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Nos Braços de um Sonho

Nos braços de um sonho

Personagens principais:

• Leonardo Ferraz – 35 anos, CEO de uma das maiores empresas de tecnologia do país. Rico, bonito, arrogante, mas extremamente protetor e carinhoso com quem ama. Apesar da fama de frio nos negócios, sonha em ser pai, mas nunca encontrou alguém que o fizesse querer formar uma família… até agora.

• Clara Oliveira – 24 anos, simples, pobre, mas muito bonita e de um coração puro. Trabalha como garçonete em um café pequeno. Mãe solo da pequena Sofia, de 2 aninhos. A família adotiva de Clara morreu e ela nunca conheceu seus pais biológicos. vive com dificuldades, mas nunca perde o sorriso e a força.

Sofia, filha de clara. Tem dois aninhos, é muito inteligente e sente muito q falta de uma figura paterna em sua vida. Sofia é muito apegada a Nicolas, já que é a única figura masculina que ela tem na vida.

Nicolas, 30 anos, vizinho e amigo de Clara. Nicolas é como um irmão para Clara, eles são amigos desde que Clara se mudou para o bairro, quando ainda estava grávida de Sofia. Nicolas trabalha em um escritório de advocacia e não tem família.

Capítulo 1 —

A manhã começara fria em New York, com uma fina névoa cobrindo as ruas estreitas de manhattan. Leonardo Ferraz caminhava sozinho pela calçada, vestindo um sobretudo escuro e óculos escuros que escondiam parcialmente sua identidade. Pela primeira vez em meses, ele dispensara o motorista. Precisava de silêncio. De anonimato. De algo que não soubesse a preço.

Havia acordado antes do sol nascer, como sempre. Mas naquela manhã, algo dentro dele pesava mais do que de costume. Talvez fosse a solidão. Talvez o vazio de uma casa grande demais e fria demais. Ou o silêncio constante que o lembrava, todos os dias, de que nenhum sucesso profissional preenche o espaço de um sonho ainda não vivido.

Ele queria ser pai.

Mas não de qualquer jeito. Queria uma família. Um lar de verdade. E, depois de tantas decepções e relacionamentos rasos, começava a duvidar se isso era mesmo para ele.

Foi então que, perdido em pensamentos, avistou uma pequena cafeteria na esquina. A fachada simples, pintada em tons pastéis, destoava dos lugares que costumava frequentar. Mas algo ali… o chamou.

Empurrou a porta, e um sininho tilintou acima de sua cabeça. O cheiro de pão fresco e café passado na hora o envolveu como um abraço inesperado. O lugar era acolhedor, com mesas de madeira, cortinas floridas e prateleiras cheias de bolos caseiros.

— Bom dia! — disse uma voz doce atrás do balcão.

Leonardo ergueu os olhos.

Ali estava ela.

Clara.

Cabelos castanhos presos em um coque bagunçado, um avental florido sobre a camiseta simples. Os olhos grandes, castanhos e vivos, escondiam cansaço… mas também uma força serena. Ela sorriu, e por um breve instante, ele esqueceu até o motivo de estar ali.

— Vai querer o quê hoje? Café ou silêncio? — ela brincou, ao notar o olhar distante dele.

Ele sorriu de canto, surpreso pela espontaneidade.

— Um café, por favor. E talvez um pedaço desse bolo. — apontou para um de cenoura com cobertura generosa de chocolate.

— Feito por mim — disse, orgulhosa. — Então esteja avisado: é viciante.

Enquanto Clara preparava o pedido, uma garotinha apareceu de trás do balcão, segurando um coelho de pelúcia pela orelha.

— Mamãe… o moço é novo? — perguntou a menina, com a voz arrastada de quem havia acabado de acordar.

Clara se abaixou e a pegou no colo.

— É sim, meu amor. Dá bom dia pra ele.

A menininha esticou o bracinho e acenou.

— Bom dia, moço bonito!

Leonardo riu, surpreso com a espontaneidade da pequena. Os olhos dela eram idênticos aos da mãe. E o coração dele — que costumava ser frio, metódico, calculado — bateu mais forte pela primeira vez em muito tempo.

— Bom dia, princesa. Qual é o seu nome?

— Sofia. E você?

Ele hesitou por um segundo. Costumava evitar se apresentar. Mas por algum motivo, quis ser sincero.

— Leonardo. Mas pode me chamar de Léo, se quiser.

Sofia sorriu.

— Tio Léo, então.

Clara olhou para ele, meio sem jeito.

— Desculpa… ela fala demais. E se apega fácil.

Leonardo balançou a cabeça, com um sorriso gentil.

— Isso não é um defeito. É um presente.

E foi nesse instante, naquela cafeteria esquecida pelo luxo da cidade, que o CEO mais poderoso do país percebeu: talvez, só talvez… o que ele tanto procurava não estivesse tão longe

Leonardo voltou para aquela cafeteria todos os dias naquela semana.

Sempre no mesmo horário. Sempre pedindo o mesmo bolo. Sempre escolhendo a mesa mais próxima do balcão, onde podia observar Clara atender com delicadeza, sorrir para os clientes habituais e, vez ou outra, correr atrás de Sofia, que transformava o lugar no próprio parquinho.

Era quase ridículo. Ele, um homem acostumado a reuniões com acionistas e jantares de gala, agora se via preso à rotina de um café de bairro. Mas ali havia uma paz que o mundo lá fora nunca lhe ofereceu. Uma simplicidade que ele não sabia que precisava.

Na terceira manhã, Clara já nem perguntava mais o pedido. Apenas colocava o café na mesa, com o bolo quentinho ao lado.

— Você é sempre tão pontual assim ou tá mesmo viciado no meu bolo? — ela brincou, apoiando as mãos na cintura.

Leonardo sorriu, encostando-se na cadeira.

— Os dois. Mas eu diria que a companhia também tem mérito.

Clara sorriu, sem saber ao certo como reagir. Aquela era a primeira vez, em muito tempo, que um homem a elogiava sem segundas intenções explícitas. Ou talvez tivesse… mas havia algo diferente nele. No jeito como olhava para Sofia, no respeito no tom de voz.

Falando nela, Sofia surgiu correndo, os pezinhos batendo no chão de madeira.

— Tio Léo! Hoje eu pintei um sol! Quer ver?

Sem esperar resposta, estendeu um papel amassado, coberto por traços coloridos e uma mancha amarela no centro.

Leonardo pegou o desenho como se fosse uma obra de arte.

— Que lindo, Sofia! Você tem talento. Posso guardar?

Os olhinhos dela brilharam.

— Pode! Mas só se você voltar amanhã pra ver o arco-íris que vou fazer.

— Feito. — ele disse, rindo.

Clara observava tudo em silêncio. E, pela primeira vez em muito tempo, sentiu medo. Não do homem à sua frente, mas do que aquilo estava despertando dentro dela. O instinto protetor que a maternidade lhe deu era forte. Forte demais para permitir que qualquer um se aproximasse. Mas Leonardo… era gentil com Sofia. Genuíno.

E isso a desarmava.

— Posso te fazer uma pergunta? — ela disse, quebrando o silêncio.

— Claro.

— Você tem filhos?

Ele balançou a cabeça.

— Não. Mas… sempre quis.

Clara desviou os olhos, mexendo na toalha da mesa.

— A maioria dos homens corre quando vê uma criança. Ou quando descobre que existe uma.

Leonardo manteve o olhar firme sobre ela.

— Talvez porque eles nunca entenderam o que é sorte de verdade.

Ela riu, sem graça.

— Você é diferente… mas eu não sei ainda se isso é bom ou ruim.

— Nem eu — ele respondeu, com honestidade.

Naquela noite, Clara fechou o café mais tarde que o normal. Sofia dormia no carrinho, com o coelho de pelúcia nos braços. A rua estava silenciosa. Ela acendeu o cigarro que evitava havia meses, só para acalmar os pensamentos.

Leonardo era um mistério. Gentil demais para ser real. Atencioso demais para não esconder alguma coisa.

E ela… estava começando a torcer para que ele não fosse mais um homem que entraria e sairia da vida dela sem aviso.

Mas ela sabia que segredos sempre aparecem. E que nenhum homem com aquele olhar e aquele relógio no pulso era só um cliente qualquer.

O que ela ainda não sabia… era o tamanho do mundo do qual Leonardo fazia parte. E o quanto a verdade, quando viesse à tona, poderia destruir o pouco que ela tinha reconstruído.

Naquela manhã de quarta-feira, Clara olhou para o relógio da parede pela quarta vez. Eram quase nove horas, e a cafeteria já estava cheia de clientes do bairro, mas nenhuma sombra de Leonardo.

Ela não queria admitir — nem para si mesma — que estava esperando por ele. Mas seu coração a traía cada vez que ouvia o sino da porta se abrindo. E o nome dele já estava na xícara separada sobre o balcão, como nos outros dias.

Mas Léo não apareceu.

Nem naquela manhã.

Nem na seguinte.

— Mamãe, cadê o Tio Léo? — perguntou Sofia pela segunda vez naquele dia, com os olhinhos ansiosos e a voz doce.

— Ele deve ter tido que trabalhar, filha — respondeu Clara, tentando soar natural enquanto dobrava guardanapos.

— Mas ele vem todo dia…

Clara se abaixou e ajeitou uma mecha do cabelo da filha.

— Às vezes os adultos têm que sair às pressas. Pode ser que ele viaje. Mas quando puder, ele volta.

Sofia assentiu devagar, mas seus olhos brilharam de um jeito estranho. Era o começo do que Clara conhecia muito bem: um silêncio dolorido. O tipo de vazio que crianças sentem quando alguém que amam desaparece sem explicação.

Na noite do segundo dia, Sofia começou a reclamar de dor de cabeça.

No terceiro, a febre apareceu.

— 38.9º… — Clara murmurou, aflita, enquanto tirava o termômetro e passava um pano frio na testa da filha, que chorava baixinho, com o coelho de pelúcia apertado contra o peito.

— Mamãe, o Tio Léo vai vir? — perguntou, a voz trêmula.

— Vai sim, meu amor. Ele só foi resolver umas coisas. Mas ele gosta muito de você. Ele não esqueceu da gente.

Mas no fundo, Clara não sabia disso. Não tinha número. Não sabia onde ele morava. Não sabia nem o sobrenome dele.

E foi aí que percebeu: estava se deixando envolver por alguém que ainda era um estranho.

E Sofia estava pagando o preço.

Enquanto isso, em um hotel cinco estrelas de Nova York, Leonardo olhava para a tela do celular, com mensagens e chamadas perdidas da sua equipe. As reuniões tinham sido longas, o tempo escasso, e ele mal conseguira respirar nos últimos dois dias.

Mas o que mais o incomodava era não ter conseguido avisar Clara.

Pegou o celular e digitou o número da cafeteria que tinha anotado uma semana antes, mas hesitou antes de ligar.

E se ela achasse que ele era igual a todos os outros?

E se já fosse tarde demais?

Ele não sabia. Mas precisava voltar o quanto antes.

Na manhã do quarto dia, a campainha da cafeteria tocou antes mesmo do horário de abertura. Clara estava no balcão, de moletom e com olheiras profundas, limpando as xícaras de forma automática. Sofia dormia no sofá do canto, com o rosto ainda pálido da febre que, graças a Deus, começava a baixar.

Ela foi até a porta, destrancou — e o coração disparou.

— Leonardo?

Ele estava ali. Cabelos bagunçados, barba por fazer, os olhos cansados mas ansiosos. Como se tivesse corrido da porta do avião até ali.

— Desculpa… — foi tudo o que ele conseguiu dizer.

Clara cruzou os braços, tentando manter a firmeza.

— Três dias, Léo. Três dias sem uma palavra. Você tem ideia do que isso fez com a minha filha?

— Eu não consegui avisar. Foi uma viagem de emergência. Reuniões, mudanças… mas isso não é desculpa. Eu devia ter dado um jeito. Eu falhei com vocês.

Ela engoliu o choro que ameaçava vir.

— Sofia teve febre emocional. Ficou três noites perguntando por você. Não comeu, não brincou, só chorava. E eu… — a voz dela falhou. — Eu deixei você se aproximar demais. Rápido demais. E agora ela tá sofrendo.

Ele se aproximou, devagar.

— Me deixa vê-la?

Clara hesitou… mas então abriu espaço para ele passar.

Leonardo se aproximou do sofá, ajoelhou-se e tocou a mão pequena de Sofia.

— Princesa…

Sofia abriu os olhos devagar, e quando o viu, murmurou:

— Tio Léo… você voltou?

Ele sorriu, emocionado.

— Voltei, meu amor. E não vou sumir mais assim, tá?

Ela fechou os olhos de novo, com um pequeno sorriso.

Clara observava a cena, o coração em pedaços.

Porque agora ela sabia.

Se ele fosse embora de novo — não só Sofia se partiria. Ela também.

Nos braços de um sonho

A manhã na cafeteria começou tranquila.

Sofia, recuperada da febre, parecia mais animada. Seus desenhos estavam espalhados sobre a mesa de sempre, e Leonardo havia aparecido mais cedo, trazendo um livrinho novo de colorir — presente que fez os olhinhos da menina brilharem.

Clara observava os dois de longe, com um nó no peito. Ver Sofia tão feliz ao lado de Leonardo era como ver um sonho tomando forma… e isso a assustava. Porque sonhos, às vezes, desmoronam.

— Tá tudo bem? — perguntou Cida, a colega de trabalho da cafeteria, vendo Clara pensativa.

— Tá sim… — mentiu, forçando um sorriso. — Só pensando demais.

Naquele momento, o sino da porta tocou.

Clara virou-se automaticamente… e seu rosto se iluminou de alívio genuíno.

— Nicolas! — disse, abrindo os braços.

O homem entrou sorrindo, alto, vestido com roupa social e a pasta de trabalho debaixo do braço. Seu jeito era calmo, sereno. E quando se abaixou para abraçar Sofia, o carinho foi imediato.

— E aí, minha princesa? Tá melhor?

— Tô sim! O Tio Léo me deu um livro novo! — disse ela, mostrando o livrinho com orgulho.

Nicolas olhou para Leonardo com uma sobrancelha arqueada, curioso. E então se levantou, estendendo a mão.

— Nicolas. Vizinho da Clara desde… sempre. E advogado também — disse, num tom amigável, porém protetor.

Leonardo apertou sua mão com firmeza, mas com cordialidade.

— Leonardo. Prazer.

— O prazer é meu. Ouvi falar muito de você. — Nicolas lançou um olhar breve para Clara, como quem queria conversar mais tarde.

Clara percebeu. Conhecia aquele olhar. O olhar de cuidado. De quem sempre esteve ali.

Minutos depois, Clara e Nicolas estavam no pequeno depósito dos fundos, em meio a sacos de café e prateleiras. Sofia e Leonardo seguiam brincando sob o olhar atento de Cida.

— Você vai me contar direito quem é esse cara? — perguntou Nicolas, direto. — E por que ele tá tão colado em vocês?

— Não é o que parece, Nico. Ele é… gentil. Carinhoso com a Sofia. E tem sido um apoio pra mim. Coisa que você sabe que eu nunca tive.

— Você me tem, Clara. Sempre teve. — respondeu ele, sem ressentimento, mas firme. — Só quero ter certeza de que esse cara não vai aparecer por algumas semanas e depois sumir. Você já tem o suficiente nas costas.

Ela suspirou, cruzando os braços.

— Eu sei. E agradeço por tudo. Mas o Léo é diferente. Ele tá tentando fazer parte da vida da gente, mesmo com a vida dele sendo… completamente oposta à nossa.

— Clara… — Nicolas se aproximou, mais suave. — A única coisa que me importa é você e a Sofia estarem seguras. E felizes. Se esse cara for de verdade… ótimo. Mas eu vou ficar de olho.

Clara assentiu, emocionada.

— Eu sei que vai.

De volta ao salão, Sofia dormia no sofá com o livrinho no colo. Leonardo estava sentado ao lado dela, acariciando seus cabelos com carinho sincero. Nicolas observava de longe, avaliando. Clara, parada na porta dos fundos, olhava os dois homens mais importantes da vida dela ali, em contraste total.

O presente e o passado.

A proteção constante… e o novo amor que nascia.

Mas será que os dois mundos podiam conviver em paz?

Ela ainda não sabia. Mas uma coisa era certa:

Sofia merecia todas as formas de amor que o mundo pudesse lhe dar.

Clara trancou a porta da cafeteria com as mãos trêmulas.

Era a terceira noite que Leonardo passava para “ver Sofia”, mas ela já não sabia mais se era por carinho… ou costume. Ele estava presente demais, rápido demais. E por mais que seu coração se derretesse toda vez que via os olhos de Sofia brilharem ao vê-lo, algo dentro dela começou a piscar em vermelho.

Respirou fundo.

Olhou para a filha, empoleirada no colo de Nicolas, com um livro aberto.

Leonardo estava ali também, de pé, observando de longe. Quieto demais. E não era por falta de assunto.

Era ciúme.

Ela sentia no ar.

— Nicolas, você pode levar a Sofia pra casa? Hoje ela está mais grudada em você do que nunca — pediu Clara, com um sorriso gentil, mas a voz baixa e firme.

— Claro — respondeu ele, sem hesitar. — Qualquer coisa, me chama.

Ela assentiu, agradecida. Quando os dois saíram, ela se virou para Leonardo, que a observava com um misto de frustração e incerteza.

— A gente precisa conversar.

Leonardo cruzou os braços, tenso.

— Sobre o Nicolas?

— Sobre nós três. Você, eu e Sofia.

Ele ficou em silêncio.

— Léo… eu gosto da sua presença. Muito mais do que imaginei que gostaria. Mas estou deixando você entrar rápido demais na nossa vida. E isso me assusta.

— Eu só quero estar perto de vocês — disse ele, a voz mais baixa, ferida.

— Eu sei. Mas eu preciso lembrar que minha prioridade é a Sofia. E que qualquer mudança, qualquer laço, qualquer ilusão… afeta ela também.

Leonardo respirou fundo, os olhos firmes nela.

— Você acha que eu seria uma ilusão?

— Eu não sei. É isso que me apavora.

Mais tarde, naquela noite, Leonardo entrou em sua casa sem ligar as luzes.

A mansão era silenciosa, fria como ele costumava preferir. Mas agora… o silêncio incomodava.

Ao passar pela cozinha, encontrou Maria, sentada à mesa, tomando seu chá de camomila como fazia todas as noites desde que ele era menino.

— Não esperava te ver de volta tão cedo — comentou ela, com um olhar afiado.

Leonardo se sentou sem dizer nada por alguns segundos. Até que desabou:

— Eu tô com medo de perder algo que talvez nunca tenha tido.

Maria o encarou.

— A moça?

Ele assentiu, os olhos baixos.

— Clara. E a filha dela, Sofia. Eu não sei o que está acontecendo comigo, Maria. Eu me sinto parte da vida delas. E, ao mesmo tempo, um intruso.

— E por que sente isso?

— Porque tem um cara lá. O tal do Nicolas. Vizinho, advogado… boa pinta, esperto. A Sofia vive grudada nele. Clara fala com ele com uma liberdade que… me irrita. Me faz sentir pequeno.

Maria suspirou.

— Isso não é sobre ele, Leonardo. É sobre você.

— Como assim?

— Você sempre teve tudo fácil, meu filho. O que quis, comprou. O que não quis, mandou embora. Mas essa mulher aí… ela é diferente. E você também está sendo. Porque pela primeira vez na vida, você quer algo que não pode controlar.

Leonardo engoliu seco.

— Ela tá certa. Entrar assim, tão rápido… talvez eu tenha forçado a barra.

— Ou talvez tenha sido sincero demais. Mas se quer que isso dure, vai ter que construir. Tijolinho por tijolinho. Sem pular etapa. E vai precisar aceitar que ela já tem um alicerce forte com esse tal de Nicolas. Ele pode ser o irmão que a vida deu a ela. Você tem que ser outra coisa. Algo que ela escolha. Que ela confie.

Leonardo olhou para o fundo da xícara de chá que Maria empurrou em sua direção.

— E se ela não me escolher?

Maria sorriu, doce e sábia.

— Então você vai seguir em frente com o coração limpo. Porque o amor de verdade nunca é invasão. É convite.

Ele assentiu, silencioso.

E pela primeira vez em muito tempo, Leonardo Ferraz, o homem que não temia nada, sentiu que o amor o estava ensinando a esperar.

A manhã nasceu cinzenta, abafada. Clara acordou com o corpo pesado, os músculos doloridos e a cabeça latejando. Não tinha forças nem pra levantar da cama.

Sofia, ao seu lado, desenhava com lápis de cor sobre uma folha amassada.

— Mamãe, você vai trabalhar?

Clara sorriu, cansada, e fez um carinho na filha.

— Hoje não, meu amor… mamãe não está se sentindo bem.

Horas depois, do outro lado da cidade, Leonardo terminava sua reunião às pressas. Desde cedo havia passado na cafeteria. E Clara não estava. Nem Sofia. A garçonete que o atendeu parecia hesitar ao dar uma resposta, mas acabou cedendo:

— Ela não veio. Disse ontem que estava meio gripada… quer que eu passe o endereço? Ela mora aqui perto.

Sem pensar duas vezes, ele pegou o endereço, entrou no carro e seguiu direto. O bairro era simples, mas acolhedor. Ao chegar, bateu na porta suavemente. Nada.

Tentou de novo. Mais forte.

E então ouviu passos pequenos e arrastados.

— Tio Leo! — gritou Sofia, ao abrir a porta com certa dificuldade.

Leonardo se abaixou, surpreso, e ela já se jogou em seu colo. O coração dele disparou.

— Oi, meu anjo… sua mamãe tá em casa?

— Tá dodói. Vem cuidar dela com a gente?

O convite soou como uma flecha no peito.

Clara apareceu logo depois, os olhos sonolentos, pálida.

— Léo? O que você tá fazendo aqui?

— Fiquei preocupado. Você sumiu. Tive que vir.

Ela hesitou. Queria dizer que não precisava. Que estava bem. Mas, pela primeira vez em muito tempo, ela não queria fingir força.

— Entra… a casa é simples, mas tem espaço.

Ele sorriu, entrou. Sentiu o calor do lar, o cheiro de lavanda misturado ao de sopa.

— Deita um pouco — disse ele, guiando-a até o sofá. — Eu cuido de vocês hoje.

— Léo, eu tô gripada, posso te contaminar.

— Eu corro o risco.

Clara riu, fraca, mas genuinamente.

Enquanto ela repousava, ele foi até a cozinha com Sofia. A pequena o ajudava a pegar talheres e pedia para ele cantar musiquinhas. Quando voltou, trazia uma sopinha morna.

— Vem, mocinha. Agora é hora de comer — disse ele, oferecendo a colher a Sofia.

Ela abriu a boca feliz, como se aquela fosse a cena mais natural do mundo.

— Assim você vai virar uma menina forte e linda, igual a sua mamãe.

Clara observava a cena com os olhos marejados. Aquela era a imagem que nunca teve. De um homem de verdade. Que ficava. Que cuidava.

— Agora é sua vez — disse ele, virando-se pra ela. — Abre a boca.

Ela riu, mas aceitou a colher. Sentiu-se estranhamente segura.

Depois da sopa, Leonardo ficou ali, sentado ao lado de Clara, com Sofia dormindo deitada em seu colo, a cabeça no ombro dele. Ele a abraçava com carinho, os dedos deslizando pelos cabelos da menina.

— Ela te ama — disse Clara, num sussurro.

— Eu também — respondeu ele, olhando nos olhos dela.

O silêncio que se seguiu foi diferente. Denso. Elétrico.

Leonardo se inclinou, com hesitação. Os olhos dela se fecharam aos poucos.

O beijo veio doce. Quente. Lento. Como se o tempo tivesse parado.

Quando se afastaram, Clara encostou a testa na dele, ainda de olhos fechados.

— Eu devia ter esperado mais pra isso — murmurou.

— Eu esperei a vida inteira — respondeu ele.

E foi nesse exato momento que a porta se abriu.

— Clara?

Nicolas surgiu na entrada, com uma sacola de farmácia na mão.

Silêncio.

O olhar dele foi direto para os três no sofá — Clara ainda colada em Léo, Sofia dormindo no colo dele.

A expressão de Nicolas endureceu.

— Acho que cheguei na hora errada.

Clara se afastou ligeiramente, surpresa.

— Nicolas… eu… não esperava você agora.

Leonardo ajeitou Sofia no colo com delicadeza, mas sem se levantar. O clima era tenso.

— Boa tarde, doutor — disse Léo, educado, mas firme.

— Boa tarde — respondeu Nicolas, seco. — Trouxe os remédios que você pediu ontem. Mas… talvez não sejam mais necessários.

Clara se levantou, ainda tonta.

— São sim. Obrigada por vir. Eu só… não esperava o Léo aqui também.

Nicolas não respondeu. Apenas deixou a sacola na mesa e olhou de novo para a cena, tentando esconder o incômodo.

Leonardo, por sua vez, olhava para Clara com mais certeza do que nunca.

Não queria ir embora.

Mas sabia que aquela guerra… não se ganharia com disputa.

Nos braços de um sonho

O silêncio depois da saída de Nicolas pairava espesso no ar. Clara estava sentada no sofá, visivelmente constrangida, mas também… mexida. O calor do beijo anterior ainda queimava em sua pele, mesmo que tentasse se concentrar na realidade.

Leonardo ajeitou Sofia nos braços, a cabeça dela encostada em seu peito.

— Se quiser que eu vá, eu entendo — disse ele, em voz baixa, respeitosa.

Clara levantou os olhos. Por um instante, vacilou. Mas algo nela mudou. Cansada de fugir dos próprios sentimentos, ela apenas balançou a cabeça.

— Não… fica.

Léo sorriu, discreto, aliviado. Colocou Sofia com cuidado ao lado dela, cobrindo-a com uma mantinha. Depois, se aproximou e sentou-se de novo ao lado de Clara, mas dessa vez, mais perto. Sem cerimônias.

— Você está com febre — disse ele, tocando suavemente a testa dela. — Deita no meu colo. Vai descansar.

— Leonardo…

— Só deita. Eu não mordo — brincou, baixinho, com aquele sorriso que a fazia esquecer o próprio nome.

Ela suspirou e se rendeu. Deitou-se com a cabeça no colo dele, e sentiu os dedos dele começarem a acariciar seus cabelos. Os toques eram leves, íntimos, quase reverentes.

— Você é diferente do que eu imaginava — murmurou ela, sem abrir os olhos.

— E você é tudo o que eu nunca soube que procurava — ele respondeu, firme, olhando para o teto, como se confessasse para si mesmo.

Clara abriu os olhos devagar e virou o rosto pra encará-lo de onde estava deitada. Os rostos tão próximos, as respirações misturadas. O silêncio era puro desejo.

Ela se ergueu lentamente, ficando frente a frente com ele.

— Eu devia mesmo estar evitando isso…

— Mas você não quer, né?

Ela hesitou. Depois negou com a cabeça.

Ele a puxou devagar, uma das mãos na nuca dela. O beijo veio mais firme desta vez, mais intenso, carregado de tudo que não podia mais ser contido. Beijaram-se com a urgência de quem queria compensar o tempo perdido. As mãos dele deslizaram pelas costas dela, os dedos entrelaçando em seus cabelos, e ela se permitiu. Por alguns minutos, não existia o mundo lá fora. Só eles dois.

Até que uma vozinha interrompeu o momento:

— Tio Leo?

Sofia, de pé no sofá, coçando os olhos.

Leonardo e Clara se afastaram rápido, com as bochechas coradas. Mas ele sorriu e a puxou para o colo.

— Oi, minha pequena. Você dormiu bem?

— Você vai embora? — perguntou, abraçando o pescoço dele com força.

Leonardo trocou um olhar com Clara, que apenas observava em silêncio, com o coração disparado.

— Só se você deixar — respondeu ele, sorrindo.

Sofia apertou os bracinhos ao redor dele.

— Então não vai. Dorme aqui com a gente.

Clara abriu a boca para responder, mas a expressão no rosto da filha era de súplica pura. Ela suspirou, vencida.

— Pode ficar no sofá… se quiser.

— No sofá? — brincou ele, fingindo ofensa. — Depois de cuidar de vocês, dar comida na boca, ser travesseiro e babá?

Clara riu.

— Tá certo. Pode usar a cama da Sofia. Eu durmo com ela.

— Nem pensar! — Sofia gritou. — A mamãe e o tio Léo dormem comigo!

Leonardo e Clara se entreolharam, surpresos e meio sem graça.

— Só hoje — disse Clara, com um sorriso envergonhado. — Porque a mamãe está doente… e você também não desgruda do seu novo melhor amigo.

Sofia bateu palmas, feliz.

Minutos depois, os três estavam na cama pequena, amontoados, aconchegados. Sofia ao centro, segura entre os dois. Leonardo passou o braço por cima da menina, tocando a mão de Clara por baixo do cobertor.

Ela apertou de volta.

— Obrigada por ter vindo — sussurrou ela, já meio sonolenta.

— Eu viria mil vezes, Clara. Sempre que você precisar… ou mesmo quando não quiser.

E com o coração mais leve do que em muitos anos, Clara adormeceu entre o que ela tinha perdido… e o que talvez estivesse começando a ganhar.

Um lar.

O sol ainda nascia quando Leonardo abriu os olhos. Clara dormia profundamente, deitada ao lado de Sofia, que o abraçava como um ursinho de pelúcia. A cena fez um sorriso escapar do seu rosto. Se aquilo fosse um sonho, ele não queria acordar.

Mas o cheiro de café vindo da cozinha quebrou a bolha de paz.

Ele se levantou devagar, ajeitando as cobertas com cuidado, e foi até a sala, ainda com o cabelo bagunçado. Ao chegar à cozinha… parou na porta.

Nicolas estava lá.

De avental. Preparando o café da manhã como se aquela fosse a casa dele.

— Bom dia — disse Leonardo, tentando manter o tom calmo.

Nicolas se virou com um meio sorriso, daqueles que escondem espinhos.

— Ah… você ainda está aqui.

— Clara estava passando mal. Achei melhor não deixá-la sozinha — disse Leonardo, cruzando os braços.

— Interessante. Isso é algo que um namorado faria… ou um intruso?

Leonardo arqueou a sobrancelha, sem tirar os olhos dele.

— E você seria o quê, exatamente? O vizinho prestativo? Ou tem outra intenção?

Nicolas pousou a colher na pia, encarando-o.

— Sou alguém que conhece a Clara há anos. Que viu a Sofia nascer. Que ajudou quando ninguém mais ajudava. E que não acha saudável um CEO milionário aparecer do nada e querer ocupar um lugar que não é dele.

O golpe foi direto, mas Leonardo nem piscou.

— E qual seria esse lugar? O de pai? O de homem que se importa? Porque até onde vi… Clara não pareceu incomodada com a minha presença ontem à noite.

Nicolas deu um passo à frente, a tensão entre os dois crescendo como eletricidade estática.

— Você pode ser rico, bonito e carismático, Leonardo. Mas eu conheço homens como você. Eles sempre querem tudo fácil. E quando as coisas apertam… somem.

Leonardo sorriu de lado, frio.

— Eu não sou “homens como eu”. E o que eu quero… não é fácil. Mas vale a pena. Cada segundo.

Nesse momento, Clara apareceu na porta da sala, ainda de pijama e com o rosto abatido.

— Vocês estão discutindo?

Os dois se viraram ao mesmo tempo, tentando suavizar as expressões.

— Só conversando — disseram, quase em uníssono.

Ela franziu o cenho, desconfiada.

— Tá bom… bom dia.

— Bom dia, Clara — disse Nicolas, pegando a xícara. — Fiz chá pra você. Tá quente.

Ela agradeceu com um sorriso breve. Leonardo, por sua vez, se aproximou e tocou de leve sua cintura.

— E a febre?

— Melhor… graças a você — disse ela, sem pensar, antes de perceber que Nicolas ainda estava na cozinha.

O clima ficou estranho por alguns segundos.

Sofia surgiu logo depois, correndo para Leonardo.

— Tio Leo! Você ainda tá aqui!

Ela se pendurou no pescoço dele, e ele a ergueu no ar com facilidade. A menina deu um beijo no rosto dele, espontânea, feliz.

Nicolas observava em silêncio, os olhos escurecendo a cada gesto de carinho que via.

— Você vai voltar hoje? — perguntou Sofia.

— Só se a sua mamãe deixar — disse Leonardo, sorrindo.

Clara ficou sem resposta por um instante. Mas a voz de Nicolas veio antes.

— Clara, posso falar com você depois? A sós?

Ela hesitou. Leonardo percebeu. Estava na cara: Nicolas queria deixar claro que ainda tinha lugar ali… mesmo que ela já estivesse começando a abrir o coração para outro.

— Podemos conversar sim — disse ela, tentando não olhar para Leonardo.

Ele assentiu, forçando um sorriso.

— Claro. Conversar é sempre bom — disse, com ironia sutil.

Enquanto o café da manhã se desenrolava, Clara sentia o ar carregado. Sofia, inocente, ria com Leonardo, enquanto Nicolas observava tudo como quem esperava o momento certo para agir.

Clara secava as mãos no pano de prato, inquieta. Sofia brincava no quarto e Leonardo tinha saído para atender uma ligação importante do lado de fora. Só restavam ela e Nicolas na sala, e o silêncio entre eles já dizia tudo: era hora da conversa.

— Eu sei que você quer dizer alguma coisa, Nicolas. Pode falar — disse ela, finalmente, encarando-o.

Ele se levantou do sofá devagar, cruzando os braços.

— Não quero te magoar, Clarinha. Só… me preocupa ver você se deixando levar tão rápido.

— Não estou me deixando levar — retrucou ela, defensiva. — Só estou… sentindo. Pela primeira vez em muito tempo.

Nicolas suspirou e caminhou até ela. Parou perto, mas com a distância respeitosa de sempre.

— Eu não tô aqui como um homem com ciúmes. Você sabe disso. Nunca te olhei desse jeito.

Clara o olhou com as sobrancelhas arqueadas, e ele sorriu de canto.

— Você é como uma irmã pra mim. Eu te amo, mas é um amor diferente. Familiar, protetor. Eu vi você quase desmoronar quando ficou grávida, sem apoio, sem chão. Vi você se levantar, sozinha, por você e pela Sofia. Não tem como eu não querer cuidar de vocês.

Ela desviou o olhar, tocando o próprio braço, lembrando do passado.

— Você acha que o Leonardo vai me machucar também, né?

— Eu não sei, Clara. É isso que me assusta. Você já foi usada antes por um homem exatamente como ele. Rico, encantador, cheio de promessas. E no fim… te deixou com uma filha e um coração em pedaços.

Ela fechou os olhos por um segundo, sentindo a dor da lembrança pesar no peito. A imagem do pai de Sofia veio como um fantasma: sorrisos falsos, palavras bonitas, mãos que diziam amor e atos que provaram o contrário.

— O pai da Sofia foi um erro que me custou caro. Mas o Leonardo… ele é diferente, Nick. Ele escuta, ele cuida… ele não fugiu quando eu fiquei doente. Dormiu no mesmo quarto que a minha filha. Teve paciência comigo.

— Eu vi — disse Nicolas, com um leve aceno de cabeça. — E por isso, pela primeira vez, estou torcendo pra estar errado.

Clara o encarou, surpresa com a sinceridade.

— Sério?

— Sério. Eu só precisava ter certeza de que você está vendo as coisas com clareza. Porque o que me preocupa não é o Leonardo como homem. É o Leonardo como o que ele representa. Um novo risco. Um novo tombo.

Ela assentiu, os olhos úmidos.

— Eu entendo. Obrigada por cuidar de mim… sempre.

Nicolas abriu os braços e ela se jogou neles, num abraço apertado, fraternal, cheio de história. Não havia paixão ali. Só cuidado, lealdade e uma amizade que resistira a tantas tempestades.

Ao longe, Leonardo voltou da ligação e viu a cena pela janela da sala. Não ouviu nada — apenas viu os dois abraçados e Clara com os olhos fechados, apoiada no peito de Nicolas.

Seus punhos se fecharam sem perceber.

Ele queria confiar…

Mas o ciúme latejava como um alarme disparado.

E mesmo sem saber, Clara teria que lidar agora com dois corações que batiam perto demais do seu — um de um amigo que a conhecia profundamente…

E outro de um homem que estava disposto a fazer qualquer coisa para conhecê-la ainda mais.

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