Why Are You Sad? | KTH • JJK
03. Por que eu ainda insisto em você?
Fiquei tão desapontado que senti um gosto amargo se espalhando da ponta até o final da minha língua enquanto olhava para a mansão de Licon.
Jungkook
— Que porra é essa? — ralhei. Taehyung balançou sua mão junto da minha, continuando os passos adiante, pisando no gramado artificial em um verde musgo por conta da iluminação azulada que saia das janelas do casarão logo à frente.
Taehyung
— Oras, uma festa.
Jungkook
— Você não disse que era da escola?
Taehyung
— Da escola, não na escola. — nunca senti tanta raiva de uma piscadela arrogante como agora.
Perceber que havia caído perfeitamente na armadilha de Kim Taehyung me fez entreabrir os lábios. Passo a língua nas bochechas até soltar o ar dos pulmões impaciente. Nessa altura do campeonato, já estávamos próximos da escada que leva à entrada. Taehyung tinha uma mão erguida e pronta para acenar para qualquer ser que respira, enquanto eu bufava e pensava que seria capaz de jogá-lo para trás agora mesmo, erguer seu corpo nos meus ombros e depois sair correndo alguns quarteirões de retorno.
Era uma festa à fantasia organizada, não por um aluno qualquer, mas sim, pelo aluno mais popular da escola: Licon Abraã.
Em Vila Nova, ser popular não é nem jogar futebol ou ser galanteador, é ter bicicleta, pais com uma condição financeira confortável e distribuir doces durante o intervalo.
Licon seguia "apenas" todos os requisitos disso aí.
Sua casa estava decorada com fantasmas de cartolina mal cortados, as bebidas do balcão tinham cores estranhas, provavelmente exageraram no corante e talvez álcool, mesmo todos sendo menores de idade, tenho certeza que é tudo alcoólico. A escada que levava ao segundo andar estava sendo monitorada pelos bajuladores de seus melhores amigos, apenas fiz menção de passar junto de Taehyung e os rapazes se colocaram na nossa frente.
Kim sorriu como se aquilo não o afetasse, mas xingou até a décima quarta geração de cada um depois de alguns passos à frente. Os lábios mexendo e a voz forçada contra a música alta que não combinava com o clima de Halloween chamaram minha atenção por tempo demais. O espaço não estava tão cheio, tinha pouca gente distribuída nos sofás. Havia bancos acolchoados perto de jarros livres e próximos a varais de pisca-piscas, nada muito forte para não atrapalhar a iluminação azulada.
Ficamos parados na porta de passagem entre a sala e a cozinha, um espaço onde era quase impossível ficar sem que alguém esbarrasse em seu ombro ou braço. Nunca tive tantos pensamentos negativos em um período tão curto de tempo, desde pegar a caneta do cabelo da menina distraída em flertar com um rapaz sentado no sofá menor dos três disponíveis e sair acertando o pescoço de todo mundo, até subir escondido, pegar um desodorante e fósforo, então fazer um churrasco diferente.
Taehyung
— Meu Deus. — Taehyung resmunga assim que segura minhas bochechas, trazendo minha atenção ao seu rosto pintado. — Nunca te vi tão expressivo. Olha só, nem sabia que seu rosto tinha linhas de expressão. — seu indicador chegou aos cantos dos meus olhos, depois próximo aos meus lábios e o afastei devagar.
Jungkook
— Quero ir para casa.
Taehyung
— Vamos nos divertir um pouco. Que tal uma bebida?
Jungkook
— Tem álcool, eu não quero.
Tenho medo do que posso fazer fora de mim, sendo sincero.
Kim olhou para mim como se eu fosse um tolo, e até me senti um quando seus calcanhares se dirigiram para a cozinha — eu o segui como um cão — e ele se serviu. Seus lábios cheinhos tocaram um líquido rosa, despejando em uma taça fina.
Taehyung
— Josh não vai descobrir. — ele tentou insistir, me empurrando a taça que eu desviei.
Cada íris azul girou nas órbitas, sua boca se abriu a ponto de mostrar a língua, então Taehyung começou a andar novamente. Nas caixas de som tocava "Attention" de Doja Cat e Taehyung dançava livremente entre aquela multidão que nunca se compararia a ele. Observei o quadril dele se mover, os lábios pronunciando cada parte da música, mesmo sendo péssimo em inglês. Parei para admirar tudo. As panturrilhas apertadas, assim como as coxas e a bunda.
Pisco mais rápido ao pensar que não deveria estar tão fixo no último lugar, preciso controlar o tremor dos dedos dentro do bolso da minha calça de moletom assim que penso na possibilidade de Josh descobrir que eu menti para ele. Não estou na escola, estou sendo um filho da puta mentiroso.
Minha garganta e meus lábios secaram, então umedeci-os esbarrando em Taehyung. Encarei seu rosto bravo.
Taehyung
— Olha por onde anda, caramba. — reclamou junto ao sorriso cúmplice.
Revirei os olhos por não estar no clima para brincar de retruco.
Taehyung
— E se a gente tentasse socializar? — propôs.
Taehyung
— Dançar? — seu corpo virou para mim de repente, com os braços levemente erguidos e o quadril em uma onda.
Jungkook
— Não consigo mexer meu corpo assim, certamente.
Taehyung
— Entrar em um verdade ou desafio?
O encarei praticamente com um outdoor de "Nem fodendo" distribuído em cada linha de expressão da minha face.
Taehyung
— Tudo bem... Apenas beber e ficar no tédio para mim, então.
Jungkook
— Você quem quis me trazer, por que está reclamando?
Taehyung
— Por que eu ainda insisto em você?
Jungkook
— Eu me pergunto isso todos os dias da minha vida. — Eu disse estalando os lábios, virando o rosto para a moça fantasiada de Freddy Krueger. Foda.
Taehyung
— Será que tem algum ruivo na festa?
A questão de Kim me tomou a atenção de maneira tão drástica que juntei os ombros e me inclinei levemente em direção ao seu corpo menor.
Jungkook
— Você acha que tem? — devolvo sua entoação mais suave em uma única palavra. Ele lambe os lábios.
Taehyung
— Não acha que seria super interessante se o assassino da máscara do pânico estivesse aqui? Aqui, disfarçado de adolescente caçando sua próxima vítima.
Traguei ar com os lábios entreabertos, o que causou um assobio baixo e um borbulhar da própria saliva. Taehyung me fitou com uma expressão enojada até bater levemente no meu ombro para que eu parasse. E parei.
Jungkook
— É uma ideia interessante.
Taehyung
— Quem esperaria um assassinato em uma festa, né? — Senti seu olhar pelar minha pele. Engoli em seco no mesmo instante, virando um pouco a cabeça e notando que esse tempo todo ele estava próximo demais. A ponto de sua respiração beijar facilmente minha bochecha.
Jungkook
— Nós esperaríamos.
Seus lábios curvaram-se para gargalhar, ele teria feito isso se outra presença não tivesse chegado de repente. Afastei-me, trombando com Licon e seu sorriso presunçoso. Ele não me deu atenção, seu interesse não era o garoto estranho do colégio.
Licon
— Kim Taehyung, que bom que veio! — quase gritou o cumprimento, deixando suas mãos sujas pelas unhas grandes demais tocarem as de Kim Taehyung. Elas, tão delicadas que seria um pecado um atrito tão grande.
Trouxe minha atenção para ambos enquanto mordia os lábios, prestando atenção na conversa mesmo com a visão ficando embaçada, perdendo o zelo quanto aos gestos que eles faziam durante a conversa.
Taehyung
— Eu e Jungkook estamos presentes, Licon. — Taehyung resmungou, pigarreou alto e tocou na barra da minha blusa. Não me mexi, somente assenti duas vezes.
Licon
— É... Isso. Aliás, Kim, ouvi falar que você gosta de meninos.
Parei para fitar o rapaz popular. Seu rosto de pele clara, lábios ressecados e olheiras muito presentes. Licon me encarou, deu um passo para o lado e teve as sobrancelhas curvadas.
Licon
— Qual foi? — seu queixo ergueu-se durante a pergunta. Neguei com a cabeça lentamente.
Taehyung
— Gosto de meninas e meninos. Por quê? — Taehyung respondeu e também estava alerta. Observei seu corpo tenso com um incômodo óbvio no meu maxilar travado.
Licon
— Me too. — Aquilo era uma surpresa até para mim. Kim e eu nos encaramos ao mesmo tempo, observei seus olhos arregalados com a expressão mais calma. — Gostaria de conhecer meu quarto? Tenho certeza de que há algumas coisas que lhe interessarão lá.
Os olhos de algodão voltaram-se para Licon. E não combinava.
Mas Taehyung nunca concordaria com isso.
Senti uma saliva se amontoar na minha garganta enquanto assistia Kim ponderar. Ele não era bobo nem nada, assim como eu não era bobo nem nada.
Sabia que Taehyung tinha vivido mais que eu em muitos aspectos. Sobre já ter dado seu primeiro beijo, e realmente dado. Mas também comeu. Ele já bebeu, usou drogas, tem birras e "problemas" que eu não considero problema como todo o resto dos adolescentes da minha idade.
No entanto, muitas coisas suas combinam comigo. E desde que ele me adotou como amigo, gosto de pensar que Kim Taehyung só é o verdadeiro Kim Taehyung comigo. Falando bobagens e de quinta a sábado maratonando A Nightmare on Elm Street centenas de vezes comigo. Só para mim. É claro que eu não queria que ele acompanhasse Licon, mas assim que Taehyung me olhou com um "Ah, eu estou a fim" tácito.
Dei o melhor sorriso que consegui, curvando um pedaço da boca, e assisti a seu corpo subir por aquelas escadas monitoradas depois que ele respondeu um "Demorô" ao senhor popular.
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