O alarme tocou às quatro e quarenta e cinco.
Adrian abriu os olhos com dificuldade. A cabeça pesava, e o corpo inteiro parecia clamar por mais algumas horas de descanso, mas ele sabia que não podia se dar a esse luxo. O som estridente do celular ecoava no quarto minúsculo, reverberando nas paredes úmidas, e a primeira batalha do dia era não desligar o despertador e voltar a dormir.
— Vai, levanta… — murmurou para si mesmo, esfregando o rosto cansado.
Sentou-se na beira da cama e ficou alguns segundos olhando para o chão. O tênis surrado estava ali, com os cadarços maltratados e uma mancha de café que nunca saíra. Vestiu-se rápido: camisa social já meio amarelada nas mangas, a mesma calça de sempre e a gravata mal passada. O espelho quebrado na parede só refletia um pedaço do seu rosto, mas foi o suficiente para ele ajeitar os cabelos bagunçados.
Na cozinha improvisada, abriu a geladeira. Nada havia mudado desde a noite anterior: apenas a garrafa d’água. Pegou-a, tomou alguns goles, sentindo o estômago protestar. “Hoje o almoço vai ter que segurar até a noite”, pensou.
Saiu para a rua ainda escura. O ar fresco da madrugada trazia um certo alívio, e a cidade começava a despertar. Alguns ônibus já passavam apinhados, trabalhadores bocejando, rostos cansados mas resignados. Adrian seguiu a pé até o ponto, encolhido no próprio casaco fino, tentando se proteger do frio.
O ônibus demorou. Quando finalmente chegou, estava cheio. Adrian entrou mesmo assim, ficando espremido entre um homem que cochilava encostado na janela e uma senhora que segurava firmemente a sacola de compras. A cada balanço do veículo, precisava se equilibrar como podia, já sentindo o suor frio começar a escorrer pelo corpo.
Enquanto olhava pela janela embaçada, pensava no dia que o aguardava. O supervisor, Bruno, provavelmente encontraria outro motivo para humilhá-lo. Talvez um detalhe qualquer, talvez até inventasse algo. Não importava: Adrian sabia que estava em posição frágil, e reclamar seria assinar sua própria demissão.
Adrian desceu no ponto de ônibus que ficava duas ruas antes da Serrano Tech Holding. O normal seria seguir direto para a empresa, mas seus passos tomaram outra direção.
Caminhou rápido por uma avenida ainda meio adormecida, onde apenas alguns cafés começavam a abrir as portas. O cheiro de pão fresco se espalhava, mas ele não tinha tempo e nem dinheiro para parar. Dobrou a esquina e seguiu até um edifício alto, com muitas janelas de vidro e portas automáticas que se abriam e fechavam quase sem parar com o entra e saí. O cheiro característico já vinha de longe, uma mistura de desinfetante, álcool e café requentado.
Entrou e ficou algumas horas lá dentro. Saiu com o semblante fechado, quase carregando uma sombra de preocupação. Os olhos levemente marejados.
Olhou o relógio. Eram sete e cinquenta e dois.
O coração disparou. Se não corresse, chegaria atrasado.
Apressou o passo pela calçada e, ao atravessar a avenida, um carro surgiu veloz, buzinando alto. O motorista freou bruscamente, e o barulho do pneu arrastando no asfalto fez Adrian congelar por um segundo. O carro parou a poucos centímetros dele.
— Tá maluco, moleque?! — gritou o motorista, a cabeça para fora da janela.
Adrian apenas ergueu a mão em sinal de desculpa e correu até a outra calçada, sentindo as pernas tremerem. O coração batia ainda mais rápido, agora misturado ao susto.
Chegou diante das portas de vidro da Serrano Tech suado, respirando ofegante, e tentou recuperar a postura antes de passar pela catraca. O crachá quase escorregou de suas mãos trêmulas. Enquanto respirava fundo, ajeitando a gravata torta, só pensava em uma coisa: "preciso achar um jeito de ganhar mais..."
Perdido em pensamentos, acabou esbarrando em Bruno que estava parado de costas para a entrada.
— Desculpa, seu Bruno... — apressou-se em se desculpar.
Bruno o encarou com olhar severo e olhou no relógio.
— Ao menos foi pontual... — o homem olhou para Adrian de cima em baixo e franziu o nariz — Sabe garoto, você é inteligente, mas talvez esse não seja o lugar para você.
Adrian não entendeu bem aquilo, mas Bruno continuou:
— Olha o estado em que você chega pra trabalhar… todo suado, camisa amarrotada, gravata torta. Parece que saiu correndo atrás do ônibus, ou pior, que dormiu na rua. — Ele fez uma cara de nojo, como se a simples visão de Adrian fosse uma ofensa pessoal. — Aqui é uma holding, não é barzinho de beira de esquina.
Adrian engoliu em seco, abaixou a cabeça e seguiu até a sua mesa. Ligou o monitor, adaptou os fones, achou um ruído branco, colocou uma playlist e tentou focar no que tinha para fazer, mas tudo o que ele queria era se enrolar nas cobertas e chorar até que suas lágrimas secassem. Por fim, desligou o ruído e a música, ficando com os fones só por ficar.
A manhã se arrastou de forma mais lenta que o normal, talvez por estar com fome, a impressão fosse maior. Finalmente, chegou a hora do almoço e ele saiu para comprar alguma coisa. Como o que ele dispunha para gastar era pouco, nunca ia almoçar com os outros, pois eles iam em restaurantes que embora tivessem opções a preços populares, para Adrian eram caros.
Para a sua sorte, perto da empresa tinha uma pequena lanchonete que servia marmitas boas por um preço melhor. E com dez reais, ele conseguia comer razoavelmente bem e assim, o almoço, se tornava café da manhã, almoço e jantar.
Mara, dona do estacionamento, sempre dava um pedaço de bolo ou pudim além de um copo de suco natural para o rapaz, pois sabia da situação dele e de como cada moeda era importante para ele.
— Adrian — chamou ela enquanto ele se preparava para voltar para o trabalho — pode vir almoçar aqui sempre... com dinheiro ou não. Está bem?
Ele assentiu, meio envergonhado daquilo, agradeceu e voltou para a empresa.
A parte da tarde foi tão exaustiva quanto a da manhã, mas estar com o estômago cheio parecia ter renovado suas energias, então ele deu o seu melhor para fazer suas atividades com excelência.
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Atualizado até capítulo 27
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