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Sob o Domínio do Alfa

Capítulo 1

⚠️ Recado do Autor:

> Essa história vai contar sobre um ômega frágil, de ciclo irregular, tímido e inseguro. Um ômega que se acha inferior aos outros, que evita espelhos e não entende o próprio valor.

Se você procura um romance leve e com personagens perfeitos, essa história talvez não seja para você. Aqui, vamos acompanhar a jornada de um coração que nunca aprendeu a se amar... até ser visto por olhos que não queriam amar ninguém.

Essa é a história de Elyan e Cael.

Um ômega esquecido pelo mundo.

Um alfa que jurou nunca se apegar.

Que comece a dor.

Que comece o amor

...----------------...

 O Início De Tudo

A primeira vez que Elyan percebeu que havia algo errado com ele, tinha apenas nove anos.

Os outros ômegas da escola já começavam a exalar o cheiro doce da puberdade, provocando suspiros e olhares famintos dos alfas adolescentes. Mas ele? Elyan só sentia enjoo. E vergonha. O cheiro dele era fraco, quase nulo. “Desperdiçado”, diziam.

— É como se você nem fosse um ômega de verdade — murmurou a mãe certa noite, sem olhar nos olhos dele.

Aquela frase ficou. Como uma cicatriz que nunca fechou.

Agora, com vinte e um anos, Elyan trabalhava como técnico de enfermagem no hospital da fronteira norte. Era um lugar isolado, ideal para alguém que queria passar despercebido. Ali, usava jaleco grande demais, calava-se mais do que falava, e mantinha sempre um metro de distância de qualquer alfa.

Não gostava da forma como eles olhavam. Ou como o corpo dele, traidor, às vezes reagia mesmo sem estar em cio.

Principalmente não gostava de lembrar que nunca teve um cio completo. Era como se o instinto dele tivesse sido cortado pela metade.

— Elyan, precisa atender na tenda de triagem — chamou a enfermeira-chefe, olhando para ele com pressa. — Um grupo chegou ferido depois do confronto nos portões leste.

Ele assentiu e pegou a prancheta. Era só mais uma noite comum de plantão. Mais feridos, mais sangue, mais silêncio. Até que não foi.

A tenda estava cheia de soldados, mas um deles...

Ele.

Cael Alaric.

Mesmo desacordado, exalava autoridade. Sangue cobria parte do tórax largo, as veias do pescoço saltavam como cordas tensas. A presença dele engoliu o ar da tenda. Um Alfa Supremo. Um líder de clã.

Elyan congelou.

Seu corpo, fraco, hesitante, começou a tremer. E o pior — sua garganta ardeu.

Não. Não agora.

Não era possível.

Um nó se formou em sua barriga. Algo antigo. Algo instintivo.

O cheiro de Cael — amadeirado, escuro, dominante — atravessou o véu da sua suposta anomalia.

O coração de Elyan disparou. Ele tentou recuar, mas os olhos âmbar se abriram.

Olharam direto para ele.

Elyan estremeceu.

— Você... é meu? — a voz rouca e baixa, ainda entorpecida, cortou o ar.

Não. Por favor, não.

Ele recuou um passo, depois outro, batendo na maca atrás de si. Os soldados riram baixinho, achando graça da reação.

Mas o olhar de Cael não se moveu. Era como se o instinto soubesse o que a razão nem conseguia aceitar.

Ali, naquela tenda sufocante, o mundo de Elyan mudou para sempre.

E o do Alfa também.

— Você… é meu?

As palavras de Cael ecoaram pela tenda como uma sentença. Não havia música de fundo, não havia romantismo, só uma verdade crua que fez o estômago de Elyan se revirar.

Ele não respondeu.

Não conseguia.

Sentia-se pequeno. Sujo. Ridículo. Como poderia pertencer a alguém como aquele homem? Um Alfa de guerra, com músculos marcados pela batalha e um olhar que pesava mais do que qualquer armadura?

— Ômega — murmurou Cael outra vez, ainda com a voz rouca, mas firme. O cheiro dele se intensificava, preenchendo cada canto da tenda, derrubando defesas que Elyan nem sabia que tinha. — Por que você está tremendo?

Elyan engoliu em seco. Sua voz saiu num sussurro fraco, quase infantil:

— Eu… não… não sou o que você pensa…

Ele recuou mais um passo, até sentir a lona gelada da parede da tenda pressionando suas costas. Sentia as pernas bambas. O ar rarefeito. E algo mais profundo… uma sensação quente entre as pernas, que não surgia desde os tempos da adolescência. A que ele sempre achou que nunca teria de verdade.

“Não agora... por favor... não perto dele.”

— Preciso chamar a médica… — disse rápido, tentando se afastar. Mas uma mão forte agarrou seu pulso antes que ele pudesse fugir.

— Não. Fica. — Cael rosnou. Não foi um pedido.

Foi uma ordem.

Elyan congelou. O toque dele era quente, firme, dominante. E mesmo que a mente gritasse para correr, o corpo paralisava como se estivesse preso em outra realidade. Como se, de algum modo, aquele Alfa tivesse poder sobre ele — mesmo ferido, mesmo ainda entre a inconsciência e o mundo real.

— Seu cheiro… é tão sutil… — murmurou Cael, estreitando os olhos. — Mas agora que senti, não consigo ignorar.

Elyan sentiu as bochechas arderem. Vergonha. Humilhação. Seu cheiro… aquele que tantos diziam ser fraco, apagado, defeituoso… agora era notado por ele.

— Me solta… — pediu baixinho, com a voz trêmula.

Os soldados em volta pareciam nem respirar. Estavam atentos. Assustados. Sabiam que Cael nunca se ligava a ninguém. Que nunca demonstrava reação diante de ômegas.

E agora ele segurava um... que mal exalava.

— Você tem nome? — perguntou o Alfa, sem soltar seu pulso.

— E… Elyan.

Cael o olhou como se quisesse gravar aquele nome no próprio sangue.

— Elyan — repetiu devagar. — Você é meu.

O mundo de Elyan girou.

Ele puxou o braço com força e, dessa vez, Cael deixou-o ir. O ômega saiu correndo da tenda, tropeçando no próprio medo, com o peito apertado e a respiração descompassada.

Correu para o banheiro mais próximo, trancou a porta e deslizou até o chão, com o jaleco encharcado de suor. Chorou em silêncio. De vergonha. De pânico.

“Não pode ser. Não comigo. Ele está confuso. Eu não sou… especial.”

Mas o cheiro de Cael ainda estava em sua pele. E o coração ainda batia forte demais.

Ali, naquele chão frio, Elyan percebeu a verdade mais assustadora:

Seu primeiro cio estava despertando.

E o Alfa que o sentiu…

Era o mais perigoso do mundo.

Capítulo 2

 O Alfa Desperta

Acordar com dor já era esperado. Cael estava acostumado ao sangue, ao estalo de ossos se quebrando, às batalhas silenciosas onde o menor erro significava a morte.

Mas acordar com um cheiro doce ainda pairando em seu instinto... isso era novo.

Ele abriu os olhos lentamente. A luz tênue do alojamento médico banhava as paredes brancas. Seus músculos doíam, os pontos em sua lateral latejavam, e sua cabeça ainda girava — mas o foco dele estava em outra coisa.

Aquele cheiro.

Fraco, delicado, quase imperceptível… como uma flor que cresce escondida entre as pedras. Era diferente de tudo que já havia sentido. Não tinha a intensidade de um cio comum. Era mais sutil. Raro.

E, por algum motivo, aquilo o deixava em alerta. Em fome. Em fúria.

— Enfermeira — rosnou baixo, sua voz ainda rouca da sedação.

A mulher que o atendia tremeu. Sabia exatamente quem estava na maca.

— O ômega que estava aqui antes — disse ele, encarando-a com intensidade. — Nome. Registro. Alcateia.

— M-me desculpe, Alfa… eu… não sei… eles trocam de plantão muito rápido…

— Minta de novo e vai sair daqui em pedaços — murmurou Cael, sentando-se com dificuldade, ignorando os pontos recém-feitos em seu abdômen. — Diga. O nome dele.

A enfermeira engoliu seco.

— Elyan… só isso que sei. Trabalha nos turnos da madrugada. Não fala muito com ninguém…

Cael repetiu o nome mentalmente, como se cada sílaba tivesse um sabor que ele não podia esquecer.

Elyan.

Do outro lado do hospital, Elyan andava rápido pelos corredores estreitos, encolhido dentro do jaleco branco. Evitava todos os olhares, fingia não ouvir as conversas sussurradas sobre o “Alfa Supremo que havia despertado”.

Seu peito ainda ardia.

Seu cheiro… estava ficando mais doce. Mais perceptível.

"Não agora. Por favor, não agora."

Passara a noite trancado no armário de suprimentos, com toalhas molhadas e calmantes, tentando conter o que parecia ser o seu primeiro cio real. O corpo estava quente, os sentidos bagunçados, e o medo latejava nas veias.

— Idiota. Você é um defeito, lembra? Um omega quebrado… ele só te confundiu com outra coisa.

Mas uma parte dele… uma parte suja e secreta… queria que aquele Alfa o encontrasse.

Elyan odiava essa parte.

No centro médico, Cael estava de pé.

— Você não pode levantar! — protestou um dos enfermeiros. — Seus pontos vão abrir!

Cael o ignorou.

— Onde ele está?

— Quem?

— Meu ômega.

As palavras saíram rasgadas, possessivas. Ele nem percebeu o que disse — só sabia que precisava ver aquele rosto de novo. Ouvir aquela voz tímida. Ver aqueles olhos grandes se encolhendo ao sentir seu cheiro.

O vínculo… mesmo incompleto… já o corroía por dentro.

Elyan escutou os passos pesados. Estavam vindo. Instinto.

Entrou na sala de arquivos e se encolheu atrás de uma pilha de caixas, cobrindo o nariz com a manga do jaleco. Tentando esconder seu cheiro, tentando desaparecer.

O coração batia alto demais.

A porta se abriu.

— Sei que está aqui. — A voz de Cael entrou antes do corpo. — Você está tentando esconder de mim… mas eu posso sentir você.

Elyan apertou os olhos, prendendo a respiração.

“Vai embora. Vai embora. Por favor…”

Mas os passos vieram, lentos, firmes. E então… silêncio.

Até que uma respiração quente bateu contra sua orelha.

— Você acha mesmo que consegue se esconder do Alfa que o sentiu?

Elyan soltou um soluço. Estava tremendo.

— Eu… não sou forte… não sou como os outros… — sussurrou, quase implorando. — Por favor… me deixa em paz…

Cael ajoelhou-se na frente dele.

Os olhos âmbar agora estavam mais escuros. Com fome. Mas não era apenas desejo carnal.

Era algo pior.

Era vínculo.

— Eu lutei guerras inteiras para manter minha liberdade. — Ele tocou de leve o queixo de Elyan. — Nunca aceitei nenhum ômega. Nunca quis nenhum.

— Então por que…? — a voz de Elyan falhou.

— Porque você é meu. E mesmo se tentar correr… vai estar só fugindo de algo que já é parte de você.

Cael se aproximou mais, o nariz roçando o pescoço sensível de Elyan.

— E pela primeira vez… meu lobo está uivando.

Elyan mordeu o lábio, olhos marejados, coração em colapso.

Ele queria correr. Mas uma parte dele… queria ficar.

Era só o começo.

E nem um deles sairia ileso.

Elyan mal conseguia respirar.

O calor que subia por seu corpo era diferente de qualquer coisa que já sentira. Não era febre. Não era medo. Era algo profundo, biológico. Como se finalmente o que existia adormecido dentro dele — o que ele sempre achou defeituoso — começasse a se mover. A florescer.

Mas florescer doía.

— Não… — ele sussurrou, o rosto ainda virado, sem conseguir encarar Cael. — Não faz isso comigo…

Cael não tocava. Só estava perto. Perto demais. O calor do corpo dele o envolvia como um cobertor que queimava. O cheiro do Alfa fazia sua pele arrepiar, os pelos do pescoço se eriçarem.

— Você está tremendo — disse Cael, a voz baixa, quase num rosnado contido. — Está começando, não está?

Elyan fechou os olhos com força, tentando negar.

Mas o cheiro dele… agora era perceptível.

O cio estava ali.

Pela primeira vez, depois de tantos anos sendo invisível, apagado, medicado… seu corpo estava se preparando para algo que ele não queria.

Não assim. Não com um Alfa como ele.

— Você não entende… — disse Elyan, com a voz falha. — Eu não sou como os outros ômegas. Nunca tive um ciclo completo. Nunca tive ninguém… Meu corpo não é bonito, meu cheiro não é forte, eu…

Cael o interrompeu.

— Cale a boca.

O comando não foi cruel. Foi firme. Carregado de uma autoridade que fazia o ar ao redor estremecer.

E então o Alfa se aproximou um pouco mais, apenas o suficiente para que Elyan sentisse a respiração dele contra sua pele.

— Você não sabe nada sobre o que me atrai — murmurou. — Eu não quero um ômega de vitrine. Nunca quis. E o seu cheiro fraco? Está me deixando louco.

Elyan tentou virar o rosto, mas Cael segurou seu queixo com uma delicadeza que parecia não combinar com suas mãos grandes e marcadas por cicatrizes.

— Você acha que é fraco, Elyan. Mas está lutando contra o próprio corpo, contra o instinto, e ainda está de pé. Isso é mais força do que qualquer um dos ômegas que rastejam atrás de mim.

Elyan sentiu uma lágrima escorrer.

Não porque acreditava. Mas porque queria acreditar.

Longe dali, os sensores do hospital começaram a disparar alertas silenciosos. Técnicos betas observavam os dados de feromônios sendo liberados em níveis crescentes na ala sul.

— Temos um Ômega entrando em cio… — murmurou um deles, franzindo o cenho.

— Nessa ala? Mas lá só tem… espera. — Ele olhou o registro e arregalou os olhos. — É ele. O recessivo. Elyan.

Cael percebeu o corpo do ômega amolecer de leve, como se o instinto estivesse vencendo a luta. A respiração de Elyan estava ofegante. A pele, quente. Os olhos, marejados, mas brilhando.

— Preciso de espaço… — sussurrou ele, com esforço. — Eu não quero… que isso aconteça aqui… com você…

— Eu não vou tocar em você — disse Cael, ainda rosnando por dentro, o autocontrole no limite. — Não enquanto estiver lutando contra si mesmo. Mas vou ficar aqui. Não vou te deixar sozinho.

Elyan engoliu seco.

— Você devia… me odiar. Sou um erro genético.

Cael chegou mais perto, até suas testas quase se tocarem.

— Você é a única coisa que me faz sentir alguma coisa depois de anos. E isso me assusta mais do que qualquer guerra.

Um silêncio pesado caiu entre os dois.

Então, Elyan se moveu.

Apenas deitou a cabeça contra o peito de Cael.

Não como um pedido. Mas como uma rendição temporária. Um “por agora”.

E o Alfa o envolveu com os braços fortes, como se o mundo inteiro pudesse esperar lá fora.

Ali, em meio ao cheiro do cio crescente e ao desespero silencioso de alguém que nunca foi amado… nascia algo entre eles.

Não era amor ainda.

Era instinto.

Era caos.

Era o começo.

Capítulo 3

 O Cio que Não Pode Ser Vivido

A noite caiu como um lençol pesado sobre a cidade.

Elyan corria.

Corria como se algo dentro dele fosse explodir.

Como se pudesse fugir de si mesmo.

Saiu pelos fundos do hospital, atravessou os corredores frios, deixou para trás o crachá, o jaleco, o mundo que conhecia. O cio havia começado. E era pior do que ele temia.

O corpo queimava.

O calor o fazia suar, tremer, ofegar. As pernas não obedeciam direito. Cada passo era uma luta contra um desejo irracional. Um desejo que nunca pediu.

Ele não queria aquilo.

Não daquele jeito.

Não agora.

O vínculo... a ligação... estava se formando. E isso o apavorava.

Cael.

Aquele Alfa.

Só o nome fazia seu coração bater mais forte. O cheiro dele ainda estava grudado em sua pele, mesmo que houvesse tomado banho às pressas. Nada o apagava.

— Eu não sou dele… — Elyan murmurava para si mesmo, em negação. — Não sou de ninguém.

Mas o corpo dizia o contrário.

Cael estava no alto da escadaria do hospital, olhos fixos na saída dos fundos. O cheiro do ômega era como uma trilha acesa em brasas.

Fraco, delicado, mas agora... em cio.

Seu lobo interior estava enlouquecido.

Gritava, exigia, queria reivindicar.

Mas Cael segurava o instinto com os dentes.

Ele não queria forçar Elyan.

Só que o vínculo estava se prendendo nele também. A dor física já começava. A ausência do outro... fazia seu coração pesar como chumbo.

"Fuja. Mas eu vou atrás."

E foi.

Elyan alcançou uma rua deserta e se escondeu entre prédios em construção. Encolhido, suando, respirando com dificuldade.

Estava com vergonha.

Vergonha do que sentia. Do calor entre as pernas. Da forma como seu corpo estava começando a pedir um Alfa. Ele, que sempre foi invisível. Que sempre teve o ciclo irregular. Que se dopava com bloqueadores que nunca funcionavam por completo.

Agora tudo estava vindo com força.

A verdade era cruel: ele era ômega. E o cio não tinha piedade de corpos frágeis.

Uma contração no ventre o fez soltar um gemido abafado.

— Não… por favor… — ele murmurou, mordendo os próprios dedos para conter o som. — Eu não quero isso…

Mas o cheiro de Cael...

Estava ali.

Ele virou bruscamente, e o viu.

Alto. Escuro. Intenso.

Cael o observava a poucos metros, parado, com os punhos cerrados, como se a presença de Elyan o deixasse em tormento físico.

— Não corra mais, Elyan. — a voz dele soou rouca, grave, carregada de algo ancestral. — Você está machucando os dois.

— Eu… não… — Elyan recuou, mas tropeçou em uma pedra e caiu sentado no chão frio. Os olhos se encheram de lágrimas. — Vai embora. Vai embora! Eu não sou um ômega como você quer!

Cael avançou com calma, ajoelhando-se diante dele.

Não o tocou.

Apenas olhou. Como se estivesse vendo alguém quebrado e não soubesse como consertar.

— Você acha que eu te quero só por desejo? — ele sussurrou. — Você acha que eu não sei o que é carregar dor no corpo?

— Eu sou… uma aberração. Meu cio é fraco. Meus hormônios são bagunçados. Meu cheiro é inconsistente. Eu... me odeio! — Elyan gritava entre soluços, tremendo.

— Então me odeie junto. — Cael respondeu. — Mas não fuja mais de mim.

Silêncio.

Elyan fechou os olhos.

As lágrimas desciam como chuva. Ele estava cansado. Confuso. Frágil demais para lutar.

E no meio da dor… ele se aproximou.

Só um pouco. Encostou a testa no ombro largo de Cael. E respirou fundo, tentando conter os espasmos do cio.

Cael mordeu o próprio lábio até sangrar.

Não a tocou além disso.

— Se quiser, eu te levo para um abrigo. Um lugar seguro, onde ninguém vai te tocar. Eu só quero te proteger… mesmo que isso signifique ficar longe. — a voz dele falhou, quebrada.

Elyan engoliu em seco. Não respondeu. Só sussurrou:

— Me leva, então.

Naquela madrugada, Cael o levou.

Cobriu seu cheiro. Fez um ninho improvisado com lençóis. Deixou calmantes à disposição. Colocou água e comida por perto. E deitou no chão, longe da cama, de costas para o instinto que o consumia.

Ali, na penumbra, dois corpos suavam em silêncio.

Ambos tremendo. Ambos ligados por um fio invisível.

O cio não foi vivido.

Mas foi sentido.

E o vínculo estava selado.

Mesmo que negassem.

Mesmo que fugissem.

O Alfa e o Ômega…

já eram um do outro.

A madrugada passou devagar, arrastada como um lamento.

O quarto era pequeno, abafado, sem janelas — um abrigo de emergência que Cael usava raramente. Isolado. Sem cheiro de outros alfas, sem presença de ninguém além deles.

Elyan estava deitado no colchão improvisado, encolhido sob cobertores macios, o corpo ainda trêmulo. O calor do cio havia amenizado com os calmantes, mas o desconforto persistia. Não era apenas físico. Era emocional.

Seu corpo pedira algo que ele se recusou a dar.

E agora… estava exausto.

Do outro lado do cômodo, Cael permanecia em silêncio, sentado no chão, as costas apoiadas na parede, os olhos fixos no teto. O lobo dentro dele uivava em silêncio, ferido por não ter podido completar o ciclo, mas a dor mais profunda não vinha do cio não vivido.

Vinha da distância.

De vê-lo ali, tão pequeno e vulnerável, e não poder fazer nada além de esperar que Elyan confiasse.

— Você está com fome? — perguntou, finalmente, a voz rouca.

Elyan demorou a responder.

— Não muito… Mas… obrigada.

Cael franziu o cenho.

Aquele “obrigada” era o primeiro agradecimento que recebia dele. Um sinal mínimo. Uma rachadura na parede que Elyan construía ao redor de si.

Ele se levantou devagar, pegou uma garrafa de água e uma tigela com sopa morna que havia esquentado mais cedo, e deixou tudo ao lado do colchão, sem forçar contato. Sem olhar nos olhos dele.

— Vou sair por algumas horas — disse com voz contida. — Preciso resolver uma coisa. Tem comida, remédio e cobertores suficientes. Tranque a porta por dentro se quiser.

Elyan mordeu o lábio, inseguro.

— Você… vai mesmo voltar?

Cael parou, surpreso. Então sorriu, mas foi um sorriso triste.

— Eu sempre volto, Elyan. Mesmo quando queria não voltar.

Horas depois, sozinho no quarto, Elyan observava a porta trancada.

A comida esfriava na bandeja. Mas ele não conseguia comer.

Estava deitado, abraçado a um travesseiro, sentindo o cheiro fraco que Cael havia deixado para marcar o ninho. Algo no fundo do peito apertava. Algo indefinido. Saudade? Carência? Vontade de ser visto?

Ele odiava sentir isso.

“Você está se entregando”, sussurrava a voz na sua cabeça. “É só o cio. Quando passar, ele vai te esquecer.”

Mas parte dele sabia que não era verdade.

Cael poderia ser muitas coisas. Um alfa rude. Dominante. Impiedoso com seus inimigos.

Mas não era mentiroso.

E tinha sido gentil.

Paciente.

Presente.

Mesmo sem nunca ter prometido nada.

Elyan apertou mais o travesseiro, tentando segurar o choro.

— Por que justo eu? — murmurou. — Por que você me escolheu…?

Enquanto isso, Cael estava em uma reunião de emergência com o Alto Conselho de Alfas. A ligação entre ele e o ômega havia sido notada. E aquilo incomodava.

— Um ômega recessivo, Cael? — disse um dos conselheiros mais velhos. — Um que nem deveria ser considerado fértil?

— Isso não é da conta de vocês. — Cael respondeu seco, frio. — Ele é meu. E é tudo o que precisam saber.

— Você sabe que esse tipo de vínculo… enfraquece alianças. Não há valor político nisso.

Cael rosnou. O som fez os outros se calarem por um instante.

— Não me interessa valor político. Eu não sou um peão de acasalamento. E se alguém encostar nele, eu arranco os olhos.

A sala silenciou.

O olhar assassino de Cael não deixava dúvidas: ninguém tocaria em Elyan.

No final do dia, ele voltou ao abrigo.

Abriu a porta devagar.

Elyan estava no mesmo lugar. Mas agora dormia. Encolhido, com a respiração calma, a testa suada, os lençóis bagunçados. Havia chorado — Cael podia ver pelos traços ainda úmidos nos cílios.

Se aproximou em silêncio.

Sentou-se ao lado do colchão.

Olhou para ele como quem olha algo precioso, mas quebrado. Algo que não sabe se pode tocar.

Elyan abriu os olhos devagar.

— Você voltou…

Cael sorriu de leve.

— Eu disse que voltaria.

Elyan hesitou… e então, lentamente, estendeu a mão.

Cael a segurou, com firmeza. Mas sem força.

A conexão entre eles queimava em silêncio. Um fio invisível, frágil, mas cada vez mais impossível de romper.

Elyan sussurrou, com a voz mais baixa que um pensamento:

— Se eu deixar você me querer… promete não me quebrar?

Cael não respondeu com palavras.

Apenas se inclinou, encostou a testa na dele…

E ficou ali. Prometendo com o silêncio.

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