A Herança dos Calloni

A noite caía suave sobre a mansão dos Calloni. As janelas abertas deixavam o aroma de lavanda invadir a sala principal, onde uma lareira crepitava, lançando sombras dançantes pelas paredes de pedra. No centro do ambiente, Lucca estava sentado em um dos sofás de couro, com uma taça de vinho nas mãos e os olhos voltados para a lareira. Ao seu lado, Luiza, sua mãe, sorria com ternura, os dedos entrelaçados aos de Ricardo Calloni, o homem que, por anos, foi tanto Dom quanto marido, sem jamais permitir que um papel anulasse o outro.

Ariela entrou na sala quase correndo, os cabelos longos soltos e os olhos brilhando de alegria. Assim que viu o irmão, soltou um grito animado e pulou no sofá ao lado dele, jogando os braços ao redor do pescoço de Lucca.

— Finalmente! Dois anos, Lucca! Você tem ideia do que é isso? — ela disse, rindo e chorando ao mesmo tempo.

Lucca riu e retribuiu o abraço, apertando-a com carinho.

— Também senti sua falta, Ari. Muito. Você cresceu mais nesse tempo, hein?

— Cresci esperando esse dia. Você faz falta. A casa ficou grande demais sem você.

— E você continua sendo minha irmã caçula favorita.

— Também sou a única, idiota! — ela disse, dando um leve tapa no ombro dele e rindo.

Luiza os observava com os olhos marejados. Ver os filhos unidos era tudo que ela sempre desejou. Ricardo serviu-se de mais vinho e se recostou, observando a cena com um orgulho silencioso.

— Família unida. Isso é o que mais importa — ele disse, a voz firme e emocionada. — E é por isso que chegou a hora.

Lucca o encarou com atenção.

— Hora de quê?

Ricardo apoiou os cotovelos nos joelhos, entrelaçando as mãos.

— De você assumir seu lugar. Eu te preparei durante toda a sua vida, e os dois últimos anos foram essenciais. Agora é o momento certo. A máfia Calloni precisa de um novo Dom. E esse Dom é você.

Lucca engoliu seco. Era um momento que ele sabia que chegaria, mas agora, ouvindo da boca do pai, tudo parecia mais real, mais pesado — e, ao mesmo tempo, mais justo.

— E você, pai? O que vai fazer?

Ricardo olhou para Luiza e sorriu.

— Eu vou me dedicar a essa mulher incrível. Passamos anos vivendo entre códigos, decisões e sombras. Agora quero mais luz. Quero viajar, quero cuidar do que construímos juntos... e quem sabe... aumentar a família.

Ariela arregalou os olhos e depois soltou uma gargalhada.

— Vocês estão pensando em ter outro bebê? Sério?

Luiza deu um leve tapa no braço da filha.

— É só uma ideia. Ainda está no campo dos sonhos... mas não é impossível.

— Eu voto a favor! — disse Lucca, levantando a taça. — Quanto mais Calloni, melhor.

— Imaginem só, uma irmãzinha agora. Ou um irmão. Seria uma loucura boa. — Ariela girou no sofá com os pés, empolgada.

Lucca se levantou, foi até os pais e os abraçou ao mesmo tempo, Ariela veio atrás e se juntou ao abraço.

— Seria incrível ter um irmão ou irmãzinha — disse Lucca. — Já pensou, Ariela? Ajudar a cuidar de um bebê de novo?

— Eu já me vejo fazendo tranças ou ensinando a andar de bicicleta. Vai ser divertido!

O riso geral se espalhou pela sala. A leveza daquele momento contrastava com o mundo pesado da máfia, mas ali, no seio da família, havia paz. Amor genuíno. União.

Depois do jantar — uma massa fresca preparada por Luiza e um tiramisù que Ariela insistiu em montar com a ajuda do irmão — os quatro voltaram à sala, agora iluminada apenas pelas luzes suaves das luminárias. Ricardo se levantou com um caderno de anotações e entregou-o a Lucca.

— Vamos falar sobre os próximos passos. Ser Dom é mais do que tomar decisões. É compreender alianças, manter códigos, proteger os seus e saber quando agir com diplomacia ou com firmeza.

Lucca folheou o caderno. Estava cheio de anotações, mapas, códigos e nomes.

— Você vai continuar me orientando?

— Claro. Mas agora, a última palavra será sua. Começaremos pelos arquivos.

— Os arquivos?

Ricardo assentiu.

— Amanhã cedo. Vamos até a sede da máfia. Há documentos, contratos, registros e segredos guardados por décadas. Eles precisam ser reorganizados. Já faz mais de vinte e sete anos que aqueles arquivos não são colocados em ordem. É a base de tudo.

— Vinte e sete anos? — Ariela arregalou os olhos. — Deve ter até poeira histórica por lá.

— Tem muito mais que poeira — respondeu Ricardo, com um meio sorriso. — Tem verdades. Tem histórias que moldaram quem somos. E agora, Lucca, são suas raízes. Sua herança.

Lucca respirou fundo, fechou o caderno e olhou para o pai.

— Eu estou pronto.

Ricardo assentiu.

— Então amanhã começamos. E faremos isso juntos, como sempre fizemos tudo nessa família. Um passo de cada vez. Mas com coragem.

Luiza sentou-se ao lado do marido, entrelaçando os dedos aos dele.

— Eu confio em você, meu amor. E confio que o Lucca saberá conduzir com honra o legado da nossa família. Ele tem o coração do pai e a firmeza que aprendeu comigo.

Ariela se esticou no tapete, virada para cima, observando o teto com as mãos cruzadas atrás da cabeça.

— Já pensou? Lucca sendo Dom e eu, futura tia. Não sei o que me assusta mais. — Ela riu e depois se virou para o irmão. — Você vai continuar sendo meu irmão babaca ou vai virar chefe mafioso autoritário?

— Vou continuar sendo seu irmão babaca. Com poder.

— Aí sim. — Ariela gargalhou, jogando uma almofada nele.

Lucca a pegou no colo e a girou, rindo alto, como quando eram pequenos.

— Eu senti tanto sua falta, Ari...

— Eu também. Dois anos foi demais.

A noite seguiu tranquila, com conversas sobre o passado e planos para o futuro. Ariela não desgrudava do irmão e, a certa altura, se aninhou no sofá ao lado dele, como quando eram crianças. Lucca passou o braço ao redor dela e sorriu.

— Você sempre foi meu raio de sol, Ari. Nunca deixe de brilhar.

— E você sempre foi meu herói. Nunca deixe de lutar.

Naquela noite, a Villa Calloni dormiu em paz. Entre laços fortalecidos, planos traçados e a certeza de que a nova geração estava pronta para escrever sua história — com honra, coragem e amor.

O amanhecer traria novos desafios. Mas por enquanto, havia apenas gratidão e a certeza de que a família era, e sempre será, o maior legado dos Calloni.

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