ALINA
Estava folheando o jornal quando ouvi o som da torradeira. O pão tinha pulado, quentinho e dourado.
Fui até a cozinha, preparei meu café da manhã e arrumei tudo direitinho na mesa. O cheirinho do café recém-passado invadiu o ambiente, e eu respirei fundo antes de pegar o jornal de novo e continuar a leitura.
Mas assim que meus olhos bateram na manchete, senti meu estômago revirar:
Polícia encontra dois novos corpos — suspeita de envolvimento com a Máfia.
A Máfia.
Por algum motivo que ninguém entende, eles decidiram aparecer justo aqui, nessa cidade pequena e sem graça.
Desde então, deixaram todo mundo com medo até da própria sombra. Ninguém sabe quem são, nem como se parecem.
Mas o que todo mundo sabe é que eles são frios, cruéis e não pensam duas vezes antes de matar quem aparece no caminho.
Depois que terminei de comer, lavei a louça. Eu simplesmente não consigo sair de casa e deixar tudo bagunçado. Voltei pro quarto pra começar a me arrumar pro trabalho. Já passava das 11h30 da manhã.
Trabalho como garçonete em um restaurante chamado Le Clair De Lune. O nome sempre me lembra uma canção de ninar francesa que minha mãe cantava quando eu era pequena e tinha medo de dormir.
Saudade da minha mãe.
Ela era o meu farol. A luz da minha vida. Quando ela se foi, parece que uma parte de mim se apagou também.
O mundo ficou escuro sem ela. Eu só queria que as pessoas que ainda têm os pais vivos entendessem o quanto isso é valioso. Que aproveitassem cada segundo, cada abraço, cada momento.
Eu, infelizmente, nunca tive esse luxo. Nunca tive a chance de guardar meus pais comigo. Porque, mesmo que tecnicamente meu pai ainda esteja vivo... pra mim, ele morreu há muito tempo.
Fugi de casa aos quinze anos. E tudo começou quando minha mãe partiu. Ele mudou.
Começou a beber. Me ignorava, me agredia, me fazia trabalhar como se eu fosse adulta. Se eu voltasse pra casa sem dinheiro, ele trancava a porta na minha cara. Passei várias noites frias de inverno dormindo na porta, chorando até soluçar, implorando pra ele me deixar entrar. Mas era inútil. Ele não era mais o homem que eu conhecia. Eu só tinha nove anos.
Os anos foram passando, e eu fui aguentando. Cada agressão. Cada desprezo. Mas depois daquela noite... depois do que ele tentou fazer... eu soube que não dava mais.
Eu lembro que estava exausta, porque ele me obrigou a limpar a casa inteira sozinha. Voltei pro meu quarto, moída de cansaço. Mas, às três da manhã, fui acordada por vozes abafadas e uma discussão estranha.
Me levantei, encostei o ouvido na porta... e o que escutei naquela noite ainda me assombra até hoje.
Flashback
— Então... cadê ela? — perguntou o primeiro homem.
— Fala baixo! Vai acabar acordando ela — sussurrou o segundo.
— Pera aí... a gente vai fazer isso com ela dormindo? — a mesma voz de antes questionou.
— Não, você pode acordar. A gente amarra ela na cama — respondeu meu pai. Eu reconheceria aquela voz nojenta em qualquer lugar.
— Eu quero ser o primeiro. Sempre quis tirar a virgindade de alguém.
— Por que diabos você tem que ser o primeiro?
— Porque eu tô pagando mais pro pai dela.
— Carson, te dou mais trezentos dólares — disse o homem, falando com meu pai.
— Por que vocês dois não vão logo primeiro? Um vai na frente, o outro atrás. Fechado? — meu pai sugeriu, como se estivesse vendendo uma mercadoria.
— Fechado.
— Por mim, tudo certo.
Lembro das minhas pernas tremendo. Meu coração disparou. Um pânico tomou conta de mim. Eu não sabia o que fazer. Só sabia que meu próprio pai ia deixar aqueles homens me estuprar. Eles iam me destruir. No corpo e na alma.
De repente, o barulho cessou. O silêncio só fez minha adrenalina subir ainda mais. Calcei os chinelos, beijei o colar da minha mãe — aquele que eu nunca tirei. Aquele que ainda uso até hoje. Abri a janela e pulei.
Logo ouvi os gritos do meu pai. Ele estava furioso. Claro que estava. Eu tinha acabado com o plano nojento e monstruoso dele.
Fim do flashback
Nunca mais vi aquele homem. Fui parar num abrigo e morei em lares temporários até completar dezoito anos. Foi aí que tive acesso ao testamento da minha mãe. Descobri que ela tinha deixado um apartamento no meu nome.
É onde moro hoje.
E o meu pai? Nem sei o que aconteceu com ele. Talvez ainda seja o mesmo lixo abusivo de antes. Talvez tenha morrido de cirrose. Sinceramente? Prefiro não pensar nisso. Não vale meu tempo.
Só sei de uma coisa: ele me fez perder a fé nos homens. Ele ainda me assombra. Aparece nos meus piores pesadelos. Nem pro meu pior inimigo eu desejaria ter um pai como o meu.
Enquanto caminho até o trabalho, o frio me obriga a apertar mais o casaco e cruzar os braços, tentando manter o mínimo de calor no corpo.
Ignoro os olhares sujos e os assobios dos porcos que infestam as calçadas.
“E aí, gostosa... chega mais que eu te mostro um negócio bom.”
“Menina, você é mais gostosa que mingau de aveia quente!” disse outro, rindo com seus dentes amarelados. (aff)
Abaixo a cabeça e acelero o passo, querendo sair o mais rápido possível daquele mar de lixo ambulante que chamam de "homens".
Sério, qual é o objetivo desse tipo de abordagem? Não é fofo, não é charmoso, muito menos aceitável. É nojento. É repulsivo. E completamente fora de hora. A chance de uma mulher sorrir pra um homem depois de levar uma cantada dessas é exatamente zero.
Quer dizer... a não ser que ela esteja indo na direção dele com um tapa na mão ou um chute onde o sol não bate.
Nesse caso... até que seria divertido.
— Alina, até que enfim, hein! — minha colega de trabalho, Carina, me cumprimentou assim que tirei o casaco e pendurei no cabide de madeira do vestiário dos funcionários do restaurante.
— Oi, Carina. Tudo certo com você hoje?
— Tô ótima. Mas me conta... por que chegou atrasada?
— Quase não consegui dormir. Meu vizinho idiota resolveu passar a noite “divertindo” a convidada dele. E as paredes são finas, sabe como é — respondi, enquanto amarrava o avental na cintura.
— Ooooohhh... ouviu alguma coisa quente? — ela fez uma carinha maliciosa.
— Você é nojenta — respondi, rindo.
— E você é careta. Alina, você devia ter aproveitado o momento! Aquilo foi o mais perto que você já chegou de um pinto molhado — falou, com aquele tom brincalhão de sempre.
Revirei os olhos e balancei a cabeça.
— Sem ofensa, tá, amiga? Você é linda de doer, mas vive travada. Muito inocente pra uma garota de 19 anos. Nem o primeiro beijo rolou ainda!
— Você vai parar de criticar minha vida amorosa algum dia? — cruzei os braços e sorri de leve pra ela.
— Não dá pra criticar o que não existe, né? — respondeu com a risada escandalosa de sempre. Aquela que parece uma hiena morrendo, e que sempre me faz rir junto.
Ela olhou ao redor do vestiário vazio e reclamou: — Poxa, justo agora que soltei uma resposta perfeita, não tem plateia? — fingiu limpar uma lágrima do canto do olho, dramática como sempre.
— Você é uma atriz, sabia? — falei entre risos.
— E parece que os SEUS clientes chegaram. Mas, espera aí... o que esses pedaços de mal caminho estão fazendo num restaurante? Era pra eles estarem sendo servidos no cardápio! Hmm... vem ni mim — disse, mordendo o lábio e lançando um olhar provocante.
— Eu amo homem de terno — completou, enquanto eu só conseguia rir e pegar meu bloquinho de anotações.
— Eu tô indo, tá? — avisei, saindo do vestiário.
— Boa sorte pra voltar com a calcinha seca! — gritou ela, e eu só virei os olhos e bati a porta atrás de mim com um olhar mortal.
Enquanto caminhava até a mesa deles, ajeitei o uniforme. Por que o Helton tinha que fazer essas saias tão curtas? Elas mal cobrem a minha bunda!
Parei em frente à mesa onde os três estavam sentados. E, contra a minha vontade, tive que concordar com a Carina: meu Deus, eles eram mesmo de tirar o fôlego. Com certeza deviam ser empresários ou alguma coisa assim — dava pra sentir a aura poderosa e fria deles de longe. Só os olhares já me deixaram desconcertada.
— Oi, gata... — disse o da esquerda, me lançando uma piscadinha e passando a língua no lábio inferior.
Hã? Eu?
— Cala a boca, Julian — respondeu o da direita, arqueando a sobrancelha e lançando um olhar gelado.
— Que foi? Ela é linda — sussurrou Julian, todo sem graça.
Ok... eu estou literalmente aqui, na frente de vocês. Só deixem eu anotar o pedido e ir embora, por favor?
Na mesma hora, vi o jeito brincalhão do Julian sumir quando o homem do meio olhou pra ele. Não foi pra mim o olhar, mas mesmo assim... me deu calafrios. O cara nem precisou me encarar pra me intimidar. Só a presença dele já era avassaladora.
E se eu dissesse que não era o homem mais lindo que já vi na vida, estaria mentindo. Totalmente. Ele tinha aquele tipo de beleza bruta. Máscula. Selvagem. Cabelos bagunçados, mandíbula marcada, barba por fazer... pele bronzeada, ombros largos e perfeitamente proporcionais. Senhor amado...
Sacudi a cabeça, tentando me livrar dos pensamentos antes que fosse tarde demais.
— Hã... posso anotar o pedido de vocês?
O homem intimidador virou os olhos lentamente na minha direção. Na mesma hora, senti meu coração disparar.
Os olhos dele...
Eram vazios. Sem expressão alguma. Aquilo me deu medo. Um negro frio, quase sem vida. Olhos que carregavam tragédia, caos. Uma aura sombria envolvia aquele homem.
Ele estava analisando meu rosto. Abaixei o olhar imediatamente, sentindo meu rosto corar.
— Vamos querer o filé com o melhor vinho da casa — o homem da direita quebrou o silêncio.
— Claro... mais alguma coisa? — perguntei, tentando manter a compostura.
Ele apenas assentiu. Dei um leve sorriso e fui direto pra cozinha deixar o pedido.
Sério, quase engasguei com tanta testosterona naquela mesa.
— Alina, pode vir aqui um instante? — ouvi meu chefe, Helton, me chamar. Se tem uma pessoa que eu detesto, é ele. Suspirei fundo antes de ir até onde ele estava.
Ele me puxou pro canto, afastando a gente dos outros funcionários. E, como sempre, começou com aquela palhaçada nojenta de sempre.
— Notei que chegou atrasada hoje... confesso que isso me dá um certo prazer — disse, mordendo o lábio inferior.
— Me desculpa, é que... eu não consegui dormir direito — respondi, meio engasgada.
— Desculpas não vão te manter empregada. Você sabe muito bem o que tem que fazer pra continuar aqui — falou, com aquele tom nojento.
De repente, ele agarrou minha cintura com força. A mão deslizou até o meu traseiro e ele apertou com brutalidade, sussurrando no meu ouvido:
— Você tá deliciosa. Um dia ainda vou te foder com tanta força...
Senti o estômago embrulhar. Ele tem quarenta e três anos. E é casado. Detesto quando ele faz isso. Sempre me toca de forma repulsiva. Mas eu não posso perder esse emprego. Eu não posso. Só queria ter coragem de mandar ele pro inferno de uma vez.
Eu odeio essa sensação de impotência. Odeio os homens. Eles só sabem tratar a gente como objeto, como brinquedo. Nunca conheci um homem que me tratasse com respeito. Nem mesmo o meu pai.
Às vezes eu só queria ter alguém.
Assim que ele me soltou, saí correndo pro lado de fora, com os olhos marejados. As lágrimas escorriam sem parar. Eu não conseguia mais segurar. Estava cansada de ser usada.
Com a visão turva, acabei trombando no peito de alguém. Duro como pedra. Quase caí com o impacto, mas ele segurou minha cintura antes que isso acontecesse. Quando olhei pra cima... era ele.
O homem da mesa.
Ele estava bem na minha frente, me encarando com aquele olhar mortal.
— M-me desculpa... — falei baixo, abaixando a cabeça e colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha. Em seguida, limpei as lágrimas do rosto.
Ficamos em silêncio por alguns segundos... até ele finalmente abrir a boca.
— Você tá bem? — perguntou, com a voz rouca e profunda. Um arrepio percorreu minha espinha.
Não.
— Ah... t-tô sim. Desculpa, de novo... — gaguejei, levantando o olhar, mas desviando no mesmo instante.
Ele estava me encarando.
— Não precisa se desculpar, anjo — disse. As palavras até pareciam doces... mas a forma como ele falou, com aquela firmeza masculina e tom bruto, fez soar dominante.
Anjo...?
De onde veio isso?
Senti minhas bochechas queimarem. Era impossível não corar com tanta gentileza.
Ele enfiou a mão no bolso do paletó e tirou um lenço escuro. Estendeu pra mim, devagar. Fiquei parada, apenas encarando.
Demorei uns segundos até finalmente estender a mão e aceitar. Sorri de leve.
— O-obrigada... — minha voz saiu falha, quase um sussurro.
Ele só assentiu com a cabeça, com aquele olhar firme que me deixava sem ar.
Deu um passo à frente, e o perfume dele me cercou como um abraço sufocante.
— A gente vai se ver de novo… bem em breve — murmurou.
Engoli em seco. O coração disparou. Sem saber o que responder, fugi dali, com passos apressados, deixando-o para trás.
O que foi aquilo?
O resto do dia passou arrastado. Quando vi, já eram 1h da manhã. Enfim, fim de turno.
Só queria saber de cama.
Era quarta-feira — e às quartas, sou eu quem fecha o restaurante. Andar sozinha à noite me dá arrepios, mas já me acostumei. Ou quase.
No caminho pra casa, tive a sensação estranha de estar sendo seguida. Olhei pra trás, mas não vi ninguém.
Meu coração disparou. Acelerei os passos, engolindo o medo seco na garganta. Essas ruas são perigosas — e eu? Ingênua demais. Nunca aprendi a me defender de verdade.
Comecei a correr.
Foi então que senti. Dois braços me envolveram pela cintura. Um pano branco cobriu minha boca e meu nariz. Comecei a gritar, mas os sons saíam abafados. Me debati com todas as forças, tentando escapar. Chutei, bati, arranhei... mas logo comecei a fraquejar.
A tontura veio como uma onda.
E, de repente, tudo ficou escuro.
GREGORIO
Fui criado pra matar. Pra não ter piedade.
“Ser um líder poderoso na máfia é sobre ser implacável. Nunca confie em ninguém, Gregorio.”
Meu pai repetia essa frase mais vezes do que consigo lembrar.
Ele me transformou no homem que eu sou hoje.
Fui ensinado a tratar mulheres como objetos descartáveis. Nunca saí em um encontro, nunca me envolvi emocionalmente. Sempre foi só sexo.
Pra meu prazer. Só o meu.
Nunca pensei em dar prazer a elas. Eu sou egoísta.
Satisfazer uma mulher? Por quê?
Todas querem a mesma coisa: dinheiro.
Fui treinado pra torturar.
Era isso que me dava satisfação.
Ver o medo nos olhos das minhas vítimas, ouvir elas implorando pela própria vida... ter o controle total do destino delas.
Elas sabem a quem pertencem.
Sabem quem é o chefe.
Sabem que comigo não se brinca.
Nesse mundo, quem não tem coração é respeitado. Tem poder. Domínio.
E o que mais um homem poderia querer?
Dinheiro traz mulher.
Todas se aproximam, piscando os olhos, prontas pra fazer qualquer coisa só pra ganhar um pouco da sua atenção... alguns minutos do seu tempo.
Pra mim, todas eram iguais. Interesseiras. Falsas.
Todas prostitutas disfarçadas.
Foi isso que me ensinaram.
Foi isso que me programaram pra acreditar.
Até o dia em que eu vi ela.
Alina D’Amico.
Foi há dois anos. Um dia de primavera, céu limpo, sol brilhando.
Ela estava no jardim — o que presumi ser da casa dela — regando as flores com uma calma que me irritou e me fascinou ao mesmo tempo.
Eu passava por ali de carro, indo resolver um assunto com um conhecido, quando bati os olhos nela.
E naquele instante...
Ela tirou meu ar.
A pele clara, lisa, parecia de porcelana, reluzindo sob o sol.
Ela usava um vestido branco leve, colado no corpo nos lugares certos. Um vestido que parecia feito pra ela.
Pedi pro motorista parar o carro.
Eu precisava olhar mais.
Mesmo de longe, consegui ver cada detalhe.
O rosto delicado, os olhos cor de mel marcantes, os lábios vermelhos que ela mordia, concentrada no que fazia.
Tava cercada por flores, mas nenhuma se comparava a ela.
Ela era a mais bonita.
Aquele tipo de beleza que hipnotiza.
O tipo de corpo que sempre me atraiu.
O vestido apertado no busto, leve nas coxas.
Era impossível ignorar.
Mas o que mais me chamou atenção... foi o cabelo.
Castanho, liso, sedoso, descia até o fim das costas.
Duvido alguém olhar pra ela e não se apaixonar na hora.
Uma beleza rara. Inacreditável.
E, claro, um homem egoísta como eu quis ela só pra mim.
Era linda. Diferente de tudo que eu já vi.
Aquela beleza que não envelhece. Que marca. Que fica.
Quis ter ela. Talvez usar... e depois soltar.
Mas tinha algo nela.
Algo que me fazia querer mais.
E até hoje... eu não sei explicar.
Mas eu preciso descobrir.
Aquele dia passou e tudo o que eu conseguia pensar... era no rosto dela.
Cada traço. Cada detalhe. Como se ela tivesse grudado na minha mente.
Assim que cheguei em casa, chamei o Levi — meu homem de confiança — e mandei que ele investigasse tudo sobre ela.
Descobri que ela tinha 17 anos e morava com uma família adotiva.
A mãe morreu quando ela tinha nove. O pai... ainda está vivo, mas não mora com ela.
Talvez ela nem saiba que ele é o pai.
Naquele momento, eu já tinha decidido.
Ela seria minha. Só minha.
Mas não de imediato. Eu precisava de paciência.
Ela ainda era jovem.
E eu podia esperar.
Não tinha medo de perdê-la. Um dos meus homens já a observava de longe todos os dias.
Pra proteger.
Pra garantir que nada tirasse ela de mim antes da hora.
Um ano depois, descobri que ela se mudou pra um apartamento em Nova York.
Aparentemente, a mãe deixou o imóvel pra ela.
Começou a trabalhar como garçonete num restaurante qualquer.
Foi quando passei a observá-la de perto.
Analisava cada passo.
Cada rotina.
Nos fins de semana, ela se voluntariava num orfanato.
Aquilo me confundia.
Por quê?
O que ela ganha com isso?
Não era por dinheiro, com certeza.
Hmm...
Notei tudo.
O jeito que ela preparava almoço pro morador de rua que sentava na escada do prédio aos domingos.
Como ajudava senhoras com sacolas pesadas do mercado.
Ela era... um anjo. Um anjo de verdade.
E foi aí que minha obsessão ficou ainda mais forte.
Eu não tava mais atraído só pelo corpo dela.
Era a alma. O espírito gentil.
E foi nesse ponto que eu entendi:
Ela não era uma garota qualquer.
E por isso... nunca se apaixonaria por um monstro como eu.
Eu tinha tudo. Dinheiro, poder, influência.
Mas ela não ligaria pra nada disso.
Uma garota tão pura e bondosa... só enxerga o coração das pessoas.
E eu? Eu não tenho coração.
Mas eu queria que ela me quisesse.
Queria que ela fosse minha.
E a única forma de conseguir isso... seria pela força.
Sim, eu sabia que era errado.
Mas eu sou egoísta.
A vida inteira, nunca ouvi um “não”.
Sempre consegui o que quis.
Então, quando percebi que ela nunca se interessaria por mim...
Essa ideia simplesmente não me agradou.
Ela seria minha. Pra proteger. Pra cuidar.
Durante dois anos... nunca a vi sair em um encontro.
Sempre me perguntei o motivo.
Ela podia ter quem quisesse.
Homens brigariam por um simples olhar dela.
Mas... nada.
A inocência dela. A pureza.
Me deixavam louco.
Eu queria ser o único capaz de fazê-la corar.
O primeiro.
E eu amava o fato de ela ainda ser virgem.
Porque isso significava que eu seria o primeiro.
O único.
Quero trancar a porta da nossa casa, carregá-la nos braços até o quarto...
e fazer ela minha.
A noite toda.
Ouvir ela gemer meu nome, estremecer debaixo de mim, implorar pelo toque que só eu posso dar.
E foi ali... naquele pensamento, que pela primeira vez na vida, eu quis dar prazer a uma mulher.
A ela.
Meu Deus... só de imaginar ela ofegante, mordendo os lábios enquanto se agarra em mim buscando segurança... enquanto eu a penetro, sem parar, acertando exatamente onde faz ela perder o fôlego...
— só essa imagem — já me deixa duro.
Imaginar ela tentando fechar as coxas porque o prazer é demais.
O quanto eu desejo ouvir ela gritar meu nome.
Eu vou protegê-la de tudo.
Não passou despercebido pra mim o quanto a vida dela foi difícil.
Ela mora sozinha. Se sustenta sozinha.
Não se vende, não sai por aí mendigando atenção ou dinheiro.
Ela tem orgulho. E isso... eu admiro.
Quando ela for minha de verdade, não vai precisar trabalhar nunca mais.
Vai ter tudo o que quiser. Tudo.
Vai ter a mim.
Vou comprar tudo o que ela desejar.
Ela não vai precisar mover um dedo.
Todo mundo vai servi-la. Porque ela será minha rainha.
A Sra. Scarpani.
Respeitada. Intocável.
Tudo o que ela precisa fazer... é ficar ao meu lado.
E eu vou dar o mundo pra ela.
Saio dos meus pensamentos quando ouço Levi me chamando.
Levi é meu homem de confiança. Somos como irmãos. Crescemos juntos e hoje ele trabalha pra mim.
— Chefe — ele chama.
— O que foi, Levi?
— Julian tá aqui.
— Que porra ele tá fazendo aqui?
— Veio com sua mãe.
— Merda... justo hoje.
— Meio pesado falar assim do seu irmão mais novo, não acha? — ele provoca.
— Tenho coisas mais importantes pra pensar — resmungo sem tirar os olhos do notebook.
— Ele só quer sair pra almoçar.
— Diz que eu tô ocupado com negócios. E manda uma das empregadas acomodar minha mãe no quarto — ordeno.
— Ele insistiu, chefe. Disse que fez reserva em um restaurante.
— Última vez que chequei, você trabalha pra mim, Levi. Isso significa que você faz o que eu mando... ou leva uma bala na testa.
— Você não teria coragem de me matar, Gregorio — ele ri.
— Cai fora daqui e me deixa trabalhar em paz — lanço um olhar frio.
— Você quem manda. Mas, caso mude de ideia, a reserva é no Le Clair de Lune — ele diz, provocando.
No momento em que ele fala o nome do restaurante, ele conquista minha atenção.
Ele sabe.
Sabe que é lá que ela trabalha.
— Por que caralhos não começou dizendo isso, seu desgraçado? — me levanto da cadeira de couro e pego meu paletó.
— Tá todo caidinho, chefe — ele debocha.
— Cala essa boca, Levi — rosno, lançando um olhar mortal enquanto saímos do meu escritório.
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