" Se lembra das respostas que um dia procurei, não faz noção do valor daquilo que encontrei".
...
Datado da época que os herdeiros de Bonneville começaram a se espalhar rumo a novas terras.
Berta Reis, mãe de Patrick Reis, que estava diretamente ligado na criação das águas vermelhas, estava com sua preocupação no limite.
Apesar de concordar com a Montair raivosa sobre sair daquelas terras que se banharam em sangue, não sabia se tudo que lhe restou naquela guerra conseguiria suportar uma viagem tão longa como Teresa estava propondo.
Primeiro porque seu filho, um garoto de cabelo tão ralos de tom vermelho claro, pequeno e calmo como seus pais, algo que seu marido nunca teria tempo para notar, as pequenas semelhanças entre eles, tudo porque Luiz Reis havia perecido naquela guerra repentina, mas enfim, seu bebê estava muito frágil depois de passar por tudo que houve na guerra.
Não culpava Hadassa como muitos estavam fazendo, se sentia incapaz de qualquer ato do tipo, a tristeza por sua perda era maior do que qualquer outra coisa.
Outro fator que a fazia se questionar sobre aquela viagem, era Inácio Reis, o irmão de seu marido, dava para ver que toda aquela pose que fazia, era somente ele se fazendo de forte, nada estava realmente bem como se esforçava para aparentar.
Ele não aguentaria uma viagem tão grande a ponto de fazer aquela montanha imensa sumir de vista como Teresa queria, e era evidente que nem toda a magia de cura mudaria aquela situação, e como tinha tanta certeza assim ?
Pelo simples fato de Inácio não estar com nenhum arranhão na pele, ou seja, ele já havia passado por todo aquele procedimento de cura, e não adiantará de nada, pois quando cambaleou de leve no momento que estavam lá enterrando seus mortos, mostrava que algo estava errado, ou no mais pequeno detalhe de levar a mão ao peito mostrava sua fragilidade, que mesmo não vendo perfeitamente, ela podia jurar que ele estava evitando fazer uma careta de dor.
Era sempre assim, ele sempre evitava ser fraco na frente dos outros, mas eram sempre esses pequenos detalhes que entregavam tudo, Berta suspirou desanimada, ele era tão parecido com seu marido até mesmo nesse orgulho sem medida.
Ela ficou lá observando em um canto enquanto seus entes queridos desapareciam na terra por magia, e permaneciam somente nos corações daqueles que viviam, e em sequência o encontro que soltou faíscas entre Heitor e Teresa.
Poucos minutos após aquele encontro, partiram deixando Bonneville para trás.
...
Foi-se horas andando na direção oposta a Bonneville, Berta já estava ficando cansada, carregar seu bebê e ficar de olho em Inácio, cansava mais do que qualquer motivação que poderia ter para recomeçar.
O dia havia se posto havia várias horas, mas ainda sim ninguém ousava parar, seguiam com fervor aqueles que tomavam a dianteira da nova jornada abaixo daquela lua tão clara.
Heitor e Teresa não haviam dito uma única palavra um com o outro desde o momento no enterro, mas ainda sim não saiam um do lado do outro, como se tivessem medindo os próprios passos.
Também eram poucos os que sussurravam para quebrar o silêncio, naquele primeiro momento, não havia sinais de risos, ou sequer alguém relaxando os ombros, sequer havia aquela rotineira fofoca, os únicos que ousavam abrir a boca, era pra dizer que ia recolher algum mantimento pelo caminho, pois devido a guerra não tinham quase nenhum.
Continuou assim por mais algumas horas até alguém gritar.
— Já não acha que está bom por hoje Teresa — bradou Heitor.
— Claro que não, ainda estamos perto daquele lugar miserável.
— E por isso quer matar todos de cansaço? — perguntou incrédulo.
Teresa revirou os olhos.
— Se já quer pedir pra sair, pede logo.
— Olhe por você então — falou irritado, em seguida foi procurar um lugar para se sentar.
Quando Teresa o fez, viu que Heitor estava falando sério, nem mesmo a motivação de conhecer terras novas estava sendo capaz de fazê-los continuar, a bruxa respirou frustrada, entendia tal necessidade até mesmo em seu corpo, mas sua teimosia não queria dar o braço a torcer tão cedo.
— Tanto faz — ela falou um pouco mais alto — descansaremos aqui hoje.
...
Nove dias haviam se passado desde o começo daquela jornada, Berta já não conseguia mais pregar os olhos de tanta preocupação, pois a cada dia os passos de Inácio ficavam mais lentos, e em consequência ficavam mais pra trás.
A bruxa notou que outros também diminuíram os passos, presos naquela mesma fadiga que atormentava Inácio, no mesmo momento que alguns olhares maldosos se direcionava a eles, tanto que foi comum naquele dia, ela ouvir sussurros a respeito daquele pequeno grupo estar querendo voltar a Bonneville, ou até mesmo a retardar o progresso deles.
Eram poucos que os olhava com mais cuidado, que reparava com mais detalhes, de modo que Berta ficou irritada o suficiente, a ponto de querer enfiar a força na cabeça daquela maioria o que realmente estava acontecendo.
Por fim decidiu simplesmente ignorar, sabia que o psicológico deles devia estar muito abalado ainda devido a guerra a ponto de mais simples detalhes virem a se tornar uma ameaça, pois em Bonneville não havia tanta hostilidade assim, e Berta também notava bem o quanto ficavam assustados a cada simples barulho, ora de alguém pisando em um galho, ou até mesmo o som do próprio vento os deixava de olhos atentos a qualquer movimento, ela também estava longe de fugir a regra, esse recomeço não estava sendo fácil pra ninguém.
Mas não demorou mais que nove dias para a verdade chegar a porta, está que com todo imediatismo de Teresa só ficava ainda pior, aqueles feridos em guerra estavam fracos demais para uma jornada assim, lutar contra uma magia que ainda nem era moldada fez os feitiços de cura serem menos eficazes, e cada vez mais necessários.
Ao cair do nono dia, quando estavam se reunindo para descansar mais uma vez, tanto Inácio, como outras pessoas que também foram feridas na guerra, tiveram uma febre terrível, e nenhum feitiço de cura foi capaz de fazer algo a respeito.
Contando com Inácio, era em torno de dez pessoas, o coração de Berta estava a mil, tentava de todas as formas estabilizar as condições dele com ervas que havia colhido pelo caminho, já que feitiços de cura não funcionavam mais, mas se ele iria ficar bem ou não, era algo que somente o tempo poderia dizer.
Ao seu redor a bruxa pode ver a mudança brusca na atmosfera do ambiente, era preocupação dos mais variados níveis, que ia desde cuidado com aqueles que estavam convalescendo ao seu lado, a puro medo de que algum Nighty os encontrasse a qualquer momento, já que devido a condição dos doentes não sairiam dali tão cedo, os mais neuróticos cochichavam que tudo aquilo não passava de de um complô para voltarem ao reino caído.
A frente deles Heitor e Teresa discutiam mais uma vez.
— Não acredito que essa tragédia aconteceu logo agora — Falou Teresa emburrada.
— E você queria que ela tivesse horas pra acontecer ? — Heitor retrucou sarcástico.
— Não, mas merda Heitor, não me diga que você não sentiu, é perigoso ficar aqui, algo está gritando em todo meu ser que se ficarmos aqui algo ruim pode acontecer.
— Eu sei, mas não conseguiremos sair com tantos inconscientes assim, pode ser perigoso para eles.
— Vamos pensar em algo.
No entanto, o que Heitor não sabia, era que Teresa já havia pensado em algo, e meia hora antes de todos dormirem, ela mandou avisar todos aqueles que estavam nitidamente do seu lado sobre seu plano.
Assim que aqueles fora do seu plano dormiram, todos os aliados da bruxa juntaram suas coisas e partiram na calada da noite, estavam movidos por puro medo daquele presságio que sentiam sobre ser perigoso ficar ali.
No dia seguinte, Berta acordou assustada mediante ao som de um grito enfurecido, era Heitor extravasando toda sua raiva a plenos pulmões depois de ver o que Teresa havia feito.
Ficaram ali cerca de trinta pessoas contando com os doentes, e todos ficaram muito atordoados ao verem o que havia acontecido.
Heitor ainda estava de punho fechado e tentando controlar a respiração, quando algumas pessoas o procuraram em busca de respostas, então ele se obrigou a guardar sua raiva para si, e falou em alto e bom som.
— Olha, eu não sei o que aconteceu noite passada a ponto de quererem partir, suas motivações muito menos...
— Mas e agora, o que nós fazemos ?
— Vamos atrás deles ou não ?
O povo manifestava suas dúvidas aos montes, e necessitava respostas, Heitor virou a face para o outro lado, para não prestar tanta atenção neles, e explodir toda a raiva que estava tentando conter.
— Olha, vai atrás deles quem quiser, eu não vou abandonar amigos que estão doentes à própria sorte.
— Falou bem senhor Dark, mesmo tendo sobrado apenas meu bebê e eu dessa guerra insana, entendo bem a importância de se cuidar de entes próximos.
Heitor olhou assustado em direção ao som daquela voz, e foi inevitável sorrir, talvez não fosse tão ruim ficar, já que a dona daquela voz, era nada mais nada menos que Eloise Anges sua paixão mais antiga, e proibida diga-se de passagem, ela era mãe de Camilo Anges, um bebê de cabelos tão escuros quanto a noite e de olhos tão azuis quanto o mar, Heitor amava aquela cor.
Do outro lado, Berta apenas observava tudo em silêncio, com um único foco em mente, a recuperação de Inácio.
Um mês havia se passado desde a partida de Teresa e os outros, Berta se dedicava ao máximo a cuidar de Inácio, e como prova de seus esforços, já era possível notar evidente melhora dele.
Já fazia quase duas semanas que os doentes haviam recobrado a consciência e extinguido a febre, e a dois dias atrás já se arriscaram a dar alguns passos, embora não tivessem forças para ir muito longe.
Berta estava lá velando o sono de Inácio, enquanto amamentava seu filho inquieto que se recusava a dormir, pela primeira vez desde a guerra sorria realmente, no fundo imaginava que devia ser uma peça do destino Patrick estar tão inquieto quanto o tio, uma que ligava todos de cabelos vermelhos e e sobrenome Reis e serem iguais, não só em semelhança, mas no temperamento diversificado também.
" Mas que família difícil essa a minha " pensava enquanto Heitor chegou ao seu lado.
— Oi — Falou ele.
— Oi.
— Como ele está ?
— Melhor, um pouco fraco ainda, mas é só, comparado a antes, a situação de agora é quase nada.
— Entendo — o Dark sorriu — acredito que se continuar assim, logo poderemos partir.
— Que bom, ainda não tive coragem de dizer a ele tudo que aconteceu enquanto estava inconsciente — confessou Berta.
— Melhor assim, conheço Inácio, com aquele gênio mal humorado dele, é bem capaz de não aceitar bem o fato de que fomos deixados para trás por causa deles — Berta suspirou desanimada, a aquela altura, Patrick já havia pegado no sono, e a bruxa deu um sorriso contido " finalmente" pensou.
— Preciso pegar mais água, pode ficar de olho nele por mim ?
— Mas é claro, estou aqui para o que precisarem — falou contente estendendo os braços para pegar o pequeno Reis.
Berta se apressou para cumprir com suas obrigações, não era longe o pequeno rio que o grupo havia criado, mas precisava ser rápida e terminar com seus afazeres antes que Patrick acordasse, seu filho andava tendo sono muito leve depois de tudo que aconteceu.
No entanto, seus planos foram interrompidos de forma inesperada.
Faltava pouco menos de dois metros para chegar ao seu destino, tanto que já podia ver as águas correndo calmante, foi quando ouviu vozes estranhas se aproximando, assustada Berta estacou onde estava.
Foi somente quando viu silhuetas escuras passando na sua frente, que ela se apressou em se esconder atrás da primeira árvore que viu, foi quando as vozes se tornaram mais audíveis.
— Não entendo, porque estamos indo tão longe do acampamento, e tão cedo assim ? — falou uma voz em tom confuso.
— Poxa, a garotinha sonolenta já está com medo — Berta ouviu várias risadas de deboche em seguida.
— Seu nome pode significar coragem, mas nunca vi alguém tão mole em toda nossa tribo quanto você, Bernard — falou outra voz séria.
— Eu não sou um covarde .
— Oh ! Não diga — Eles riram de novo — então por que não lutou contra Bonneville como nosso mestre havia ordenado ? — Berta arregalou os olhos de medo, então eram os Nighty, eles estavam ali.
— Simples, não vi motivo para lutar uma guerra tão tola por causa de um pedaço de chão, quando a tanto por aí desocupado — Berta ouviu um forte barulho e tremeu onde estava.
— Por que me socou seu idiota ? — falou enraivecido e outra voz se pronunciou.
— Por que você é um inútil que só desonra o sobrenome Nighty, não sei como nosso chefe tem esperanças em você.
— Sabe irmão, por que não damos um fim nessa desonra em nosso nome ? — Berta colocou as mãos na boca para não gritar.
— Sim, não compensa ensinar ele a ser homem como nosso chefe quer.
— Mas... — o que veio a seguir, foi uma sucessão de sons de chutes, socos e explosões que a bruxa escondida saltava de medo.
Houve um silêncio mortal abruptamente que se estendeu por minutos, até que alguém finalmente o quebrou.
— Não falei irmão, ele era um estorvo em nossas vidas — o dono da outra voz riu — não soube nem se defender de atos tão simples, então devia morrer mesmo.
— Ai que merda, agora temos que inventar uma desculpa para o chefe de como o projeto de sobrinho dele não voltou.
— Não acho que ele vá sentir falta também.
— Verdade — As vozes foram sumindo até restar o mais profundo silêncio, Berta esperou mais um pouco antes de mover do seu esconderijo.
Em primeiro plano, Berta queria correr dali, avisar aos outros que havia um acampamento Nighty não muito distante deles, mas travou antes mesmo de dar o primeiro passo em direção ao seu povo.
Com o coração batendo a mil por hora, ela se virou para onde havia acontecido toda a cena, e ficou horrorizada com o que viu, havia árvores queimadas por todo lugar, crateras, marcas de sangue, e bem no centro de tudo aqui, estava um garoto inconsciente.
Suas vestes cor da noite denunciavam bem que ele não era de Bonneville, e seus cabelos escuros estavam tão curtos que parecia uma sombra por sua cabeça, sem contar seu corpo que estava recheado de hematomas.
A princípio pensou em deixá-lo ali, mas quando se lembrou do que aquelas pessoas haviam falado, seu coração gritou que aquilo era errado, não podia ser má com quem não tinha feito mal a si, não importa o nome que viesse a carregar, e pelo que havia acontecido a pouco, duvidava muito que seu coração fosse errar em seu julgamento.
Então por fim decidiu seguir onde ele apontava e ajudar aquele homem.
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Atualizado até capítulo 36
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