O amanhecer seguinte trouxe um céu límpido, com tons de dourado tingindo as nuvens suaves. Mas, para Serena, o brilho do sol parecia frio e distante. Vestiu-se cedo, escolhendo um traje discreto, diferente dos vestidos exuberantes que costumava usar em eventos sociais. Hoje não desejava chamar atenção; hoje tinha um objetivo claro e íntimo: encontrar aquele que um dia se tornaria o vingador de sua morte.
Guardara no coração o nome dele como um segredo sagrado, mas agora não podia mais esperar. Precisava vê-lo. Precisava ter certeza de que ainda havia tempo.
O trajeto até o hospital privado foi silencioso. Sentada no banco traseiro de um carro de última geração, Serena observava a cidade despertar. As ruas agitadas, os edifícios espelhados e até os pequenos detalhes da paisagem traziam-lhe lembranças da vida anterior, da ruína inevitável. Mas, dessa vez, não permitiria que a história seguisse o mesmo rumo.
Quando o motorista estacionou diante do imponente edifício de mármore claro, ela respirou fundo. O hospital, com suas janelas altas e aparência respeitável, escondia segredos podres. Serena sabia bem: já havia visto como médicos eram comprados e como parentes gananciosos conspiravam para devorar a fortuna do herdeiro adormecido. Endireitou os ombros e entrou, cada passo ecoando como um desafio.
No quarto, o coração quase lhe escapou do peito. Lá estava ele. O homem que, no passado, carregara seu corpo sem vida e chorara lágrimas silenciosas por ela. Agora, deitado sobre lençóis brancos, parecia ainda mais pálido, marcado pela imobilidade de um sono forçado. Tubos e fios o cercavam, e sua respiração lenta era quase imperceptível. Serena aproximou-se com cuidado, sentando-se na poltrona ao lado da cama. Estendeu a mão e tocou a dele com suavidade.
— Eu voltei — murmurou, engolindo o choro. — Não sei se pode me ouvir, mas estou aqui. E desta vez não vou deixar que te tirem tudo.
Os dedos dele estavam frios, mas naquele silêncio quase sagrado, ela jurou sentir uma fagulha — como se, em algum lugar, ele realmente pudesse escutá-la.
A porta se abriu sem aviso, trazendo dois homens de fala baixa. Serena reconheceu-os imediatamente: os primos distantes que, em sua vida passada, haviam sugado a fortuna dele até não restar nada.
— Ainda está no mesmo estado — disse um, com desdém, aproximando-se da cama. — Um peso para todos nós.
— Não por muito tempo — respondeu o outro, com um sorriso frio. — Em breve assinaremos os papéis, venderemos parte da empresa e resolveremos esse problema de uma vez.
Serena se ergueu de imediato, os olhos faiscando.
— Vocês não vão vender nada.
Eles se viraram, surpresos.
— E quem é você para interferir? — zombou o mais velho.
— Sou a única que se importa com ele — respondeu, firme. — E se acham que vou permitir que roubem o que lhe pertence, estão muito enganados.
Os dois trocaram olhares irritados. Um deu de ombros.
— Não adianta, garota. Ele não tem família legítima para protegê-lo. A herança dele é nossa por direito.
Serena sorriu com frieza.
— Veremos.
Quando saíram, lançando-lhe olhares ameaçadores, ela voltou a sentar-se ao lado da cama. O coração estava acelerado, mas sua decisão era inabalável. Não poderia enfrentá-los apenas com palavras. Precisava de algo maior, algo que lhe desse poder de proteger o que era dele.
A lembrança voltou clara como cristal: dois jovens no orfanato, escondidos atrás da biblioteca, prometendo cuidar um do outro quando crescessem. “Eu vou te proteger”, ele dissera, com um sorriso tímido. “E eu nunca vou te abandonar”, ela respondera.
As lágrimas arderam em seus olhos.
— Talvez seja tarde demais para você saber disso — sussurrou. — Mas eu ainda me lembro da nossa promessa.
Foi então que a ideia surgiu, ousada, quase insana, mas certeira. Se se casasse com ele, poderia assumir legalmente a proteção de seus bens, afastar os parentes gananciosos e garantir que, quando despertasse, encontraria tudo intacto. Para os outros, pareceria loucura. Para ela, era o único caminho.
Ao retornar à mansão dos Valente, encontrou resistência imediata. Quando mencionou a intenção de apoiar o herdeiro adormecido, seus pais a olharam como se tivesse perdido o juízo.
— Minha filha, você entende o que está dizendo? — perguntou o pai, sério. — Quer se envolver com um homem que nem sequer está consciente?
Serena respirou fundo.
— Entendo, sim. Mas sei o que está em jogo. Se ele perder tudo, aqueles abutres ganharão ainda mais força. E não quero que sejam eles a controlar o futuro da nossa cidade.
A mãe suspirou, aflita.
— Mas um casamento… você sacrificaria sua juventude…
Ela segurou a mão da mãe com firmeza.
— Já perdi uma vida inteira confiando nas pessoas erradas. Desta vez, quero confiar apenas em quem sei que nunca me abandonou.
Seus pais ainda hesitavam, não compreenderam o que ela queria dizer, mas a determinação nos olhos da filha deixava claro que nada a faria recuar.
Naquela noite, Serena voltou ao hospital. Sentou-se ao lado dele, observando o peito subir e descer com dificuldade.
— Eles vão dizer que sou louca — confessou, num sussurro. — Vão rir de mim, vão me chamar de tola outra vez. Mas não me importo. Se for esse o preço para te proteger, eu aceito.
Acariciou a mão dele com ternura, como se fosse um pacto silencioso.
— Eu vou ser sua esposa, mesmo que você não saiba disso agora. Vou cuidar de você, da sua empresa e do seu futuro. Quando despertar, vai encontrar tudo de volta em suas mãos. E se, por acaso, nunca acordar… ainda assim, vou cumprir a promessa que fiz.
O quarto permaneceu em silêncio, mas por um instante breve, Serena jurou sentir os dedos dele se moverem levemente. Um arrepio percorreu-lhe a espinha. Talvez fosse apenas sua imaginação. Ou talvez ele realmente tivesse escutado.
De qualquer forma, não havia mais volta. A decisão estava tomada. A partir daquele dia, Serena Valente seria a esposa do homem em coma.
E com isso, a verdadeira guerra contra os traidores apenas começava.
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Atualizado até capítulo 47
Comments
Gil Marri
começando deu 15)09/25 as 4:59 da manhã
2025-09-15
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Celia Aparecida
começando ler hoje 14/9/2025
2025-09-15
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