Capítulo 2 Mapa do Sanatório

Mapa do Sanatório

A manhã amanheceu coberta por uma neblina tão espessa que parecia sólida. Ravenshade permanecia mergulhada em um silêncio opressor, quebrado apenas pelo rangido ocasional das árvores tocando umas às outras no vento gélido. Laura despertou com a sensação de que alguém a observava. Os olhos se abriram devagar, o corpo ainda preso à tensão do pesadelo que havia tido — se é que realmente foi um sonho.

Levantou-se em silêncio, sentindo o assoalho frio sob os pés. O espelho do banheiro ainda estava embaçado, mas agora limpo. A mensagem havia desaparecido. “Ele já acordou.” Aquelas palavras ecoavam na mente como um aviso que não deveria ser ignorado.

No andar de baixo, encontrou Gabriel já acordado, sentado à mesa do saguão com uma pilha de papéis antigos, mapas e documentos digitalizados. Estava absorto em um diagrama complexo que mostrava a estrutura interna do sanatório.

“Você dormiu?” ela perguntou, servindo-se de um café amargo que parecia mais tinta do que bebida.

“Mais ou menos,” ele respondeu. “Mas olha isso. Consegui algo interessante. Um antigo mapa do Sanatório de Delling — antes do incêndio de 1971.”

Ela se aproximou e viu o papel envelhecido. Era um esboço detalhado com anotações manuscritas e símbolos estranhos. Havia cinco alas principais: Psiquiatria Geral, Terapia Experimental, Confinamento Especial, Arquivos Clínicos e o Porão Técnico. No centro, um grande pátio circular com um símbolo desenhado à mão: três círculos interligados por uma espiral central. A legenda apenas dizia: “Nó da Loucura”.

“O que é isso?” perguntou Laura, apontando para o símbolo.

“Não sei. Mas encontrei em outros documentos também. Parece ter ligação com os experimentos do Dr. Halberd.” Gabriel passou outra folha para ela, onde se lia: ‘O nó é a ligação entre os níveis de consciência e o plano latente. É por onde a entidade se manifesta quando há brechas cognitivas.’

Laura franziu o cenho. “Entidade? Isso já está começando a ultrapassar os limites da ciência.”

Jonas apareceu no saguão com olheiras profundas e a câmera na mão. “Tive um sonho bizarro essa noite. Uma criança me olhava no pé da cama. Ela dizia meu nome sem mexer os lábios.” Ele não riu, não brincou. A expressão em seu rosto era séria — e isso dizia muito.

“Temos que ir até lá hoje,” disse Laura. “O sanatório fica a três quilômetros da cidade, na direção leste. Devemos encontrar a entrada pelos fundos, segundo os moradores... os poucos que falam sobre ele.”

Jonas suspirou. “Vamos mesmo fazer isso? De verdade? Porque... cara, eu tenho um mau pressentimento.”

“Se quiser ficar, fique,” respondeu Gabriel. “Mas vamos com ou sem você.”

Pouco depois, com lanternas, câmeras, mochilas e os mapas em mãos, o trio seguiu pela estrada de terra que levava até o sanatório. A vegetação parecia crescer de forma anormal naquela área. Galhos se entrelaçavam como veias negras, o solo era úmido e afundava sob os passos. O ar cheirava a mofo, e o céu parecia permanentemente coberto por nuvens.

A construção logo surgiu entre as árvores: uma estrutura gótica, com torres retorcidas e janelas partidas. O tempo e o abandono haviam corroído a fachada, mas ainda era imponente. A entrada principal estava bloqueada por escombros, mas a lateral oferecia uma abertura, quase como um convite.

Gabriel foi o primeiro a entrar. Um cheiro nauseante de podridão antiga tomou conta dos sentidos. O som dos próprios passos ecoava de forma descompassada, como se alguém caminhasse logo atrás. No salão principal, as paredes estavam cobertas de símbolos riscados à faca, quase todos parecidos com o do mapa. Círculos, espirais, olhos abertos.

“É aqui,” murmurou Laura. “Esse é o pátio central.”

No chão, o símbolo do Nó da Loucura estava gravado com precisão. Mas agora, havia algo mais: marcas de unhas ao redor do desenho, como se alguém tivesse tentado apagá-lo — ou saído de dentro dele.

“Essas marcas são recentes,” disse Gabriel, ajoelhando-se. “Alguém esteve aqui. Alguém... ou algo.”

Jonas apontou a câmera para o chão. “Isso não está certo. Nenhum símbolo fica tão preservado depois de cinquenta anos.” De repente, sua câmera travou. A tela ficou preta, depois acendeu novamente — mas a imagem estava distorcida. Havia uma figura atrás de Laura, imóvel, olhando.

Ele olhou para trás. Nada.

“Tem alguém aqui,” murmurou Jonas. “Acabei de filmar.”

“Revisamos depois. Agora, vamos aos arquivos clínicos,” ordenou Laura, tentando manter a calma.

Caminharam pelos corredores escuros, com móveis tombados, portas semiabertas e espelhos quebrados. O ambiente inteiro parecia exalar uma presença que observava de cada canto. Ao abrirem a porta dos arquivos, depararam-se com centenas de pastas jogadas no chão. Algumas ainda estavam legíveis, outras queimadas ou comidas por insetos.

Laura pegou uma delas. “Paciente 142 – Diagnóstico: Esquizofrenia Paranoide. Tratamento: Sessões de Isolamento Sensorial. Observações: O paciente alega ouvir o som do véu. Recusa-se a dormir. Riscou a própria pele com símbolos circulares.”

“Olha isso,” disse Gabriel, pegando outra pasta. “Paciente 118 – afirma que há uma escada invisível no pátio que leva a outra dimensão. Diz que o Dr. Halberd o fez subir uma vez, mas que ele voltou com algo dentro dele.”

Jonas parou de filmar. “Esses relatos... eles são similares. Todos falam de vozes, de símbolos, de... véus, portais, entidades. Não é só loucura. É quase como um ritual coletivo.”

Foi então que ouviram um som vindo do corredor. Um arrastar suave. Como tecido sendo puxado pelo chão. As luzes das lanternas tremeluziram.

“O que foi isso?” perguntou Gabriel, apontando para a porta.

“Não vamos esperar pra descobrir,” disse Laura. “Hora de sair daqui.”

Ao voltarem ao pátio, o símbolo no chão agora estava diferente. Parecia... molhado. Como se tivesse acabado de ser desenhado com sangue fresco.

Uma voz infantil, fraca, surgiu atrás deles. “Vocês não deveriam ter entrado... Ele já sabe de vocês agora.”

Viraram-se. Nada.

A respiração dos três ficou ofegante. Laura apontou para a saída. “Vamos. Rápido.”

Ao saírem do sanatório, o ar parecia mais leve — mas dentro deles, algo havia mudado. Eles sabiam que o que viram ali dentro era mais do que loucura. Era uma presença real. Um elo invisível que os conectava agora àquele lugar.

E o símbolo do Nó da Loucura... havia ficado gravado em suas memórias como um selo.

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Comments

Silva Writer

Silva Writer

Arrepiante!
A tensão só vai aumentando. Os relatos dos pacientes, os sonhos dos personagens, os acontecimentos no sanatório, o tal símbolo no chão...
É melhor correr pessoal 👀

2025-05-27

1

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Capítulos
1 Capítulo 1 A Chegada a Ravenshade
2 Capítulo 2 Mapa do Sanatório
3 Capítulo 3 Sala do Sussurros
4 Capítulo 4 Sub-solo
5 Capítulo 5 A Voz que Nunca Cala
6 Capítulo 6 As Janelas Que Observam
7 Capítulo 7 A Sala dos Ecos
8 Capítulo 8 As Vozes de Vidro
9 Capítulo 9 O Sussurro das Cadeiras Vazias
10 Capítulo 10 Espelho Quebrado
11 Capítulo 11 As Vozes do Porão Lacrado
12 Capítulo 12 Carne e Sussurros
13 Capitulo 13 A Sala Sem Saída
14 Capítulo 14 Gritos do Porão
15 Capítulo 15 O Quarto do Sussurro
16 Capítulo 16 Um Grito Antigo
17 Capítulo 17 O Sussurro Atrás da Porta
18 Capítulo 18 O Espelho das Treze Verdades
19 Capítulo 19 O Cântico das Almas Afogadas
20 Capítulo 20 O Labirinto da Memória
21 Capítulo 21 Vozes Entre as Paredes
22 Capítulo 22 O Quadro que Sussurra
23 Capítulo 23 A Porta das Lamentações
24 Capítulo 24 Véu do Abismo
25 Capítulo 25 O Sussurro do Labirinto
26 Capitulo 26 Ecos de Sangue
27 Capitulo 27 A Canção das Correntes
28 Capitulo 28 O Poço das Vozes
29 Capítulo 29 A Cela do Esquecimento
30 Capítulo 30 Sussurros da Carne
31 Capítulo 31 O Canto da Terra Rasgada
32 Capítulo 32 Labirinto Vivo
33 Capítulo 33 A Cúpula do Esquecimento
34 Capítulo 34 As Vozes de Sal e Cinza 🩶
35 Capítulo 35 O Teatro dos Esquecidos
36 Capítulo 36 O Espelho que Sussurra
37 Capítulo 37 O Corredor da Cegueira
38 Capítulo 38 A Biblioteca dos Sussuros
39 Capítulo 39 O Labirinto dos Reflexos Quebrados
40 Capítulo 40 A Porta Pulsante
41 Capítulo 41 O Vale do Silêncio Perpétuo
42 Capitulo 42 A Casa Sem Portas
43 Capítulo 43 Origem
44 Capítulo 44 O Véu de Ascalon
Capítulos

Atualizado até capítulo 44

1
Capítulo 1 A Chegada a Ravenshade
2
Capítulo 2 Mapa do Sanatório
3
Capítulo 3 Sala do Sussurros
4
Capítulo 4 Sub-solo
5
Capítulo 5 A Voz que Nunca Cala
6
Capítulo 6 As Janelas Que Observam
7
Capítulo 7 A Sala dos Ecos
8
Capítulo 8 As Vozes de Vidro
9
Capítulo 9 O Sussurro das Cadeiras Vazias
10
Capítulo 10 Espelho Quebrado
11
Capítulo 11 As Vozes do Porão Lacrado
12
Capítulo 12 Carne e Sussurros
13
Capitulo 13 A Sala Sem Saída
14
Capítulo 14 Gritos do Porão
15
Capítulo 15 O Quarto do Sussurro
16
Capítulo 16 Um Grito Antigo
17
Capítulo 17 O Sussurro Atrás da Porta
18
Capítulo 18 O Espelho das Treze Verdades
19
Capítulo 19 O Cântico das Almas Afogadas
20
Capítulo 20 O Labirinto da Memória
21
Capítulo 21 Vozes Entre as Paredes
22
Capítulo 22 O Quadro que Sussurra
23
Capítulo 23 A Porta das Lamentações
24
Capítulo 24 Véu do Abismo
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Capítulo 25 O Sussurro do Labirinto
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Capitulo 26 Ecos de Sangue
27
Capitulo 27 A Canção das Correntes
28
Capitulo 28 O Poço das Vozes
29
Capítulo 29 A Cela do Esquecimento
30
Capítulo 30 Sussurros da Carne
31
Capítulo 31 O Canto da Terra Rasgada
32
Capítulo 32 Labirinto Vivo
33
Capítulo 33 A Cúpula do Esquecimento
34
Capítulo 34 As Vozes de Sal e Cinza 🩶
35
Capítulo 35 O Teatro dos Esquecidos
36
Capítulo 36 O Espelho que Sussurra
37
Capítulo 37 O Corredor da Cegueira
38
Capítulo 38 A Biblioteca dos Sussuros
39
Capítulo 39 O Labirinto dos Reflexos Quebrados
40
Capítulo 40 A Porta Pulsante
41
Capítulo 41 O Vale do Silêncio Perpétuo
42
Capitulo 42 A Casa Sem Portas
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Capítulo 43 Origem
44
Capítulo 44 O Véu de Ascalon

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