Oi, leitor!
Antes de começar a história, quero deixar algumas informações importantes pra você aproveitar da melhor forma possível:
⚠️ Esta obra se passa em um universo alternativo ABO (Alfa, Beta e Ômega), com regras próprias construídas especialmente para essa narrativa. Alguns elementos podem diferir de outras histórias do mesmo gênero, incluindo a estrutura social, funcionamento das marcas e relações entre Alfas, Betas e Ômegas.
⚠️ Contém temas maduros e distópicos, incluindo:
Preconceito;
Relações de poder e desigualdade;
Romance proibido;
Conflitos políticos(dentro da história) e emocionais;
🚨Situações de violência verbal e psicológica, sempre tratadas com o máximo da minha responsabilidade dentro da trama.🚨
⚠️ Se você procura uma história mais leve, talvez essa não seja a melhor escolha no momento. Mas se gosta de universos complexos, personagens com cicatrizes (literalmente e emocionalmente), resistência e aquela história carregada de tensão que a gente gosta... Bem-vindo!
Agradeço sinceramente por estar aqui. Cada leitura, comentário e apoio faz diferença pra mim e para história.
Se quiser me acompanhar e enviar feedback, é só me chamar!
Boa leitura!
– Kyan 🤍
Blackmoor nunca dormia. As luzes dos estabelecimentos locais se acendiam gradualmente, uma a uma, enquanto passos apressados desapareciam pelas vielas úmidas da cidade decadente.
Rowan fechava a loja com um estalo seco da porta, seguido pelo som metálico do molho de chaves ecoando pela rua agora quase vazia. Sua mão marcava o vidro frio com digitais quentes enquanto girava a chave na porta desajeitada pela última vez naquela noite.
O cheiro de essência ainda pairava no ar — amadeirado, adocicado, misturado ao leve toque cítrico da nova composição que testara naquela tarde, quando não aparecia cliente. Era seu consolo.
Yunna, sua melhor amiga, o acompanhava carregando uma caixa com pequenos frascos contendo misturas variadas. Frascos de vidro grosso, tampas bem vedadas, rótulos escritos à mão com todo o cuidado de quem ainda acreditava em beleza, apesar do mundo sujo e decadente que vivia.
— Não entendo por que levá-las. Você nunca tem tempo. — Ela jogou o cabelo trançado para o lado enquanto olhava para cima, observando o letreiro neon vermelho e cinza que, em vez de iluminar, quase queimava as retinas antes de se apagar por completo.
— Eu sei, mas sinto que ficam mais seguras em casa. — Ele pausou por um momento, girando o molho de chaves entre os dedos. Ambos começaram a caminhar. Ele carregava algumas sacolas pesadas, contendo essências novas, enquanto Yunna levava apenas a caixa com os frascos. — Estou indo para o clube hoje.
— Por que você ainda faz isso? Sua loja é famosa…
— É. — Ele respondeu com um sorriso gentil, quase resignado. — Mas fama não enche o estômago, Yu. A loja não lucra o suficiente pra sustentar as coisas… nem pra manter a loja aberta por muito tempo. Infelizmente.
Os olhos escarlates dele se voltaram para os olhos esmeraldas em um olhar silencioso de consolo — uma trégua num campo de batalha diário.
— Não se preocupe. Eu não corro perigo. Eu sempre volto pra vocês, não é?
Yunna não respondeu. Sabia que não adiantava argumentar. Não naquela noite. Caminharam em silêncio, cada um afundado em seus próprios pensamentos. Quando chegaram à esquina, Rowan sorriu e acenou com a cabeça antes de desaparecer nas sombras da rua lateral.
O caminho até o clube era sempre o mesmo. E, à noite, parecia ainda mais sufocante. Cada quarteirão virado parecia pesar sobre o corpo, e até o ar queimava como se carregasse fuligem invisível.
A chegada foi silenciosa.
Mostrou a identificação. Entrou. Passou por corredores apertados, paredes pintadas com tons escuros, o cheiro de desejo com uma pequena pitada de suor impregnando o ambiente.
No camarim, sentou-se sozinho. O espelho estava levemente embaçado, mas ainda assim refletia cansaço. Tudo parecia... vazio. Até mesmo os olhares dos outros betas no local. Vazios. Ocupados apenas pelo cansaço e pela desesperança que os assolava.
Alguns só conseguiam dinheiro suficiente se topassem se arriscar de ir até o fim com algum alfa. Rowan teve sorte — ou força — o bastante para juntar o suficiente e abrir sua loja sem precisar desta opção. Mas nem sempre era o bastante. Ainda não era o bastante.
As luzes começaram a mudar de cor, os tons ficando mais baixos, diversos, envolventes. Era o sinal do início da noite.
Rowan já estava pronto. A maquiagem ao redor dos olhos era leve quase imperceptível, apenas o suficiente para esconder os traços de exaustão de um longo dia. Seus cabelos, soltos sobre os ombros, ondulavam de forma natural, captando a luz com o tom avermelhado que lhe dava o apelido do clube.
Vermelho. Sangue. Fogo. Ele era tudo isso quando entrava no palco e até muito mais que isso.
— Carmesim! — A voz firme de Lyandra ecoou pelo camarim. Seus olhos buscaram e encontraram o alvo. — Sua vez no palco, grandão. Faça eles pirarem.
Rowan respirou fundo. O personagem estava pronto.
Carmesim subiu ao palco com passos marcados, envoltos em silhuetas de luz vermelha. Sua roupa era justa, pensada para valorizar os músculos com discrição. Um tipo de fantasia — a de “marido de aluguel” — montada especialmente para permitir liberdade de movimentos e provocar sem jamais prometer demais.
As primeiras notas de "6 Inch" – Beyoncé (feat. The Weeknd) começaram a tocar, vibrando sob o piso. O salão silenciou, como se prendesse a respiração.
— Com vocês, o meu, o seu, o nosso… Carmesim!
Nenhum grito. Nenhum aplauso.
Apenas olhos.
Olhos duros, predatórios. Como se estivessem em um leilão silencioso, analisando, calculando, disputando o que era oferecido ali em carne viva.
Carmesim sabia disso.
Por isso, cada movimento seu era lento, calculado. Seu corpo se movia como fumaça em ambiente fechado — perigosa, irresistível. Ele brincava com a barra da sua regata, puxando-a levemente, revelando o abdômen marcado com suor e luz.
Girava no palco com elegância, braços erguendo-se até formar linhas fortes e fluidas. A luz vermelha cortava sua figura como uma navalha, criando uma aura entre o divino e o lascivo.
E ele nunca sorria.
Carmesim não precisava sorrir. O seu olhar, entre o desdém e o desafio, falava tudo o que os outros desejavam ouvir — e até muito mais.
A dança se aproximava do fim. Ele parou no centro do palco, a luz vermelha intensa atrás de si. Silhueta firme. Provocante.
Deslizou as mãos pelo próprio corpo, do pescoço ao peito, num gesto sutil e perigoso. Um aviso. Um alerta.
Carmesim não era de ninguém ali. Mas, se quisesse, poderia ser de todos.
A música alcançou o seu fim. E ele permaneceu imóvel por mais alguns segundos. Seu peitoral subia e descia pelos movimentos fluidos feitos. Os olhos ainda fixos em todos os alfas daquele local, devolvendo cada olhar calculado com frieza estudada. De um jeito sexual, que atiçava ainda mais os alfas.
Então, apenas então, deixou escapar um meio sorriso de canto. Uma sombra de expressão alémda frieza. Um fantasma.
E desceu do palco como quem sabe que já ganhou muitos olhares naquela noite — sem precisar se entregar por completo.
A sua apresentação havia terminado. Ele havia conseguido exatamente o que buscou.
A grande caçada, para aqueles predadores... Estava só começando.
Quando Rowan desce do palco, alguns betas o parabenizam pela sua incrível performance lá em cima. Ele apenas agradece com um aceno breve, sem energia para interações mais prolongadas. Suado e exausto, se joga num pequeno sofá no canto do camarim, olhos fixos na televisão pendurada na parede que exibia a próxima “atração” dos alfas.
Ele odiava aqueles olhares. Odiava aqueles sorrisos predatórios, como se os betas fossem apenas meros objetos de desejo — carne exposta, oferecida num prato dourado para eles. Odiava todos eles e suas regras e leis idiotas. Tudo ali era um jogo silencioso de posse, onde nenhum dos seus movimentos era apenas uma dança. Cada gesto era um grito para a sobrevivência disfarçada de arte.
— Carmesim?
Ele se vira ao ouvir o nome, só para encarar os olhos duros de Lyandra, a organizadora do show. O batom vermelho dela estava intacto, o cabelo preso com exatidão. Havia sempre algo calculado demais nela — como se até o piscar de olhos fosse ensaiado. E ele não entendia, mas até sua postura era firme, imponente.
— Um alfa pagou por uma dança particular. Trinta minutos. — A informação murchou ainda mais seu corpo. Ele não queria mais essa dor de cabeça hoje. — Sabe que não tem escolha. O Rex vai estar de olho. Não se preocupe.
Não havia nada reconfortante naquela última frase. Rowan apenas assentiu em silêncio, levantando-se relutante. Pegou um pano e limpou o suor do rosto e do pescoço, ajeitou a roupa com gestos mecânicos. O cheiro do camarim era abafado: perfume barato, spray de cabelo e o suor misturado de todos os dançarinos. Rowan não gostava nenhum pouco desse cheiro — quase tanto quanto odiava a obrigação de se apresentar ali para aqueles alfas.
Caminhando com Rex até a sala reservada, ele passou pelos corredores estreitos e escuros do clube, onde outros betas conversavam, se ajeitavam, ou simplesmente esperavam a próxima chance de se venderem por migalhas de status ou segurança. Rowan não os julgava. Já pensou nisso por horas quando era mais novo, tentando decidir se aquilo o ajudaria a sair da miséria onde nasceu.
— Qualquer coisa, me chama — Rex murmurou, posicionando-se ao lado da cortina grossa que separava a sala. — Ele bebeu muito...
Ele parecia querer dizer algo mais, mas engoliu as palavras. Rowan entendeu. Seria um desastre se o cliente perdesse o controle. Já havia acontecido antes. O clube sabia lidar com consequências — mas nem sempre as vítimas tinham a mesma sorte.
Quando entrou, o alfa já estava sentado no sofá, com as pernas abertas. A posição era relaxada, mas carregada de domínio. A luz fraca da sala projetava sombras no rosto dele, dando mais destaque à máscara metálica que cobria metade da face.
Carmesim inspira fundo. Abre um sorriso forçado, falso. O sorriso que o palco exige. A máscara que usava era mais leve que a do alfa, mas ainda assim tão incômoda quanto.
A cicatriz que cortava o rosto do homem era fina, descendo da bochecha até o queixo. Um detalhe imperceptível à distância, mas marcante de perto. Cabelos loiros — mais escuros nas raízes. Olhos cinzas como fumaça prestes a engolir tudo. Suas mãos, calejadas, seguravam um copo de uísque com uma pedra de gelo derretendo lentamente.
Carmesim subiu no minipalco, os olhos treinados vasculhando os sinais. Era mais forte que ele: identificar ameaças, pontos de fuga, possíveis mudanças de comportamento. Dançar era sobrevivência.
— Sua apresentação... — o alfa falou depois de longos segundos, a voz rouca, como se fosse feita de veludo rasgado. — ...Excepcional.
Tudo nele parecia premeditado, como se, mesmo alterado, cada palavra fosse pensada antes de sair. Até a respiração parecia controlada.
— Eu agradeço. — Carmesim respondeu com polidez, mantendo a pose profissional. A voz saía firme, enquanto os dedos que deslizavam pela camisa.
— Eu te observo tem um tempo... — o alfa continuou, pausando brevemente. — ...Seu olhar é tão duro. Dá um charme a mais.
Carmesim suspirou. Olhou-o por cima do ombro enquanto dançava, o corpo se movendo no ritmo abafado da música ambiente. Restavam 15 minutos.
— Você faz o que eles fazem?
— Não. — A resposta veio cortante. Sem personagem. Sem floreio. — Eu sou apenas dançarino.
— Pena.
O silêncio depois daquilo era mais incômodo do que qualquer palavra. O alfa não desvia os olhos. E diferente dos outros, ele não olhava apenas o corpo — parecia querer ver através dele. Isso deixava Carmesim desconfortável. Mais do que qualquer outro olhar predador que já enfrentou.
As garras do alfa estavam levemente expostas. Não como ameaça — mas como instinto mal contido. A respiração pesada, o olhar fixo, inabalável. Carmesim estava acostumado a tensão, mas havia algo naquele homem que o desestabilizava.
Quando a dança terminou, Carmesim desceu do minipalco com um sorriso automático.
— Foi um pra...
— Mentira. — O alfa o cortou, ainda com a mesma calma insuportável.
— Como, senhor?
— Não foi um prazer pra você, só pra mim. — Ele riu, sem humor, e passou a mão pelos fios loiro-escuros, revelando um anel pesado no dedo médio. O gesto era aristocrático, carregado de uma autoridade silenciosa.
— Foi um prazer. — Carmesim respondeu, automático.
— Foi um prazer. — o alfa repetiu, um sorriso prepotente se formando. Caninos perfeitos, brancos demais. — Até a próxima.
Carmesim não respondeu. Apenas saiu, cruzando a cortina. Rex estava lá, o observando. Tinha escutado tudo, mas não comentou. Caminharam em silêncio pelo corredor de volta ao camarim.
Sentado diante do espelho, Rowan encarou o próprio reflexo. O suor já seco, a maquiagem borrada no canto do olho. Sorriu, um riso sem acreditar.
Aquele alfa não era como os outros.
Já dançou para todos os tipos de alfas. Alguns eram animalescos, outros perigosamente sedutores. Mas aquele era diferente. Tinha algo no silêncio dele. Algo que parecia vê-lo como mais do que um corpo. E ao mesmo tempo, o devorava com os olhos como se já fosse posse dele. Rowan também poderia jurar que viu confusão e nojo ali em alguns momentos. Esse homem era diferente.
— Por que o alfa estava de máscara? — Rowan perguntou, enquanto retocava a maquiagem com mãos que fingiam firmeza. — Algo especial?
Rex da uma leve risadinha rouca.
— Bom... a Lyandra não comentou direito, mas ele é bem poderoso lá em cima. — Rex apontou com o queixo, referindo-se à Cidade Alta, onde a elite alfa e ômega vivia em torres limpas e cintilantes.
— Entendi...
Mas ele não entendia. Não de verdade. Aquela presença ainda pesava nos seus ombros, como se tivesse deixado um rastro invisível em sua pele.
Talvez aquela dança não tivesse acabado ali.
Esse era o medo de Rowan.
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