Capítulo 2

A sombra da noite, para a maioria, se tornou o habitat ideal para acobertar muitos delitos e delinquentes. Muitos, também, nos consideram tão delinquentes quanto aqueles que praticam o mal. Tudo isto não tinha significado algum para mim e para um grupo de colegas. Mas, em determinada noite, tudo mudou.

A cidade se encontrava envolta pelas trevas. A lua havia desaparecido no escuro do espaço insensível. Após alguns dias de intenso calor, a chuva parecia corroborar nosso estado de ânimo. Nossas almas clamavam pela angústia e pela dor. Éramos oito. Cinco rapazes e três garotas. Todos com um único destino, o suicídio.

— Então, ainda em pé nosso passeio? Set perguntou olhando o céu banhado em lágrimas espectrais.

— Por que a dúvida? Interpelou-o Fobos, nosso líder.

— A chuva… tentou argumentar, Set.

— A chuva é como nossas lágrimas a verterem sobre a Terra, ou talvez nosso sangue a gotejar por nossos corpos. Quem sabe se não haverá, enfim, um fim em tudo… filosofou Fobos.

Naquela época orbitávamos entre os dezesseis e os vinte anos. Pela ordem etária estaríamos assim: Fobos, Lilith, Deimos, Set, Mefisto, Hades, Pandora e Eve. Logicamente que não se tratavam de nossos verdadeiros nomes, mas se tudo quanto abominávamos estava estreitamente relacionado ao mundo exterior, por que prolongá-lo entre nós? Não, éramos quem éramos. Nossos verdadeiros nomes não significavam nada.

Fobos era o líder. Seus vinte anos lhe conferiam a supremacia que o mantinha na liderança. Filho de um rico empresário, aderira à cultura e ao meio de vida gótico por sentir-se um estranho no complicado e hipócrita mundo em que os pais viviam. Não era nenhum rebelde, apenas procurava seu próprio caminho. Seu jeito seguro de nos liderar fazia com que se tornasse natural respeitá-lo.

O fator mais intrínseco de sua personalidade era mantido oculto sob as muitas camadas de conceitos que haviam aderido a seu caráter. Nenhum de nós, embora enfrentando situação semelhante, imaginávamos o quanto ele era discriminado pelos seus. Não podíamos sequer supor que ele já não tinha mais o amparo de qualquer um dos seus familiares. Estava só.

Lilith era uma moça linda, mas um tanto afetada. Somente quem a conhecia mais profundamente sabia que esta afetação era uma das armas que utilizava para se defender das agressões do mundo externo. Sua índole contestadora a tornara um peso para a família.

Aderiu ao grupo ao travar conhecimento com Fobos. O jeito indolente e plangente que ele demonstrava possuir a cativara. Da mesma idade que ele, ela se enamorou e acabou aderindo ao seu estilo de vida.

Com o passar do tempo, sentiu que sua alma vibrava tal qual as manifestações de vida dos góticos. Desde então, sentia-se cada vez mais irmanada com todos os aspectos que caracterizavam o grupo.

Deimos. Este era uma incógnita. Alguns meses mais novo que Fobos e Lilith, ainda na casa dos dezenove, entrara para o grupo vindo de uma família onde todos eram góticos. Não os acompanhou por julgar faltar espaço para ele. Dizia que se sentia mais integrado ao grupo que a família. Embora não aparentasse possuir nenhum traço angustiante, também trazia as marcas que abatem aqueles que sofrem os tormentos da dor.

Set. o mais irritado de todos. Sempre pronto a atacar quem quer que fosse, só mantinha sua raiva controlada quando Fobos o enquadrava. Não sabíamos muito a seu respeito. O pouco que ele nos havia confidenciado demonstrava que em seus dezenove anos de vida, enfrentara a barra de haver vivido em um lar destruído pela violência e pelas drogas. Talvez por este detalhe, nos o aturávamos e relevávamos suas explosões.

Mefisto. Este era o retrato da adolescência. Mal havia completado dezoito anos quando viu seu restrito mundo desabar. Não era o mais novo do grupo, mas era aquele que há menos tempo fazia parte dele. Não era muito ligado ao estilo que seguíamos, só decidiu nos acompanhar por falta de opção melhor.

Pandora. O que poderia se esperar de uma menina de quinze anos que passara os últimos cinco sofrendo abusos dentro da própria casa? Não era oriunda de nenhuma família desprovida de posses, pelo contrário. Porém, sua história fazia coro àquelas tantas que se desenrolam nos meios menos abastados. Encontramo-la pronta para se jogar de uma ponte.

Ao lhe falarmos sobre as angústias tão características que nos permeavam os âmagos, ela se convenceu a desistir de pôr um fim à vida. Desde então, isto já se dera há cerca de dois anos, vivia com Fobos e Lilith numa casa que haviam alugado.

Eve. Quem a encontrasse andando pelas ruas jamais imaginaria que aquela criatura doce de ar angelical fosse uma de nós. Embora estivesse dominada por uma dor muito forte, não deixava transparecer a tortura que a consumia.

Filha caçula de um engenheiro e uma professora universitária, tinha uma vida confortável e tranquila. Mas tudo ruiu logo que completou três anos. Naquela época, descobriu-se que ela era portadora de uma doença degenerativa muito grave. Os médicos lhe prognosticaram, no mais auspicioso ensejo, cinco anos de sobrevida.

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