Desde pequeno, Lucas sabia que sua realidade era diferente da dos primos. Morava com os pais em uma casa simples, num bairro afastado do centro. A rua de terra batida levantava poeira quando o vento soprava mais forte, e a garagem apertada mal comportava o carro da família: um Celta prata, já com a pintura gasta e o para-choque meio solto.
Mas apesar das limitações, Lucas nunca sentiu falta de amor. Seus pais, João e Marta, eram trabalhadores. João fazia bicos como pedreiro e Marta limpava casas. Sempre davam um jeito de colocar comida na mesa, mesmo que às vezes fosse só arroz, ovo e um suco artificial barato.
O que mais chamava atenção de Lucas era quando os tios chegavam para visitar: Marcelo e Fabiana. Eles vinham num SUV preto brilhando e com duas motos esportivas que sempre chamavam a atenção da rua inteira. Vestiam roupas de marca, falavam de viagens, restaurantes, compras em sites gringos. Lucas ouvia tudo aquilo de olhos arregalados, como se fosse outro mundo. E era mesmo.
— Tio Marcelo, quanto você ganha? — perguntou Lucas um dia, curioso.
— Uns 24 mil por mês, mais ou menos — respondeu ele, como quem fala de algo banal.
Aquela resposta ficou ecoando na mente de Lucas. Vinte e quatro mil. Era como mágica. Parecia dinheiro de filme. "Um dia eu vou ser que nem eles", pensou. Mas a escola não ajudava muito.
Lucas nunca foi um aluno brilhante. Tirava notas medianas, às vezes passava raspando. Os professores diziam que ele tinha potencial, mas que não se esforçava. A verdade é que Lucas não via sentido em decorar fórmulas ou fazer redações sobre temas que não entendia. Mas uma coisa sempre o diferenciou: o inglês.
Desde os 10 anos, Lucas gostava de ver vídeos no YouTube com legendas em inglês, jogava games online com gringos e usava aplicativos pra aprender novas palavras. Era como um vício bom. Ele não sabia ainda, mas aquilo seria seu maior trunfo no futuro.