarde, a gente passa para te buscar?
— NÃO! Todas vão dormir lá. Não há perigo numa casa… Prefiro morrer! A vida não tem graça!
Márcio interveio:
— Deixa, Rosa. Pensando bem, não há mal nenhum em dormir na casa de uma amiga, ainda mais com uma senhora por perto.
Rosa suspirou, relutante:
— Tudo bem, Beatriz. Confiamos em você. Mas quero você de volta pela manhã. E é para ficar lá — nada de sair dando voltinhas.
— Sim, combinado! Juro que não saio e, de manhã, estarei de volta.
“Eu odeio esta casa e odeio vocês dois me prendendo. Não sou prisioneira. Já tenho 17 anos; não sou mais criança. Se me proíbem, eu faço escondido”, pensou Beatriz.
Saltando de alegria, agradeceu, beijou os pais e correu para o quarto, ansiosa para contar a novidade à Júlia.
⨳⨳⨳
— Ju! Consegui convencer os velhos! Vou dormir aí! Mas como a gente vai sair sem a sua avó ver?
— Tranquilo. Minha avó é o de menos. Depois que ela dorme, pode a casa cair que não acorda.
— Nem acredito que vou nessa festa! Preciso de um look seu; meus pais não podem nem sonhar. Nada de roupa de balada, porque minha mãe é bisbilhoteira.
— Claro, Bia! Milagre essa permissão. A noite vai ser pequena para nós duas.
— Tô de saco cheio dessas regras idiotas. Quero viver do meu jeito!
— É isso aí! Temos que aproveitar. Já te falei meu lema: a vida é uma só. Beijos! Amanhã, na escola, a gente termina de planejar.
— Beijos, até amanhã! — despediu-se Beatriz, sorrindo de orelha a orelha.
Dia da Festa
Beatriz acordou empolgada. Pela janela, conferiu o clima: céu limpo, sem nuvens, como se o universo conspirasse a seu favor. As horas arrastaram-se até o momento de sair. O combinado era estar na casa da Júlia às 17h.
Era uma festa diferente de tudo o que Beatriz já tinha experimentado: haveria bebidas e meninos mais velhos, e ela estava decidida a aproveitar cada segundo. Até então, os pais só permitiam encontros em cinemas ou praças, sempre com hora marcada para voltar.
Cuidou de cada detalhe: unhas impecáveis, cabelo sedoso, pele bem hidratada. Preparou a mochila com o mínimo para evitar suspeitas, celular, um tênis confortável e uma muda de roupa extra. O dia transcorreu sem atritos; Beatriz se esforçou para manter-se amável e cooperativa. Qualquer deslize poderia colocar o plano em risco.
Às 17h em ponto, já na sala, mochila pronta e ansiedade estampada no rosto, chamou:
— Pai, vamos?
Rosa e Márcio assistiam à TV quando Beatriz os interrompeu. Rosa levantou-se, lançou um olhar rápido ao que havia na mochila e deu as últimas instruções:
— Bia, estamos confiando em você. Quero que volte antes do almoço, está bem?
Beatriz assentiu com um sorriso sereno, mas por dentro fervia de raiva. Sentia-se invadida. Como pode ser tão controladora e irritante? Márcio observava em silêncio. Pegou as chaves do carro e se dirigiu à porta. Beatriz o seguiu, saindo sem se despedir da mãe.
Casa da Júlia
A avó de Júlia recebeu Beatriz com carinho, envolvendo-a num abraço afetuoso. Era uma senhora adorável, cuja gentileza parecia perfumar o ambiente.
Júlia e Beatriz correram para o quarto, rindo e compartilhando a empolgação de se arrumar para a festa. Enquanto experimentavam roupas e ajustavam os últimos detalhes, Júlia revelou mais informações:
— A festa vai ser na casa do Iago, aquele cara que estudou na nossa escola. Como ele é uns três anos mais velho, já terminou o ensino médio. E o melhor: ele fez questão de nos convidar.
Entre risos e conversas animadas, escolheram cuidadosamente os looks, determinadas a causar a melhor impressão.
— ✦ —
Empolgadas, Beatriz e Júlia não faziam ideia de que a vida, muitas vezes, oferece o doce antes do amargo. Descobririam que nem toda diversão é inofensiva.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 40
Comments
Giselda Wolmann Leão
Pior que eu tenho uma sobrinha assim acabou com a vida do pai de tanto brigar com a mãe e o pai
2024-01-27
1
Shirlei
Que menina mimada…
2023-12-24
2
Melina Mello
não, e não vejo a hora dela quebrar a cara
2023-12-03
1