MELISSA 30 ANOS, VIÚVA.
ETHAN/ TERRORISTA 20 ANOS.
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A vida não pediu licença antes de virar o mundo de Melissa Martins do avesso. Viúva aos trinta anos, sozinha com 1 filha de doze anos, ela se acostumou a caminhar na corda bamba entre o desespero e a esperança. Morava em Botafogo, num quartinho alugado que engolia mais da metade da pensão deixada pelo ex-marido. E quando ficou desempregada, há dois meses, o aviso de despejo foi só a última gota num copo transbordando de medo.
Foi então que Dona Marlene, uma senhora que faz a limpeza no posto de saúde onde Melissa fazia alguns bicos em bota fogo, estendeu a mão. “Vem pro Vidigal, minha filha. Minha amiga celeste Tem um barraco bom, simples, mas ajeitadinho. Dois quartos, cozinha, banheiro. É seu até você se reerguer.” Gratidão foi pouco para descrever o que Melissa sentiu. Não era a Zona Sul glamourosa que sempre sonhou para os filhos — mas entre a calçada fria e um lar modesto, o barraco era um castelo. E castelos, ela aprendeu, são construídos de gratidão, não de reclamação.
Enquanto Melissa se mudava e recomeçava, o morro sussurrava sobre outra história — uma bem mais sombria.
Ethan Andrade, mais conhecido como **Terrorista**, tinha apenas vinte anos, mas carregava no olhar a morte de quem nasceu e cresceu nas entranhas do crime. Branquinho, tatuado, dono de um corpo atlético e de uma mente afiada como lâmina. Aos dez anos, já segurava a Glock ao lado do pai para defender o Vidigal. E aos quinze, com o pai assassinado, se tornou um predador solitário — e letal.
Mas há três meses, o destino resolveu testar até onde Ethan aguentava sangrar. Foi numa noite como tantas outras, em que ele corria pelas lajes para evitar que o rival de outro morro o cercasse. O estalo seco do disparo ecoou como sentença: a bala atravessou sua coluna, e a dor foi tão grande que o fez desabar de cara no concreto quente.
Foram semanas no hospital, cada hora mais longa que a anterior. Quando os médicos confirmaram que ele ficaria temporariamente sem movimentos nas pernas, o mundo dele desmoronou. A fúria se tornou maior que qualquer arma que já empunhou. O terror que antes ele espalhava pelas vielas se voltou contra ele mesmo — e o arrastou para um abismo de ódio e desesperança.
Faz dois meses que voltou para casa. Ou melhor: para a prisão sobre rodas que se tornaram seus dias. Recusou fisioterapia, expulsou médicos, afastou todo mundo. Preferia morrer a ser visto fraco. E quem ousava aparecer diante dele era obrigado a baixar a cabeça — porque qualquer olhar de pena era pago com chumbo. Sua Glock de ouro estava sempre à mão, como lembrança do poder que ninguém podia tomar dele.
No outro extremo desse mesmo morro, Melissa segurava as mãos da filha no caminho para o posto de saúde. Agora, depois de tantos currículos ignorados, tinha ido para tentar trabalhar como técnica de enfermagem no posto do Vidigal. O salário não era grande coisa, mas era o suficiente para comprar comida, pagar a conta de luz e manter a filha na escola. E para quem viveu noites em claro com medo de não ter nada no dia seguinte, aquilo era mais que um recomeço — era um milagre, se conseguisse.
Enquanto a técnica de enfermagem de alma forte encontrava esperança nas escadarias íngremes do morro, o rei cruel do Vidigal afundava na própria escuridão. E sem saber, destino e desejo começavam a traçar uma rota impossível de escapar. Porque cedo ou tarde, as vidas de Melissa Martins e Ethan Andrade — O Terrorista — iriam colidir. E nenhum dos dois sairia ileso.
📖 Capítulo 1 – Chegada ao Morro
O céu estava encoberto por nuvens pesadas quando Melissa Martins desceu do ônibus lotado em frente à entrada do Vidigal. Carregava nas mãos as duas únicas malas que conseguiu trazer de Botafogo, junto da filha que caminhavam abraçadas e assustadas com a movimentação intensa na rua. A mudança tinha sido repentina, forçada, desesperada. Mas ela não teve outra escolha: depois de cinco meses sem receber respostas de entrevistas, com as contas empilhando como tijolos na porta, a pensão que recebia do falecido marido não pagava mais nem metade das despesas.
Melissa respirou fundo, olhando para cima, onde o morro se erguia imenso, com suas vielas serpenteando como veias de concreto. Cada beco parecia ter olhos que a observavam, julgando, medindo, testando. O coração dela batia forte, mas não era medo que sentia: era determinação. Já havia enfrentado humilhações demais para permitir que qualquer coisa a derrubasse agora.
— Vamos, meu amor — disse, com a voz suave, mas firme. Alice, a mais velha, segurava a mão dela com força.
Foi então que Dona Celeste, uma senhora de quase sessenta anos, moradora antiga do Vidigal, apareceu no alto da ladeira. Ela acenou para Melissa com um sorriso acolhedor. — Você deve ser a moça que conversei pelo telefone, não é? — perguntou, ajudando-a com as malas. — Aqui ninguém passa fome se eu puder ajudar. Ainda mais quando dona Marlene indica.
Melissa sentiu o coração aquecer. Em meio a tanta incerteza, encontrar alguém disposto a estender a mão era como enxergar um raio de sol em meio à tempestade.
A casa que Dona Celeste havia conseguido para ela ficava num canto mais alto, quase no topo do morro. O barraco de dois quartos era simples, feito de alvenaria improvisada, mas tinha chão limpo, pintura descascada apenas em alguns pontos e janelas que deixavam entrar o ar fresco do mar. Para quem não ganhava nem um salário mínimo, era um verdadeiro castelo.
Enquanto subiam as escadas íngremes, Melissa sentia o peso do passado em cada passo. As lembranças do marido, um homem com quem tinha vivido anos de brigas, traições e noites frias, se misturavam à tristeza que ainda carregava. Mesmo separados antes dele morrer, ela jamais deixaria que sua filha ouvisse uma palavra ruim sobre o pai — ensinou- ela a amá-lo, mesmo em silêncio.
Ao entrar na casa, Alice correu para explorar cada canto, Melissa pousou as malas no canto da sala e fechou a porta atrás de si. Olhou em volta. O lugar precisava de cuidados, mas era delas. Pela primeira vez em meses, sentiu-se protegida, mesmo que em meio ao caos.
Naquela noite, depois de preparar arroz com ovos mexidos, elas
se sentaram no chão em cima de um lençol estendido como toalha. Comiam rindo entre um gole de suco e outro, a luz fraca da única lâmpada balançando com o vento que entrava pela fresta da janela. Melissa enxugava discretamente as lágrimas que insistiam em escapar, enquanto admirava o rostinho sorridente da filha. Aquela pequena momentos de felicidade a lembravam que a gratidão era mais poderosa que qualquer reclamação.
No dia seguinte, acordou antes do sol nascer. Enquanto a sua princesa ainda dormia, arrumou a casa, lavou o pouco de roupa que tinha trazido, varreu a frente do barraco e organizou as gavetas improvisadas com caixas de papelão. Depois vestiu uma calça jeans surrada, camiseta branca e prendeu o cabelo em um coque apertado. Precisava começar a procurar emprego, de novo.
Enquanto caminhava morro abaixo, sentia todos os olhares sobre ela. Alguns curiosos, outros maliciosos, mas muitos indiferentes, acostumados com rostos novos que vinham e iam com a mesma rapidez. Nos becos, crianças corriam descalças, vendedores ambulantes gritavam as promoções do dia, enquanto os sons de tiros distantes ecoavam como trovões abafados — um lembrete cruel de onde estava.
Melissa encontrou o posto de saúde local, uma construção de paredes verde-claras descascadas, com cheiro constante de desinfetante e mofo. Foi recebida pela recepcionista, uma mulher alta, magra, de expressão dura, que olhou de cima abaixo antes de perguntar: — Veio se consultar?
— Na verdade, vim saber se precisam de técnica de enfermagem — respondeu, erguendo o queixo. — Sou formada, tenho experiência e estou disponível.
A recepcionista arqueou uma sobrancelha, pegou um papel amassado em cima da mesa e entregou. — Preencha isso e aguarde. Se tiver vaga, vão te chamar.
Melissa sentou-se em um dos bancos de metal enferrujado do corredor, olhando as pessoas que entravam: mães com crianças febris, idosos cansados, jovens feridos por brigas de rua. Aquela realidade era dura, mas ela sentia que, de algum modo, ali poderia fazer a diferença.
Enquanto aguardava, não deixava de pensar nos filhos sozinhos em casa. Mas sabia que precisava agir. Não podia se dar ao luxo de desistir. A lembrança de cada humilhação que já sofrera a mantinha firme. Quando finalmente a chamaram, entregou os documentos e foi informada de que ligariam assim que houvesse vaga.
No caminho de volta, ouviu boatos sobre o “terrorista do morro”, o homem que comandava tudo dali. Comentavam que ele era jovem, bonito, mas cruel, que tinha perdido os movimentos das pernas após um acidente e que ninguém ousava sequer olhar nos olhos dele. Cada história parecia mais exagerada que a anterior, mas todas terminavam da mesma forma: com o terror que o nome dele causava.
Melissa sacudiu a cabeça. Não tinha tempo para medos. Precisava de um trabalho. Precisava alimentar os filhos. E precisava continuar de pé.
Ao chegar em casa, foi recebida com abraço caloroso. Alice mostrava os desenhos que havia feito. Juntas, arrumaram a casa um pouco mais, improvisaram cortinas com lençóis velhos, organizaram a pequena cozinha e colocaram música para tocar em um celular com caixa de som surrada.
À noite, depois do banho, deitaram toda juntas no mesmo colchão grande, abraçadas. Melissa contou histórias sobre princesas guerreiras e heróis corajosos, mas no fundo desejava que ela soubesse que a verdadeira força estava ali, naquele abraço apertado, na união que as fazia seguir em frente mesmo quando tudo parecia ruir.
Naquela madrugada, enquanto todos dormiam, Melissa ficou olhando o teto escuro, sentindo a brisa do mar que chegava pela janela. Apesar do medo do desconhecido, apesar da violência que rondava cada beco, sentia que, pela primeira vez em muito tempo, poderia encontrar ali não apenas a chance de sobreviver — mas quem sabe, até de recomeçar.
📖 Capítulo 2 – Vozes do Morro
Melissa acordou antes mesmo do sol surgir no horizonte. O céu ainda estava tingido de tons azulados, e a neblina cobria parte do Vidigal como um véu pesado. Seu corpo doía do cansaço dos últimos dias, mas o olhar determinado refletido no espelho rachado da casa lembrava quem ela era: uma mulher que não se rendia.
Depois de preparar o café com o pouco que tinha — café fraco e pão amanhecido — acordou sua filha com beijos e promessas de que tudo ficaria bem. Alice ajudava a arrumar a casa e Melissa prendia os cabelos e vigiava o tempo. Precisava levá-la até a escola comunitária e depois descer para continuar a busca por trabalho.
Na rua principal, os becos fervilhavam. O comércio informal despertava, homens carregando caixas de bebidas e cigarros ilegais, crianças correndo descalças e carros com vidros escuros passando lentamente, observando cada movimento. O clima de tensão era constante; qualquer desatenção poderia ser interpretada como desrespeito ou, pior, traição.
Quando Melissa entrou na pequena escola, foi recebida pela professora de sorriso bondoso. As crianças correram para as salas improvisadas com carteiras tortas, mochilas rasgadas e cartazes coloridos presos com fita adesiva. Melissa se despediu da filha com abraços fortes, lembrando de obedecer, estudar e, acima de tudo, respeitar a todos.
Na descida do morro, as vozes sussurradas sobre o “terrorista do Vidigal” se tornavam mais constantes. Cada grupo de moradores parecia ter uma história diferente sobre ele: uns diziam que ele matava sem pensar duas vezes; outros, que era um estrategista frio, que planejava cada movimento com precisão mortal. E havia quem contasse que ele havia perdido os movimentos das pernas por um castigo divino — mas todos, sem exceção, baixavam os olhos quando falavam seu nome.
Melissa atravessava essas conversas como quem corta uma neblina: firme, mas cautelosa. Sentia os olhares de curiosidade e julgamento, afinal, era a nova moradora do morro. Muitos cochichavam pelas costas, outros apenas observavam, esperando para ver se ela aguentaria a pressão do lugar ou se seria mais uma a desistir.
Chegou ao posto de saúde perto das nove da manhã. O movimento era intenso: crianças febris, mulheres grávidas, idosos debilitados. O corredor exalava um cheiro forte de desinfetante misturado com o suor de dezenas de corpos aglomerados. O som de tosses, choros e gritos de dor ecoava pelos corredores estreitos.
— Ainda não temos vaga para você — disse a mesma recepcionista do dia anterior, sem levantar os olhos do monitor velho. — Volte semana que vem.
Melissa respirou fundo, conteve o desespero e agradeceu com a voz calma que treinara por anos para não demonstrar fraqueza. Saiu do posto, mas em vez de voltar para casa, percorreu cada viela próxima, perguntando em salões de beleza, botecos, barracas de comida, lojinhas de roupas e farmácias se precisavam de ajuda. O “não” era quase sempre imediato, seguido de um olhar de desconfiança ou pena.
Enquanto caminhava, viu Gabriel, o braço direito do terrorista, passando em uma moto potente. O motor roncava alto, e ele levava uma expressão de quem não sorria havia anos. As pessoas se afastavam do caminho, e alguns moradores chegavam a encostar na parede para dar passagem. Melissa, no entanto, manteve-se no meio da rua, ereta, sem vacilar — não seria intimidada por ninguém.
Quando voltou para casa no fim da manhã, encontrou Alice lendo um livro. A imagem aqueceu seu coração. Alice sorria ao vê-la chegar e corre para seus braços, implorando atenção. Ela a abraçou com força, deixando as lágrimas escaparem. Estava exausta, mas ainda de pé.
O restante da tarde foi dedicado a limpar o barraco. Melissa esfregou cada canto, limpou as janelas, lavou o banheiro e organizou as poucas roupas. Alice a ajudava com alegria.
— Vai dar certo, mãe? — perguntou Alice, com os olhinhos marejados.
— Vai sim, meu amor. — Melissa respondeu, segurando o rosto dela com ternura. — Porque a mamãe nunca vai desistir de você.
O resto do dia se arrastou entre cuidados com as crianças e a preparação de um jantar simples. Enquanto cortava legumes, Melissa pensava em como a vida dera tantas voltas. De um casamento infeliz em Botafogo para a solidão da viuvez, da luta para pagar aluguel até aquele momento: morando no Vidigal, com uma filha e a esperança de encontrar um emprego que sustentasse sua família.
Quando anoiteceu, a calmaria não chegou. O som de tiros ecoou distante, interrompendo o silêncio. Melissa abraçou a filha com força, tentando não demonstrar medo. Alice já entendia o significado daqueles estampidos e, silenciosamente, se encolhera ao lado dela. Era a realidade nua e crua: no Vidigal, a qualquer hora do dia ou da noite, a violência lembrava a todos quem mandava ali.
De madrugada, Melissa acordou assustada com vozes altas na rua. Espiou pela janela e viu homens armados caminhando com fuzis pendurados no peito. Um deles gritava ordens enquanto outro arrastava um morador pelo braço. Ela sentiu o coração disparar. Sabia que o Vidigal tinha suas próprias regras — e que qualquer passo em falso poderia custar uma vida.
Mesmo assim, ao fechar a cortina improvisada, Melissa não permitiu que o medo tomasse conta. Deitou-se no colchão junto da filha, a abraçou e prometeu a si mesma que faria o impossível para protegê-las. Sabia que tinha entrado em um mundo que não perdoava os fracos — mas ela não era fraca.
E enquanto o som dos tiros se tornava cada vez mais distante, ela adormeceu com um pensamento que a mantinha viva: não importava o que viesse, estava pronta para enfrentar tudo.
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