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Por Engano, Por Destino

01*

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Meu nome é Enzo Bianchi, tenho 32 anos e sou médico especializado em pediatria. Moro na capital da Itália, onde minha rotina é dividida entre o hospital, a vida na cidade e a administração das vinícolas que herdei do meu nono, Lorenzo. Ele é o meu maior apoiador e um dos únicos em quem realmente confio. Lorenzo é um homem simples, gentil, e seu jeito tranquilo sempre me dá segurança.

Minha família é um capítulo à parte. Minha mãe, Donatella, é uma mulher que gosta que tudo saia do jeito dela. Controladora, detalhista, com uma personalidade forte que às vezes me sufoca, mas que eu aprendi a respeitar com o tempo. Já meu pai, Lorenzo Filho, é o oposto. Ele é divertido, gentil e tem um sorriso que pode iluminar qualquer ambiente. Mas não se engane: quando necessário, ele sabe ser rígido e firme, especialmente com assuntos sérios.

Minha história não é simples. Tive muitos fracassos ao longo da vida, especialmente no campo dos relacionamentos. Foram amores que não deram certo, amizades que se mostraram interesseiras... Tudo isso por causa do sobrenome Bianchi — um nome que carrega peso na Itália, e que, infelizmente, traz expectativas e preconceitos que só complicam a vida. Mas, para mim, esse nome não passa de uma palavra. O que realmente importa é quem eu sou, não o que meu sobrenome representa.

Desde jovem, meu maior sonho tem sido ser pai. Não me importo com dinheiro, nem com a fama da família. Quero algo mais simples, mais real: ver meu filho crescer, acompanhá-lo desde o ventre, escutar seu primeiro chorinho, acompanhar cada ultrassom, sentir aquela conexão única que só um pai pode ter. Porém, ainda não encontrei a mulher certa, aquela que eu pudesse amar de verdade, com quem pudesse compartilhar esse sonho. Uma mulher cujo olhar revelasse seu coração e alma.

A verdade é que, depois de tantas tentativas frustradas, acabei desistindo da busca pela mulher dos meus sonhos. Mas nunca desisti do sonho de ser pai. Isso é algo que está enraizado em mim e que não pretendo abrir mão, não importa o que aconteça.

Por conta disso, convivo muito com crianças — trabalho em diversos orfanatos, participo de projetos sociais para ajudar os pequenos que precisam. Poderia simplesmente adotar uma criança, mas para mim não é o mesmo. Eu quero sentir cada momento da gestação, quero acompanhar a vida desde o começo, e isso é algo que não consigo abrir mão.

Foi então que, em um desses dias, minha amiga de longa data, Betina, entrou na minha vida de uma forma diferente. Estávamos na casa dela, conversando sobre o futuro e relembrando os tempos de faculdade, nossas aventuras, os planos que fizemos quando éramos mais jovens e acreditávamos que tudo seria mais fácil. Falávamos da vida, dos sonhos, das decepções, quando o assunto acabou caindo na questão de encontrar alguém para amar.

— Ai, amigo — disse Betina, suspirando — acho que meu sonho de encontrar um cara decente morreu.

Olhei para ela e sorri, tentando animá-la.

— Be, você ainda tem muito tempo para encontrar a pessoa certa — respondi, com aquele tom de amigo preocupado, querendo confortá-la.

Ela riu, mas com um brilho de tristeza nos olhos.

— Você fala isso, mas e você? — ela perguntou, me encarando de frente. — Por que você não vai atrás do seu sonho? Da mulher da sua vida?

Fiquei em silêncio por um instante. Era uma pergunta que eu evitava responder.

— Você sabe que eu desisti disso — falei, meio sem jeito. — Só não desisti de ser pai.

De repente, Betina levantou-se de um salto e, animada, exclamou:

— Enzo! Enzo! Enzo! Tive uma ideia!

Olhei para ela, assustado, sem entender muito bem o que estava acontecendo.

— Mulher, você deve estar louca, só pode. Que surto é esse? — perguntei, meio rindo, meio preocupado.

Ela respondeu com a maior seriedade possível:

— Amigo, e se eu te emprestar meu útero para você ter seu filho?

Fiquei paralisado, tentando absorver aquilo que acabara de ouvir.

— Como assim, Betina? Não tô entendendo — falei, ainda em choque.

— Vamos numa clínica de inseminação artificial — explicou ela, confiante. — Vamos fazer os exames para ver se eu posso gerar o seu filho. Já que eu não estou usando esse útero mesmo, posso te ajudar a realizar seu sonho.

Olhei para ela, tocado e surpreso. Nunca imaginei que alguém pudesse fazer isso por mim, e ainda mais alguém tão especial quanto Betina.

— Betina, você está mesmo disposta a fazer isso por mim? — perguntei, sentindo um nó na garganta.

Ela sorriu e assentiu.

— Sim, amigo. Quero que você realize esse sonho.

Nos abraçamos, e naquele momento senti uma mistura de alegria, esperança e uma emoção que não cabia em mim. Pela primeira vez em muito tempo, senti que talvez fosse possível mesmo ser pai, sem precisar esperar por um amor idealizado que talvez nunca chegasse.

Não perdi tempo. Comecei a pesquisar clínicas, a conversar com especialistas, e juntos, eu e Betina, demos entrada em todos os papéis necessários. Ela seria minha barriga de aluguel, minha parceira nessa jornada que estava só começando.

Era um novo capítulo na minha vida, cheio de desafios, mas também de possibilidades. E, pela primeira vez, senti que o sonho de ser pai poderia finalmente se tornar realidade, não importa o que viesse pela frente.

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02*

 

Me chamo Luiza Moretti, tenho 26 anos, e sou auxiliar em uma creche no interior da Itália. Trabalho lá há alguns anos e, honestamente, não me vejo fazendo outra coisa. Meu mundo gira ao redor das crianças — daquelas mãozinhas sujas de tinta, dos choros desesperados por atenção, e principalmente daqueles sorrisos banguelas que me salvam nos piores dias.

Sou uma mulher simples, nascida e criada em uma vila pequena, onde todos sabem da vida de todos, e o cheiro de molho de tomate invade as ruas aos domingos. Minha criação não foi exatamente comum. Fui criada por minha nona Giovanna, uma típica italiana de sangue quente, dona de um coração enorme — e de um rolo de massa que ela jurava saber usar como arma.

Minha mãe — ou como costumo chamá-la, minha genitora — me deixou com a minha nona quando eu tinha apenas dois anos. Chegou numa tarde qualquer, me colocou nos braços daquela mulher forte e simples, e disse apenas: “É tua neta.” Depois disso, desapareceu como se nunca tivesse existido.

A nona não pensou duas vezes. Mesmo vivendo um dos momentos mais difíceis da sua vida, ela me acolheu. Havia perdido seu único filho — meu pai — há apenas um ano, em um trágico acidente de carro. A dor ainda era fresca, mas, de alguma forma, ela viu em mim uma chance de respirar de novo.

Cresci ouvindo histórias sobre meu pai. Minha nona mostrava fotos antigas dele — sorrindo, brincando, jovem — e dizia que ele teria sido um pai maravilhoso. Mas, para ser honesta, não me lembro dele. Nunca o conheci. Olho as fotos, escuto as histórias, mas não me reconheço naqueles traços. Às vezes penso se carrego mais da mulher que me deixou do que daquele homem que todos diziam ser bom. É uma dúvida que guardo só pra mim.

Mas se tem uma certeza que eu carrego é o amor da minha nona. Ela me deu tudo. Amor, valores, cuidado. Trabalhou duro a vida inteira para não me deixar faltar nada — e mesmo nos dias em que faltava, ela dava um jeito. Foi ela quem me ensinou a cozinhar, a respeitar os outros, e a me levantar sozinha sempre que a vida me derrubava.

Sou um pouco estourada, confesso. Tenho a língua afiada e, muitas vezes, falo sem pensar. Quando estou nervosa, gesticulo tanto com as mãos que já derrubei mais de uma xícara de café em brigas de bar. Às vezes falo rápido demais, misturo os assuntos, atropelo as palavras. Mas isso é só um detalhe. No fundo, sou uma mulher centrada, pé no chão. Desconfiada, sim, principalmente com homens.

Nunca acreditei muito nessa história de “príncipe encantado”. Já me envolvi com alguns homens, mas sempre acabava descobrindo uma traição, uma mentira, uma decepção qualquer. Isso só reforçou o que eu já desconfiava: não preciso de um homem para ser feliz. Posso me bastar. E me basto.

Foi então que, cercada pelo universo das crianças na creche, essa vontade de ser mãe começou a crescer dentro de mim. No começo, era uma coisa leve — um pensamento aqui, outro ali. Mas, com o tempo, passou a ser um desejo real, vivo, urgente. Ver aquelas crianças todos os dias, segurar aquelas mãozinhas pequenas, ouvir aquelas vozinhas doces chamando “tia Lu”, mexeu comigo de um jeito que eu não esperava.

Mas como realizar esse sonho sem estar casada? Sem sequer ter um namorado?

Simples: produção independente.

Não foi uma decisão fácil. Pensei muito antes de contar para a minha nona. Ela, com seu jeito tradicional e coração gigante, poderia não entender. Mas, para minha surpresa, ela me apoiou de imediato. “Se é isso que o seu coração quer, então vai atrás, minha filha”, disse ela, segurando minhas mãos com os olhos marejados.

Desde então, começamos a guardar dinheiro. Ela voltou a fazer doces e bolos para vender na feira da praça — seus famosos cannolis e sfogliatelles sumiam das barracas em minutos. E, mesmo quando eu dizia que podia cuidar sozinha, ela me dava sempre “uns trocadinhos”, como ela mesma chamava, pra ajudar com o “fundo do bebê”, como passou a dizer com orgulho.

Cada moeda guardada, cada doce vendido, cada hora extra que fiz na creche, me traziam um passo mais perto do meu sonho. Um sonho que muita gente julgava impossível, ou até errado. Mas eu nunca me importei com o que os outros pensam. Quem vive de acordo com o que os outros acham certo, acaba vivendo uma vida que não é sua.

Hoje, estou aqui, sentada em uma sala de espera de clínica, com as mãos suadas e o coração acelerado. É o dia da minha primeira consulta. Vou iniciar o processo de inseminação artificial.

Enquanto espero, olho para a barriga ainda vazia e tento imaginar o que está por vir. Medo? Sim, tenho. É muita coisa pra uma mulher só. Mas nunca tive dúvidas. Quero ser mãe com todo o meu coração. Quero sentir meu bebê crescendo dentro de mim, quero ouvir o batimento do seu coração pela primeira vez, quero acompanhar cada fase, cada chute, cada ultrassom.

Esse filho — que ainda nem começou a existir — já é amado. Já é esperado. Já é sonhado.

E quando ele chegar, vai ter uma mãe forte, decidida, cheia de amor. Vai ter também uma nona Giovanna com o rolo de massa na mão, pronta pra espantar qualquer um que se aproxime com más intenções. Vai crescer cercado de comida boa, valores firmes, e, principalmente, afeto.

Não sei como será o futuro. Não sei se vai ser fácil. Mas sei que, a partir de hoje, minha vida começa a mudar.

E eu estou pronta.

 

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03*

Enzo

Depois de semanas de pesquisa, telefonemas e conversas, eu e Betina finalmente escolhemos a clínica. Era moderna, com ótimas avaliações e, principalmente, discreta. Marcamos nossa primeira consulta para dar início ao processo de inseminação artificial. Eu mal conseguia dormir nas noites anteriores. A ansiedade batia como se o futuro estivesse logo ali, ao alcance das mãos.

No caminho da clínica, Betina estava, como sempre, sendo... Betina.

— Tá ansiosa, Be? — perguntei, de olho no GPS e no trânsito.

Ela bufou e cruzou os braços, teatral como sempre.

— Ansiosa? Não. Tô é com fome. Por que mesmo você não me deixou comer?

Ri com a cara emburrada dela e respondi com o tom mais médico possível:

— Provavelmente vão pedir exames de sangue. Jejum é essencial pra garantir os resultados. Depois você come uma pizza inteira, prometo.

— Ok, doutor. Futuro papai chato — ela disse, debochando, mas com um sorriso nos lábios.

Soltei uma risada e comentei:

— Logo mais...

Aquela frase ficou no ar. Logo mais. Logo mais tudo mudaria.

Chegamos à clínica, fizemos a ficha na recepção e sentamos na sala de espera. O ambiente era aconchegante, com tons claros, música baixa e um cheirinho suave de lavanda no ar. Enquanto esperávamos o médico nos chamar, meus olhos vagaram pelo local, meio distraídos, até que pararam... nela.

Uma mulher sentada sozinha, com um porte sereno e, ao mesmo tempo, forte. Ela era baixinha, mas dona de uma presença imensa. Tinha os cabelos longos, escuros, que desciam como uma cascata até a cintura. O olhar dela era marcante, profundo, daqueles que parecem atravessar a alma. Não sorria, mas havia uma doçura ali, uma firmeza silenciosa.

Por um segundo, senti meu coração errar o compasso. E então, como se o universo quisesse brincar comigo, ela olhou na minha direção. Um olhar rápido, mas intenso. Foi o suficiente para me desconcertar.

— Enzo! — a voz de Betina me arrancou do transe. — Vamos sentar ali, ó, tem dois lugares.

Assenti e a segui, mas confesso: a imagem daquela mulher ficou na minha cabeça.

Luiza

A sala de espera era bonita, moderna, mas isso não me impedia de suar frio. As mãos estavam trêmulas e a perna balançava compulsivamente. Meu coração batia tão rápido que eu mal conseguia respirar direito. Era a minha primeira consulta. O início de tudo.

Minha nona me desejou boa sorte com os olhos marejados e um beijo estalado na testa. “Vai lá, minha filha. Tua coragem me enche de orgulho”, ela disse, e eu levei aquela frase como escudo.

Olhava ao redor, tentando me distrair, quando o vi.

Um homem alto — muito alto, devia ter quase 1,95 — com cabelos castanhos escuros, bagunçados de um jeito natural, olhos que pareciam mudar de cor sob a luz, entre mel e âmbar. Pele bronzeada, corpo de quem cuidava de si. Parecia saído de uma propaganda de perfume.

Fiquei olhando por uns segundos até perceber que uma mulher linda o chamava, puxando-o pelo braço. Desviei o olhar rapidamente, me xingando por dentro. “Foco, Luiza! Você está aqui por outro motivo.” Endireitei a postura e fixei os olhos na porta.

Foi quando ela se abriu.

— Senhora Luiza Moretti? — chamou uma enfermeira simpática.

Levantei com pressa e fui levada até uma sala clara, onde um médico de jaleco branco me esperava. O nome bordado dizia: Dr. Maurizio Fabbri.

Ele sorriu gentilmente e me convidou a sentar.

— Então, Luiza, vamos conversar um pouco. Você pretende fazer inseminação artificial, correto?

Assenti com a cabeça e respondi:

— Sim, doutor. É algo que venho planejando há tempos. Já fiz exames de sangue recentemente, tenho tudo aqui...

Entreguei a ele a pasta com meus exames. Ele analisou, fez algumas anotações e, depois de me explicar todo o processo, solicitou novos exames atualizados. Ultrassonografia, exames hormonais e avaliação da saúde uterina. Tudo isso era necessário para garantir que meu corpo estava pronto para gerar uma vida.

— Vamos fazer um ultrassom agora para checar o endométrio e os ovários, tudo bem?

— Claro — respondi, tentando conter o nervosismo.

Fui levada até uma sala anexa. O exame foi rápido, indolor. O doutor explicou cada imagem, mostrou meus ovários, o útero, e sorriu satisfeito.

— Seu útero está saudável, Luiza. Tudo indica que você é uma ótima candidata para inseminação.

Senti os olhos encherem d’água. Meu coração explodiu de alegria.

— Obrigada, doutor. Isso... isso significa o mundo pra mim.

Ele sorriu com gentileza.

— Vamos te acompanhar com carinho. Em breve, você estará gerando seu sonho.

De volta com Enzo e Betina

Minutos depois, Betina foi chamada. Entramos juntos no consultório, onde um outro médico nos aguardava — Dr. Pietro Mancini, especialista em reprodução assistida.

Ele nos cumprimentou com um aperto de mão firme e um sorriso acolhedor.

— Então, casal... ou melhor, dupla corajosa. Vamos começar a jornada?

Betina riu alto e respondeu:

— Não somos casal não, doutor. Somos amigos de longa data. Eu estou emprestando o útero, ele está emprestando o material genético. Simples assim.

Dr. Pietro deu uma risada e pegou nossa ficha.

— Muito bem. Enzo, já vi seus exames de espermograma, estão todos ótimos. Betina, precisamos avaliar sua saúde ginecológica, índice hormonal, pressão arterial, histórico familiar. Faremos uma bateria de exames nos próximos dias.

Ela assentiu, e logo fomos levados à sala de exames. Betina fez coleta de sangue, exame clínico e foi agendada para o ultrassom transvaginal.

— Seu corpo será monitorado por ciclos, e assim que seu endométrio estiver ideal, faremos a inseminação — explicou o doutor.

Saímos da clínica com uma pasta cheia de papeis, receitas, orientações e o coração cheio de expectativa.

— E então, doutor futuro papai? — disse Betina, com aquele brilho debochado nos olhos.

— Estou nervoso, confesso — respondi. — Mas tenho fé que vai dar certo.

Enquanto saíamos da clínica, não pude evitar procurar com os olhos aquela mulher de antes. Ela já não estava lá. Só restava a lembrança do olhar que me atravessou como um raio.

Mal sabia eu que o destino estava apenas começando a brincar com nossas vidas.

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