Olhar

OS BINÓCULOS de alta-definição de Saaid estavam focados na mulher estonteantemente linda que havia sido sua esposa. Era ela, Sopphia. Com o glorioso cabelo dourado esvoaçando ao vento e sentada ao chão de um jardim no meio da cidade, era uma visão espetacular. A beleza de Sopphi era extraordinária, e a simples visão dela fazia o sangue de Saaid ferver. Naquele momento em especial, não só de atração, mas de raiva também. O ódio mais uma vez o consumiu. Ele estava inconformado por ela aparecer em público em Maraban, usando apenas uma lingerie floral com uma corrente de pedras preciosas no pescoço, que realçavam os seios fartos, a pele delicada e as suas curvas perfeitas.

Ele viu os rapazes da equipe de fotografia se movendo em volta de Sopphi, oferecendo-lhe água, sucos e petiscos, arrumando-lhe o cabelo e retocando sua maquiagem, e perguntou-se maldosamente qual deles seria o felizardo de ter o privilégio de usufruir daquele belo e magnífico corpo, quem seria o desgraçado que teria total acesso a sua cama. Afinal, podia viver com Thomas Star, mas os tabloides da Inglaterra revelavam claramente que havia tido vários relacionamentos. Ela podia ser tudo, menos uma mulher fiel. Era possível que ela e Thomas tivessem, de comum acordo, um relacionamento aberto, mas não era isso propriamente, tampouco o conceito de relacionamento aberto, que impressionava Saaid; ele não dormia com qualquer mulher, nem mesmo depois que se divorciara e ficara livre para fazer isso, se quisesse. Sua ex-esposa era uma mulher volúvel, pensou com expressão séria e amargurada.

Casar-se com Sopphi fora o maior erro que cometera na vida, e as consequências foram brutais. Durante um ano, suportará um sofrimento indescritível.

Sopphi tinha uma dívida incomensurável para com ele, por ter feito de sua vida um verdadeiro inferno durante doze meses.

Somado a isso, havia os milhões que recebera dele desde que a farsa do casamento deles chegara ao fim com um divórcio. Saaid tinha todo o direito de se sentir ultrajado e hostil. E o fato de ter decidido vir para Maraban para fotografar e filmar sem a devida autorização a colocava à mercê de Saaid; ela e sua preciosa carreira em ascensão.

Sempre foi assim. De algum jeito sobrenatural, Sopphi sempre sentia quando Saaid a olhava, mesmo ela sendo tão indiferente, e daquela vez, mesmo com todo aquele tempo e distância, não foi diferente.

Saaid notou isso quando ela parou subitamente e olhou em volta. Os olhos dela queimaram em sua direção. Brilhantes, grandes e intensos. Seu peito ardeu, e diante de tudo, escolheu a raiva para se apegar. Era mais fácil odiá-la, era mais fácil sentir raiva, do que dor, do que mágoa, do que tristeza.

Ele baixou os binóculos. Nada mais seria igual entre eles, pensou, irritado.

Ao longo de sua vida, raramente Saaid fizera o que quisera, pela necessidade de sempre levar em consideração as necessidades dos outros e dar prioridade a elas. Por que, pelo menos uma vez, não colocar a sua própria vontade em primeiro lugar?

Ele já tinha verificado a programação de Sopphi, e ela partiria de Maraban dentro de algumas horas. Tomar conhecimento desse fato só deixava Saaid ainda mais determinado. Ele tomou sua decisão com a mesma firmeza que anos antes o levara a se casar com uma estrangeira sem antes consultar o pai. E nada o faria mudar de ideia, nem mesmo a desconfortável inquietação que crescia em seu íntimo.