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Entre o Passado e o Desejo

Prefácio — Entre o Passado e o Desejo

Existem feridas que o tempo não apaga.

Existem promessas que o coração insiste em cobrar.

E existem encontros que mudam o curso de uma vida inteira.

Essa não é apenas a história de uma mulher ferida, nem de um homem que acreditava ser incapaz de amar. É a história de dois mundos quebrados que se chocam e, entre os destroços, encontram algo que nenhum deles buscava — mas que sempre precisaram.

Helena Duarte acreditava que amor era sinônimo de dor. Que ser escolhida nunca lhe seria permitido. Até que foi empurrada para um casamento arranjado, onde descobriu não apenas um marido improvável, mas um espelho de sua própria solidão.

Enrico Castellani, frio, calculista e marcado pelo peso de um legado, nunca acreditou que houvesse espaço em sua vida para sentir. Até que uma mulher entrou em sua casa como substituta — e, sem pedir licença, ocupou cada espaço de sua alma.

Entre segredos do passado e o desejo incontrolável que cresce a cada página, essa história fala sobre recomeços, sobre enfrentar as sombras e, sobretudo, sobre a escolha de amar apesar de tudo.

Esta não é uma narrativa de perfeição. É uma narrativa de sobrevivência. De dor que se transforma em força. De um amor que, nascido em meio à obrigação, floresce como a mais inesperada das liberdades.

Seja bem-vindo a Entre o Passado e o Desejo.

Aqui, cada página é um risco.

E cada risco, a promessa de que o amor pode, sim, ser suficiente.

Capítulo 1 — O Peso do Ontem

Helena Duarte estava acostumada ao silêncio.

Não aquele silêncio acolhedor, que envolve como um cobertor numa noite fria, mas o silêncio pesado, sufocante, que denuncia a ausência de tudo: de afeto, de escolha, de pertencimento.

Aos vinte e três anos, ela já havia aprendido demais sobre perdas. Crescera como a sombra da filha "perfeita" que os pais idolatravam, a segunda opção de uma família que só enxergava nela um peso, nunca um orgulho. Sua existência era uma constante lembrança de que não era o bastante. As palavras ásperas, as comparações injustas, a falta de carinho… tudo isso a moldara como uma mulher resiliente, mas também cansada.

Naquela manhã, ao arrumar a mesa de café em sua pequena cozinha de azulejos gastos, Helena observava o relógio como quem contava os minutos para um destino inevitável. O cheiro de pão requentado se espalhava pelo ar, mas não havia apetite. Apenas ansiedade.

O celular vibrou.

Uma mensagem curta, fria, direta:

"Hoje, às 20h. Esteja pronta. É importante para a família."

Helena suspirou. Sabia muito bem o que aquelas palavras significavam. Não era um convite. Era uma ordem. Assim havia sido sempre. A “família” decidia. Ela apenas obedecia.

O jantar daquela noite era um daqueles encontros formais em que os sorrisos pareciam moldados sob medida, tão falsos quanto o brilho das joias que adornavam as mulheres à mesa. Helena sentou-se em silêncio, ouvindo as conversas sobre negócios, ações, fusões. Não fazia parte daquele mundo, mas sua presença era exigida como parte da encenação.

Foi quando o anúncio veio, na voz firme do seu pai, que não permitia interrupções:

— Helena se casará com Enrico Castellani. O contrato está fechado.

O choque atravessou o corpo dela como uma corrente elétrica. O coração bateu descompassado, os olhos arregalaram-se, mas ninguém à mesa pareceu notar. Ou talvez notassem, mas fingissem não ver. Porque, para eles, o que ela sentia era irrelevante.

— Pai, eu… — ela tentou protestar, mas foi interrompida pelo olhar duro da mãe.

— Não é uma escolha, Helena. É um dever.

Um dever.

Como se sua vida, seu corpo, seus sonhos fossem fichas de negociação em um jogo em que ela nunca tivera vez.

Quando deixou o jantar, Helena sabia que precisava falar com Patrick.

Eles estavam juntos havia quase dois anos. Ele não era o namorado perfeito, mas sempre fora o porto onde ela acreditava poder descansar das exigências da família. Não era paixão avassaladora, mas era companhia. E naquele momento, mais do que nunca, ela precisava sentir que não estava sozinha.

O coração pesava enquanto caminhava pela rua estreita do bairro onde ele morava. As luzes amarelas dos postes iluminavam a calçada irregular, e cada passo parecia ecoar sua ansiedade. As palavras martelavam em sua mente: “Casamento arranjado... contrato fechado...” Como ela poderia contar isso a Patrick? Como poderia explicar que, em poucos meses, estaria casada com outro homem?

Respirou fundo diante da porta. Bateu uma vez. Duas.

Ninguém respondeu. Mas o som abafado de risadas chegou até ela pela janela entreaberta. Risadas familiares. Uma voz masculina grave — a dele. Uma voz feminina... doce, um pouco arrastada. Reconhecível demais.

Helena franziu o cenho. Empurrou devagar a porta, que cedeu sem resistência. O coração acelerou. Passou pelo corredor estreito, cada passo mais pesado do que o anterior, até que parou à entrada da sala.

E ali, diante de si, a cena que a rasgaria por dentro:

Patrick estava sentado no sofá, o sorriso largo, as mãos firmes segurando a cintura de uma jovem que ria com a cabeça jogada para trás. Helena não precisou de mais do que um segundo para reconhecer os cabelos castanhos perfeitos, o perfume caro que sempre a fazia se sentir diminuída.

Era sua irmã.

Bianca.

O riso congelou nos lábios da outra quando percebeu a presença de Helena. Patrick arregalou os olhos, mas não se afastou. Pelo contrário, pareceu hesitar, como se não houvesse motivo para esconder.

— Helena... — Bianca começou, ajeitando-se no colo dele, o sorriso já transformado em deboche. — Eu... não esperava você aqui.

Helena sentiu as pernas tremerem. O corpo inteiro parecia querer desabar, mas ela se manteve de pé, mesmo que a respiração saísse em soluços curtos.

— Patrick... o que é isso?

Ele levantou-se devagar, sem conseguir encará-la nos olhos. Passou a mão pelos cabelos, nervoso, e disse apenas:

— Helena, me desculpa... mas eu não podia mais fingir.

— Fingir? — a voz dela soou mais alta, rachada de incredulidade. — Fingir o quê? Que me amava? Que eu era suficiente?

Bianca riu baixinho, sarcástica.

— Sempre soube que ele não era pra você, irmãzinha. Você nunca soube... manter um homem. Patrick merece alguém à altura.

As palavras bateram em Helena como facas.

Se tivesse forças, teria gritado. Se tivesse orgulho, teria ido embora sem uma palavra. Mas só conseguiu ficar ali, encarando os dois, com a alma sangrando em silêncio.

— Eu vim até aqui pra dizer que vou me casar — ela murmurou, a voz embargada. — Arranjaram um marido pra mim. E eu achei que precisava te contar... porque acreditava que você era a única parte da minha vida que ainda era minha.

Os olhos marejados se ergueram para Patrick, que desviava o olhar como um covarde.

— Mas agora eu vejo que não tenho mais nada. Nem a mim mesma.

Virou-se antes que eles pudessem responder. As lágrimas desceram livremente quando a porta bateu atrás de si. Caminhou pela rua sem rumo, os passos trôpegos, o coração despedaçado. Não sabia o que a aguardava no futuro, mas uma certeza queimava em seu peito:

Não havia mais passado a que pudesse se agarrar.

Agora, só restava seguir em frente.

Capítulo 2 — O Homem de Gelo

A cidade nunca dormia.

Arranha-céus se erguiam como gigantes de vidro e aço, refletindo as luzes artificiais de uma capital que respirava pressa. No coração desse império de concreto, erguia-se a sede da Castellani Corporation, um conglomerado que movia bilhões e definia o destino de setores inteiros da economia. E, no centro de tudo, estava ele: Enrico Castellani.

Com apenas trinta anos, Enrico já havia herdado o título que muitos julgavam cedo demais: CEO. Mas não era apenas o sobrenome que sustentava sua posição — era a frieza calculada, a inteligência afiada e a ausência completa de indulgência.

Onde outros viam sentimentos, ele via fraquezas. Onde outros buscavam companhias, ele preferia o silêncio da própria solidão.

Naquela manhã, sua rotina seguia o mesmo ritmo impecável.

O relógio marcava seis horas quando ele terminou a corrida matinal em sua esteira particular. O corpo definido era resultado não de vaidade, mas de disciplina. Enrico não acreditava em excessos. Não acreditava em nada que o desviasse de sua missão: manter e expandir o império que recebera do pai, agora doente e afastado dos negócios.

Sentou-se à mesa do café, onde relatórios o aguardavam. O olhar verde, gélido, deslizava pelas páginas com precisão, como quem devora dados e transforma em estratégias.

Ao seu redor, a mansão Castellani parecia mais um palácio moderno: mármore, vidro e silêncio absoluto. Nada nele era improvisado. Nada nele era vulnerável.

Ou quase nada.

Mais tarde, ao entrar em sua sala no último andar da empresa, Enrico foi recebido por sua irmã mais nova, Giuliana Castellani. Ao contrário dele, Giuliana era expansiva, vibrante, sempre buscando quebrar a rigidez do irmão.

— Bom dia, homem de gelo — ela provocou, deixando-se cair na poltrona diante da mesa dele. — Está preparado para conhecer sua futura esposa?

Ele ergueu os olhos do relatório, impassível.

— Não é uma esposa. É um contrato. Um acordo que favorece os dois lados.

— Claro, claro... — Giuliana riu, cruzando as pernas. — Mas, convenhamos, Enrico. Você vai se casar. E por mais que tente parecer indiferente, todos sabemos que isso mexe com você.

Enrico não respondeu de imediato. Encostou-se na cadeira, avaliando a irmã.

No fundo, ela tinha razão. Não porque houvesse expectativa de romance — isso ele descartava de imediato —, mas porque a ideia de dividir sua vida, mesmo que de forma protocolar, com alguém, feria seu instinto de isolamento. Ele aprendera cedo que sentimentos eram fraquezas. E agora teria de conviver com uma mulher estranha, imposta, dentro de sua casa.

— Contanto que ela saiba respeitar limites, não haverá problema — disse por fim, encerrando o assunto.

Mas, ainda assim, uma inquietação que não queria admitir latejava em seu peito.

Do outro lado da cidade, Helena Duarte encarava seu reflexo no espelho do quarto. O rosto ainda carregava o peso da noite anterior, quando descobrira a traição de Patrick com sua irmã. Os olhos vermelhos denunciavam lágrimas que ela preferia esquecer.

Sentia-se partida.

Mas, ao mesmo tempo, havia uma estranha clareza. Patrick, com sua covardia, apenas confirmara o que ela já sabia: seu destino não estava nas próprias mãos. Nunca estivera. Agora, mais do que nunca, sua vida era um tabuleiro movido pelas ambições da família.

Sobre a cama, um vestido de seda azul-marinho a esperava. Fora escolhido por sua mãe, como sempre. O tecido parecia frio ao toque, pesado como as obrigações que carregava. Helena suspirou. Aquela noite marcaria o início de algo maior — um encontro com um homem de quem só ouvira histórias. Um homem que todos descreviam como implacável.

— Enrico Castellani... — murmurou, como se o nome tivesse gosto amargo na boca.

O restaurante cinco estrelas escolhido para a reunião era discreto, mas imponente. Lustres de cristal iluminavam as mesas privadas, onde negócios e alianças se firmavam longe dos olhos curiosos. Helena entrou acompanhada dos pais, o coração acelerado, as mãos trêmulas escondidas no colo.

E então o viu.

Enrico Castellani já estava sentado. A postura impecável, o terno sob medida em tom escuro, a expressão impenetrável. Os olhos verdes a fitaram com intensidade — não de curiosidade, mas de avaliação. Como se estivesse analisando um relatório, não uma pessoa.

Helena engoliu em seco. Sentiu-se pequena sob aquele olhar. Mas não desviou. Não depois de tudo que já enfrentara. Mesmo com a voz trêmula por dentro, manteve-se firme por fora.

Enrico inclinou levemente a cabeça, um gesto mínimo de cumprimento.

— Helena Duarte — disse ele, a voz baixa, grave, com um tom que parecia ao mesmo tempo educado e indiferente. — Finalmente nos conhecemos.

Ela assentiu, sentando-se diante dele.

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