Marca visível

A flor branca repousava agora sobre a mesa de cabeceira, ao lado da cama onde Elena se revirava, incapaz de encontrar repouso. A chuva seguia, fina, persistente, tingindo a noite de um cinza úmido e silencioso.

Ela não sabia explicar, mas aquela flor parecia pesar mais que deveria.

Como um presságio.

Como um convite.

Ou uma marca... invisível, mas que ardia sobre sua pele.

Levantou-se no meio da madrugada, foi até a janela e afastou a cortina com a ponta dos dedos, encarando a rua deserta, que parecia dormitar sob a névoa densa. O coração apertou. Não havia ninguém ali — mas Elena sabia. Ou melhor: sentia.

Sentia-o.

Como uma presença que não precisava de corpo para existir, que se insinuava através do vidro, atravessava paredes, colava-se à sua pele.

Respirou fundo e fechou a cortina, mas não conseguiu se afastar. Ficou ali parada, com os olhos fechados, tentando conter o arrepio que insistia em subir por sua espinha.

Lá fora, na escuridão, ele a observava mais uma vez.

Dante.

Imóvel.

Silencioso.

Invisível, mas tão presente quanto a própria chuva.

Ele acompanhava cada gesto, cada hesitação, como quem assiste a uma peça cujo final já conhece, mas não quer apressar.

Sabia que Elena estava perto. Muito perto.

E, naquela noite, a deixou em paz.

Por enquanto.

Na manhã seguinte, o céu amanheceu opaco, e Elena se levantou exausta, como se não tivesse dormido. A flor permanecia no mesmo lugar, mas agora ela a evitava com o olhar, como se a simples visão fosse capaz de disparar em seu peito aquela angústia que não sabia nomear.

No trabalho, tudo parecia igual — o barulho das xícaras, as vozes abafadas, o aroma do café se misturando ao cheiro úmido da rua.

Até ele entrar.

Dante.

Outra vez.

Elena quase deixou a bandeja cair quando o viu.

Mas, desta vez, ele não foi até o balcão.

Sentou-se na mesa de sempre, no canto, e ficou ali, imóvel, com as mãos cruzadas sobre o tampo de madeira, como se fosse parte do mobiliário.

E observava.

Apenas isso.

Elena tentou se ocupar, servindo clientes, recolhendo pratos, fingindo não perceber o olhar dele que a atravessava de ponta a ponta.

Mas era inútil.

Podia senti-lo, intenso e silencioso, como a chuva que voltava a cair do lado de fora, engrossando aos poucos, inundando as calçadas e borrando as luzes da cidade.

Quando finalmente criou coragem, aproximou-se da mesa com o bloquinho nas mãos.

— O... de sempre? — perguntou, a voz um pouco trêmula.

Dante ergueu os olhos lentamente, fixando-a de maneira tão profunda que Elena precisou desviar o olhar.

Ele sorriu, discreto, e respondeu:

— Hoje... não.

Elena franziu o cenho, surpresa. Ele inclinou-se levemente, diminuindo a distância entre os dois, e disse, num tom baixo, quase cúmplice:

— Hoje... quero que escolha por mim.

Ela o encarou, confusa, sem saber se aquilo era apenas uma brincadeira ou... um teste.

— Não sei o que você gosta...

Ele inclinou a cabeça, os olhos ainda presos nos dela.

— Acho que sabe, Elena.

E então se recostou na cadeira, como quem dá tempo para que ela processe aquilo.

Elena sentiu o estômago revirar, o coração acelerar, as mãos suarem. Virou-se apressada, caminhando até o balcão, onde preparou o café sem sequer perceber o que fazia.

Quando voltou, colocou a xícara à frente dele, evitando o toque, evitando o olhar.

Mas Dante segurou o pulso dela com firmeza e suavidade, impedindo que ela se afastasse.

O choque percorreu o corpo de Elena como uma faísca.

— Obrigado... — disse ele, soltando-a logo em seguida.

Ela se afastou, respirando com dificuldade.

Por que... por que ele fazia aquilo?

Por que a paralisava daquele jeito?

Sentia-se presa numa armadilha da qual não sabia — ou não queria — escapar.

Naquela tarde, choveu sem parar. Quando o expediente terminou, Elena colocou o casaco e se preparou para enfrentar a rua, mas, ao abrir a porta da cafeteria, o coração quase parou.

Lá, sobre o mesmo parapeito da véspera... uma nova flor.

Desta vez, não branca, mas vermelha.

Vibrante.

Viva.

Molhada pela chuva, como uma ferida aberta.

Elena olhou em volta, o olhar desesperado tentando atravessar a cortina de água que caía incessante.

Nada.

A rua vazia.

Mas sabia que ele estivera ali.

Que ele estava ali.

Afastou a franja molhada do rosto e pegou a flor, apertando-a com força, como quem tenta acordar de um pesadelo — ou se agarrar a ele.

E então, sentiu.

Na gola do casaco, discretamente presa, um novo bilhete.

As mãos tremiam enquanto desdobrava o papel, já encharcado.

Letras inclinadas, precisas, inconfundíveis:

"Estamos cada vez mais perto."

O coração de Elena disparou, as pernas vacilaram.

Olhou em volta mais uma vez.

Mas, na sombra, em algum lugar onde ela não podia ver... ele sorria.

Dante.

Imóvel, silencioso, satisfeito.

A marca já estava nela.

A marca invisível.

E Elena... começava a perceber.

Começava, talvez, a aceitar.

Mesmo que ainda não soubesse o que, de fato, significava.

Mas ele sabia.

E a chuva... seguiria caindo.

Fina.

Persistente.

Testemunha silenciosa do jogo que, agora, já não tinha mais volta.

Nem para ela.

Nem para ele.

Nem para o desejo que, cada vez mais, os consumia.

Juntos.

E irremediavelmente.

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Comments

Cata_UchihaUzumaki

Cata_UchihaUzumaki

Adorei a mensagem que a história passou. Parabéns, autora!

2025-05-27

2

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Capítulos
1 Personagens
2 O encontro
3 Sinais
4 A primeira festa
5 Marca visível
6 O toque que faltava
7 O primeiro risco
8 A presença invisível
9 A primeira fissura
10 Reflexos da escuridão
11 Predadores em silêncio
12 O beijo que não aconteceu por inteiro
13 O jogo da fome
14 Prisioneiros do desejo
15 Nas sombras do passado
16 Jogos de sombras e desejos
17 Sombras entrelaçadas
18 Sombras entrelaçadas continuação
19 Labirinto de sombras e desejo
20 O fogo que queima na escuridão
21 O fogo que queima na escuridão
22 No limite do desejo e do medo
23 Obsessão que mata
24 Sangue e obsessão
25 Entre o medo e a paixão
26 Laços de sombra e fogo
27 Fogo e sombras entrelaçadas
28 A beira do abismo
29 O abismo Entre nós
30 O abismo Entre nós
31 Entre sombras e promessas
32 No limite do desejo e do Caos
33 Sussurros na escuridão
34 Entre a luz e. A escuridão
35 Festa
36 Festa continuação
37 Marcas invisíveis
38 Corredor
39 O sabor amargo da verdade
40 Entre A morte e o desejo
41 Dois abismos
42 Sombras que se procuram
43 O Lobo entre as sombras
44 Máscaras e pecados
45 Renascida em chamas
46 Segredos de um coração partido
47 Ecos de um segredo
48 Um encontro inesperado
49 Silêncios que ferem mais que palavras
50 O reconhecimento que queima
51 Ecos que nunca foi esquecido
Capítulos

Atualizado até capítulo 51

1
Personagens
2
O encontro
3
Sinais
4
A primeira festa
5
Marca visível
6
O toque que faltava
7
O primeiro risco
8
A presença invisível
9
A primeira fissura
10
Reflexos da escuridão
11
Predadores em silêncio
12
O beijo que não aconteceu por inteiro
13
O jogo da fome
14
Prisioneiros do desejo
15
Nas sombras do passado
16
Jogos de sombras e desejos
17
Sombras entrelaçadas
18
Sombras entrelaçadas continuação
19
Labirinto de sombras e desejo
20
O fogo que queima na escuridão
21
O fogo que queima na escuridão
22
No limite do desejo e do medo
23
Obsessão que mata
24
Sangue e obsessão
25
Entre o medo e a paixão
26
Laços de sombra e fogo
27
Fogo e sombras entrelaçadas
28
A beira do abismo
29
O abismo Entre nós
30
O abismo Entre nós
31
Entre sombras e promessas
32
No limite do desejo e do Caos
33
Sussurros na escuridão
34
Entre a luz e. A escuridão
35
Festa
36
Festa continuação
37
Marcas invisíveis
38
Corredor
39
O sabor amargo da verdade
40
Entre A morte e o desejo
41
Dois abismos
42
Sombras que se procuram
43
O Lobo entre as sombras
44
Máscaras e pecados
45
Renascida em chamas
46
Segredos de um coração partido
47
Ecos de um segredo
48
Um encontro inesperado
49
Silêncios que ferem mais que palavras
50
O reconhecimento que queima
51
Ecos que nunca foi esquecido

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