Oi, Guzinho. Diz Lipe passando o braço atrás de Gus pouco antes de chegar na escola.
- Oi Lipe. Gus tira o braço do outro de seus ombros.
- Parte meu coração assim. Diz Lipe fazendo bico.
- Qual coração?
- O que você está dizendo que não tenho? Mas, você está certo grande Gus.
- Oi Mary. Diz Gus.
- A garota asiática estava esperando na entrada da escola.
- Vocês vem meninos, na sexta?
- O que tem na sexta? Fala Gus com cara de confuso.
- Como assim, Gus, já esqueceu? O baile de formatura do terceiro ano. Fala a garota olhando para Gus.
- Ah, eu não gosto dessas coisas.
- Não Guzinho, estou sem acompanhante para sexta. Não vou vim só, vem comigo? Diz Lipe, fazendo um bramido para imitar um cachorro chorando.
- Okay que coisa estranha foi essa que você tentou fazer, e não vou ser sua garota.
- Óbvio que não vai ser minha garota, você é um garoto tapado. Lipe dá um leve tapa na nuca de Gus.
- Eu não vou e não adianta insistir.
- Tchau meninos e deixa de ser anti social Gus.
Gus entra em sua sala e passa pela mesa do trio que nem o olha, ele lembra que mais cedo viu algumas manchas roxas na sua barriga, mas o problema nunca iria aparecer se continuar usando camisa até sumir. O resto do dia se passou tranquilamente, da mesma forma que o dia seguinte, ou pelo menos até o final deste, quando no final do dia Lipe faz um grupo no aplicativo de mensagem.
...As estrelas...
...Integrantes: Lipe, Mary, Você...
...Você foi adicionado....
Lipe: Gusssss, você prefere gravata borboleta ou não?
Você: Nenhuma, já disse que não vou Lipe.
Mary: Vamos Gus, vamos de trio, eu, você e o Lipe. Você tem que se enturmar mais, te apresento até umas amigas, o que acha?
Você: Como vocês são chatos... okay, eu vou, mas não me julgue se ficar doente no dia. ;)
Lipe: Você não vai ficar doente Sr Gustavo, eu vou deixar seu termo e vou vestir o meu ai com você!!
Mary: Então não vai ter meios de você fugir...ah, leva uma gravata borboleta azul para o Gus, Lipe.
Mary: Eeeeeeeee eu disse que se a gente fizesse um grupo iríamos convencê-lo Lipe.
Lipe: Sim, às 19 horas eu estarei aí amanhã para te pegar seu Gustavo.
Você: Okay.
Gus bloqueia o celular e pensa em toda a situação que teria que passar no próximo dia, na sua cabeça, é difícil se relacionar com as pessoas, e se elas não gostarem de mim, se rirem de mim, e se me acharem um estranho, eram tantas possibilidades e tantos "e se" que os seus olhos enchiam de lágrimas e a melancolia voltava, o que o deixava mais triste, queria ser apenas uma pessoa normal, porque eu não posso ser igual as outras pessoas, pensou.
Foi para a varanda de seu quarto e viu as copas das árvores do parque, desceu pela escada de decoração de madeira que tinha ali e seguiu rumo ao seu lugar secreto. Diferente da última vez, ele simplesmente não entra de vez dentro dos arbustos primeiro olhar e ver que não tinha ninguém lá, entra e com a jaqueta que tinha levado faz um apoio para a cabeça, vendo o dia indo embora e a noite cair com as primeiras estrelas pintarem o céu Gus acaba caindo no sono.
- Ei, eiii. Esse menino dorme como uma pedra.
Gus acorda sendo chacoalhado, abre os olhos e vê o Félix.
- Puts, você de novo aqui, vem todo dia? E o que tá fazendo o que essa hora? Diz Gus com tom irritado olhando o cacheado.
- Esquentado como sempre, venho e ultimamente tenho vindo mais vezes no dia esperando encontrar alguém que não me deu o número de celular. Retruca Félix balançando o aparelho em suas mãos.
- Não tem nada para fazer em casa?
- Não. Pensei que não ia mais acordar.
- E tinha como não acordar com você me balançando?
- Não tem medo de dormir aqui no meio do nada e se algum tarado ou tarada aparecer?
Félix leva a mão para a barriga de Gus, mas ele se senta rapidamente antes do toque do garoto cacheado.
- Você é um gato para ser tão rápido? Quer café? Pergunta Félix balançando o copo na sua mão.
- Estou longe de ser um gato e eu não dei autorização pra você me tocar. Como assim café!? Que coisa aleatória.
- Pega o café.
Logo a mão de Gus estava ocupada com um copo de café, reconheceu o nome do cybercafé que passava em frente todo dia, não era de beber café, mas daquele até que estava gostando.
- Pensei que você não beberia.
- A, o que de pior pode acontecer!? A propósito, porque você se mudou para essa cidade mesmo?
- Eu vim por causa da promoção da minha mãe, ela vai administrar uma filial aqui. Ah, eu acho que já vou. Vai me dar seu número de celular? Pergunta Félix com um olhar esperançoso.
- Não, mas me dar o seu, qualquer coisa eu mando mensagem.
- Tá, aqui.
Félix se levanta e tira um pedaço de papel com seu número do bolso do short.
- Anda com seu número em um papel no bolso, assim de saúde. Gus diz com um olhar sarcástico.
- Prevenido sempre, inclusive para outras coisas... Félix dá uma piscadinha para Gus.
- Okay ? você não estava indo embora? Bye bye. Fala Gus enquanto acena com a mão livre para o rapaz a sua frente.
Félix passa a mão no cabelo de Gus bagunçando-o se abaixa depositando um beijo na bochecha do rapaz que fica altamente envergonhado e com um sorrisinho de canto nos lábios, logo após o garoto cacheado sai de dentro dos arbustos. Gus volta a se deitar e fica por mais um tempo assim, até ser despertado pelo toque do seu celular chamando.
...Chamada: Lipe...
- Oi Lipe.
- Oi Guzinho, vamos escolher o termo amanhã, que hora?
- Odeio baile de formatura, certeza que não podemos ir de calça e camisa normal?
- Não, você sabe, regras da escola.
- Mas, eu também me lembro que tu iria escolher sem mim.
- Ah, mas não quero ter que esperar por horas sozinho até a Mary escolher um vestido.
- O casal vai que horas amanhã?
- Affs Mary me joga para você e tu me joga para ela, eu sou um brinquedo para ambos!? Mas, preferia fazer um casal com você, sabe né Guzinho...
- Imbecil, diz logo a hora.
- 10 horas está bom para você?
- Ah... Ok.
- Aeeeeeee, passo na sua casa para te pegar.
- Certo Lipe.
- Que som de grilo é esse menino?
- É que estou no parque.
- Às 11 horas da noite sozinho. Você não tem medo? Qual parque tá, eu vou deixar você em casa.
- Que? É próximo a minha casa, sei andar sozinho, não sou uma criança. Agora vou desligar.
- Tá, quando chegar avisa.
Gus finaliza a chamada e se levanta, percebe que tudo está um grande vazio, não tinha mais ninguém na rua aquela hora, sai de dentro dos arbustos e segue seu caminho para casa, quando vira na rua dela, dois cachorros que estavam no final começam a latir, sem dúvidas um dos seus maiores medo é de cachorro, "só é não demonstrar medo seu Gustavo, passa tranquilidade que eles não veem", pensou o garoto "cachorro fóbico", quando faltava quatro casas para a sua os cachorros correram em sua direção latindo.
Gus nunca correu tão rápido como naquele momento, ao abrir o portão e ficar em segurança dentro do seu quintal, teve a certeza que poderia participar das olimpíadas se quisesse, era só ter cachorros raivosos para correr atrás dele sempre.
Ao entrar em casa se dirige a cozinha lembrando que não tinha comido nada naquele dia ainda além do café do Félix, mas, se bem que café não é comida, pensou o garoto, olhou na dispensa e tinha macarrão, macarronada, pensou Gus, foi a geladeira pegou a carne moída e molho de tomate já preparador, colocou para esquentar, depois que o macarrão ficou pronto misturou e colocou em um prato. Lembrou do número do garoto cacheado, salvou e mandou uma foto da sua refeição como primeira mensagem.
Félix, online
Félix: Como assim não me chamou para jantar, eu te dei café...
Você: Isso não tem nada haver. Vou jantar antes que esfrie, bye.
Félix: Tem tudo haver, tá. Tchau Gustavo. Ficar falando Gustavo o tempo todo é tão estranho.....
Você: Namm, mas pode me chamar de Gus.
Félix: Huu bem melhor, Tchau Gus.
Gus tira a atenção do celular e dá a primeira garfada no seu jantar, e estava bom, naquele momento estava feliz, mesmo que não tivesse feito tudo do zero, tinha conseguido deixar a comida final gostosa, tinha dado o ponta pé na sua amizade com Félix e iria sair com seus amigos pela primeira vez depois de um longo tempo no outro dia. Após terminar sua refeição, limpa tudo e sobe para seu quarto, olha no relógio e já passava da meia noite, pensando no seu dia acaba caindo no sono.
São nove da manhã da sexta, dia do baile de formatura, Gus levanta da cama e vai para fora do quarto, ao descer as escadas tem uma surpresa, seus pais que voltaram um dia mais cedo de viagem.
- Bom dia. Diz Gus passando por ambos em direção a cozinha.
- Bom dia. Ambos respondem, o pai de Gus se levanta e vai em direção a cozinha.
- Pelo visto não se dá o trabalho nem de se pentear ao levantar da cama.
- Tudo bem comigo e com você? Pergunta o garoto em tom sarcástico.
- Fale direito comigo seu animalzinho. Por que não me ligou? Acho que fui bem claro no bilhete que deixei.
- Ah, eu esqueci. Quer torrada?
- Nada de se estranhar você esquecer da sua família.
- Eu que esqueço? Vocês que me evitam.
- Não evitamos tu, e sabes disso, apenas queremos o seu melhor.
- E o meu melhor implica em negar o que sou?
- Você não é isso que diz, não está bem da cabeça e sabe disso.
Nesse momento a mãe entra na cozinha e fala com o marido.
- Diz logo para o garoto porque voltamos mais cedo da viagem.
- Olha Gustavo, a gente veio arrumar nossas malas, decidimos passar dois meses na Europa, não acho que será problema né. já sabe se virar sozinho.
- Okay, vão lá. O que você acha? Só diz para a empregada que sempre vem na quarta para não entrar no meu quarto agora nas férias como ela fez na última vez.
- Tu devia esquecer aquele episódio, e voltar a agir normalmente com ela, já faz tanto tempo. Assim como a gente, ela só quer seu bem, por isso no primeiro momento que leu aquele papel ela nos trouxe.
- Isso é tudo?
- É sim, vamos embora agora pela tarde.
- Então encerramos aqui.
Gus se levanta da cadeira e deixa a xícara, depois lavaria, só queria sair daquele lugar com ar pesado, passa pelos seus pais, sua mãe mal o olha. Seguindo o caminho para seu quarto e lembrando do fatídico dia que deixou um bilhete declarando sua paixão a um colega de classe dentro do seu livro de história. Ao deitar na cama tudo que ocorreu no passado não muito distante volta à sua cabeça.
Estava tomando banho depois de seu pai pegá-lo na escola, tinha deixado seu material em cima da cadeira que foi ao chão. Dina é o nome da mulher que ele tinha como uma tia naquela época, lembra de sua expressão de assustado e do medo que sentiu ao sair do banho e ver a mulher sentada na cama com o papel em sua mão.
No mesmo instante lágrimas começaram a rolar pela sua face, se ajoelhou aos pés dela pedindo desculpas e implorando para que não mostrasse ou contasse aquilo aos seu pais, porém, Dina como uma mulher muito religiosa não podia deixar aquilo seguir adiante, o diabo estaria ali tentando corromper aquela família, levantou deixando o menino ali no chão chorando copiosamente.
Logo depois seu pai entra em seu quarto dando um tapa na mesa fazendo o menino se encolher no chão frio. Samuel pega ele pelo braço o levantando do chão e fazendo sua toalha que estava enrolada na sua cintura cair, antes que pudesse pegar-lá novamente, tem seus cabelos puxados, agora olhando para a figura do homem tomado pelo ódio a sua frente, sente como se estivesse sendo sugado para um poço escuro e profundo.
- Como você me explica isso Gustavo! Samuel grita tão alto que as pessoas que passavam pela rua escutaram.
- Quando que isso começou? Me responda seu bostinha. Continua o homem a gritar.
- Eu não sei, eu apenas sinto isso. Respondeu entre os soluços que soltava a todo instante.
- Fala direito e para de chorar, aja como um macho! Eu vou te ajeitar!
Após isso o homem que estava ainda segurando o cabelo do menino joga-o na cama pega a vassoura que estava lá deixada pela Dina quando saiu do quarto para mostrar o bilhete e começa a desferir vários golpes nas pernas e tórax de Gus, uma sequência tão forte que pequenos cortes se abriam nos locais dos impactos e suas pancadas eram ouvidas por toda a casa.
O garoto com sua visão turva pelas lágrimas vê a mãe entrando no quarto e pegando no braço do marido o impedindo de continuar, até hoje ele lembra as palavras desferidas por ela, "vamos querido, não vale a pena perder tempo com isso aí", a frieza em sua palavras foram como navalhas cortando o seu coração, primeiro o seu pai tinha deixado a figura de compreensivo e amoroso, como também a sua mãe.
Ambos saíram do quarto deixando o garoto ali deitado nú com algumas gotas de sangue escorrendo no seu corpo. Ficou imóvel por um bom tempo, não lembra o que pensava ou se chegou a pensar em algo, mas, lembra que adormeceu ali e como foi doloroso para se levantar e tomar um banho após acordar, lembra do sangue manchando a água de vermelho, das marcas roxas que ficaram e da dificuldade de fazer qualquer coisa com o corpo dolorido.
Pensou naquela época que tudo voltaria ao normal depois de alguns dias, mas, nada voltou a ser como era antes, seus pais não saiam mais com ele, passaram a fazer cada vez mais viagens longas de trabalho.
O mudaram de escola, não iriam pagar caro em um bom estudo para uma pessoa anormal como ele, foi o que disseram na primeira e última vez que o deixaram em frente a seu novo colégio. Sua solidão começou ali, em sua casa, isolado de todos e de tudo que ocorria, sem amigos, sem ninguém para lhe escutar ou ajudá-lo, aos seus 13 anos não entendia toda a complexidade da situação a qual se encontrava, todo dia esperava que magicamente tudo voltasse ao normal de antes.
Porém, as coisas só pioraram com o tempo, quando Matheus, Italo e Junior entraram na escola, o viram como uma presa fácil, isolado, sem amigos e claramente medroso o menino virou alvo constante dos rapazes. Quando percebeu que nada mais ia voltar a ser como antes, perdeu as suas esperanças e sua vontade de continuar ali, qual o sentido de ter uma vida assim, pensava.
Sempre olhava as outras pessoas e todos pareciam tão melhores que ele, melhores em suas vidas amorosas, em suas vidas familiares, em suas relações de amizade, enquanto ele continuava igual, parado, estagnado ano após ano em um ciclo que sempre se repetia. As datas especiais não lhe eram mais assim, sempre se sentia sufocado nelas, não queria que chegassem e quando chegava só queria que tudo acabasse logo.
Nem mesmo quando sua amizade com a Mary e com o Lipe começou, tudo continuava igual, seu desejo de não está ali, de se sentir um completo estranho entre eles, até quando ele não conseguia disfarçar a tristeza e um dos dois tentava conversar, não se sentia à vontade, sentia que não seria compreendido, mas assim ia seguindo, esperando o dia em que tudo isso iria acabar.
Gus é tirado de sua imersão do passado e pensamentos com o toque do seu celular, olha para a tela e vê o nome de Lipe.
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Atualizado até capítulo 38
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