Capítulo 3 – Casa e Tensão

Cheguei em casa ainda com o cartão apertado na mão, tentando organizar meus pensamentos enquanto caminhava pelos corredores silenciosos. Cada passo parecia mais pesado que o anterior; meu coração batia rápido demais, e senti uma pontada de dor no peito — lembrança cruel de que meu corpo não podia ignorar a doença.

Sentei-me na borda da cama, segurando o cartão com cuidado. As palavras dele ecoavam na minha mente: “Você toca muito bem… quero te contratar…”

Era surreal. Eu ainda estava corado, tremendo, tentando processar o que havia acontecido. Aquela sensação intensa, aquela queimação silenciosa, ainda persistia, mesmo depois de Dom Blake ter saído do café.

Respirei fundo, engolindo o remédio mais uma vez, escondendo o frasco no bolso da camisa, e tentei me acalmar. O corpo reclamava, o coração insistia em correr, mas eu precisava permanecer consciente, focado.

E então… o silêncio foi quebrado por um grito que me fez pular da cama.

— EVANDER! — a voz cortou o ar como uma lâmina, furiosa e cheia de amargura. Olhos que queimavam com raiva apareceram na porta do meu quarto, penetrando cada centímetro da minha pele. Meu pai.

— Quero mais! — ele berrou, avançando com passos pesados, o rosto contorcido, a mão levantada como se pudesse esmagar qualquer coisa que estivesse à sua frente. — Mais! Mais prática! Mais perfeição! Mais de você!

Meu corpo tremeu, não apenas pela doença, mas pelo medo, pela dor e pela lembrança de todos os castigos, físicos e verbais, que ele sempre infligia. O coração disparado, a respiração ofegante. Eu queria desaparecer, me encolher, fugir. Mas não havia lugar para escapar.

Segurei meu violino, instintivamente, como se fosse uma proteção frágil contra a fúria que entrava em meu quarto. Meu corpo doía, minha mente girava, e mesmo os pensamentos sobre Dom Blake, o cartão, o café e a sensação intensa que me queimava, desapareceram por um instante diante da presença brutal de meu pai.

— Sente-se! — ele ordenou, empurrando-me levemente. — Agora! Mais!

E naquele momento, mesmo sentindo o peso da doença e o desespero que sempre me consumia em casa, uma parte de mim ainda lembrava do breve encontro com Dom, da intensidade silenciosa, do cartão apertado na minha mão. Mas agora, nada importava além do grito, dos olhos amargos, e da exigência brutal que queimava no ar do meu quarto.

Meu pai não dava espaço para desculpas.

— Tire suas roupas! — gritou, olhos ardendo de raiva. — Ajoelhe-se! Agora!

Meu coração disparou, não apenas pelo choque da ordem, mas pelo medo de que cada batida acelerada pudesse me derrubar de vez. Tremi, obedecendo, sentindo cada músculo do meu corpo em alerta constante. A camisa e as calças caíram, e a frieza do quarto me fez estremecer. A vergonha e o medo se misturavam à dor física que antecipava.

Ajoelhei-me, segurando o violino com cuidado, tentando manter a postura que meu pai exigia. — Comece! — ordenou ele, estendendo a vara de madeira como se fosse um cetro de punição.

Minhas mãos tremiam. Cada nota que saía do violino parecia pesada, carregada de culpa. Uma nota errada e sentia a chicotada acertar minhas costas, forte o suficiente para doer, mas calibrada para não ultrapassar o limite da minha doença. A dor ardia, queimava e marcava, e cada falha aumentava minha ansiedade e o ritmo acelerado do meu coração.

— Mais rápido! Mais preciso! — ele berrava, avançando cada vez que uma nota falhava. — Não posso ver hesitação! Não posso ver fraqueza!

A cada chicotada, meu corpo estremeceu, e eu sentia o sangue latejando em minhas veias, o peito doendo, o coração ameaçando saltar. Mas eu não podia parar. O violino era minha corda de sobrevivência, o único meio de não provocar mais fúria nele.

Mesmo entre a dor e a humilhação, minha mente, em algum lugar, se apegava à lembrança do cartão, do breve encontro com Dom Blake, e do fogo silencioso que ele havia acendido em meu peito. Era uma fagulha pequena, quase invisível, mas suficiente para me dar força para continuar, nota após nota, chicotada após chicotada.

E naquele quarto, nu, ajoelhado, com o corpo doendo e a respiração falhando, eu entendi que cada nota era mais do que música. Era resistência. Era sobrevivência. Era a tênue linha entre a vida e a destruição que meu pai insistia em impor.

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