Fragmentos de memória

Logo após toda aquela luz se dissipar, um cansaço profundo tomou conta de Viana. Ela abriu os olhos lentamente, sentindo um ardor no peito, como se a dor de algo que ainda não entendia tivesse deixado uma marca. Com um esforço, sentou-se abruptamente na cama, uma pontada forte irradiando do local da adaga que ainda parecia cravar-se em sua pele.

"Celeste! Graças a Vontheur, você está acordada! Não se levante, pelo menos me diga como está se sentindo!" Elys se aproximou, segurando sua mão com força, seus olhos transbordando de preocupação.

"Eu... Argh!" Ela gemeu, uma dor lancinante tomando conta de sua cabeça, e logo uma avalanche de memórias da verdadeira Celeste começou a inundar sua mente. Era como se a consciência dela estivesse tentando se firmar, sobrecarregando aquele corpo frágil que acabara de assumir.

Elys, rapidamente, pediu que chamassem um médico, sua preocupação evidente. E, logo em seguida, o primeiro a aparecer no quarto foi Cristan. O clima entre os dois irmãos já era tenso, e, ao ver Celeste acordada, Cristan não perdeu tempo em fazer seu comentário irônico.

"Tsk! Não acredito que já está dando trabalho de novo... Como sempre, não faz nada e ainda dá trabalho!" Ele se aproximou da cama com desdém.

Mas Elys não deixou barato. Sua expressão endureceu, e ele olhou para o irmão com firmeza.

"Essa é a primeira coisa que você tem a dizer? Se veio aqui apenas para acusá-la de algo que nem sequer é culpa dela, peço que se retire," disse, sua voz cortante. Ele sempre havia sentido que Cristan gostava de fazer esses comentários venenosos para provocar a irmã, e não era a primeira vez que isso acontecia.

"Você é outro da laia dela, não é? Por isso a defende tanto," Cristan lançou uma provocação ainda mais ácida, os olhos dele brilharam com sarcasmo.

Mas antes que a discussão pudesse continuar, o médico entrou na sala, interrompendo o clima tenso.

"Err... Vossas Altezas, preciso que se retirem para que eu possa examinar a primeira princesa," disse o médico, ao se aproximar de Celeste com um olhar cuidadoso.

Elys e Cristan saíram do quarto, ainda com olhares pesados, e o médico começou o exame. Celeste, ainda um pouco atordoada, manteve-se em silêncio, respondendo apenas o necessário. Suas respostas eram curtas e diretas, quase como se estivesse tentando não se perder em pensamentos, enquanto a dor e as memórias da verdadeira Celeste inundavam sua mente.

"Você tem sinais fortes de anemia," disse o médico, enquanto escrevia algo em seu caderno. "Vou receitar um remédio e peço que volte a se alimentar adequadamente. Precisa comer pelo menos de três a quatro vezes por dia."

Celeste franziu o cenho, um pouco confusa, mas assentiu. Não tinha forças para questionar. Seus pensamentos estavam tão turvos, e seu corpo tão fraco, que mal podia focar no que ele dizia.

"Obrigado," murmurou ela, sua voz fraca, mas com um tom de autoridade que era natural dela. "Quando sair, diga aos outros que não quero receber ninguém. Estou muito cansada. Mandem uma empregada com o remédio e a refeição, por favor."

O médico olhou para ela surpreso, como se o tom de comando fosse algo que ele não esperava de Celeste. Ela sempre havia sido tímida, insegura.

"P-perdão?" ele perguntou, os olhos arregalados com a resposta dela.

"Acho que você entendeu bem... Preciso me esforçar para repetir?" Ela nem sequer olhou para ele enquanto falava, sua voz baixa, quase exausta.

"Sim, princesa. Com licença," o médico disse, rapidamente se retirando. Agora, Celeste estava sozinha.

"Ótimo, agora posso começar a recapitular tudo..." Ela murmurou para si mesma, enquanto lentamente se levantava. Sentia-se fraca, mas não queria continuar deitada. Caminhou até uma mesa, pegou uma folha de papel e uma caneta, e se sentou em frente à penteadeira, tentando organizar seus pensamentos.

Ao olhar para o espelho, não pôde evitar notar seus cabelos. Estavam vermelhos como sangue. E seus olhos... também estavam vermelhos. Havia algo de inquietante e fascinante na maneira como ela agora se via. Não era mais Celeste, não completamente. Era uma fusão estranha, uma mistura de identidade que ela mal conseguia controlar.

"Bem... Pelo menos ela é bem bonita," Celeste murmurou, sorrindo levemente para si mesma, embora o sorriso fosse forçado. Logo, porém, seu olhar ficou distante, enquanto as memórias da verdadeira Celeste inundavam sua mente. As informações sobre o mundo atual começavam a se ajustar, e ela tentava entender mais sobre a nova vida que estava assumindo.

"Atualmente, Celeste é a primeira filha mulher do Duque Cedric Voss... Ela tem três irmãos mais velhos e uma irmã mais nova, mas é considerada inútil por causa da sua reclusão..." Celeste refletia, absorvendo as informações. As memórias da verdadeira Celeste eram confusas, mas algumas delas começavam a fazer sentido.

"Cedric Voss... Esse sobrenome não me é estranho," murmurou ela, o pensamento atravessando sua mente como uma faísca. Sentia que havia algo mais ali, algo que ainda não conseguia entender completamente.

Ela se levantou lentamente e caminhou até a janela. Observou o que podia do mundo lá fora, a luz suave da tarde filtrando-se pelas cortinas. Sentou-se em um sofá próximo e fechou os olhos, permitindo-se relaxar por um momento. As memórias e as dores estavam se misturando em sua mente, e o cansaço começava a pesar de forma pesada.

"Eu deveria me preocupar com tudo isso agora? Devo me focar em entender esse mundo... ou seria melhor apenas descansar?" Celeste sussurrou, os olhos começando a se fechar. Seu corpo finalmente cedeu, e ela se entregou ao cansaço, seus olhos se fechando completamente.

O sono a envolveu, profundo e implacável. A confusão, as memórias e os novos pensamentos começaram a se esvair enquanto ela adormecia, permitindo-se, finalmente, um descanso que já era mais do que merecido.

Um pouco depois

Elys entrou silenciosamente no quarto, seus passos leves e cautelosos, como se temesse interromper algo importante. A porta se abriu com um leve rangido, e ele olhou para o lado da cama onde Celeste havia se deitado. A luz suave do final da tarde entrava pelas janelas, banhando o quarto com um brilho dourado, mas o ambiente parecia pesado, carregado de uma tensão silenciosa.

Apenas parado à porta, Elys ficou observando-a por alguns instantes. O ambiente parecia calmo, mas a preocupação em seus olhos não se dissipava. O que ele queria mais naquele momento era garantir que ela estava bem, que nada de ruim estava acontecendo enquanto ele não estava lá. A dor, as memórias que ainda pareciam estar a invadir o corpo de Celeste... tudo isso o deixava inquieto.

"Celeste?" Ele chamou seu nome suavemente, tentando não assustá-la, mas também sem muita certeza de como ela reagiria. No entanto, ela não respondeu. Apenas respirava com um ritmo constante e tranquilo, como se estivesse em um sono profundo.

Celeste estava ali, deitada no sofá perto da janela, com os olhos fechados, o corpo relaxado, mas com uma aura de exaustão visível. Ela parecia distante, imersa em algum pensamento profundo, ou talvez apenas buscando escapar dos próprios tormentos. O rosto dela estava pálido, e os cabelos vermelhos, como sangue, caíam em suaves ondas ao redor de seu travesseiro improvisado.

Elys observou Celeste por mais alguns momentos, com o coração apertado. A bandeja com a refeição ainda estava ali, mas ela parecia tão cansada, tão fraca, que ele sabia que ela não teria forças para se alimentar agora. O olhar que ele lançou à princesa era de profunda preocupação. Ela estava tão imersa em seu próprio turbilhão de memórias e sentimentos que sequer parecia ter notado o mundo ao seu redor.

O tempo parecia se arrastar enquanto ele pensava em como lidar com a situação. Ele queria que ela tivesse forças, que fosse mais forte, mas sabia que as circunstâncias estavam além de qualquer controle. A dor física que ela sentira, a fragilidade de seu corpo... Tudo estava gritando por descanso.

Com um suspiro, ele pegou a bandeja com a refeição que trazia e a colocou cuidadosamente ao lado dela, para que, ao acordar, ela pudesse se alimentar sem esforço. Ele sabia o quanto a situação era difícil, e o quanto a força que ela precisava reunir era quase sobre-humana. Mas ele não conseguia ignorar o fato de que, mesmo com todas as dificuldades, Celeste parecia distante de tudo isso.

Decidido, Elys se aproxima novamente após ter deixado a bandeja sobre uma mesa, foi até o sofá, abaixando-se ao lado de Celeste. Sua mão tocou levemente seu ombro, mas ela não reagiu. A jovem estava completamente alheia ao ambiente, os olhos fechados em um sono profundo e, aparentemente, reparador.

"Você não deveria estar aqui... dormindo desse jeito", murmurou para si mesmo, mas suas palavras caíram no ar sem resposta.

Sabia que precisaria mover Celeste até a cama, mas não queria forçar nada. O corpo dela parecia tão leve e frágil, e ele queria ser o mais cuidadoso possível. Com as mãos trêmulas, Elys cuidadosamente passou um braço por debaixo dos ombros dela e o outro por trás de suas pernas. Ela estava tão relaxada, ainda alheia ao que acontecia ao seu redor. Elys podia sentir o calor do corpo dela, a suavidade dos seus cabelos vermelhos caindo por sobre o travesseiro improvisado.

Com um suspiro pesado, ele a levantou delicadamente, mantendo-a firmemente, mas sem fazer movimentos bruscos. O quarto estava quieto, e ele, em seu instinto protetor, não queria fazer barulho. Com uma leve dificuldade, Elys começou a caminhar, a princesa ainda nos seus braços, como se fosse uma criança. Ele tinha a sensação de que, de algum jeito, Celeste estava tão leve quanto a brisa da manhã. Ela não fez nenhum movimento, nenhuma palavra, nada. Apenas seguiu adormecida, entregue à sua exaustão.

Ele a colocou cuidadosamente na cama, ainda mantendo-a em seus braços por um momento, observando-a com ternura. Seus olhos estavam fechados e o semblante, embora pálido, parecia um pouco mais sereno. Ele ajeitou o edredom ao redor dela, cobrindo seu corpo com suavidade, sem querer interromper seu descanso. A princesa estava em um sono profundo, uma recuperação que ele sabia que era essencial.

Ele ficou ali por alguns minutos, sem se mover, apenas olhando para o rosto dela. A luz do final da tarde lançava sombras suaves sobre seus traços, fazendo-a parecer mais vulnerável do que ele havia visto antes. As memórias de tudo o que ela passara, e a sensação de que estava perdendo algo... ainda estava ali. Elys sabia que, de algum jeito, essa dor estava muito além do que ele podia ajudar.

Finalmente, ele se levantou, uma expressão de pesar se formando em seu rosto. "Descanse, Celeste", sussurrou, uma promessa silenciosa. "Eu estarei aqui quando acordar."

Elys então se retirou lentamente, fechou a porta suavemente e se afastou, ainda com a imagem de Celeste repousando em sua mente, seu corpo leve e vulnerável na cama. Sabia que, enquanto ela estivesse assim, ele estaria ao lado dela, tentando de todo coração aliviar o peso que parecia sobrecarregar seus ombros.

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Comments

Berenice Martins Bento

Berenice Martins Bento

top estou gostando vamos esperar mais atualização e ver se não demora ☺️☺️

2024-12-23

1

Amelia Quil

Amelia Quil

Impressionante!

2024-10-09

1

Ver todos
Capítulos
1 E então meus olhos se fecharam...
2 Fragmentos de memória
3 O despertar da alma
4 Descanso
5 Fim da rotina
6 confrontos no Jardim
7 Aethoria
8 O almoço
9 Compras? Ou segredos?
10 Encontros no Silêncio
11 Séculos...
12 Sob a luz da lua
13 Capitão Lucien
14 Library
15 Convite
16 Reencontro
17 O Corcel negro
18 O Reflexo do Destino
19 O Caminho até a Boutique
20 A designer
21 A Saga do vestido se acaba
22 exclusivos
23 outro lado
24 "Rostos e Máscaras: O Jogo... Vai começar?"
25 Cedric e delphine
26 Todo jogo exige um aquecimento
27 Tensão no ar
28 A noite chega
29 Chegada ao baile
30 Políticas e Intrigas
31 O campo de batalha adornado
32 Fora do centro
33 Tempo depois
34 Palavras não ditas
35 Direitos...
36 Início
37 O Amanhecer Antes da Jornada
38 Jardim de rosas espinhosas
39 Uma sopa morna e aguada. Sem gosto, mas de alguma forma, indigesto.
40 idéias
41 O cavalo e sua cavaleira
42 saída
43 Intrigas sob o sol poente
44 A presa disfarçada de caçador
45 Carta aberta
46 interação
47 Em breve a cerimônia
48 Algo estranho
49 Onde os monstros descansam
50 O coração da noite
51 Sombras que caminham entre o limbo da vida e da morte
52 O servo e a sombra
53 A lua de sangue
54 Valter e o lago
55 Nos lábios da serpente
56 Onde o ouro brilha o sangue é castigo
57 O servo da rainha amaldiçoada
58 O amanhacer sem hesitação
59 Pulso da Floresta Morta
60 Respostas erradas
61 Um coração corrompido
62 raízes que sussurram
63 Enfim as trombetas
64 Quando a Memória Desperta
Capítulos

Atualizado até capítulo 64

1
E então meus olhos se fecharam...
2
Fragmentos de memória
3
O despertar da alma
4
Descanso
5
Fim da rotina
6
confrontos no Jardim
7
Aethoria
8
O almoço
9
Compras? Ou segredos?
10
Encontros no Silêncio
11
Séculos...
12
Sob a luz da lua
13
Capitão Lucien
14
Library
15
Convite
16
Reencontro
17
O Corcel negro
18
O Reflexo do Destino
19
O Caminho até a Boutique
20
A designer
21
A Saga do vestido se acaba
22
exclusivos
23
outro lado
24
"Rostos e Máscaras: O Jogo... Vai começar?"
25
Cedric e delphine
26
Todo jogo exige um aquecimento
27
Tensão no ar
28
A noite chega
29
Chegada ao baile
30
Políticas e Intrigas
31
O campo de batalha adornado
32
Fora do centro
33
Tempo depois
34
Palavras não ditas
35
Direitos...
36
Início
37
O Amanhecer Antes da Jornada
38
Jardim de rosas espinhosas
39
Uma sopa morna e aguada. Sem gosto, mas de alguma forma, indigesto.
40
idéias
41
O cavalo e sua cavaleira
42
saída
43
Intrigas sob o sol poente
44
A presa disfarçada de caçador
45
Carta aberta
46
interação
47
Em breve a cerimônia
48
Algo estranho
49
Onde os monstros descansam
50
O coração da noite
51
Sombras que caminham entre o limbo da vida e da morte
52
O servo e a sombra
53
A lua de sangue
54
Valter e o lago
55
Nos lábios da serpente
56
Onde o ouro brilha o sangue é castigo
57
O servo da rainha amaldiçoada
58
O amanhacer sem hesitação
59
Pulso da Floresta Morta
60
Respostas erradas
61
Um coração corrompido
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raízes que sussurram
63
Enfim as trombetas
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