Capítulo 4 – A Sombra e o Menino
A tarde estava nublada quando Haru e Kaori deixaram o apartamento de Akira pela primeira vez desde a noite da chuva. Ele segurava a mão da irmã com firmeza, o bolso pesando pelo envelope com o dinheiro que recusara contar. O cheiro do casaco limpo ainda lembrava o apartamento — e a presença que o dominava.
Haru não queria admitir, mas algo havia mudado. Não apenas ao redor dele, mas dentro.
Akira havia deixado uma marca. Um rastro de calor e confusão.
Eles passaram o dia comprando roupas básicas para Kaori, um pouco de comida, e visitaram o parque que ela tanto queria conhecer. Ver sua irmã correr entre as árvores, com o cabelo solto e riso leve, fez Haru respirar pela primeira vez em dias.
Mas a paz era ilusória.
Enquanto ela brincava, ele sentiu o celular vibrar.
[Mensagem de número desconhecido]
> Você voltou ao mundo. Gosto disso.
– A.
Haru bufou e guardou o celular sem responder.
Mas a mensagem ficou.
À noite, já no pequeno quarto de pensão que alugou com parte do dinheiro, Kaori dormia profundamente. Haru, no entanto, não conseguia fechar os olhos. Seu corpo ainda doía das noites nas ruas, mas era sua mente que mais pesava.
Ele pensava em Akira.
No jeito como olhava para ele — como se estivesse vendo algo escondido até de si mesmo.
Era perigoso.
Era errado.
Mas era impossível de ignorar.
Enquanto isso, em uma sala escura no topo de um prédio antigo, Akira acendia um cigarro diante de um velho quadro de avisos. Nele, várias fotos e anotações. No centro, uma imagem recente de Haru, saindo da pensão com Kaori ao lado.
Ren entrou logo depois.
— Você mandou vigiar ele? — perguntou com uma sobrancelha erguida.
— Eu quero saber se ele tá seguro. Nada além disso.
— Você sabe que isso soa como obsessão, né?
Akira não respondeu. Só tragou o cigarro e olhou de novo para a foto. Haru parecia tão diferente daquele garoto sujo e encolhido no mercado. Tinha luz nos olhos agora. Uma luz que ele não conseguia esquecer.
— Acha que pode arrancá-lo desse mundo, chefe?
— Eu não quero arrancá-lo. Quero entender como ele ainda tem esperança, mesmo depois de tudo.
Ren suspirou.
— Você sempre gostou de quebra-cabeças.
— Não. Eu gosto de fogo. E esse menino... é como um fósforo aceso no meio da escuridão.
Na manhã seguinte, Kaori acordou com febre.
Haru tentou esconder o desespero, mas a testa quente da irmã e o jeito como ela choramingava de dor faziam o pânico apertar o peito.
O hospital público estava lotado. Médicos corriam de um lado para outro. Haru tentou manter a calma, mas foi ignorado diversas vezes.
Kaori começou a tossir forte. Seus olhos pediam ajuda. E Haru sentiu tudo desmoronar de novo.
Sem pensar, puxou o celular.
— Droga... — sussurrou, antes de apertar o contato que evitava usar.
Três toques. E então:
— Haru?
— Eu... Ela tá piorando. Eu tentei, mas... Eles não estão atendendo a gente.
— Onde estão?
Quarenta minutos depois, Akira apareceu na entrada do hospital com dois homens. Um deles era médico.
— Pegue a menina, — ordenou sem rodeios.
O médico a examinou ali mesmo e, com rapidez, a levou para o carro.
Haru quis reclamar, mas não conseguiu. Estava sem chão. Tudo que queria era que Kaori melhorasse.
Akira olhou para ele com os olhos sérios.
— Confia em mim?
— Não. Mas vou engolir o orgulho, só por ela.
Akira assentiu.
— Às vezes, engolir o orgulho é a coisa mais nobre que alguém pode fazer.
Na clínica particular, Kaori recebeu atendimento imediato. Diagnóstico: infecção respiratória leve, mas tratável. Precisava descansar e tomar os remédios corretamente.
Quando o médico saiu, Haru se sentou ao lado da cama. Passou a mão no cabelo da irmã, suspirando.
— Você sempre foi forte, Kaori.
— Haru-nii... — ela murmurou, sonolenta. — Aquele moço... ele é seu amigo?
Haru engoliu seco.
— Não sei.
— Ele parece triste.
A frase o atingiu mais uma vez. A pureza da irmã via o que ele não queria ver.
Akira, parado na porta, ouviu tudo.
Mais tarde, Haru se aproximou dele, do lado de fora do quarto.
— Por que está sempre por perto?
Akira o olhou nos olhos.
— Porque quero entender você.
— E se não houver nada pra entender?
— Então vou continuar procurando até encontrar.
Haru deu um passo à frente, encurtando a distância.
— Você é perigoso.
— E você também, Haru. Você só não percebeu ainda.
O silêncio caiu entre eles. Denso. Intenso.
Haru queria odiá-lo. Precisava odiá-lo. Mas tudo em Akira — a voz, os olhos, a calma inquebrável — o atraía como uma sombra silenciosa tentando abraçar a luz.
Era errado. Mas era real.
— Eu não posso me perder nisso.
— Você já está no meio.
E com isso, Akira se afastou, deixando Haru ali, encarando o próprio reflexo na janela da clínica. Um menino tentando fugir de uma sombra que se aproximava cada vez mais.
Mas... parte dele já não queria correr.
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Atualizado até capítulo 76
Comments
@𝑚𝑖𝑛𝑖𝑛𝑜_𝑑𝑜𝑖𝑑𝑜.𝑐𝑚
A cada frase que leio, me arrepio Inteirinha! que intenso cara, adorei
2025-04-17
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★𝕺𝖘𝖈𝖆𝖗 𝕬𝖑𝖍𝖔★
Está tudo rápido demais, mas intenso.....
2025-04-14
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