Isabela Duarte
Idade: 26 anos
Nacionalidade: Brasileira
Naturalidade: Belo Horizonte – MG
Formação: Graduada em Turismo com ênfase em Hotelaria pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Profissão atual: Recepcionista no Hotel Esplendor, um hotel de luxo em São Paulo.
Lorenzo Ferraz
Idade: 33 anos
Nacionalidade: Brasileiro, com dupla cidadania italiana
Naturalidade: São Paulo – SP
Formação: Graduado em Administração de Empresas com MBA em Finanças Internacionais pela London Business School
Profissão atual: CEO do Grupo Ferraz, um império empresarial com investimentos nos setores de hotelaria, aviação executiva, e construção civil.
Beatriz Monteiro Ferraz
Idade: 30 anos
Nacionalidade: Brasileira
Naturalidade: Brasília – DF
Formação: Graduada em Relações Internacionais pela Universidade de Genebra
Profissão atual: Diretora de Imagem e Relações Públicas do Grupo Monteiro
Henrique Monteiro
Idade: 28 anos
Nacionalidade: Brasileiro
Naturalidade: Brasília – DF
Formação: Graduado em Artes Cênicas e Cinema pela Universidade de São Paulo (USP)
Profissão atual: Roteirista freelancer e documentarista em início de carreira
A chuva tamborilava contra os vidros do saguão, transformando a cidade em um reflexo borrado de luzes e passos apressados. Isabela apertou os botões do uniforme e ajeitou a franja atrás da orelha, tentando ignorar o frio que subia pelas pernas. O turno da noite no hotel Esplendor geralmente era tranquilo — hóspedes discretos, executivos cansados, ou celebridades protegidas pelo luxo cinco estrelas do lugar.
Ela nunca se destacava. Era eficiente, silenciosa, invisível. E gostava assim.
Até aquela noite.
Ele chegou como uma tempestade em pele de homem. Um carro preto deslizou até a entrada, e dele saiu Lorenzo Ferraz. Alto, elegante, o terno sob medida parecia moldado à sua presença dominante. Os seguranças o acompanharam até a recepção, mas bastou um gesto para que se afastassem. Ele preferia agir sozinho. Sempre foi assim — dono de tudo, mas com um ar distante, quase inalcançável.
Isabela o reconheceu de imediato. O rosto dele já estampara capas de revistas, colunas de economia, até boatos em redes sociais. Mas ao vivo, era diferente. Havia algo no olhar — frio, calculista, mas cheio de algo não dito, como se escondesse uma dor ou uma lembrança que nunca cicatrizou.
— Boa noite, senhor — disse ela, a voz surpreendentemente firme. — Precisa de ajuda com o check-in?
Ele ergueu os olhos. E por um segundo, o tempo parou.
Não havia arrogância ali. Nem charme forçado. Havia só... silêncio.
— Você é nova aqui? — perguntou Lorenzo, curioso, como se não esperasse reparar em ninguém.
— Não exatamente. Mas talvez eu seja fácil de ignorar.
Ele sorriu. Um sorriso breve, quase imperceptível, que contradizia tudo que a mídia dizia sobre ele.
— Pode me recomendar um bom vinho? — perguntou, com um tom mais leve, apoiando os antebraços sobre o balcão.
Ela hesitou, mas indicou um Malbec argentino, com uma nota suave de baunilha. Não era o mais caro da adega, mas o mais envolvente. Lorenzo pediu que fosse enviado à suíte presidencial. Depois, fez uma pausa.
— Você poderia subir e explicar ao garçom como servir.
Isabela arregalou os olhos. Aquilo não era normal. Não era parte do protocolo.
— Senhor, eu...
— Só hoje — disse ele, encarando-a com uma firmeza gentil. — Só uma noite. Sem perguntas.
Ela hesitou por longos segundos. A proposta era absurda. Impossível. Inaceitável. Mas seu coração ainda doía — fresco como um corte feito há pouco.
Horas antes, ela havia descoberto que o namorado com quem dividia planos — e ilusões — a traía. Mensagens escondidas, desculpas esfarrapadas, e por fim, a confirmação nos olhos dele quando ela o confrontou. Um silêncio covarde. Um fim frio.
Isabela estava cansada de ser a mulher que esperava, que se anulava, que aceitava menos do que merecia.
Então, por que não?
Por que não se permitir uma loucura? Uma noite sem explicações? Uma fuga?
Ela inspirou fundo.
— Só uma noite — respondeu, com um sorriso que não chegou aos olhos.
A suíte era um espetáculo de mármore, vidro e silêncio. O vinho estava lá. A desculpa também. Mas quando os olhos de Lorenzo encontraram os dela novamente, não havia mais protocolo. Só havia dois desconhecidos tentando fugir de suas próprias vidas — pelo tempo que o relógio permitisse.
Ele a beijou com urgência, mas sem pressa. Como se cada segundo fosse um luxo. Isabela se entregou, não como uma funcionária assustada, mas como uma mulher que, por uma noite, ousou existir. Sem limites, sem regras, sem passado.
As roupas caíram como folhas ao vento, e os corpos se encontraram com fome, calor e entrega. A cama se tornou um santuário de silêncios preenchidos por respirações aceleradas e toques que pareciam promessas não ditas.
Ele odiava noites chuvosas.
Não pela água — mas pela forma como tudo parecia mais lento, mais introspectivo. Como se o mundo parasse por alguns minutos só para lembrá-lo do que ele preferia esquecer.
Lorenzo Ferraz chegou ao Hotel Esplendor tarde demais para se importar com formalidades. Não queria jantares elaborados, nem bajulação. Queria silêncio. Um copo de vinho. Um lugar onde pudesse, por algumas horas, deixar de ser ele — o bilionário, o herdeiro, o nome que todos cochichavam pelas costas.
Enquanto caminhava pelo saguão, já sabia que não esperava nada daquela noite.
Até que a viu.
A recepcionista.
Ela não era como as outras. Não tentava chamar atenção. Não sorria demais, não se ajeitava para impressioná-lo. E ainda assim, Lorenzo sentiu o olhar ser puxado por ela como se algo invisível o ligasse àquela figura simples e serena atrás do balcão.
Isabela.
Ele só soube o nome dela mais tarde. Mas naquele instante, só enxergou os olhos castanhos que se ergueram com segurança inesperada para encarar os dele.
Ela não era bonita da maneira óbvia. Era bonita da maneira que você percebe quando olha duas vezes — e aí não consegue mais parar de olhar.
— Você é nova aqui? — perguntou ele, quase sem pensar.
Não sabia por que falou. Ele nunca falava com recepcionistas. Mas ela... provocava algo diferente. Um tipo de silêncio confortável que ele não sentia há muito tempo.
— Não exatamente. Mas talvez eu seja fácil de ignorar.
A resposta dele foi um sorriso, curto, verdadeiro. E ali, pela primeira vez em semanas, Lorenzo esqueceu dos contratos, dos números, das exigências familiares. Esqueceu até o motivo de estar ali.
Ela sugeriu um vinho. Um Malbec argentino. Ele não ligava para rótulos, mas havia algo no jeito como ela falou — como se aquele vinho tivesse história, alma. Como se ela mesma o tivesse escolhido em segredo, só para ele.
Ele aceitou.
E então disse algo que surpreendeu até a si mesmo:
— Você poderia subir e explicar ao garçom como servir.
Foi a desculpa mais mal formulada que já dissera na vida. Mas ele precisava vê-la mais uma vez. Precisava estender aquele instante.
Quando ela hesitou, ele viu nos olhos dela uma dúvida. Mas também viu dor. Algo recente, cru. E reconheceu — porque carregava a mesma coisa por dentro.
— Só hoje. Sem perguntas.
Quando ela aceitou, Lorenzo sentiu o próprio coração acelerar. Aquilo não fazia parte do roteiro da sua vida. Mas ele não queria seguir roteiro algum naquela noite.
Na suíte, quando ela entrou, algo mudou no ar. O vinho era só uma ponte. O olhar dela, uma promessa silenciosa. E quando ele se aproximou, não foi com a pressa de um homem no controle — mas com a curiosidade de alguém que encontra algo raro.
Ela não era como as outras mulheres que conhecera. Não se entregava para agradar. Se entregava porque escolhia.
E isso o desarmou completamente.
O toque dela queimava. O silêncio entre eles dizia mais do que mil conversas. Os lençóis guardariam para sempre os rastros daquela noite — onde, pela primeira vez em muito tempo, Lorenzo sentiu que não precisava fingir ser forte.
Quando ela adormeceu em seus braços, ele ficou ali, por longos minutos, observando o contorno do rosto dela, o peito subindo e descendo suavemente. Um pensamento proibido cruzou sua mente: E se...
Mas Lorenzo Ferraz não vivia de “e se”.
Na manhã seguinte, ele partiu sem olhar para trás.
Foi covarde, sim. Mas achou que era o certo.
Mal sabia ele que, naquela noite em que achou ter deixado tudo para trás, havia deixado o mais importante.
Ponto de vista de Isabela
Ela achava que o mais difícil seria vê-lo outra vez.
Mas não era.
O mais difícil era ter que vê-lo todos os dias e fingir que aquela noite… não existiu.
Lorenzo caminhava entre os corredores do hotel como se pertencesse àquele lugar — e talvez pertencesse mesmo. Alto, elegante, distante. Era sempre cercado por reuniões, números e ordens dadas com precisão. Tão impenetrável quanto no dia em que partiu sem dizer adeus.
Mas agora, Isabela não era mais a mesma.
Mesmo que quisesse, não conseguia ignorar que algo dentro dela estava mudando.
No início, foram pequenos sinais.
Uma leve tontura ao subir as escadas.
Um enjoo inesperado ao servir café.
E uma sensibilidade estranha quando o perfume de uma hóspede a fez recuar involuntariamente.
Ela culpou o estresse.
Culpou a falta de sono, a alimentação irregular, as emoções engasgadas que carregava desde aquela noite.
Só isso, dizia para si mesma.
Só preciso de descanso.
Mas o espelho começava a mostrar algo diferente. Seu rosto parecia mais pálido. As olheiras não sumiam mais com corretivo. Os botões da camisa começaram a apertar no peito — algo sutil, mas novo.
E mesmo assim, ela negava.
Não podia ser.
Não com ele. Não com Lorenzo.
Seria como prender para sempre um elo com alguém que agora mal a cumprimentava. Um homem que passou por sua vida como uma sombra quente e sumiu como se nada tivesse acontecido.
Mas o corpo insistia. E o tempo… o tempo também.
Era fim de tarde quando ela teve que subir até o andar executivo com um pedido especial. O elevador estava cheio, então ela foi pelas escadas. Ao chegar no 15º andar, sentiu uma pontada na base do estômago. Não era dor. Era uma pressão estranha, acompanhada por um mal-estar que subiu até o peito.
Encostou-se na parede. Respirou fundo.
Vai passar, pensou.
Mas, pela primeira vez, o medo bateu forte.
E se…?
Isabela não queria pensar naquela hipótese. Não podia.
Ela não sabia lidar com mais uma incerteza.
Especialmente quando Lorenzo passava por ela todos os dias e sequer a olhava.
Mas naquela mesma noite, sozinha em seu pequeno apartamento alugado, sentada no sofá com uma manta nos ombros e um chá esquecido na mesa, ela levou a mão ao abdômen, de forma involuntária.
Havia um silêncio ali. Quente. Vivo.
Como se algo dentro dela — ainda não revelado — estivesse começando a existir.
Um arrepio percorreu sua espinha.
Ela olhou para o teto por longos segundos.
Não chorou.
Não sorriu.
Apenas sentiu.
E naquele instante silencioso, mesmo sem provas, mesmo sem nomes ou exames, algo dentro dela soube.
Ainda não estava pronta para aceitar.
Mas o corpo dela já sabia.
E em breve, não teria mais como fingir.
Ponto de vista de Lorenzo
A rotina era a mesma: reuniões, contratos, telefonemas. Ele falava, decidia, ordenava. Era o Lorenzo Ferraz que todos esperavam que ele fosse — o herdeiro centrado, frio, calculista.
Mas por dentro... tudo estava em ruínas.
Ele não deveria ter voltado àquele hotel.
Mas era o único lugar onde o barulho do mundo parecia diminuir.
E era ali, entre os corredores luxuosos e os sorrisos ensaiados dos funcionários, que ele a via.
Isabela.
Todos os dias.
O rosto que ele fingia não reconhecer.
A mulher que ele não conseguia esquecer.
E pior: a mulher que ele nunca deveria ter tocado.
A culpa pesava mais a cada passo. Porque aquela noite não fora um encontro casual qualquer — fora uma fuga. Um ato desesperado de alguém que, pressionado por todos os lados, se permitiu respirar por um instante... e acabou cruzando um limite irreversível.
Naquela noite, horas antes de conhecê-la, ele havia discutido com o pai. Mais uma vez.
— Está na hora de se casar com a Beatriz. Já passou da hora. A imagem da empresa depende disso.
— A imagem da empresa ou a sua? — retrucara Lorenzo, tentando manter a voz baixa.
— A nossa família precisa de estabilidade. A sua noiva é discreta, educada, vem de uma família forte. É o casamento perfeito. Você não precisa amar. Precisa funcionar.
Não precisa amar. Precisa funcionar.
Essas palavras ecoavam até hoje. Como uma sentença.
Ele saiu de casa naquela noite sem rumo. Com raiva, com dor, com uma vontade sufocante de desaparecer por algumas horas. Entrou no carro sem destino, dirigiu por ruas desconhecidas até o único lugar que parecia neutro — o Hotel Esplendor.
Não estava procurando ninguém. Muito menos redenção.
Mas então... viu ela.
Isabela. Com seu uniforme simples, os cabelos presos, os olhos grandes e firmes demais para alguém tão discreta. Havia uma tristeza bonita nela. E uma força que o fez parar.
Foi ela que o viu primeiro como homem, não como nome.
Foi com ela que ele se permitiu ser só Lorenzo.
E sim — naquela noite, ele traiu Beatriz.
A noiva com quem ele já não tinha nada, além de um contrato informal assinado por expectativas familiares.
Foi errado.
Mas foi verdadeiro.
E talvez seja isso que mais o assombre.
Agora, de volta ao mesmo hotel, ele fingia.
Fingia que não sentia nada quando Isabela o cumprimentava.
Fingia que não reconhecia o perfume sutil que ela usava.
Fingia que não percebia os olhos dela evitarem os dele com tanto cuidado.
Mas todos os dias, ao vê-la, a cena voltava: os dedos entrelaçados, os corpos colados, os gemidos contidos no silêncio da suíte, o calor da pele dela contra a sua. E depois, o sono tranquilo dela, abraçada a ele como se o mundo inteiro coubesse ali.
Ele a deixou dormindo.
Como um covarde.
E agora, todas as noites, ele se perguntava: e se eu não tivesse ido embora?
Mas Lorenzo não sabia amar do jeito certo.
Foi criado para cumprir função, não desejo.
Para construir impérios, não vínculos.
Mesmo assim, agora ele estava ali. Preso.
Entre a mulher que todos esperavam que ele honrasse…
E a mulher que ele deixou.
Isabela.
o coração dele já carregava um peso invisível.
Um pressentimento.
Como se soubesse, lá no fundo, que aquela noite deixaria marcas — em ambos.
E a pergunta o atormentava:
Será que ela o odeia por tê-la deixado?
Ou pior… será que ela nunca o amou de verdade?
Mas ele não podia perguntar.
Porque perguntar significava abrir uma porta que ele não tinha certeza se teria coragem de atravessar.
Ainda não.
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